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Contribuição previdenciária patronal sobre as folhas de pagamento

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Agenda 27/06/2023 às 11:20

5. Das verbas

Antes de mais nada, a própria lei 8.212/91 elege um rol, em seu art. 28, §9º, de verbas que possuem natureza indenizatória:

Mesmo com o extenso rol trazido pela legislação, ainda sim o legislador não conseguiu contemplar todo o universo de verbas pagas em uma relação empregatícia. O que dizer, por exemplo, sobre a natureza do aviso-prévio? Seria uma verba remuneratória se o período fosse trabalhado? E indenizatória se o valor correspondente aos dias fosse indenizado ao obreiro? E quanto as férias? E o terço de férias?

Ou seja: o rol trazido pelo §9º do art. 28 da Lei 8.212/91 é exemplificativo/aberto/ampliativo, não podendo o aplicador do direito ficar restrito somente a essas hipóteses, mas, estando livre para analisar a natureza jurídica de cada verba in concreto.

Assim, inicia-se a análise de algumas verbas controvertidas.

5.1. Terço de férias/horas-extras/adicionais noturnos, de periculosidade e insalubridade

O adicional por trabalho noturno, como a sua própria denominação prevê, tem por objetivo indenizar os empregados pelo caráter prejudicial à saúde, bem-estar e, até mesmo, à sua própria segurança pelas funções exercidas durante este período.

O adicional foi criado pois presume-se que o período noturno é prejudicial ao obreiro que labora nesses horários.

Já o adicional por insalubridade pressupõe que o obreiro, no decorrer das suas atividades sofres riscos de ser acometido por moléstias. Por fim, o adicional por periculosidade pressupõe que o obreiro se exponha de forma habitual ou permanente à risco de morte ou lesão grave no decorrer de suas atividades.

Sendo adicionais que visam coibir o risco do empregado, devem ser interpretadas como não integrantes do salário-de-contribuição, eis que decorrem não de uma contraprestação ao serviço, mas sim pela exposição ao risco que esta acarreta para si. Ou seja: o valor percebido pelo obreiro não tem a ver com o seu serviço, mas sim com o risco que corre, e, sendo assim, por não possuírem lastro no trabalho, não devem ser entendidas como verbas de natureza remuneratória.

Já os adicionais por serviços extraordinários, ou horas-extras, servem, justamente, para punir o empregador por exigir uma jornada de trabalho superior àquela definida em lei, contrato ou convenção coletiva, e indenizar o empregado que se submeteu a esta situação. Ou seja, novamente, trata-se de verba que está lastreada em um prejuízo sofrido pelo empregado, e não, efetivamente, no trabalho que prestou

Contudo, o entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça caminha em sentido contrário. Este entende que as referidas verbas devem compor o salário-de-contribuição, sendo, portando, verbas com cunho remuneratório, e não indenizatório, conforme consta em seu informativo n.º. 540.

DIREITO TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE VERBAS TRABALHISTAS. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).

Estão sujeitas à incidência de contribuição previdenciária as parcelas pagas pelo empregador a título de horas extras e seu respectivo adicional, bem como os valores pagos a título de adicional noturno e de periculosidade.

Por um lado, a Lei 8.212/1991, em seu art. 22, I, determina que a contribuição previdenciária a cargo da empresa é de “vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa”. Por outro lado, o §2º do art. 22 da Lei 8.212/1991, ao consignar que não integram o conceito de remuneração as verbas listadas no §9º do art. 28 do mesmo diploma legal, expressamente exclui uma série de parcelas da base de cálculo do tributo. Com base nesse quadro normativo, o STJ consolidou firme jurisprudência no sentido de que não sofrem a incidência de contribuição previdenciária “as importâncias pagas a título de indenização, que não correspondam a serviços prestados nem a tempo à disposição do empregador” (REsp 1.230.957-RS, Primeira Seção, DJe 18/3/2014, submetido ao rito do art. 543-C do CPC). Nesse contexto, se a verba trabalhista possuir natureza remuneratória, destinando-se a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, ela deve integrar a base de cálculo da contribuição. Desse modo, consoante entendimento pacífico no âmbito da Primeira Seção do STJ, os adicionais noturno e de periculosidade, as horas-extras e seu respectivo adicional constituem verbas de natureza remuneratória, razão pela qual se sujeitam à incidência de contribuição previdenciária. Precedentes citados: REsp 1.098.102-SC, Primeira Turma, DJe 17/6/2009; e AgRg no AREsp 69.958-DF, Segunda Turma, DJe 20/6/2012.

REsp 1.358.281-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23/4/2014.45

Contudo, em decisão recentíssima do Supremo Tribunal Federal, ao analisar o RE 593.068/SC, apreciando o tema 163 da repercussão geral, deu provimento ao recurso, entendendo que não incidem as referidas verbas descritas neste tópico para fins de incorporação aos proventos de aposentadoria do servidor público, ou seja, se não incorporam os proventos de aposentadoria, possuem natureza indenizatória.

O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 163 da repercussão geral, deu parcial provimento ao recurso extraordinário para determinar a restituição das parcelas não prescritas, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli (Presidente), Marco Aurélio e Gilmar Mendes. Em seguida, por maioria, fixou-se a seguinte tese: “Não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público, tais como ‘terço de férias’, ‘serviços extraordinários’, ‘adicional noturno’ e ‘adicional de insalubridade’”, vencido o Ministro Marco Aurélio. Não votou o Ministro Alexandre de Moraes, sucessor do Ministro Teori Zavascki. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello.

Plenário, 11.10.2018.46

Trata-se de acertado entendimento proferido pelo Supremo Tribunal Federal, eis, que, analisando-se os elementos do vínculo empregatício, verifica-se que:

Os adicionais supracitados não possuem o elemento da habitualidade, eis, que, cessadas as situações de risco, cessam-se, igualmente, as referidas verbas, não vislumbrando, portanto, a existência de elemento salarial.

Os adicionais por jornada extraordinária não possuem, igualmente, o mesmo elemento, eis, que, caso o empregado não extrapole a referida jornada, não fara jus à referida verba, não sendo esta paga de forma habitual ao empregado.

Por fim, o terço adicional de férias é recebido independentemente da contraprestação de um trabalho. Trata-se de legítimo adicional com natureza indenizatória concedida ao obreiro que cumpriu o seu período aquisitivo e obteve o direito de gozar das suas férias.

Assim sendo, seria perfeitamente possível excluir as referidas verbas sobre a base de cálculo da CPP, eis que o tema fora pacificado na mais alta corte judicial brasileira.

5.2. Os 15 primeiros dias de afastamento que antecedem o auxílio doença

O auxílio-doença é um benefício previdenciário que visa conceder ao segurado da previdência social certa estabilidade financeira após sofrer algum acidente ou ser acometido por alguma doença que o impossibilite de exercer as suas atividades laborativas usuais.

Um de seus requisitos é que o acidente seja grave a ponto de fazer com que este seja suspenso durante um período superior a 15 dias, ou seja, nos primeiros 15 dias a remuneração deverá ser paga pela empresa, e, após este prazo, haverá a concessão do auxílio-doença para que o obreiro afastado continue com a sua estabilidade financeira.

Sendo a remuneração concedida ao obreiro independentemente da realização de um trabalho, trata-se de verba nitidamente indenizatória, eis, que o empregado está percebendo tal quantia independentemente da contraprestação de um serviço.

Este é o entendimento do E. STF:

3. A jurisprudência encontra-se pacificada no sentido de que a remuneração paga pelo empregador durante os primeiros quinze dias de afastamento do empregado por motivo de doença ou acidente não tem natureza salarial e sim previdenciária. Precedentes desta Corte e do STJ. 47

Logo, o referido período deve ser excluído sobre a base de cálculo da CPP.

5.3. Salário Maternidade/Paternidade e Férias Gozadas

Entre as contingencias sociais previstas em lei e sujeitas à proteção pelo regime previdenciário estão a doença, o acidente e a maternidade/paternidade, em relação às quais foram criados os benefícios denominados auxílio-doença, auxílio-acidente e salário-maternidade/paternidade.

O salário-maternidade é devido á gestante segurada empregada, trabalhadora avulsa, empregada doméstica, contribuinte individual, facultativa ou segurada especial, durante 120 dias (exceto na hipótese de adoção, em que o período é escalonado, dependendo da idade da criança), ou até mesmo por 180 dias (por opção da empregadora, desde que tributada pelo Lucro Real), com início até 28 dias anteriores ao parto e término 91 dias depois dele, considerando, inclusive, o dia do parto. Em regra, é pago pela empresa, e reembolsado pelo INSS, via compensação contra a contribuição devida ao INSS. Na hipótese de serem pagos os 60 dias a mais (empregadora optante por licença maternidade de 180 dias) os 60 dias adicionais pagos pela empregadora são compensados com imposto sobre a renda devido pela empregadora na modalidade Lucro Real.

Relativamente ao salário-maternidade, não resta dúvida de que também esta parcela não pode integrar a base de cálculo da contribuição previdenciária.

Isso porque, conforme expostos linhas atrás, trata-se de benefício de natureza previdenciária, cuja finalidade é reforçar o patrimônio da segurada quando da ocorrência de uma contingencia social que impede de trabalhar, e não de remuneração por serviço prestado pela empregada, não se ajustando, portanto, à situação prevista no art. 195, I, “a”, da Constituição Federal.

Sendo assim, a previsão contida no artigo 28, §2° da Lei 8.212/91 contraria o disposto no artigo 195, §4° da Constituição Federal, uma vez que tal dispositivo somente permite a criação de novas fontes de custeio da seguridade social se respeitando o disposto no artigo 154, I da carta, ou seja, mediante lei complementar (e a Lei 8.212/91 não é lei complementar), desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados em seu texto.

Fica ainda mais evidente a impossibilidade de incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade quando se verifica que é o próprio INSS o sujeito obrigado ao pagamento destas parcelas, uma vez que a empresa apenas adianta tais valores à segurada, vindo posteriormente a deduzi-los contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento a pagar. Diante de fato tão contundente, afasta-se qualquer dúvida a respeito da inconstitucionalidade da exceção trazida pelo art. 28, § 9°, I, da Lei n° 8.212/91, segundo a qual não integram o salário de contribuição os benefícios da previdência social, nos ermos e limites legais, salvo o salário-maternidade.

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Pelo exposto, nos parece clara a impossibilidade de inclusão do salário-maternidade, na base de cálculo da contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salário.

Já as férias gozadas podem ser interpretadas com o mesmo raciocínio, eis que trata-se de uma verba que o obreiro recebe independentemente da contraprestação de um serviço, mas em decorrência ao atingimento da hipótese de incidência que a prevê.

Em que pese o entendimento do Superior Tribunal de Justiça ser praticamente pacífico neste sentido, a discussão não pode ser deixada de lado, eis que ainda existe uma corrente minoritária, no sentido de conferir natureza indenizatória às referidas verbas ainda sim encontra eco no poder judiciário, conforme se verifica do julgamento do AgRg no Agravo de Instrumento n.º. 1.420.247-DF:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SALÁRIO-MATERNIDADE E FÉRIAS GOZADAS. AUSÊNCIA DE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PELO EMPREGADO. NATUREZA INDENIZATÓRIA QUE NÃO PODE SER ALTERADA. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. RELEVÂNCIA DA MATÉRIA A EXIGIR REABERTURA DA DISCUSSÃO PERANTE A 1ª. SEÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO PARA DETERMINAR A SUBIDA DOS AUTOS DO RECURSO ESPECIAL QUE, NOS TERMOS DO ART. 14, II DO RISTJ, FICA, DESDE JÁ, SUBMETIDO A JULGAMENTO PELA 1ª. SEÇÃO.

1. O preceito normativo não pode transmudar a natureza jurídica de uma verba. Tanto no salário-maternidade quanto nas férias gozadas, independentemente do título que lhes é conferido legalmente, não há efetiva prestação de serviço pelo empregado, razão pela qual, não é possível caracterizá-los como contraprestação de um serviço a ser remunerado, mas sim, como compensação ou indenização legalmente previstas com o fim de proteger e auxiliar o Trabalhador.

2. Da mesma forma que só se obtém o direito a um benefício previdenciário mediante a prévia contribuição, a contribuição também só se justifica ante a perspectiva da sua retribuição em forma de benefício (ADI-MC 2.1010, Rel. Min CELSO DE MELLO); dest’arte, não há de incidir a contribuição previdenciária sobre tais verbas.

3. Apesar de esta Corte possuir o entendimento pacífico em sentido oposto (REsp. 1.232.045/SP, Rel. Min LUIZ FUX, DJe 25.11.2010; REsp. 1.149.071/SC, Rel. Min. ELIANA ALMON, DJe 22.09.2010), a relevância da matéria exige a reabertura da discussão perante a 1a. Seção.

4. Agravo Regimental provido para determinar a subida dos autos do Recurso Especial que, nos termos do art. 14, II do RISTJ, fica, desde já, submetido a julgamento pela 1ª. Seção.48

Com o provimento do referido recurso para que o Recurso Especial do agravante fosse julgado pela C. Corte, houve, em um momento, o afastamento da natureza salarial das referidas verbas:

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SALÁRIO-MATERNIDADE E FÉRIAS USUFRUÍDAS. AUSÊNCIA DE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PELO EMPREGADO. NATUREZA JURÍDICA DA VERBA QUE NÃO PODE SER ALTERADA POR PRECEITO NORMATIVO. AUSÊNCIA DE CARÁTER RETRIBUTIVO. AUSÊNCIA DE INCORPORAÇÃO AO SALÁRIO DO TRABALHADOR. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PARECER DO MPF PELO PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA AFASTAR A INCIDÊNCAI DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O SALÁRIO-MATERNIDADE E AS FÉRIAS USUFRUÍDAS.

1. Conforme iterativa jurisprudência das Cortes Superiores, considera-se legítima a incidência de Contribuição Previdenciária sobre verbas indenizatórias ou que não se incorporem à remuneração do Trabalhador.

2. O salário-maternidade é um pagamento realizado no período em que a segurada encontra-se afastada do trabalho para a fruição de licença maternidade, possuindo clara natureza de benefício, a cargo e ônus da Previdência Social (arts. 71 e 72 da Lei 8.213/91), não se enquadrando, portanto, no conceito de remuneração de que trata o art. 22 da Lei 8.212/91.

3. Afirmar a legitimidade da cobrança da Contribuição Previdenciária sobre o salário-maternidade seria um estímulo à combatida prática discriminatória, uma vez que a opção pela contratação de um Trabalhador masculino será sobremaneira mais barata do que a de uma Trabalhadora mulher.

4. A questão deve ser vista dentro da singularidade do trabalho feminino e da proteção da maternidade e do recém nascido; assim no caso, a relevância do benefício, na verdade, deve reforçar ainda mais a necessidade de sua exclusão da base de cálculo da Contribuição Previdenciária, não havendo razoabilidade para a exceção estabelecida no art. 28, §9º., a da Lei 8.212/91.

5. O Pretório Excelso, quando do julgamento do AgRg no AI 727.958/MG, de relatoria do eminente Ministro EROS GRAU, DJe 27.02.2009, firmou o entendimento de que o terço constitucional de férias tem natureza indenizatória. O terço constitucional constitui verba acessória à remuneração de férias e também não se questiona que a prestação acessória segue a sorte das respectivas prestações principais. Assim, não se pode entender que seja ilegítima a cobrança de Contribuição Previdenciária sobre o terço constitucional, de caráter acessório, e legítima sobre a remuneração de férias, prestação principal, pervertendo a regra áurea acima apontada.

6. O preceito normativo não pode transmudar a natureza jurídica de uma verba. Tanto no salário-maternidade quanto nas férias usufruídas, independentemente do título que lhes é conferido legalmente, não há efetiva prestação de serviço pelo Trabalhador, razão pela qual, não há como entender que o pagamento de tais parcelas possuem caráter retributivo. Consequentemente, também não é devida a Contribuição Previdenciária sobre férias usufruídas.

7. Da mesma forma que só se obtém o direito a um benefício previdenciário mediante a prévia contribuição, a contribuição também só se justifica ante a perspectiva da sua retribuição futura em forma de benefício (ADI-MC 2.010, Rel. Min. CELSO DE MELLO); dest’arte, não há de incidir a Contribuição Previdenciária sobre tais verbas.

8. Parecer do MPF pelo parcial provimento do Recurso para afastar a incidência de Contribuição Previdenciária sobre o salário-maternidade.

9. Recurso Especial provido para afastar a incidência de Contribuição Previdenciária sobre o salário-maternidade e as férias usufruídas.49

Como a questão já se encontrava pendente de julgamento de julgamento de Recurso Repetitivo apresentado no REsp n.º. 1.230.957/RS, que discutia, justamente, a natureza jurídica das referidas verbas, a Fazenda opôs Embargos Declaratórios pedindo a concessão de liminar para sobrestar os efeitos da decisão que reconheceu a natureza indenizatória das referidas verbas.

Após uma série de oposições de embargos declaratórios, e literal substituição do relator, Min. Napoleão Nunes Maia Filho pelo Min. Mauro Campbell Marques, que era, igualmente, relator do Recurso Repetitivo apresentado no REsp n.º. 1.230.957/RS, a conclusão final pela corte foi que as referidas verbas efetivamente possuem natureza remuneratória e devem compor a base de cálculo para incidência da CPP.

Contudo, data a exoticidade do caso, o precedente ainda pode ser utilizado para a discussão judicial sobre as referidas rubricas.

5.4. Parcelas recebidas à título de Programas de Alimentação

O Programa de Alimentação ao Trabalhador – PAT, é um programa de adesão voluntária que objetiva estimular o empregador a fornecer alimentação nutricionalmente adequada aos trabalhadores, através da concessão de incentivos fiscais, priorizando-se o atendimento aos trabalhadores de baixa renda.

Foi estipulado pela Lei 6.321, de 14 de abril de 1976, e regulamentada pelo Decreto n.º. 5, de 14 de janeiro de 1991.

A legislação prevê, de forma clara, em seu art. 1º que as pessoas jurídicas poderão deduzir, do lucro tributável para fins do imposto sobre a renda o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período base, em programas de alimentação do trabalhador, previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho 50 .

Ou seja: tanto a legislação quanto o decreto que a regulamenta dispõe sobre o incentivo fiscal quanto ao imposto de renda. Contudo, de acordo com o art. 499 da Instrução Normativa n.º. 971, de 13 de novembro de 2009, não integra a remuneração, a parcela in natura, sob forma de utilidade alimentação, fornecida pela empresa regulamente inscrita no PAT aos trabalhadores por ela diretamente contratados, de conformidade com os requisitos estabelecidos pelo órgão gestor competente 51 .

Assim sendo, ante a própria normativa trazida pela Receita Federal, não integra a base de cálculo da CPP a verba correspondente a título de Programas de Alimentação ao Trabalhador, desde que essas estejam autorizadas a funcionar de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego.

5.5. Stock Options

O Stock Options é uma espécie de incentivo concedido aos colaboradores de uma empresa, com o intuito de reter talentos dentro de seus planos de escalonamento de carreira. Trata-se de uma benfeitoria concedida pela empresa, no sentido de conceder suas ações ou de propiciar opções de venda facilitadas, justamente para a concretização do fim de bonificar a atuação de um bom profissional.

Mesmo com todas as crises experimentadas pelo Brasil, trata-se de fenômeno recente e que vem sendo utilizado cada vez mais por empresas de grande porte, tanto de capital aberto, quanto de capital fechado.

Para maior elucidar, veja-se uma reportagem que explica com perfeição sobre o que se trata a referida verba:

Stock options, ou remuneração baseada em ações (em sentido amplo), é uma figura relativamente recente no mercado brasileiro, ainda sem legislação específica. Muito embora o termo “stock options” seja utilizado de forma genérica para as diversas modalidades de remuneração baseada em ações, trata-se de uma modalidade específica desse remuneração, juntando-se a outras modalidades praticadas no mercado, a exemplo das “restricted shares units” (RSUs), “phantom shares” e “matching shares”.

O principal objetivo da remuneração baseada em ações é engajar o profissional no desenvolvimento e crescimento da empresa, de forma que a valorização da empresa e, consequentemente de suas ações, traga benefícios não somente à empresa, mas também ao profissional participante do plano de ações. Assim, cria-se uma “cultura de prosperidade” (“ownership”) nos profissionais com relação à empresa, sendo esse o principal fato motivador da adoção dessa modalidade de remuneração.

Muito embora inicialmente fossem restritos a executivos e profissionais de cargos gerenciais, os planos de remuneração baseada em ações tiveram sua abrangência expandida, podendo beneficiar, em alguns casos, todos os profissionais de uma empresa. Esses planos podem ser locais ou globais, sendo que a maioria das empresas multinacionais que atuam no Brasil utiliza planos globais criados e administrados pelas suas matrizes no exterior, seja porque não possuem capital aberto no Brasil, seja pelos custos de implementação e administração de um plano local em comparação aos globais, que já possuem regras e mecanismos de controle apurados.

Nos últimos anos, no entanto, vemos uma movimentação cada vez maior de empresas brasileiras, tanto de capital aberto quanto fechado, no sentido de criar planos locais de remuneração baseada em ações, alinhando-os à sua estratégia de governança.52

Em um artigo produzido através da colaboração feita por Priscila da Costa de Paula, Ricardo Victor Ferreira Bastos e Ana Paula Gesing, há a corroboração de que as referidas verbas são, na verdade, utilizadas pelas empresas de capital aberto ou fechado com o intuito de estimular sócios e colaboradores para o engajamento nas atividades mercantis:

Corroborando o que fora dito, Nereu Miguel Ribeiro Domingues observa que o objetivo desse plano é tornar os colaboradores espécies de sócios da empresa e estimulá-los a se comprometer cada vez mais com o negócio em que estão inseridos.

(...)

Como se vê, stock options pode ser entendida como uma verdadeira opção de compra de ações conferidas ao empregado pelo empregador de acordo com condições estabelecidas em planos previamente divulgados, possuindo, na maioria dos casos, condições de aquisições de ações de modo privilegiado. Esses planos permitem que, numa data futura, o empregado exerça esse direito de compra nos termos definidos pelo plano que funciona como uma espécie de manual.53

Já em outra colaboração feita à Revista Eletrônica do Curso de Direito das Faculdades OPET (Organização Paranaense de Ensino Técnico em Curitiba), também há o mesmo entendimento, no sentido de que stock options são benfeitorias concedidas aos empregados e colaboradores das empresas de capital aberto ou fechado, por intermédio de ações ou por opções à compra de ações:

Stock Options, no sentido que é empregado pelo Direito Estrangeiro, significa “opção de ações” (DAL MAS, 2008, p. 19). A economia americana utiliza-se como forma de pagamento beneficiário aos trabalhadores, o qual, por meio da disponibilização de lotes de ações, o funcionário pode se tornar um acionista da empresa para a qual presta serviços ou possui contrato de trabalho estabelecido (SPERB e SILVA, 2012, p.1).

As Stock Options são, em tradução simples, as “opções de ações” concedidas pelas empresas a seus empregados, administradores e fornecedores, que acabam por torna-los sócios das instituições em que trabalham, ou com a qual tenham prévios contratos firmados, por meio da aquisição destas ações.

Assim, perante os beneficiários dos planos, o que realmente se busca, sejam eles empregados, terceirizados ou fornecedores, é a fidelização a longo prazo, de forma que se comprometam com os resultados da empresa, viabilizando a retenção de talentos (MOREIRA, QUINTELA e SAVASSI), 2013, p.33).

Mais especificamente as Stock Options são planos oferecidos por determinadas empresas a seus empregados, com objetivo de proporcionar a opção de compra futura de suas ações, ofertadas por valor prefixado e, normalmente, inferior ao de mercado, após um período de carência previamente estipulado. A ideia é motivar os empregados, fazendo-os agir como proprietários da empresa, trabalhando no sentido de maximizar o seu valor.54

Assim, não há dúvidas que stock options trata-se de uma benfeitoria eventual concedida ao colaborador e ao empregado. Sendo assim, antes de nos posicionarmos sobre a sua natureza jurídica para fins de incidência tributária na CPP sobre as folhas de pagamento, importante é observarmos tanto o entendimento administrativo quanto jurisprudencial da questão.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, caminha, através de diversos precedentes, no sentido de que as referidas vantagens são dotadas de natureza salarial, e, portanto, devem integrar a base de cálculo da CPP e de outros tributos:

APURAÇÃO SOBRE STOCK OPTIONS. LEGITIMIDADE DA EMPRESA AUTUADA.

A empresa autuada é quem deve figurar no polo passivo do lançamento, pois é com ela que mantinham vínculos de prestação de serviços os segurados beneficiados com as outorgas de direito de compra de ações, além de que, conforme os registros contábeis, foi esta empresa quem suportou as despesas decorrentes das referidas outorgas.

PLANOS DE OPÇÕES DE COMPRA DE AÇÕES (STOCK OPTIONS). CARÁTER REMUNERATÓRIO. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES.

Incidem contribuições previdenciárias sobre os ganhos que os segurados obtêm pelo exercício do direito de compra de ações quando se caracteriza a inexistência de risco para o beneficiário.

No caso sob apreço, inexistia qualquer desembolso quando do fechamento dos contratos de opção entre a empresa e seus diretores e estes poderiam ao final do período de carência exercer as opções a valor simbólico, estando isentos de qualquer risco de perda.

A ocorrência do fato gerador para a verba em questão se dá quando da transferência das ações ao patrimônio dos beneficiários, que se concretiza no momento do exercício do direito de compra.55

O Fisco entendeu, em síntese, que, como as referidas opções privilegiadas foram fornecidas tão somente aos empregados da empresa, trata-se de uma verba que decorre por conta de uma contraprestação havida entre empregado e empregador, sendo, portando, o referido ganho, incorporado ao salário-de-contribuição para fins de incidência da CPP sobre as folhas de pagamento.

Contudo, já o entendimento jurisprudencial diverge do entendimento administrativo. O Tribunal Superior do Trabalho, em alguns precedentes, vem entendendo pelo caráter indenizatório da referida verba, tendo em vista o risco de o obreiro poder aferir lucro ou não em decorrência das variações do mercado acionário, o que detém nítido caráter mercantil:

4. STOCK OPTIONS. O programa pelo qual o empregador oferta aos empregados o direito de compra de ações (previsto na Lei de Sociedades Anônimas, n. 6404/76, art. 168, § 3º) não proporciona ao trabalhador uma vantagem de natureza jurídica salarial. Isso porque, embora a possibilidade de efetuar o negócio (compra e venda de ações) decorra do contrato de trabalho, o obreiro pode ou não auferir lucro, sujeitando-se às variações do mercado acionário, detendo o benefício natureza jurídica mercantil. O direito, portanto, não se vincula à força de trabalho, não detendo caráter contraprestativo, não se lhe podendo atribuir índole salarial.56

Antes de se adentrar quanto a análise sobre a natureza jurídica da referida verba, é importante ressaltar que são cinco os elementos que constituem o vínculo empregatício: pessoalidade, não-alteridade, subordinação, habitualidade e, por fim, onerosidade.

O elemento da pessoalidade dispõe que o empregado é insubstituível para determinada função, ou seja, deve realizar o serviço de forma direta e pessoal. Já o requisito da não-alteridade decorre da não assunção dos riscos do negócio empresarial por parte do empregado, ou seja, se a empresa vir a ruir por conta de algum risco, mesmo assim ela estará obrigada a pagar as verbas trabalhistas que decorrerem desse tipo de relação. Subordinação, por sua vez, é o requisito que dispõe a obrigatoriedade do empregado em acatar as ordens do seu empregador, por ser ele juridicamente (e não economicamente ou tecnicamente) avalizado para tanto, sob pena de infrações ao contrato de trabalho, e eventual culminação de demissão por justa causa. Habitualidade é o elemento que predispõe uma previsibilidade objetiva de frequência do obreiro na rotina empregatícia. Por fim, o requisito da onerosidade pressupõe que o empregado deve receber a contraprestação pelo serviço prestado junto ao empregador, sob pena de não se verificar uma legítima relação empregatícia57.

É importante a análise desses elementos, tendo em vista que a natureza jurídica salarial ou indenizatória de determinada verba decorrerá justamente de uma atividade que seja lastreada em todos os cinco elementos outrora citados. Na ausência de um ou mais deles, a verba, consequentemente, não poderá ser observada como possuidora de uma natureza salarial para fins de incidência da CPP sobre as folhas de pagamento.

Salário, por exemplo, é uma verba previsível e eventual, que decorre da existência de um legítimo vínculo empregatício com todos os seus elementos, decorrente do elemento habitualidade outrora estudado. A verba stock options não cumpre o requisito da habitualidade, tendo em vista ser uma bonificação que pode o empregador conceder ou não, e, portanto, não pode ser enquadrada com natureza salarial.

Além do mais, a referida verba não cumpre o requisito da não-eventualidade.

O salário, por exemplo, deverá ser pago ao obreiro independentemente da crise financeira que a empresa venha ser acometida, já a stock options é uma opção para uma ação que está sujeita a todas as variações do mercado de valores mobiliários.

Caso o empregado seja bonificado com uma dessas ações, eventual prejuízo que venha a obter com a manutenção desta em suas finanças pessoais não poderia ser exigido da empresa, por não ser razoável enquadrá-la com natureza salarial. Ou seja: Se adquiriu uma ação por R$ 50,00 e, após alguns meses, por conta da crise que a empresa experimentou, o valor da ação fora reduzido para R$ 25,00, a diferença negativa por conta do risco enfrentado pela empresa não poderia ser exigida por intermédio do poder judiciário trabalhista. Logo, o empregado assume os riscos de eventual prejuízo ao receber as referidas stock options.

Por conta da ausência desses dois elementos imprescindíveis do vínculo empregatício, o enquadramento correto deve ser a de natureza indenizatória, não incidindo, portanto, a CPP sobre as folhas de pagamento e eventual tributação reflexa.

5.6. Hiring Bonus

O bônus de contratação, ou hiring bonus, diferentemente do stock options, não possui a intenção de manter o empregado dentro da governança de carreira que a empresa adota, mas sim a de atrair novos talentos aos seus negócios.

O Banco Safra, por exemplo, em seu Programa de Recrutamento Trainee Safra 2019, dispôs, como benefícios, após a sua conclusão, o seguinte: Job Rotation personalizado de acordo com a posição a ser ocupada, curso intensivo de mercado financeiro, envolvimento com os executivos desde o processo de seleção, acompanhamento de carreira durante todas as etapas, MBA ou pós-graduação após a conclusão do programa, remuneração de R$ 6.800,00, participação nos lucros e resultados adicional ao salário e ao décimo terceiro, e, por fim, incentivo de contratação, ou hiring bonus , no valor de R$ 20.000,0058, ou seja, um incentivo de quase três vezes o valor da remuneração mensal que se pretende pagar ao trainee.

Clara é a intenção do Banco Safra, neste exemplo, de atrair trainees talentosos para integrarem os seus quadros e solidificarem uma carreira dentro da referida instituição financeira.

Em uma reportagem da revista Migalhas, há a interessante conceituação sobre a referida verba:

Diante de um cenário econômico pautado pela escassez de profissionais altamente qualificados e pela crescente competitividade entre as empresas por estes profissionais, as empresas têm adotado diversas estratégias de atração de candidatos, dentre as quais o pagamento do bônus de contratação ("hiring bônus").

O bônus de contratação consiste no pagamento de determinada verba, acordado entre a empresa e determinado profissional, visando sua efetiva contratação. O pagamento acontece antes do início da prestação de serviços, e tem como objetivo atrair o profissional e cobrir as eventuais vantagens do antigo emprego.

A adoção de tais estratégias no cenário corporativo repercute no mundo jurídico, pois as empresas começam a ser questionadas pela Fiscalização quanto à natureza jurídica desta verba.

Isto porque, de acordo com a legislação trabalhista, a habitualidade, a periodicidade e a uniformidade com que são pagos os bônus constituem os elementos caracterizadores da sua natureza salarial. Assim, se o empregador pagar bônus habitualmente, periodicamente e como contraprestação do serviço, o valor pago deve ser considerado como verba de natureza salarial (salário) e, consequentemente, base de cálculo para os encargos trabalhistas (13º, férias e FGTS, etc.).

Interpretação similar à trabalhista pode ser adotada no âmbito previdenciário quanto ao pagamento de bônus, pois o artigo 201 da CF, em seu § 11º, determina que os ganhos habituais devem incorporar o salário, originando a obrigatoriedade do recolhimento das contribuições previdenciárias. Dessa forma, a habitualidade configura-se como principal pressuposto para a incorporação de um pagamento no salário do empregado.

Por sua vez, o §9º do artigo 28 da lei 8.212/91 e decreto 3.048/99 (artigo 214, inciso IV, § 9º, letra “j”) descrevem, de forma expressa, todas as verbas que estão excluídas da base de cálculo da incidência da contribuição previdenciária e há previsão de isenção quanto ao pagamento de gratificação eventual.

Especificamente, em relação ao pagamento de bônus de contratação, existem decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais1 recentes (não se trata de entendimento pacífico ou majoritário) no sentido de que o pagamento de bônus de contratação/luvas tem natureza indenizatória e, portanto, não estaria sujeito à incidência da contribuição previdenciária.

Enfim, ainda que a jurisprudência administrativa e judicial não tenha adotado um posicionamento pacífico sobre o tema, seria possível defender que o pagamento de bônus de contratação não está vinculado ao contrato de trabalho e não possui caráter contraprestacional, o que por si afasta a exigência da contribuição previdenciária.59

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, entende, de forma não pacificada, que a referida verba possui, também, natureza salarial, tendo em vista que o pagamento se dá como forma de retribuir o trabalho, conforme se extrai da ementa e de parte do voto da Relatora Dra. Elaine Cristina Monteiro e Silva Vieira:

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. BÔNUS DE CONTRATAÇÃO (HIRING BÔNUS). PAGAMENTO VINCULADO A PERMANÊNCIA DO EMPREGADO NA EMPRESA E EM SUBSTITUIÇÃO DAS VANTAGENS SALARIAIS DEVIDAS DURANTE O PERÍODO DO LABOR. PARCELA DE NATUREZA SALARIAL. INCIDÊNCIA.

Tendo em vista que o pagamento do bônus de contratação se deu de forma a retribuir os trabalhos prestados na empresa contratante, com expressa determinação contratual de que o mesmo substitui e engloba todas as vantagens que o empregado poderia auferir no exercício de suas funções junto ao contratante, além de exigir-lhe tempo mínimo de permanência na empresa, é de se reconhecer a natureza salarial da verba, devendo compor a base de cálculo das contribuições previdenciárias lançadas.

(...)

Entendo que somente os pagamentos que não guardam relação com o contrato de trabalho podem ser tidos por ganhos eventuais desvinculados, devendo decorrer de condições específicas de um trabalhador, como por exemplo destinação de valores em eventos de doença e outros sinistros fortuitos, sem relação direta ou indireta pela prestação de serviços.

Não há dúvida de que o pagamento de bônus de contratação - Hiring bônus, ou mesmo, gratificação em razão da admissão do empregado (utilizados por algumas empresas) tem relação direta com o vínculo contratual estabelecido entre as partes, e o seu principal objetivo é atrair profissionais para o quadro funcional da empresa, representando, a bem da verdade, um pagamento antecipado pela futura prestação de serviço do trabalhador.

Assim sendo, observa-se que o referido bônus, nada mais é que um artifício para atrair trabalhadores valorizados em seu segmento profissional, funcionando como um diferencial em relação aos concorrentes. Por esse motivo, mesmo que a recorrente tente rotulá-la como mera liberalidade, a rubrica em questão ostenta, no seu âmago, uma ponta de contraprestação, posto que tem por desiderato oferecer um atrativo econômico ao obreiro com este firmar o vínculo laboral.60

Contudo, dentro do próprio acórdão existiu divergência.

O voto vencido da Conselheira Ana Paula Fernandes teve o entendimento muito semelhante ao que demos para realizar a análise jurídica das stock options:

A meu ver, mantendo posicionamento que já adotei em outros julgamentos, a exemplo do acórdão 9202004.308 – 2ª Turma, esta questão não gera dúvidas quanto a não aplicabilidade de contribuição previdenciária pela expressa não ocorrência do fato gerador do tributo em questão: Trabalho.

Observe-se que o pagamento em questão (bônus de contratação), ocorre antes da relação de emprego ser instaurada. Se ocorre antes, logo não representa a contraprestação de um trabalho realizado pelo empregado, pois este ainda nem é empregado da empresa.

A própria Consolidação das Leis do Trabalho – CLT não trata desse instituto, por não a considerar sob a rubrica de remuneração advinda do exercício de um trabalho.

E por que a Justiça do Trabalho não considera o bônus de contratação como remuneração advinda de relação de trabalho? Por que no momento em que ela é operacionalizada, falta-lhe o elemento fundamental da relação de emprego – habitualidade.

E por que a Justiça Federal Previdenciária não admite o bônus de contratação como salário de contribuição? Por que, da mesma forma, falta-lhe o elemento da habitualidade para configurar a existência da relação de emprego da qual decorre a remuneração tributável. O argumento principal está na Constituição Federal, que prevê expressamente em seu artigo 201, § 11, que “os ganhos habituais devem incorporar o salário, originado obrigatoriamente o recolhimento de contribuições previdenciárias”. A Constituição Federal, berço do custeio do Sistema de Regime Geral da Previdência Social não engloba verbas eventuais, ao contrário, as excetua. Assim, resta claro que, no caso em tela, não estamos tratando de ganhos habituais, portanto, estes não podem incorporar o salário de contribuição do empregado. 61

Contudo, em que pese haver divergência em âmbito administrativo, fato é, que a maioria dos precedentes ali havidos caminham no sentido de conferir natureza salarial a referida verba.

No âmbito judicial, o mesmo entendimento sobre dotar a referida verba com traços de natureza salarial também é verificado em boa parte dos precedentes encontrados, conforme se verifica:

2. BANCÁRIO. HIRING BÔNUS. LUVAS. NATUREZA JURÍDICA.

Este Tribunal Superior entende que a parcela em debate possui caráter salarial, porque constitui reconhecimento pelos desempenho e resultados alcançados pelo profissional em sua carreira, equiparando-se às luvas do atleta profissional. É irrelevante o fato de seu pagamento ocorrer uma única vez. As luvas não correspondem a uma indenização, pois não visam o ressarcimento, a compensação ou a reparação de nenhuma espécie, mas, sim, caracterizam resultado do patrimônio que o trabalhador incorporou à sua vida profissional. 62

Conforme o que fora explicado, a natureza jurídica do bônus de contratação não pode ser salarial, eis, que, não estão presentes os requisitos da habitualidade, indispensáveis para a perfectibilização do vínculo empregatício. Ademais, se a verba é paga antes mesmo de iniciar-se a relação empregatícia, como se tratar de verba salarial, que é paga em decorrência, justamente, da existência desse tipo de relação?

Há de se considerar que o referido bônus possui a clara intenção de gratificar o talentoso obreiro pelo fato de ter este confiado a sua carreira à determinada empresa. De acordo com a súmula 203 do próprio Tribunal Superior do Trabalho, a gratificação por tempo de serviço integra o salário para todos os efeitos legais, e, igualmente, a súmula 207 do Superior Tribunal Federal dispõe que as gratificações habituais, inclusive a de Natal, consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário.

A intenção das duas súmulas ora citadas é a de justamente conferir natureza salarial a verbas que habitualmente são pagas ao empregado, e não àquelas que são eventualmente conferidas ao obreiro.

Para fins de planejamento tributário, o contribuinte deve ser orientado no sentido de fazer incidir a CPP sobre as folhas de pagamento na rubrica da referida verba, contudo, o profissional do direito não deve se calar ante este entendimento, e deve buscar incansavelmente a mudança deste entendimento, sob pena de desestimular a sua utilização pelo mercado, fazendo com que algo que deveria ser positivo tanto aos empregados quanto aos empregadores caia em desuso.

5.7. A indenização compensatória de 40% do montante depositado nas contas de FGTS do obreiro em caso de demissão sem justa causa

De acordo com o art. 18, §1º, da lei n.º. 8.036, de 11 de maio de 1990, na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho.

Como o empregado recebe a referida quantia a título de indenização por uma prática que deve ser desaconselhada aos empregadores, no caso, a prática da demissão sem justa causa, por ofender justamente o princípio da continuidade e da estabilidade da relação empregatícia, a verba não pode ser incluída na base de cálculo da CPP.

Este é o entendimento jurisprudencial.

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FÉRIAS INDENIZADAS E O RESPECTIVO TERÇO CONSTITUCIONAL, ABONO PECUNIÁRIO DE FÉRIAS, FGTS E MULTA DE 40%. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. SALÁRIO MATERNIDADE. FÉRIAS GOZADAS. DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO. HORAS EXTRAS. ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE, INSALUBRIDADE E NOTURNO. INCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO. Há ausência de interesse recursal no tocante à incidência de contribuição previdenciária sobre férias indenizadas e o respectivo terço constitucional, abono pecuniário de férias, FGTS e multa de 40%, porquanto já reconhecida a não incidência de contribuição previdenciária sobre tais rubricas. A Primeira Seção, em julgamento de recurso repetitivo, consolidou o entendimento de que incide contribuição previdenciária sobre: os adicionais noturno e de periculosidade e as horas extras, bem como o seu respectivo adicional, uma vez que são de natureza remuneratória (REsp 1.358.281/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe de 05/12/2014); o salário maternidade, dada a natureza salarial dessa parcela (REsp 1.230.957/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 18/03/2014); o décimo terceiro salário, por expressa disposição legal - art. 7º, § 2º, da Lei n. 8.620/1993 (REsp 1.066.682/SP, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º/02/2010) - e em razão do que dispõe a Súmula 688 do STF. A jurisprudência firmada na Primeira Seção sedimentou a orientação de que a contribuição previdenciária incide sobre as férias usufruídas, uma vez que que tal rubrica "possui natureza remuneratória e salarial, nos termos do art. 148 da CLT, e integra o salário de contribuição" (EDcl nos EDcl no REsp 1.322.945/DF, Rel. p/ acórdão Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe de 04/08/2015) e o adicional de insalubridade, por possuir natureza remuneratória (vide AgRg no REsp 1487689/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, DJe 23/02/2016; AgRg no REsp 1559166/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Segunda Turma, DJe 24/02/2016). O crédito de contribuição previdenciária reconhecido pelas instâncias ordinárias, dada a vedação contida no art. 26 da Lei n. 11.457/2007, somente poderá ser compensado com débitos de mesma natureza e destinação constitucional, nos termos do art. 66 da Lei n. 8.383/1991. Agravo interno desprovido.63

5.8. Ganhos eventuais e abonos expressamente desvinculados do salário

Os ganhos eventuais e abonos expressamente desvinculados do salário são verbas pagas pelo empregador ao empregado por mera deliberalidade de sua parte, de forma esporádica e não-contínua.

De acordo com o §2º do art. 457 da CLT, as importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado e não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargos trabalhista e previdenciário 64 .

Mesmo que não houvesse expressa determinação legal neste sentido, conforme o próprio nome das referidas rubricas, tratam-se de verbas habituais, e, sendo assim, não podem integrar o salário-de-contribuição, eis que ausente o elemento da habitualidade para a perfectibilização do vínculo empregatício.

5.9. A parcela paga a título de vale-transporte

O vale-transporte foi instituído pela Lei n.º. 7.148, de 16 de dezembro de 1985.

De acordo com o art. 2º da referida lei, o Vale-Transporte, concedido nas condições e limites definidos, nesta Lei, no que se refere à contribuição do empregador, não tem natureza salarial, nem se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos, não constitui base de incidência de contribuição previdenciária ou de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e não se configura como rendimento tributável do trabalhador 65 .

Contudo, para descaracterizar o caráter salarial da verba é importante seguir o comando legal, no sentido de que o empregador participará dos gastos de deslocamento do trabalhador, concedendo ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% do seu salário básico.

O STF entende que não há a incidência de contribuição previdenciária sobre a verba do Vale-Transporte, mesmo que esta seja paga em dinheiro:

EMENTA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA. VALE-TRANSPORTE. MOEDA. CURSO LEGAL E CURSO FORÇADO. CARÁTER NÃO SALARIAL DO BENEFÍCIO. ARTIGO 150, I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONSTITUIÇÃO COMO TOTALIDADE NORMATIVA.

1. Pago o benefício de que se cuida neste recurso extraordinário em vale-transporte ou em moeda, isso não afeta o caráter não salarial do benefício. [...]

6. A cobrança de contribuição previdenciária sobre o valor pago, em dinheiro, a título de vales-transporte, pelo recorrente aos seus empregados afronta a Constituição, sim, em sua totalidade normativa.66

O STJ, por sua vez, alinhou o seu posicionamento, referendando o entendimento do STF:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NÃO INCIDÊNCIA. PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. REVISÃO. NECESSIDADE.

1. O Supremo Tribunal Federal, na assentada de 10.03.2003, em caso análogo (RE 478.410/SP, Rel. Min Eros Grau), concluiu que é inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária sobre o vale-transporte pago em pecúnia, já que, qualquer que seja a forma de pagamento, detém o benefício natureza indenizatória. Informativo 578 do Supremo Tribunal Federal.

2. Assim, deve ser revista a orientação pacífica desta Corte que reconhecia a incidência da contribuição previdenciária na hipótese quando o benefício é pago em pecúnia, já que o art. 5º do Decreto 95.247/87 expressamente proibira o empregador de efetuar o pagamento em dinheiro.

3. Recurso especial provido.67

Assim sendo, por comando legal e entendimento pacífico em âmbito jurisprudencial, não incide a contribuição previdenciária sobre esta rubrica.

5.10. Participação nos lucros ou resultados da empresa

A Lei 10.101, de dezembro de 2000, que dispõe sobre a PLR, prevê certas diretrizes que devem ser seguidas para que a empresa possa conceder tal benefício ao obreiro sem que haja a caracterização de natureza salarial da referida rubrica.

De acordo com o §2º do art. 3º desta lei, é vedado o pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores a título de participação nos lucros ou resultados da empresa em mais de duas vezes no mesmo ano civil e em periodicidade inferior a 1 trimestre civil.

Logo, respeitando-se a referida periodicidade, não haverá preocupação com a caracterização salarial da referida verba. Este é o entendimento do STF:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS. ART. 7º, XI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. MP 794/94.

Com a superveniência da MP nº 794/94, sucessivamente reeditada, foram implementadas as condições indispensáveis ao exercício do direito à participação dos trabalhadores no lucro das empresas.

Embora o artigo 7º, XI, da CB/88, assegure o direito dos empregados àquela participação e desvincule essa parcela da remuneração, o seu exercício não prescinde de lei disciplinadora que defina o modo e os limites de sua participação, bem como o caráter jurídico desse benefício, seja para fins tributários, seja para fins de incidência de contribuição previdenciária. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.68

Sobre o autor
Rodrigo Nunes Sindona

Advogado, mestre em direito pela FADISP, especialista em direito tributário, previdenciário e empresarial pela EPD, direito penal e constitucional pela Faculdade LEGALE, Defensor Dativo junto ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SINDONA, Rodrigo Nunes. Contribuição previdenciária patronal sobre as folhas de pagamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7300, 27 jun. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/87323. Acesso em: 22 dez. 2024.

Mais informações

Monografia apresentada junto a Escola Paulista de Direito - EPD, para a obtenção do certificado de especialização em direito previdenciário.

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