8. A plasticidade ética dos advogados
Para finalizar, é interessante fazer um paralelo entre a atuação do advogado criminalista e a atuação dos dirigentes da Ordem.
Quando se fala, em tom de crítica, a respeito da "plasticidade ética" dos advogados, especialmente em relação aos que defendem bandidos (não estou dizendo que eles possam ser sócios dos bandidos), essa crítica não procede, porque todos têm direito ao contraditório e à ampla defesa e somente serão considerados culpados depois de um processo jurídico regular. Até a Suzane e os irmãos Cravinhos têm direito à defesa, para que o juri possa decidir. Assim, alguém tem que fazer esse "serviço sujo", que é absolutamente indispensável para o Estado de Direito e para a democracia. Portanto, cabe ao advogado criminalista fazer tudo o que estiver ao seu alcance, juridicamente, para defender o seu cliente "bandido".
Pois bem: na minha opinião, os dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil não podem agir dessa mesma maneira, em defesa da Ordem, de seus interesses particulares ou corporativos, ou em defesa do Exame de Ordem, porque eles não podem atuar, nessas hipóteses, como se fossem advogados que estão defendendo bandidos.
Os dirigentes da Ordem não podem fazer tudo o que estiver ao seu alcance para defender o Exame de Ordem, mesmo sabendo que ele é inconstitucional, como se eles fossem advogados criminalistas que têm a obrigação de defender os bandidos, mesmo sabendo que eles são culpados. O Exame de Ordem, neste caso, encontra-se em uma posição equivalente à do bandido, mas não merece qualquer defesa, porque o raciocínio correto seria que a OAB deve defender a Constituição (Estatuto da Advocacia, art. 44), e nunca um Exame inconstitucional.
Portanto, se os dirigentes da OAB não têm argumentos jurídicos favoráveis à constitucionalidade do Exame de Ordem, deveriam rever o seu posicionamento e passar a combater o Exame, exigindo que o Congresso Nacional aprovasse os projetos que acabam com ele, ou ingressando com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o STF.
Nenhuma outra atitude seria possível, haja vista que uma das
funções básicas da OAB é a defesa da Constituição e da Ordem jurídica. Assim, os
seus dirigentes não podem defender sempre os seus interesses, cegamente, ou tudo
aquilo que eles sabem que está errado, imaginando que os fins justificam os
meios, simplesmente para "ganharem a causa" de qualquer maneira, sem qualquer
outra consideração, como se fossem advogados, que estivessem apenas seguindo um
dos mandamentos do advogado, citado por Ruy Barbosa, na famosa Oração aos Moços:
"Onde for apurável um grão, que seja, de verdadeiro direito, não regatear ao
atribulado o consolo do amparo judicial."
A conseqüência dessa atitude, dos dirigentes da Ordem, certamente, será a perda de credibilidade e de legitimidade da OAB, como instituição. Esse é o motivo fundamental das minhas críticas, à OAB e ao Exame de Ordem.
9. Considerações finais
O Exame de Ordem da OAB é inconstitucional, porque atenta contra o princípio da isonomia.
Além disso, ele foi disciplinado através de um provimento da OAB, que usurpou as competências do Congresso Nacional e do Presidente da República, tornando-se por essa razão formalmente inconstitucional.
O Exame de Ordem da OAB é também materialmente inconstitucional, porque atenta contra a liberdade de exercício profissional, o princípio da legalidade e a autonomia universitária e usurpa a competência do MEC para a fiscalização e a avaliação dos cursos jurídicos.
Os dirigentes da OAB se limitam a dizer, sempre, que o Exame de Ordem é necessário para avaliar a capacidade profissional e a honestidade (!) do bacharel em Direito e para proteger o interesse público, tendo em vista a proliferação de cursos jurídicos de baixa qualidade. Não contestam, juridicamente, os argumentos referentes à inconstitucionalidade do Exame de Ordem e somente admitem discutir a sua organização, os seus detalhes e o seu "aperfeiçoamento".
Na minha opinião, o Exame de Ordem não avalia, corretamente, a capacidade profissional do bacharel em Direito. Os critérios utilizados na elaboração e na correção das provas o transformaram em um verdadeiro instrumento de exclusão social.
Na minha opinião, o Exame de Ordem também não é capaz, muito menos, de avaliar a honestidade ou a ética de quem quer que seja. É um absurdo inominável afirmar que esse Exame avalia a ética do bacharel em Direito, para que a sociedade possa contar com "um advogado melhor dotado de princípios éticos" e "merecedor da confiança dos brasileiros".
A imprensa, infelizmente, divulga, quase com exclusividade, o "discurso" da OAB, em defesa do Exame de Ordem, sem permitir a divulgação das opiniões jurídicas contrárias.
Para que fosse mantido o respeito à Constituição, bem como à imparcialidade e à veracidade das informações jornalísticas, essencial em um regime que se pretende seja republicano e democrático, os dirigentes da OAB deveriam sair de seu isolamento, para contestar os nossos argumentos jurídicos, e a imprensa deveria divulgar as opiniões contrárias ao Exame de Ordem, e programar a realização de uma completa reportagem a respeito desse Exame, para que fossem ouvidos os dois lados interessados na questão: os dirigentes da OAB e os bacharéis impedidos de trabalhar pelo Exame de Ordem.
Os meus argumentos, que são também os de inúmeros juristas nacionais e estrangeiros, estão disponíveis na Internet, na página: http://www.profpito.com/exame.html