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Alexis de Tocqueville.

Liberdade e igualdade na democracia da América

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DEMOCRACIA E LIBERDADE

Diferente da igualdade, o tema da liberdade toma proporções mais tangíveis ao ser humano, pois suas consequências ou aparições não são fatalistas ou providenciais. No entanto, antes de falarmos sobre o pensamento de Tocqueville a respeito do tema, vejo como imprescindível a consideração da diferença entre a liberdade pretendida pelos modernos e a liberdade pretendida pelos antigos.

Essa diferenciação se faz surgir com Benjamin Constant, em 1818, quando professava seu discurso em Paris. Para ele, o objetivo dos antigos, perante a democracia, era a distribuição do poder político entre todos os cidadãos de uma mesma pátria; já o objetivo dos modernos, se daria na "segurança nas fruições privadas" (Bobbio, 2000, p.8).

Tocqueville, todavia, enxerga um ponto a mais nessa relação, que é o ponto dos direitos políticos. Para ele, a liberdade privada não reside apenas na segurança de suas propriedades materiais, mas também de suas propriedades políticas. Pois, exercendo e possuindo apenas as primeiras, como já vimos, o cidadão se fecha para o mundo político em seu país, passando-se a ser, de soberano em sua nação, a servo em suas ideias de bem-estar.

Da importância das comunas para a liberdade

Tocqueville, dando a elevada importância para a liberdade política, percebe que o meio mais apropriado para a sua construção se desenvolve nas comunas. Ou seja, nas cidades, onde a proximidade com os cidadãos é maior do que para com a união. Desse modo, diz Tocqueville: "Ora, tirem a força e a independência da comuna, e nunca encontrarão nela mais do que administrados, e não cidadãos" (Tocqueville, 2005, p.78).

Pensa-se, assim, que a possibilidade de construção de uma virtude cívica, e por consequência, de uma maior proximidade do cidadão para com os seus direitos políticos se deve a uma maior liberdade para a administração citadina. Pois, o indivíduo passa a se enxergar como verdadeiramente um membro de algo socialmente poderoso, e dessa forma, contribui para a fortificação de suas liberdades políticas e para o respeito à igual liberdade de seu próximo como se verifica em sua fala:

As instituições comunais estão para a liberdade assim como as escolas primárias estão para a ciência: elas a colocam ao alcance do povo, fazem-no provar seu uso tranquilo e habituam-no a empregá-la. Sem instituições comunais uma nação pode se dotar de um governo livre, mas não possui o espírito da liberdade. Paixões passageiras, interesses de um momento, o acaso 84 das circunstâncias podem lhe dar as formas externas da independência; mas o despotismo reprimido no interior do corpo social cedo ou tarde volta à tona. (Tocqueville, 2005, p. 71)

Da tirania da maioria

Apesar de a liberdade política se fazer necessária na democracia, Tocqueville teme, que, diante de um desrespeito da maior parte da população em frente a menor, suas decisões acabem por se tornar tirânicas. Para o filósofo, aliás, essa é uma tendência natural da democracia, que, sem limites ao poder do povo, aumenta o poder da maioria enquanto reprime o poder das minorias.

O filósofo, diante dessa questão, chega, até mesmo, a considerar se não estaria entrando em contradição consigo mesmo ao perceber que a maioria não poderia ter o direito de tudo fazer, mas que dela, se originam todos os poderes.

Considero ímpia e detestável a máxima de que, em matéria de governo, a maioria do povo tem o direito de fazer tudo; apesar disso situo na vontade da maioria a origem de todos os poderes. Estarei em contradição comigo mesmo? (Tocqueville, 2005, p. 294)

Apesar de tal dúvida, posteriormente, Tocqueville, aprofundando melhor sua ideia, se mostra totalmente contrário à possibilidade de uma maioria que detenha o poder de ordem e decisão última. Pois, em suas palavras: "Ora, se você admitir que um homem investido da onipotência pode abusar dela contra seus adversários, por que não admite a mesma coisa para uma maioria?" (Tocqueville, 2005, p. 294-295)

Maioria essa que desconsidera as indagações e opiniões das minorias que tentam se posicionar frente às suas decisões. Dessa forma, o filósofo se coloca em oposição ao francês Rousseau, que considerava possível a existência de um líder soberano, que, com o consentimento de todos, guiasse a sociedade sem necessidades de limites ao seu poder:

Há pessoas que não temeram dizer que um povo, nos objetos que só interessavam a ele mesmo, não podia sair inteiramente dos limites da justiça e da razão e que, assim, não se devia temer dar todo o poder à maioria que o representa. Mas é, esta, uma linguagem de escravos. (Tocqueville, 2005, p.294)

Considera ainda que, aquele que se coloca contra a vontade da maioria, que tudo pode, fica sujeito à violência, mas não a violência física, e sim o pior tipo de pena que se poderia dar a um cidadão: que é ignorá-lo, ridicularizá-lo, e o manter afastado de todos, como se um mal para a sociedade fosse.

Essa maioria, portanto, diz Tocqueville, estaria na posse de uma força material, na produção de leis, e moral, na violência psiquica empregada contra as minorias. Essa realidade, desse modo, leva as minorias a uma situação análoga escravidão social, na qual se encontram obrigados a participarem de opiniões contrárias as suas sem direito à mudança. Caso não participem, assim, perdem seus direitos políticos e sociais, e nada mais é para a maioria, do que um mero animal.

Por conseguinte, aquele que pertence à minoria, nada consegue fazer, pois encontra diante de si todo um sistema construído com base na vontade da maioria, e desse modo, se torna um estranho em seu próprio país. Não consegue, dessa maneira, se queixar às autoridades judiciárias pois são frutos da maioria, não consegue ser ouvido, pois não tem quem lhe dê atenção.

Quando um homem ou um partido sofrem uma injustiça nos Estados Unidos, a quem você quer que ele se dirija? À opinião pública? É ela que constitui a maioria. Ao corpo legislativo? Ele representa a maioria e obedece-lhe cegamente. Ao poder executivo? Ele é nomeado pela maioria e lhe serve de instrumento passivo. À força pública? A força pública não passa da maioria sob as armas. Ao júri? O júri é a maioria investida do direito de pronunciar sentenças, os próprios juízes, em certos Estados, são eleitos pela maioria. Por mais iníqua e insensata que seja a medida a atingi-lo, você tem de se submeter a ela. (Tocqueville, 2005, p.296)

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Da importância da liberdade de associação

Um dos principais direitos, para Tocqueville, que reprime ou mitiga a tirania da maioria consiste na liberdade de associação. Que se distingue, por sua vez, em duas: a associação política e a associação civil. A primeira, segundo o pensador, consiste na capacidade de os cidadãos se uniram para modificarem algo que é contra o seu direito ou criarem novas garantias jurídicas para as suas pretensões.

Reconhecendo a fraqueza humana em sua individualidade, Tocqueville considera a associação política como uma barreira a tirania da maioria, pois, com ela, aqueles que estavam aos recantos da sociedade, quase como invisíveis, ganham força por se juntarem à outras pessoas e assim trilharem juntos um caminho de reivindicações de seus direitos políticos e sociais.

A associação civil, por sua vez, se relaciona com a capacidade de os indivíduos se unirem para a realização de ações que sozinhos não conseguiriam, tal qual a construção de uma obra ou a realização de um grupo de assistências sociais.

Nos Estados Unidos, nos mostra Tocqueville, a quantidade de associações se mostra cada vez maior e mais forte. Se situando desde o campo político até o campo moral, as pessoas se unem e com isso, garantem, além de seus direitos, com convívio social, uma maior qualidade de solidariedade.

Dessa forma, a união de uma coletividade frente ao estabelecimento de uma doutrina gera um sentimento de pertencimento, esse sentimento, em comunhão, proporciona um ardor fervoroso pela liberdade e pela expressão comunicativa que, diante de uma injustiça, não tarda a mostrar sua força em suas mais diversas formas de manifestações, podendo essas manifestações ocorrerem, por exemplo, por meio da imprensa. Assim, acerca das associações nos Estados Unidos, expõe Tocqueville:

O habitante dos Estados Unidos aprende desde o nascimento que deve contar consigo mesmo para lutar contra os males e os embaraços da vida; ele lança a autoridade social um olhar desconfiado e inquieto, e só apela para o seu poder quando não pode dispensá-lo. Isso começa a se perceber desde a escola, onde as crianças se submetem, até mesmo nos jogos, a regras que elas mesmas estabelecem e punem entre si os delitos que elas mesmas definem. (Tocqueville, 2005, p. 219)

Da importância da religião e da cultura norte americana

Já mencionamos o papel fundamental que possui a religião do povo americano para a construção de sua identidade como cidadão e a sua importância para a manutenção de um vínculo de solidariedade entre eles. Agora, vamos tratar da religião pela sua importância como barreira fundamental à tirania da maioria.

Tocqueville, verificando as origens do povo americano, constata que, a religião americana, depois de ter se afastada da autoridade do papa, não mais se curvará a autoridade nenhuma. E, dessa maneira, levaram aos Estados Unidos um cristianismo que ele chama de democrático e republicano. acreditando, assim, que a política e a religião sempre estiveram de acordo.

A religião católica, pensa Tocqueville, é uma das mais favoráveis à igualdade de condições. Pois, como ele diz: "O padre se eleva sozinho acima dos fiéis; abaixo dele tudo é igual." (Tocqueville, 2005, p.339). Assim, colocando o rico e o pobre, o doente e o saudável, a mulher e o homem, todos em uma mesma posição de igualdade, a igreja católica se mostra mais igualitária que igreja protestante, que tende a causas individuais, levando mais os homens a independência.

Para o filósofo, por consequência, a igreja católica é um fator importante que incide sobre a política dos Estados Unidos de modo favorável a manutenção da democracia, criando em seus seguidores, um respeito supramaterial às bases organizacionais da sociedade americana.

Deixem o espírito humano seguir sua tendência, e ele ajustará de maneira uniforme a sociedade política e a cidade divina; ele procurará, se ouso dizê-lo, harmonizar a terra com o céu. (Tocqueville, 2005, p. 338)

Outro fator crucial para a manutenção das bases democráticas nos Estados Unidos se verifica pela ação cultural da sociedade. Sabemos que na américa, o povo se habituou a prática da política, e a tornou objeto de sua rotina. Essa cultura, que se intensifica nas cidades, tem o grande apoio da descentralização administrativa existente, pois, exercem seus direitos políticos diretamente em relação com sua cidade.

Desse modo, a cultura política americana, aliada a fragmentariedade dos poderes comunais, formam uma das mais importantes barreiras à tirania da maioria, pois mantém as pessoas fortemente ligadas aos seus direitos e não tendem a unificar dogmas políticos em uma única visão no país.

Das duas classes que estão submetidas a tirania nos Estados Unidos

Para Tocqueville, nos Estados Unidos, existem três povos diferentes e até rivais: os brancos, os indígenas e os negros. No entanto, o homem branco, nessa relação, se situa em uma posição de soberania, enquanto as duas outras raças se igualam em desgraças e inferioridade. Inferioridade essa, que, desde a chegada do europeu no novo mundo, se sustenta por uma série de medidas opressivas. No entanto, apesar da igualdade em relação às suas desgraças, o índio e o negro possuem importantes diferenças:

Essas duas raças infortunadas não têm em comum nem o nascimento, nem a aparência, nem a língua, nem os costumes; somente suas desgraças se parecem. Todas as duas ocupam uma posição igualmente inferior no país que habitam; todas as duas sentem os efeitos da tirania; e, se suas misérias são diferentes, podem lhes ser atribuídos os mesmos autores. (Tocqueville, 2005, p. 374)

O índio, percebe Tocqueville, possui cultura, história e laços familiares em seu próprio país, todavia, com a chegada do homem branco, se vê obrigado a recuar até os desertos dos Estados Unidos, e, na medida em que o europeu aumenta sua população e sua indústria, diminui a possibilidade de vida do povo indígena, pois retira dele sua comida e sua terra.

Dessa forma, o índio se encontra diante de duas opções: ou aceitar a imposição cultural do homem branco, ou lutar por sua honra. Assim, Tocqueville nos diz que existe uma maior probabilidade de luta, e por consequência, de morte do indígena, pois, além de estarem em menor número, não possuem poderes o suficiente, e, por conseguinte, a luta se torna, aparentemente, um modo de exercer a sua cultura heroica e selvagem, considerando que sua liberdade reside em se manter o mais distante possível da cultura americana.

No entanto, os que se submetem a ela logo enxergam as dificuldades que lhe são incutidas pela forma de construção do cidadão: O índio, possuindo uma cultura que valoriza a caça e a pesca, bem como uma vida amena, despreza a noção de um trabalho forçoso para seu sustento e sua evolução social, para ele, tudo deveria provir da natureza, de onde, para o ser humano, bastaria pegar o que lhe fosse necessário. Logo, o indígena, não se encaixando no meio social, tanto pelo preconceito que enfrenta, quanto pela sua natureza, se encontra nos limites mais extremos da liberdade humana, vivendo de mendigagem e trabalhos insalubres, tendo, como único direito, o de continuar vivo em meio aos que usufruem de sua terra.

E, para se confirmar a objetificação dos outros povos para os americanos, em uma tentativa de se livrar do indígena, que não servia para a sociedade industrial americana, a união sustentou o transporte de algumas tribos para o Arkansas, um local cercado por terras inexploradas e rios cristalinos, com isso, o governo norte americano prometia aos indígenas não interferirem em sua cultura ou na sua nova terra. No entanto, não garantiam a segurança do local, que constantemente se encontrava invadido pelo europeu, que, na disputa pela terra, ou pelos bens daquela terra, levava a melhor sobre o desordenado povo indígena.

Tocqueville, com o intuito de nos verificar esse fato, nos apresenta uma fala do povo indígena:

"Quando vossos ancestrais chegaram a nossas terras, o homem vermelho era forte e, embora fosse ignorante e selvagem, recebeu-os com bondade e permitiu-lhes repousar seus pés entorpecidos na terra seca. Nossos pais e os vossos apertaram-se a mão em sinal de amizade e viveram em paz. "Tudo o que o homem branco pediu para satisfazer suas necessidades, o índio apressou-se a lhe dar. O índio era então o senhor, e o homem branco o suplicante. Hoje, a cena está mudada: a força do homem vermelho tomou-se fraca. À medida que seus vizinhos cresciam em número, seu poder diminuía cada vez mais; e, agora, de tantas tribos poderosas que cobriam a superfície do que chamais Estados Unidos, mal restam algumas, que o desastre universal poupou. As tribos do Norte, tão renomadas outrora entre nós por seu poderio, já quase desapareceram. Foi esse o destino do homem vermelho na América. "Eis-nos, últimos de nossa raça: também deveremos morrer?". (Tocqueville, 2005, p.391-392)

Para Tocqueville, essa fala não poderia ser mais premonitória, pois, acredita ele que o futuro do povo indígena nos Estados Unidos, infelizmente, é o de morrer de forma isolada, tal qual na sua formação.

O homem negro, por sua vez, está submetido a escravidão desde de seu nascimento, e até antes dele. Não possui nenhum privilégio de humanidade, se encontra sem família, sem saber de onde veio e sem saber o que é liberdade, enxerga no seu amo todas as virtudes que se encontram em vantagens às suas, se considera inferior pois é chamado de inferior desde o seu nascimento. Para o homem negro, que sente o mais alto peso da tirania sobre seus ombros, seu corpo é propriedade de outra pessoa. O que que, nas palavras de Tocqueville, se torna evidente:

Ao ver o que sucede no mundo, não diríamos que o europeu está para os homens das outras raças assim como o próprio homem está para os animais? Ele os faz servir a seu uso e, quando não os pode dobrar, os destrói. (Tocqueville, 2005, p. 374)

Nos Estados Unidos, desse modo, a solidariedade não existe fora das relações intereuropeias, o que existe, pelo contrário, é uma cultura do senhor e do escravo, onde os dois se situam em planos de existenciais e biológicos distintos, o homem negro, assim, carrega os traços semelhantes aos dos animais, sua força é sua única característica útil, e mesmo ela, é colocada como inferior à do homem branco.

Isso posto, já prevendo a abolição da escravidão nos Estados Unidos, Tocqueville nos coloca diante de uma grande questão: será apenas necessária a mudança na lei para que a população negra possa viver em igualdade com o povo americano? Para responder a essa questão, o filósofo nos leva até a democracia da antiga Atenas de Pérciles, onde a escravidão não possuía uma relação de raças diferentes, mas o escravo poderia ser da mesma raça desde que tivesse perdido uma batalha.

Nessa situação, retirar a escravidão das leis se torna mais difícil que retirar da cultura. Pois, antigamente, o escravo poderia passar a ser livre sem que fosse possível, posteriormente verificar seu passado, pois, visualmente era igual aos outros da cidade. Nos Estados Unidos, no entanto, identificar uma pessoa que já foi escrava, e que, dessa forma, já foi vista como inferior, é imensamente mais fácil.

E, desse modo, com a seleção imediata das pessoas diferentes, o americano limita a possibilidade de participação social do negro. Ele agora é livre pela lei, mas se encontra preso pela sociedade, não podendo frequentar mesmas as escolas, casas, calçadas, e, portanto, não podendo partilhar os mesmos direitos que o branco. Dá-se, assim, a liberdade a alguém que nunca a viveu e que se encontra perdido em sua busca.

Assim o negro é livre, mas não pode compartilhar nem os direitos, nem os prazeres, nem os trabalhos, nem as dores, nem mesmo o túmulo daquele de quem foi declarado igual; em nenhum lugar poderia encontrar-se com este, nem na vida nem na morte. (TOCQUEVILLE, 2005, p. 398)

Destarte, reconhecendo a influência dessa cultura escravista nos Estados Unidos, Tocqueville não acredita que a igualdade entre o povo branco e o negro vá acontecer algum dia, pelo contrário, acredita que o racismo apenas tende a aumentar, e assim, fomentar a disputa entre esses dois povos, podendo ocasionar diversas consequências negativas.

Fazendo um rápido paralelo com o hodierno, reconhecemos acertada a ideia de Tocqueville pelas diversas tragédias ocorridas nos Estados Unidos e no Brasil no ano de 2020, entendemos e confirmamos que essas disputas estão longe de terminarem, pois, a cultura escravista se fortalece a cada dia.

Desse modo, na democracia onde a liberdade e a igualdade se mostravam fatores cruciais para a construção da solidariedade americana entre seus iguais, evidencia, por outro lado, um dos seus vícios mais obscuros que se manifesta através da escravização e inferiorização de outros povos. Assim, a solidariedade americana se apresenta como restrita ao grupo de europeus que, por possuírem aspectos físicos e culturais diferentes, se enxergam como detentores do destino dos seus inferiores. Enxergamos, dessa forma, que a maior dificuldade encontramos, agora, em superar as diferenças e conseguir unir o senso de humanidade a uma só raça.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscando uma nova forma de estudo para um novo mundo que estava nascendo, Tocqueville, tal qual um cientista político, estuda, através de fatores relevantes de seu tempo e do passado, um novo tipo de poder que se iniciava nos Estados Unidos, que era o poder pleno da maioria. Diante disso ele consegue nos mostrar uma diversidade de características que constituem os fundamentos da soberania do povo norte americano, se utilizando, de forma crucial e inteligentíssima, de previsões a respeito dessa sociedade e de suas relações internas.

Percebemos, através desse estudo, que Tocqueville não se confunde com um simples pensador, pois sua contribuição a respeito da igualdade e da liberdade nos sistemas democráticos se faz tão presente quanto em sua época. Suas ideias e previsões nunca foram tão bem correspondidas quanto hodiernamente, em que, nos utilizando de todas as suas obras, tanto para compreendermos o passado e o presente, quanto para imaginarmos o futuro.

Com o desejo, pouco antes de morrer, de deixar sua marca na história através de suas obras, presumimos que seu objetivo de vida se encontra concluído. E percebemos que sua contribuição nos foi fundamental através de seus estudos sobre as instituições que se formavam na américa, por exemplo, conseguimos verificar a importância da independência dos sistemas comunais para a manutenção da democracia na américa, e como sua relevância se fazia diante da maior participação social na política do país, contribuindo para que se evitasse um despotismo ou uma tirania da maioria.

Do mesmo modo, vimos como o costume de um povo pode ser um fator crucial para a sua identidade política, ademais, percebemos como esses costumes se exteriorizam em uma sociedade de modo que se tornam barreiras às imposições contrárias. Diante disso, Tocqueville, brilhantemente, nos apresentou uma das mais louváveis características da cultura americana, que é sua habitual participação política.

No entanto, acreditamos que a maior contribuição de Tocqueville, no estudo da democracia, tenha sido sobre possibilidade de conciliação entre igualdade e liberdade. Findo as exposições, e baseados no pensamento de Tocqueville, conseguimos verificar que essa relação, além de possível, é absolutamente necessária para a manutenção da democracia, haja vista que, não existe democracia sem igualdade e liberdade, no entanto, sendo apenas necessário o bom uso de cada uma, e isso, como verificamos, se faz possível através de uma série de fatores externos ao ser humano.

Desse modo, uma democracia apenas igualitária, como vimos, terminaria por se tornar despótica, mas sem ela, teríamos uma aristocracia. E de outro modo, não é possível a liberdade sem a igualdade, mas, uma vez alcançada a liberdade civil, devemos entender a necessidade de não excluirmos da vida social a liberdade política. Para isso, desse modo, vimos, com Tocqueville, os fatores fundamentais para que uma sociedade não abandone seus direitos políticos, e dentre eles, temos os fatores culturais e materiais, como o hábito político e a maior liberdade e autonomia administrativa.

Além disso, temos a sua importante contribuição na observação cirúrgica que ele faz dos outros povos existentes na américa senão o povo europeu. Isso mostra sua preocupação com a real aplicação do ideal de igualdade para todos os que se percebem seres humanos, e não apenas para pessoas isoladas em determinados grupos. Verifica-se ainda a importância dada para a construção da liberdade do povo negro nos Estados Unidos, que, apesar de prevista na lei, não se observa na sociedade.

Dessa forma, recebemos uma contribuição de Tocqueville para os pensamentos políticos, sociais, filosóficos e humanistas do mundo, e assim, verificamos seu caráter inovador enquanto estudioso dos fatos políticos que se faziam presentes na América e no mundo. Esses pensamentos ainda se fazem importantes quase dois séculos após sua morte.


Referências

TOCQUEVILLE, Alexis. A Democracia na América. Livro I Leis e Costumes. São Paulo: Editora Martins Fontes. 2005

BOBBIO, Noberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Editora Brasiliense S.A. 2000.

Sobre os autores
Evanilson Kleverson da Silva Melo

Sou estudante de direito na UFAL, e dedico a maior parcela do meu tempo à procura pelo conhecimento, que me vem dos mais diversos meios, e minha persistência nesse modo de vida consiste na vontade de transmitir a maior quantidade possível do conhecimento que adquiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Evanilson Kleverson Silva; CORREIA, Manoel Max Silva. Alexis de Tocqueville.: Liberdade e igualdade na democracia da América. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7098, 7 dez. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/88094. Acesso em: 22 dez. 2024.

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