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Aspectos penal e processual penal da novíssima lei antitóxicos

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Agenda 23/10/2006 às 00:00

11 – CAUSAS DE AUMENTO DE PENA NOS CRIMES DE TRÁFICO E EQUIPARADOS (ART. 40)

          As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se ocorrer uma das situações expressamente definidas no art. 40 da Lei 11.343/06.

          11.1 – Noções Gerais. O antigo artigo 18 da Lei 6368/76 predispunha 04 incisos com causas de aumento de pena aplicáveis, aparentemente, a todos os crimes previstos na Lei. Agora, mais objetivamente, as sete causas aumentativas somente têm incidência aos crimes de tráfico.

          11.2 – Crítica. Imperdoável o legislador ter olvidado as causas de aumento da pena de concurso eventual de agentes e de mercancia que visar o idoso. Ora, se um dos objetivos do diploma é o de reprimir o tráfico, não há justificativa para exclusões, mormente se inexiste bis in idem. O idoso foi olvidado, malgrado o alcance da Lei 10.741/03, que notadamente tutelou a vulnerabilidade física e mental dos sexagenários.

          I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito.

          Agrava-se a pena na hipótese de tráfico internacional, que será aferido pela natureza, procedência e circunstâncias do fato pertinente à entrada ou saída do país. A competência é da Justiça Federal.

          II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;

          A pena será agravada se o sujeito ativo praticar o comércio ilícito valendo-se de função pública que guarde vínculo com a repressão à criminalidade. Ex.: policiais que negociam entorpecente. Ou então se desempenhar missão de natureza educacional, como profissionais responsáveis pela idealização e execução de espetáculo ou diversão de qualquer natureza, de serviço de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social. Diga-se o mesmo se o pai ou a mãe exercerem a traficância e envolverem seus filhos na atividade criminosa. Por fim, se o agente tiver função de guarda ou vigilância sobre a substância entorpecente.

          III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

          O distanciamento dos traficantes de locais de maior aglomeração para evitar a difusão da droga é preocupação constante. Assim, se o crime de tráfico for perpetrado no interior ou nas cercanias de qualquer estabelecimento referido no inciso, a majoração será imponível. Obviamente, o elenco é taxativo.

          IV - o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva;

          Neste, a majoração decorre do exercício da traficância permeada de violência, grave ameaça com ou sem arma de fogo, ou ainda, mediante qualquer outro processo de intimidação. Sabido é que em periferia e em favelas, os traficantes impõem os mais diversos métodos de intimidação e violência aos moradores e os obrigam à guarda de entorpecente do crime organizado para transação futura. Afigure-se, outrossim, o exemplo do agente que obriga, mediante ameaça de morte a familiares, a jovem a entrar com droga em presídio para entregar a um membro do mesmo grupo criminoso.

          V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;

          Incide a majorante quando se caracterizar o tráfico interestadual, ou com o Distrito Federal. A hipótese em tela é outra que leva o crime para competência da Justiça Federal.

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          VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;

          O aumento sobrevém se o agente visar ou envolver, no exercício da mercancia, crianças e adolescentes. É conhecido o emprego de menores na traficância, especialmente por serem inimputáveis.

          VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.

          Como o art. 36 tipifica a mesma conduta, certamente a incidência de ambos caracterizaria bis in idem, o que é vedado.

          A causa aumentativa incidirá quando o financiamento ou custeio for exercido pelo mesmo agente que realiza uma das condutas preconizadas nos artigos 33 a 37, como na hipótese do traficante que, além de investir na aquisição de novos pontos de venda, tem em depósito considerável quantidade de drogas. Repise-se que no crime do investidor, sua conduta é dissociada, autônoma, enquanto aqui o financiamento ou custeio é parte integrante, desdobramento natural do negócio ilícito do agente que, ao mesmo tempo, é traficante e financista. Incide, além dos crimes de tráfico, nos crimes de associação (art. 35) e colaboração com o tráfico (art. 37).


12 – DELAÇÃO PREMIADA (ART. 41).

          O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços.

          Para a incidência da causa de diminuição de pena, a cooperação do indiciado ou réu deverá ser plena. Exige-se que haja colaboração durante o inquérito policial e durante a ação penal, de molde a possibilitar a identificação dos demais membros da organização criminosa, bem como a recuperar total ou parcialmente o produto do crime. Quanto mais eficaz a cooperação maior será a redução da pena.

          12.1 – Crítica. Note-se que a redação adotada no dispositivo em apreço repete ipsis litteris o contido no art. 14 da Lei de Proteção às vítimas e testemunhas. Mas não é só. A delação premiada é tratada com maior profundidade no art. 49 (como adiante analisado), com o acréscimo de que a Lei 9.807/99 admite inclusive o perdão judicial. Houve redundância que passou despercebida pelos responsáveis com a elaboração do texto final.

13 – CÁLCULO DAS PENAS (ARTS. 42/43)

          Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

Art. 43. Na fixação da multa a que se referem os arts. 33 a 39 desta Lei, o

juiz, atendendo ao que dispõe o art. 42 desta Lei, determinará o número de

dias-multa, atribuindo a cada um, segundo as condições econômicas dos acusados, valor não inferior a um trinta avos nem superior a 5 (cinco) vezes o maior salário-mínimo.

Parágrafo único. As multas, que em caso de concurso de crimes serão impostas sempre cumulativamente, podem ser aumentadas até o décuplo se, em virtude da situação econômica do acusado, considerá-las o juiz ineficazes, ainda que aplicadas no máximo.

          13.1 – Critério Trifásico. A regra de cálculo, em atendimento ao princípio constitucional de individualização da pena corporal, vem estatuída no diploma penal (CP, art. 68). A nota que merece atenção é que em crimes de tóxicos, na fixação da pena-base, o juiz dará prevalência à natureza e quantidade da substância ou produto (circunstâncias objetivas), em seguida, à personalidade e conduta social do agente (circunstâncias subjetivas). Elas se sobrepõem às demais circunstâncias preconizadas no art. 59 do Código Penal. É que aquelas são mais nocivas e concentram maior danosidade à saúde pública e periculosidade do agente. As circunstâncias objetivas – natureza e quantidade da droga – são apuradas no trabalho pericial; já, a personalidade e a conduta social são inferidas na instrução criminal (interrogatório e oitiva de testemunhas).

          13.2 – Pena de Multa. A fixação da multa obedece a critério bifásico: a) por primeiro, o juiz determina o número de dias-multa (mínimo de 10 e máximo de 360), fundado nas circunstâncias do art. 59 do Código Penal; b) segundo as condições econômicas do réu, fixará dia-multa em valor não inferior a um trinta avos nem superior a 5 (cinco) vezes o maior salário-mínimo. As multas corresponderão a cada crime, independente de concurso de infração, e poderão ser majoradas até o décuplo, segundo as condições econômicas, caso o juiz a considere insuficiente ainda que aplicada no máximo.

          A Lei 11.343/06 aumentou sensivelmente, em cada tipo penal, os patamares concernentes ao número de dias-multa em comparação com a Lei 6368/76. Segundo a atual tabela adotada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (salário-mínimo de R$ 350,00 e dia-multa mínimo de R$ 11,66), para cada crime, chega-se aos seguintes resultados aproximados:

          a) Crime de tráfico (art. 33): multa entre R$ 5.830,00 a R$ 17.490,00;

          b) Crime de induzimento, instigação ou auxílio ao uso de droga (art. 33, § 2º): multa entre R$ 1.166,00 a R$ 3.498,00;

          c) Crime de oferecimento eventual (art. 33, § 3º): multa entre R$ 8.162,00 a R$ 17.490,00;

          d) Crime de tráfico (art. 34): multa entre R$ 13.992,00 a R$ 23.320,00;

          e) Crime de associação para o tráfico ou para o financiamento ou custeio ao tráfico (art. 35 e parágrafo único): multa entre R$ 13.992,00 a R$ 23.320,00;

          f) Crime de financiamento ou custeio ao tráfico (art. 36): multa entre R$ 17.490,00 a R$ 46.640,00;

          g) Crime de colaboração com o tráfico (art. 37): multa entre R$ 3.498,00 a R$ 8.162,00;

          h) Crime culposo de tráfico (art. 38): multa entre R$ 583,00 a R$ 2.332,00;

          i) Crime de condução de embarcação ou aeronave (art. 39): multa entre R$ 2.332,00 a R$ 4.664,00; e, finalmente,

          j) Crime de condução de embarcação ou aeronave de transporte coletivo de passageiros (art. 39, parágrafo único): multa entre R$ 4.664,00 a R$ 6.996,00.


14 – BENEFÍCIOS PRISIONAIS.

           Os crimes previstos nos arts. 33, caput, e § 1º, e 34 a 37, no tocante às prisões cautelares são inafiançáveis e insuscetíveis de liberdade provisória. Em sede de sentença, ao magistrado é vedada a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, bem como a concessão de sursis, graça, indulto e anistia.

          14.1 – Livramento condicional. Repetindo o contido no art. 83, V, do Código Penal, introduzido pela Lei de Crimes Hediondos, o parágrafo único do art. 44 somente permite a concessão do livramento depois de cumpridos dois terços da pena privativa de liberdade, vedando-a no caso de reincidente específico, ou seja, do reincidente em um dos tipos penais especiais apontados no caput do art. 44.

          Como o regime integral fechado preconizado pela Lei de Crimes Hediondos (Lei 8072/90) foi considerado inconstitucional pelo STF, duas situações incompatíveis se apresentam para o condenado. Obviamente, fixado o regime fechado, único cabível aos crimes de tráfico e tendo o condenado direito à progressão para o semi-aberto e deste para o aberto, nenhuma vantagem terá no livramento condicional, claramente mais prejudicial que qualquer regime prisional. Até porque a maioria das comarcas brasileiras não possui estabelecimento adequado para cumprimento do regime aberto, o que impõe ao juiz, extraordinariamente, conceder-lhe a prisão albergue domiciliar.

          Urge que o legislador brasileiro defina as regras para a progressão de regimes em crimes hediondos e assemelhados, pondo fim ao impasse criado pela decisão do STF que permite a progressão depois de cumprido somente um sexto da pena a todo e qualquer crime. Atualmente um crime de roubo à mão armada (não hediondo) acaba sendo mais penoso ao preso que um crime de tráfico de entorpecentes (equiparado a hediondo).


15 – ISENÇÃO E REDUÇÃO DE PENA (ARTS. 45/47).

          Art. 45. É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

          Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para tratamento médico adequado.

          Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

          Art. 47. Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a necessidade de encaminhamento do agente para tratamento, realizada por profissional de saúde com competência específica na forma da lei, determinará que a tal se proceda, observado o disposto no art. 26 desta Lei.

          Tal qual disposto no art. 26, caput, do Código Penal, o art. 45 da Lei 11.343/06 traz uma hipótese de exclusão da culpabilidade ao agente dependente ou que atua sob o efeito de droga. Qualquer que seja a infração praticada, se, em trabalho pericial, for considerado inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, será considerado inimputável. Na hipótese, a norma aplicável será a da Lei em comento e não o Código Penal.

          O critério é o biopsicológico, isto é, o trabalho pericial deverá atestar a dependência ou influência de substância entorpecente e a ausência de capacidade de entendimento e/ou autodeterminação, concluindo pela inimputabilidade.

          Estando provadas a materialidade e autoria de qualquer crime e comprovada a inimputabilidade, o juiz proferirá sentença de absolvição imprópria. Absolve, mas obriga o réu a submeter-se a tratamento médico adequado, ainda que se trate de usuário ou dependente em cumprimento de pena privativa de liberdade (art. 26).

          Ao réu semi-imputável (art. 46) por não possuir, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, o juiz poderá reduzir a pena de um a dois terços.

          Importante lembrar que na semi-imputabilidade somente tem cabida a redução da pena, descabendo a substituição por tratamento médico adequado. Mais. Pelo novo diploma, o juiz pode determinar que o agente se submeta a tratamento realizado por profissional de saúde, caso a avaliação pericial ateste esta precisão; mesmo que se trate de agente em cumprimento de pena privativa de liberdade (art. 26).

Sobre o autor
Jayme Walmer de Freitas

Professor da Escola Paulista da Magistratura e de Pós-Graduação no COGEAE da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenador do 7º Curso de Pós Graduação "Lato Sensu" - Especialização em Direito Processual Penal, da Escola Paulista da Magistratura. Autor das obras Prisão Cautelar no Direito Brasileiro (3ª edição), OAB – 2ª Fase – Área Penal e Penal Especial, na Coleção SOS – Sínteses Organizadas Saraiva vol. 14, pela Editora Saraiva, além de coordenador da Coleção OAB – 2ª Fase, pela mesma Editora. Coautor do Código de Processo Penal Comentado, pela mesma Editora. Colaborador em Legislação Criminal Especial, vol. 6, coordenada por Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, pela Editora Revista dos Tribunais. Colaborador em o Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana, coordenada por Jorge Miranda e Marco Antonio Marques da Silva, pela Editora Quartier Latin. Colaborador em o Direito Imobiliário Brasileiro, coordenada por Alexandre Guerra e Marcelo Benacchio, pela Editora Quartier Latin. Autor de artigos jurídicos publicados em revistas especializadas e nos diversos sites jurídicos nacionais. Foi Coordenador Pedagógico e professor de Processo Penal, Penal Geral e Especial, por 14 anos, no Curso Triumphus – Preparatório para Carreiras Jurídicas e Exame de OAB, em Sorocaba. Juiz criminal em Sorocaba/SP, mestre e doutor em Processo Penal pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Jayme Walmer. Aspectos penal e processual penal da novíssima lei antitóxicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1209, 23 out. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9074. Acesso em: 22 nov. 2024.

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