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Alienação parental e os reflexos sociojurídicos

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Verifica-se de que forma o Poder Judiciário brasileiro atua nos casos de alienação parental e analisam-se as mudanças trazidas aos jurisdicionados após vigência da Lei 12.318/10.

RESUMO: O presente estudo objetivará verificar de que forma o Poder Judiciário Brasileiro atua nos casos de Alienação Parental e analisar as mudanças trazidas aos jurisdicionados após vigência da Lei 12.318/10, comparando o posicionamento do Poder Judiciário Brasileiro diante dos casos de Alienação Parental antes e depois da vigência de Lei 12.318/10, considerando as decisões mais recentes sobre o assunto e identificando as atitudes tomadas pelo judiciário para coibir a prática deste ato. Para a consecução dos objetivos propostos, será necessário definir a Alienação Parental e seus sujeitos, além das possíveis consequências que os atos da alienação podem causar aos filhos menores, dentre eles a síndrome da Alienação Parental. Por fim, será realizado um comparativo entre o posicionamento jurisprudencial adotado antes da vigência da Lei 12.318/2010 e o adotado após a vigência da aludida lei.

Palavras-chave: Alienação Parental. Síndrome. Efeitos jurídicos. 


INTRODUÇÃO

Neste trabalho, foi abordado o tema “Alienação parental e os reflexos sócio-jurídicos advindos da alienação parental, com estudo de suas consequências e implicações nas relações familiares” tendo em vista que muitas famílias já vivenciaram esse fenômeno em virtude da dissolução conjugal. Em razão desse fato ser bastante corriqueiro, foi sancionada a Lei 12.318/10, que prevê diversos instrumentos processuais dependendo de cada caso. 

A ampliação dos temas contemplados pelo Direito de Família reflete o crescimento de situações conflituosas que demandam maior atenção do Estado para a manutenção da ordem social e de sua célula fundamental, a família.

Mesmo depois que o divórcio se tornou pauta jurídica cercada de legalidade no País, a questão que envolve os filhos, quando o rompimento do casal não ocorre em meio a pacificidade, permaneceu como alvo de cuidados, uma vez que, majoritariamente, a criança resta prejudicada por uma disputa acirrada dos pais pela sua guarda ou reconhecimento de sua razão.

A problemática deste estudo gira em torno das dificuldades de se identificar a Alienação Parental e de como solucioná-la, uma vez que pode ocasionar problemas psicológicos para a criança ou o adolescente em virtude do exercício abusivo do direito de guarda. 

Feitas estas considerações iniciais, o presente estudo objetivou apresentar os aspectos jurídicos da alienação parental bem como as lacunas deixadas pela Lei 12.318/10.

O estudo se justifica pois diante do processo de Alienação Parental que pode desencadear Síndrome de Alienação Parental, é importante que todos os indivíduos envolvidos na questão, a começar pela própria família, até os advogados e culminando no magistrado, o qual decidirá sobre o caso, saber identificar o problema de maneira eficaz. É mister que esses indivíduos tenham sensibilidade no que tange aos interesses da criança e do adolescente e paralelamente a isso que a lei seja eficiente a fim de que possa dar amparo de maneira satisfatória à criança ou adolescente e ao genitor alienado, tendo em vista que sofre demasiadamente se ficar comprovado que esta alienação foi fundamentada em falsas denúncias. 

O presente trabalho tem como base o método de pesquisa exploratório-explicativa, posto que pretende proporcionar maior familiaridade com o tema abordado (fenômeno) com o intuito de torná-lo mais explícito e identificar os fatores que contribuem e/ou determinam tais fenômenos. 


1 O PODER FAMILIAR            

1.1 A família e o dever de proteção e de formação dos filhos

O conceito de família é norteado por constante evolução. Situação necessária que se faz presente e tem o intuito de proteger a dignidade da pessoa humana e seu entorno social. Não há uma concepção tradicional e estagnada à qual se possa ater. No entanto busca alcançar o desafio a definição abrangente e pautada no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana segundo o qual “família é o núcleo existencial integrado por pessoas unidas por vínculo sócioafetivo, teleologicamente vocacionada a permitir a realização plena dos seus integrantes” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2019, p.44).

A noção de regulação pessoal sustenta uma imagem de indivíduo que é um conjunto de possibilidades a serem descobertas e contrapõe-se àquela que afirma que os indivíduos precisam ser moldados, conduzidos, fabricados pelos agentes externos. Essa representação modificou a função da família. A ênfase na regulação pessoal e nas relações familiares desenhou a ideia de que se torna dever da família contemporânea favorecer esse desenvolvimento aos seus membros, evitando atos de educação impositiva. Assim, não é o indivíduo que existe, para que haja a permanência da família, mas a existência da família que se justifica pela necessidade individual de ter suporte no processo de desenvolvimento pessoal (SINGLY, 2010).

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Nesta perspectiva, o desenvolvimento dos indivíduos é marcado não por um conjunto de referenciais a serem atingidos ao final da vida, mas, por ser um caminho de descobertas, pauta-se em um conjunto de princípios que, estando na base da formação, orientam a regulação pessoal, mas sem moldá-la. As famílias estariam buscando menos imitações e mais revelações (BANNURA, 2009).

Pela legislação, a família existe para que as garantias legais consideradas fundamentais aconteçam, tais como direito à vida, educação, saúde, lazer, entre outras. Quando se trata dos filhos inseridos em famílias diferentes da nuclear (divorciadas, recompostas, mononucleares, homoparentais etc.), parece existir também uma ênfase na dimensão psicológica, sendo construídos discursos sobre os perigos de perturbação do bem-estar psíquico. Em se tratando dos deveres parentais no pós-divórcio, existe uma série de preocupações com o filho que se baseiam nessa ideia do crescimento pessoal dele e do risco de que haja infortúnios produzidos pela separação conjugal capazes de desviar ou bloquear esse crescimento (ALVIM, 2018).

Em nome da regulação pessoal do filho, são elaboradas sugestões de convivência parental e repetidos os discursos marcados por estereótipos de gênero. Exemplos dessa afirmação encontram-se na proposta de uma série de sugestões sobre a convivência familiar entre criança e pai socioafetivo, após o divórcio, e afirma que, de forma geral, até os três anos de idade, os vínculos maternos prevalecem e, portanto, mesmo considerando todas as habilidades paternas que possam existir, o pai não se estabelece como “substituto pleno” (BANNURA, 2009, p. 95). 

Tamanha ênfase no desenvolvimento pessoal ampliou o alcance popular e institucional das teorias psicológicas. As normas psicológicas ou relacionais têm assumido, na família, o lugar antes ocupado pelas normas morais. A psicanálise, por exemplo, contribuiu com o discurso de que a família frustra desejos e, ao mesmo tempo, viabiliza a satisfação desses, em uma espécie de jogo de equilíbrio inerente aos grupos familiares que seria fundamental para o desenvolvimento infantil. A própria ideia de desenvolvimento pessoal perpassado por um conjunto de relações que possibilitem esse florescimento foi profundamente difundida pela psicologia. Uma das grandes abordagens teóricas da Psicologia, a Psicologia Humanista, tem esse mote no cerne de suas discussões (SINGLY, 2010).

Ademais, importa destacar como a relação interpessoal pode ser terapêutica a ponto de despertar as potencialidades do outro. Considera-se uma significativa participação da psicologia no processo de modificação da conceituação e função da família (ROGERS, 2014).

A formação do caráter e, consequentemente, o seu reflexo na sociedade, inicia-se no âmbito familiar, na estruturação da sua primeira relação social: a relação com os entes familiares. Estes além de desempenharem a função constitucionalmente prevista, qual seja a de responsabilidade legal, figuram como exemplo/espelho por aquele ser em construção. Os princípios orientadores do indivíduo sejam eles religiosos ou morais, e os costumes, surgem, em regra, com a vivência na denominada primeira sociedade do indivíduo: a família (GOETZ, 2017). 

O reflexo, ou seja, a formação do indivíduo para o convívio em sociedade, consequentemente, estará ligada à formação que este recebeu de seus tutores/responsáveis legais. Posto isto, é que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reconheceu e incumbiu a família, juntamente com a Sociedade e o Estado o dever do cuidado. Dever este que também constitui norma constitucional e direito fundamental (FREITAS, 2012). 

Apesar de esse dever corresponder diretamente a direitos protegidos como normas fundamentais e elencados até mesmo por normas de proteção internacional, o avanço nos tribunais pátrios para a aplicação da devida responsabilização para aqueles que, diante de seus deveres de pais, ausentaram-se do cuidado, seja ele material, afetivo ou até mesmo de um cuidado em sentido estrito, ainda é pequeno (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2019). 

Observa-se na legislação brasileira tentativas em assegurar os princípios da primazia da criança e do adolescente e da dignidade humana, com a instituição de mecanismos para assegurar sua efetividade, tais como, a criação de meios para compelir o responsável legal pela prestação de alimentos ao necessitado e culminando até mesmo nas normas para coibir a alienação parental, entre outros (GOETZ, 2017). 

Posto isto, é que tem se admitido a responsabilização na formação de seus filhos como meio eficaz para garantir os direitos fundamentais da criança e do adolescente. Os pais têm não só a responsabilidade legal, como pontuado, mas também, uma responsabilidade moral e social. As consequências de uma formação humana deficiente são imensuráveis e a família tem papel fundamental no crescimento e desenvolvimento de um ser humano honroso. 

Explicado o papel da família na proteção e formação dos filhos, passa-se à análise do rompimento dos laços conjugais e a continuidade dos deveres parentais.


2 ALIENAÇÃO PARENTAL

A alienação parental é considerada gênero quando envolve qualquer espécie de obstrução da convivência parental espontânea. Esse fenômeno pode ser praticado por um dos genitores, pelos avôs ou tios, por quem estiver exercendo a autoridade parental perante aquela criança ou adolescente (SILVA; OLIVEIRA, 2017).

É principalmente no âmbito familiar que a criança encontra o espaço comunitário e o afeto essenciais ao seu pleno desenvolvimento, independentemente da forma como se iniciou e como eventualmente se desfez o vínculo afetivo dos pais. Assim ambos têm a obrigação de propiciar aos filhos um ambiente saudável, seguro e livre de qualquer forma de violência ou de maus-tratos. É no espaço familiar — estejam pais unidos ou separados —, que a criança e o adolescente devem encontrar sua estabilidade e sua socialização, cujos valores e fundamentos formarão sua própria e estável personalidade (FREITAS, 2012).

Toda e qualquer forma de violência praticada contra o menor, além de se mostrar uma prática covarde, é difícil de ser averiguada e diverge da função dos genitores que é deixar sua prole a salvo dos perigos do mundo (CANTILINO, 2010).

Como observa Lagrasta Neto (2011), a Lei da Alienação Parental é fruto do esforço do juiz trabalhista Elzio Luiz Peres e da proposta do Deputado Regis Fernandes Oliveira, tendo sido promulgada em 27 de agosto de 2010, com vetos aos artigos 9º e 10, cujas oposições não tiram o brilho, a inteligência, a boa redação e, sobretudo, a eficiência da Lei 12.318/2010, que contém os dispositivos necessários para a sua pontual aplicação judicial, ao prever multas severas e progressivas, dentre outras penalidades mais gravosas que podem ser imputadas ao genitor alienador, como a perda da guarda, a imposição de visitas monitoradas, a escolha de locais neutros para a visitação, a proposta de internação do alienador — a depender de sua conduta doente —, além do acompanhamento das visitas por terapeuta.

Mas, infelizmente, ainda se trata de legislação mal compreendida, não tão bem absorvida pelos julgadores e quase nunca aplicada por juízes e tribunais com a necessária e esperada contundência.

A Lei de Alienação Parental considera como ato de alienação, a maligna interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, ou mesmo por terceiros que estão próximos ao menor, quer em decorrência dos vínculos de parentesco — como ocorre com os avós, tios e até mesmo irmãos maiores e capazes —, ou de pessoas que tenham a criança ou o adolescente sob sua autoridade em razão da guarda ou vigilância. O objetivo é promover o repúdio da criança em relação ao outro genitor, ou que ocorra alguma falha ou solução de continuidade na manutenção desse vínculo.

O efeito perverso e ponto nevrálgico de caracterização da alienação parental decorre do ato inconsciente de rejeição da criança ao progenitor alienado, provocando irrecuperáveis prejuízos às relações de contato e de convivência do filho, cuja sadia comunicação constitui imprescindível instrumento de manutenção e fomento da relação paterno-filial. Afirma, com razão, Carvalho (2011) ser um dos maiores desafios dos Tribunais a garantia e a manutenção da relação de convívio entre o genitor não guardião e a prole, diante das dificuldades causadas pelos pais. 

A Lei de Alienação Parental identifica, exemplificativamente, algumas das hipóteses de alienação parental e prescreve que seu exercício fere direito fundamental da criança e do adolescente, consistente numa saudável e fundamental convivência familiar, prejudicando, com a obstrução ou impedimento do contato, a realização do afeto nas relações com o genitor e com o restante do grupo familiar.

É direito fundamental do filho, ainda incapaz, a convivência com seus pais, antes que esse elo de amor e de afeto se perca pelo vazio causado por decisões judiciais que interrompam e afastam o progenitor falsamente acusado de abuso, apenas em decorrência de uma intensa e bem articulada verbalização de falsas alegações.

Deve o julgador, em conformidade com a Lei nº 12.318/2010, garantir o mínimo de convivência com o genitor alienado, a não ser que tenha provas concretas ou lhe ateste profissional por ele designado para acompanhar as visitas, a existência de risco real à integridade física ou psicológica do menor, pois, como afirma Gomes (2013), as visitas mínimas foram concebidas para debelar os efeitos produzidos pelas falsas denúncias de abuso sexual com a suposta vítima, só sendo negadas as visitas, pelo menos na presença de terceiros, se houver laudo elaborado por profissional, atestando a nocividade dessa sagrada convivência.

2.1 Alienador versus alienado  

O sujeito ativo da Alienação Parental é chamado de Alienador, na maioria das vezes o Alienador é o genitor que possui a guarda do menor, e abusando deste poder busca afastá-lo do outro genitor, criando inúmeras formas de atrapalhar a convivência de ambos. Por diversas vezes o alienador busca distanciar o filho do alienado por atos simples, que podem até passar despercebidos, como por exemplo, convidar outras crianças para irem à casa do filho justamente nos dias em que este deve estar com o genitor que não possui sua guarda, ou ainda perguntar com frequência à criança se ela quer mesmo ver o outro genitor no dia estipulado (SILVA; OLIVEIRA, 2017). 

O comportamento do alienador tende a ser muito criativo, sendo impossível criar uma lista fechada de suas condutas. O que pode se afirmar com certeza é que o alienado não respeita as regas e costuma não obedecer às sentenças judiciais (DANTAS, 2011). 

O alienador pensa e trata o filho como se fosse uma propriedade sua, não levando em consideração que, para um desenvolvimento psicológico saudável, a criança precisa na mesma proporção de ambos os genitores, esquecendo-se o alienador que somente o seu carinho e cuidado não contribui de forma satisfatória para que a criança se sinta plenamente feliz. 

Ainda, na atualidade, é comum que a guarda do filho menor fique com a mãe e por essa razão as mulheres são as maiores causadoras da Alienação Parental, entretanto tal atitude não pode ficar restrita a elas, já que também existem pais guardiões, avós e tios. 

Já os sujeitos passivos da Alienação Parental, suas vítimas, são em geral o filho menor e o cônjuge que não possui sua guarda, podendo também estender-se a familiares e terceiros. 

O genitor que não possui a guarda do filho, em primeiro lugar enfrenta as dificuldades e tristezas de não ter o filho consigo na mesma proporção que o outro genitor, restando-o apenas vê-lo nos dias de visitas estipulados, encontrando assim dificuldades em manter com o filho vínculo forte e verdadeiro que possuía antes da ruptura conjugal.

O genitor alienado às vezes acaba contribuindo de forma inconsciente com a Alienação Parental, quando ao se sentir impedido de participar ativamente da vida do filho acaba diminuindo o número de visitas e ligações, afastando-se pouco a pouco do filho. 

Este afastamento acaba por reforçar a ideia de que o guardião/alienador é o único capaz de atender a todas as necessidades do filho, ficando o outro genitor/alienado rotulado como incapaz, irresponsável, e sem amor, o que consequentemente traz ao filho um sentimento de abandono. Desta feita, a maior vítima da Alienação Parental é o filho que, em meio ao conflito,é procurado para opinar de quem mais gosta. A criança ou adolescente vítima de Alienação Parental tem o vínculo com o alienado prejudicado, ou até mesmo rompido, o que por si só pode lhe acarretar sérios problemas emocionais, já que alimentada e embasada pelos discursos do alienador passa a ter uma péssima imagem do outro genitor, chegando até a odiá-lo (SILVA; OLIVEIRA, 2017). 

Sobre os autores
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORQUETTE, Alexandra Junia Paula; SILVA, Alexandre Alves. Alienação parental e os reflexos sociojurídicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6568, 25 jun. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91117. Acesso em: 22 nov. 2024.

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