4- SANEAMENTO DO PROCESSO
O processo constitui um amálgama de interesses e direitos, obrigações, faculdades e ônus. Há subjacente o interesse público na correta prestação jurisdicional e na preservação do Direito (objetivo). Este interesse público e a presença das condições da ação e dos pressupostos processuais implicam na atividade de saneamento do feito, a qual, embora tenha momento propício para ser realizada, é lavada a efeito continuamente durante todo o desenrolar da relação processual.
A atividade saneadora, que é levada a efeito pelo magistrado oficiosamente ou por provocação das partes ou do custus legis, se caracteriza pela atividade de fiscalização e constatação acerca da presença das condições da ação e pressupostos processuais, bem como das medidas para suprir eventuais falhas. Estas matérias são de ordem pública e, já ao analisar a inicial, deve o magistrado proceder à verificação. Não é por outro motivo que o artigo 295 do CPC refere à possibilidade de indeferimento da inicial de plano, elencando expressamente as condições da ação. O inciso II deste preceptivo legal menciona a ilegitimidade manifesta da parte. No inciso III está contemplada a falta de interesse processual. Já o inciso III, do parágrafo único, refere-se à impossibilidade jurídica do pedido.
Dentre os casos de indeferimento ali mencionados não figuram os pressupostos processuais, mas evidentemente que pode ocorrer o indeferimento da inicial se verificada a presença de algum óbice (pressupostos negativos, como a coisa julgada) ou a ausência insuprível de algum pressuposto positivo.
Uma visão instrumentalista recomenda extrema cautela no indeferimento da inicial. Se há possibilidade de suprimento da falha, esta deve sempre ser oportunizada, ainda que a lei não o diga expressamente. Se há possibilidade de suprimento, não haverá prejuízos para os interesses públicos envolvidos e é isso o que importa. Aqui entra em voga novamente o que antes referi, no sentido da necessidade de uma visão que compreenda o processo sem mitificação. As condições da ação, que são condições para a obtenção da tutela-tipo pleiteada, têm em mira o exercício útil da jurisdição. Se é possível que providências das partes supram omissão ou falha que atinge uma destas condições ou pressupostos da relação processual, sempre deve ser oportunizada, porque a forma serve o processo e não o inverso.
Mas é após a fase postulatória, na denominada fase das providências preliminares, que se encontra o momento típico para o saneamento do processo. Estabilizada objetiva (artigos 264 e 294 do CPC) e subjetivamente (artigos 41 a 43 do CPC) a demanda, feitas as considerações das partes do custus legis, abre-se o espaço para que ocorra o saneamento do processo.
Ordinariamente, as condições da ação se apresentam em conformação tal que podem ser constatadas omissões ou falhas a elas relativas já na análise inicial da exordial, o que não impede que somente agora, superada a fase postulatória, venham a ser objeto de análise mais aprofundada. O mesmo raciocínio vale para alguns dos pressupostos processuais, como, ad exemplum, a capacidade para ser parte.
Já no tocante aos pressupostos processuais objetivos intrínsecos, normalmente terão surgido problemas no decurso do processo, sendo aqueles cujo saneamento com mais freqüência se realiza nesta fase específica.
Adiante veremos as condições da ação e os pressupostos processuais no saneamento
5- CONDIÇÕES DA AÇÃO (RECTIUS: CONDIÇÕES PARA A OBTENÇÃO DA TUTELA-TIPO PRETENDIDA) E PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS NO SANEAMENTO
A sistematização das condições da ação e dos pressupostos processuais foi longe e complexa, mas chegou, feitas algumas ressalvas, a um termo satisfatório em termos estruturais. A própria conformação original de alguns dos institutos sofreu alterações com o decorrer do tempo.
As condições da ação identificadas no âmbito do processo civil cingiram-se a três, a saber: legitimidade ad causam, possibilidade jurídica do pedido e interesse processual.
A legitimidade ad causam é definida como a pertinência subjetiva da demanda. Considera o direito específico posto em juízo e a sua referibilidade em vista do sujeito que postula e contra o que se postula. Por uma ilação lógica, em regra somente quem titula o direito pode ir a juízo pedir, e somente em face de quem este direito subjetivo tenha pertinência se pode postular. A aferição da legitimidade considera a relação do sujeito com o direito, mas não toma em linha de conta suas condições pessoais diante da formação da relação processual. Supre requisito relativo ao exercício do direito de ação, mas não em relação à relação processual que se formará em decorrência dele. A previsão da legitimidade pode ir desde situações bastante específicas, onde um sujeito é relacionado, exemplo o Ministério Público em relação à defesa do meio ambiente, até outras, nas quais a simples situação de o indivíduo figurar como portador do título de crédito o legitima. É no direito subjetivo material que está a pedra de toque da aferição desta condição.
Hoje, com novas categorias de direitos coletivos e difusos, rompendo-se com os paradigmas do direito privado, a legitimidade amplia-se na forma da legitimação de associações e do Ministério Públicos em relação a estes direitos, inclusive no que diz respeito ao processo de execução, ou, ainda para a proteção de certos direitos individuais homogêneos, como a saúde em relação a idosos e a crianças e adolescentes. [18] A respeito do instituto, o magistério de Humberto Theodoro Júnior:
"A defesa de direito próprio, em nome alheio, caracteriza a denominada legitimação anômala ou extraordinária.
A Lei Processual admite, em certos casos, a atuação do MP como substituto processual, como, por exemplo, ao réu preso (art. 9º, inciso II), ao interdito (fl. 1.182, § 1º) e na especialização da hipoteca legal em caso de tutela ou curatela (art. 1188, parágrafo único).
A CF/88 prevê legitimação extraordinária no chamado mandado de segurança coletivo, que poderá ser impetrado por partido com representação no Congresso nacional e por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída há pelo menos um ano em defesa dos interesses de seus membros ou associados.
Prevê, ainda, a Constituição, a possibilidade de as associações agirem em nome próprio, em quaisquer ações civis, na defesa de seus associados, desde que expressamente autorizados (pelo estatuto ou por deliberação assemblear) (art.5º, nº XXI)" [19]
A substituição processual, operada nestes, e em outros múltiplos casos, desvincula a legitimação de uma relação imediata do substituto com o direito material posto em causa.
A possibilidade jurídica inicialmente sofreu os ecos do imanentismo sincretista, que obnubilou a percepção em relação à independência (relativa) entre os planos do direito material e processual. A feição que lhe foi concedida desconsiderava o direito de invocação da tutela jurisdicional como regra, e colocava o direito material em proeminência, na medida em que partia da premissa de que deveria haver previsão legal do direito de ação, ou ao menos deveria invocar o autor um direito material plausível para caracterizar a presença de um pedido "juridicamente possível". Este panorama inverteu-se, consolidando a independência dos planos material e processual, ao menos no que concerne a esta condição. A partir desta inversão, somente diante da negativa expressa ou implícita da lei é que inexiste o direito de ação, tendo sido reduzido significativamente o espectro de abrangência da condição. São exemplos de impossibilidade a utilização do mandado de segurança em relação a vantagens pecuniárias pretéritas [20] e a utilização da ação civil pública para discussão de inconstitucionalidade. [21]
O interesse processual, modernamente, constitui-se de um trinômio, formado pela necessidade, utilidade e adequação do provimento. [22] Falar-se em necessidade é questionar acerca de ser efetivamente necessária a tutela jurisdicional no caso concreto. Este requisito sofreu, no entanto, grande esvaziamento diante do princípio do amplo acesso à jurisdição. Um dos aspectos mais interessantes e presentes na discussão da efetiva necessidade de tutela jurisdicional reside na presença de uma instância administrativa anterior. [23] A rigor, tomada a necessidade da tutela jurisdicional como ultima ratio, seria exigível que a parte ao menos comprovasse que tentou obter administrativamente a providência estatal, ou que a via administrativa é menos célere ou mais onerosa que a judicial. Mas o exaurimento, ou mesmo a mera invocação, da instância administrativa como condição para a necessidade não é da tradição de nosso Direito. A única tentativa anterior à CF/88 de incluir a instância administrativa como condição para o interesse processual, que ocorreu em relação ao mandado de segurança na Emenda Constitucional de 1969, não vingou. [24]
Recentemente, entretanto, a ação de habeas data foi condicionada à invocação da instância administrativa, conforme a Súmula nº 02 do STJ, e artigo 8º, da Lei nº 9.507/97.
O conflito entre a interpretação ampla conferida o artigo 5º, inciso XXXV, da CF/88 e o requisito da necessidade do provimento jurisdicional por ser a via administrativa mais onerosa ou menos célere, se deve, sem dúvida, ao fato de que adotamos uma matriz processual peninsular sem que exista aqui, ao contrário do que lá ocorre, a dualidade de jurisdições. É hora de (re)pensarmos a finalidade do processo administrativo e da utilidade que ele poderia ter para desafogar o Judiciário.
Seja como for, salvante esta limitada hipótese do habeas data, a instância administrativa não condiciona o ingresso em juízo, devendo, no entanto, certamente repercutir na sucumbência. Refiro-me especificamente àquelas hipóteses onde no curso do processo verifica-se que um simples pedido administrativo poderia ter solucionado a questão trazida a juízo e, não obstante, a parte ingressou com ação judicial. Não havia propriamente uma lide, e o Estado não deveria ser onerado pela opção da parte em ingressar diretamente com a demanda judicial ao invés de pleitear a providência administrativamente.
Por outro lado, comprovando a parte que a via administrativa é mais onerosa, menos eficaz ou célere, suprida está a condição indiscutivelmente. [25]
A utilidade diz respeito à utilidade prática, concreta, que logrará o autor com o provimento ou a tutela-tipo postulada. Verificando-se de plano que o resultado da ação não será jurídica ou praticamente útil, fenece-lhe interesse. Obviamente que resta inviável perscrutar-se a psique do autor para tentar aferir que espécie de utilidade pretende ele, ou por outras palavras, o parâmetro de que deve o julgador lançar mão é objetivo, e não subjetivo. Para a parte, a sentença pode ser relevantíssima até por questões de ordem moral, mas se observado que na prática a utilidade inexiste ou é irrelevante, deve o julgador sobrepor ao interesse da parte o interesse do Estado em prover jurisdição somente quando ela é necessária e justificada. Aquele que, por exemplo, tem título passível de execução, não pode pretender uma condenação com o mesmo objeto apenas para ver declarado publicamente que tinha razão.
Já a adequação do provimento diz com a espécie de tutela pretendida e sua pertinência abstratamente considerada em relação aos fatos que embasam o ingresso em juízo. Se tenho um caso de antecipação de tutela, o caminho é uma ação ordinária com tal pedido de liminar, e não a utilização de uma cautelar inominada satisfativa. [26]
Os pressupostos processuais, de seu turno, são relativos à relação processual que decorrerá do exercício do direito de ação. A doutrina os dividiu em subjetivos e objetivos, sendo os primeiros relativos aos sujeitos imediatos da relação processual, juiz e partes. No tocante às partes, os pressupostos compõem três categorias de exigências que materializam a capacidade para ser parte, a capacidade para estar em juízo e a capacidade postulatória.
A capacidade para ser parte, também dita capacidade processual, não se confunde com a legitimidade, porquanto esta é específica em relação a um determinado direito, e aquela é genérica. Considera o sujeito em si, e não em vista de um determinado direito. É, portanto, a capacidade para figurar como sujeito da relação processual. Em regra, a capacidade processual está associada à capacidade civil de direito, ou seja, à capacidade para ser sujeito de relação de direito. As pessoas jurídicas, por exemplo, carecem de regular constituição para figurarem como autoras e rés, salvo as hipóteses onde a lei defere a possibilidade de ser parte a entidades sem personalidade jurídica, como soe ocorrer com o espólio ou a massa falida, não podendo, no entanto, a pessoa jurídica opor a sua irregularidade quando figurar como ré (artigo 12, § 2º do CPC). A capacidade civil das pessoas jurídicas de direito privado, e, por conseguinte, sua capacidade processual, obedece ao previsto no artigo 45 do Código Civil. No caso das pessoas físicas, a personalidade jurídica termina com a morte, de forma que é inviável postular-se em nome de pessoa falecida, o que não inviabiliza a sucessão processual em demanda já proposta. O nascituro, embora não tenha personalidade jurídica, pois ela ainda está in fieri, condicionada ao nascimento com vida, tem seus direitos resguardados, conforme tradição de nosso Direito (artigo 2º do Código Civil).
Outras vezes, a capacidade processual está associada a outros requisitos específicos, como é o caso da condição de cidadão para a ação popular (artigo 1º, caput, e § 3º, da Lei nº 4.717/65). Há uma limitação específica da capacidade.
A capacidade para estar em juízo relaciona-se aos institutos da capacidade de fato, da presentação, da representação e da assistência, regidas tanto pela lei processual como pelo direito material. Em regra, toda a pessoa com capacidade de fato ou de exercício pode estar em juízo, quer como autora, quer como ré (artigo 7º, do CPC). As pessoas jurídicas e formais ensejam aplicação das regras de representação ou de presentação [27], de acordo com as leis ou estatutos que as criam, na forma do artigo 12 do CPC. As pessoas físicas demandam, por vezes, representação ou assistência, na forma da lei civil. Há, ainda, a possibilidade de necessidade de integração da capacidade processual, como ocorre, exempli gratia, com os cônjuges, nas hipóteses do artigo 10 do CPC, cuja omissão, não suprida judicialmente, redunda em nulidade.
A capacidade postulatória diz com a necessidade da representação por advogado habilitado (artigo 36 do CPC). O papel do advogado foi alçado à condição de função essencial à justiça, conforme se depreende do artigo 133 da CF/88. A rigor, poderia o legislador, como fez em alguns casos, dispensar a presença do advogado, mas certamente isso implicaria em uma importante perda na qualidade da prestação jurisdicional. Dentre os casos de dispensa da representação por advogado constam o artigo 9º, caput, da Lei dos Juizados Especiais e o artigo 791, caput, da CLT, nas causas trabalhistas
Mas não basta ao advogado estar habilitado, sendo necessário que não esteja suspenso e apresente instrumento procuratório, estando dispensados de sua exibição os agentes públicos cujos cargos exercem função de representação judicial, como os membros da AGU, Procuradoria da Fazenda Nacional, Procuradorias dos Estados e Municípios. [28]
Duas situações podem ocorrer quando ausente o instrumento procuratório. Na primeira, a mais comum, este simplesmente não é apresentado junto à inicial ou contestação, e o fato é percebido pelo magistrado em ação oficiosa ou por provocação da parte ex adversa ou do Ministério Público. Tem incidência o artigo 13 do CPC, de forma que o magistrado deverá intimar a parte a suprir, em prazo razoável, a falha ou defeito na capacidade ou representação da parte, sob pena de, no caso do autor, declarar a nulidade do processo, no caso do réu, decretar a revelia, e no caso do terceiro, excluí-lo. A outra situação é aquela na qual o causídico pugna, já na inicial, pela juntada posterior do instrumento procuratório, o que somente é admitido nas hipóteses estritas do artigo 37 do CPC, sendo a sanção pelo descumprimento da juntada em prazo de quinze dias (prorrogável por mais quinze a pedido) a inexistência dos atos praticados. Esta hipótese é rara.
As reformas processuais inicias do CPC, em meados da década passada, em boa hora dispensaram a necessidade de reconhecimento de firma na procuração.
Infelizmente, conquanto exija a legislação a representação por advogado, ainda há uma generalizada crença, embasada em estereótipos, de que os serviços dos advogados são demasiadamente caros, ao que se soma o visível déficit na implantação das Defensorias Públicas por parte da União e dos Estados. Nos poucos Estados Federados onde as Defensorias estão razoavelmente instaladas e operativas, há uma enorme demanda reprimida. De bom alvitre seria fosse concedida pelo poder público maior atenção a estes importantes órgãos, sob pena de as camadas mais carentes da população serem relegadas a condição de párias frente ao sistema jurisdicional do Estado. [29] O resultado é que muitos direitos não são implementados porque ou as pessoas acreditam que o custo benefício não justifica ou porque falta representação judicial pela completa impossibilidade financeira.
Pertinente às partes surge um último requisito que diz respeito à existência de litisconsórcio unitário necessário, sendo que a ausência do litisconsorte necessário implica falta de legitimidade ad processum. [30] Deve juiz determinar a citação do litisconsorte nestas condições,com base no artigo 47, parágrafo único, do CPC.
Os pressupostos relativos ao juiz dizem respeito à competência e a ausência de impedimentos e suspeições. A competência em termos de processo civil pode ser absoluta ou relativa. Absolutas são a competência funcional (em sentido vertical e horizontal) e a ratione materiae. Relativas são as competências estabelecidas em função do valor da causa e territoriais. A competência absoluta é matéria que deve ser conhecida de ofício pelo magistrado (artigo 113 do CPC), ou alegada na contestação, como preliminar (artigo 301, inciso II, do CPC), sob pena de a parte ter de arcar com as custas pelo tardio apontamento. A incompetência relativa carece do manejo da exceptio fori, em peça separada e com suspensão do processo, na forma dos artigos 112, 307 e 265, inciso III, do CPC, sob pena de prorrogação.
É princípio fundamental da jurisdição a imparcialidade, já que o juiz coloca-se (ou deve colocar-se), de forma eqüidistante das partes. E digo mais. A atividade do julgador é a atividade de um agente estatal, e, portanto, subordina-se, também, ao artigo 37, caput, da CF/88, devendo observar os princípios ali elencados, dentre os quais figura a imparcialidade. As causas de impedimento e suspeição, mencionadas nos artigos 134 e 135 do CPC, respectivamente, comprometem potencialmente a imparcialidade, legitimando o manejo da exceção de suspeição ou impedimento, cujo processamento se faz na forma dos artigos 304 e seguintes do CPC.
Os pressupostos objetivos comportam uma divisão em intrínsecos e extrínsecos conforme sua presença ocorra ou não na própria relação processual considerada. Dentre os pressupostos intrínsecos, figuram as nulidades (ou invalidades) processuais em todas as suas manifestações. O sistema de nulidades do CPC não apresenta uma sistematização satisfatoriamente precisa. O critério da cominação de nulidade não permite divisar claramente a espécie de invalidade, se nulidade absoluta, relativa ou anulabilidade. Há nulidades absolutas cominadas e não cominadas, assim como relativas.
Embora boa parte da doutrina nacional utilize esta sistematização, é visível a superioridade daquela concebida por Galeno Lacerda, em seu célebre "Despacho Saneador", segundo o qual "o que caracteriza o sistema das nulidades processuais é que elas se distinguem em razão da natureza da norma violada, em seu aspecto teleológico."
Uma primeira divisão assoma da consideração da essencialidade ou não do vício. O vício essencial atinge a estrutura do ato, e dá azo às nulidades absolutas, relativas e anulabilidades. O vício não essencial, ao revés, conduz à mera irregularidade, que não contamina o ato a ponto de justificar sua extirpação ou sua repetição.
Dentro dos vícios essenciais, três categorias ou níveis são visualizados a partir da natureza da norma violada e de sua teleologia. As normas violadas poderão ser cogentes ou dispositivas, conforme possam ou não ter sua eficácia afastada pela ação das partes. As normas cogentes ensejam a existência de nulidade absolutas ou relativas. Sua natureza implica em que inexista preclusão para que o magistrado aponte e/ou sane a invalidade, o mesmo valendo para as partes. As normas dispositivas, por outro lado, em vista de sua natureza, se violadas, somente ensejarão o reconhecimento da anulabilidade pela provocação do interessado, sendo defeso ao magistrado imiscuir-se na esfera de disposição legítimas das partes.
Diante das normas cogentes, outra dicotomia se impõe conforme a teleologia da norma considerada. Se cogente e voltada preponderantemente à preservação do interesse público (Estado-Juiz) presente na relação processual, a violação produzirá nulidade absoluta. Ao contrário, se o interesse visado for o privado [31] (rectius: das partes), ocorrerá nulidade relativa.
A diferença entre as nulidades absolutas e relativas conforme a doutrina tradicional, reside na possibilidade de convalidação, a qual seria inviável diante das absolutas, conclusão esta que vem a cada dia sendo mais questionada diante de uma visão instrumentalista do processo.
O sistema de nulidades, qualquer que seja a sistematização adotada, está alicerçado nos princípios do prejuízo e da finalidade (artigos 249, § 1º, e 244 do CPC).
Por fim, os pressupostos objetivos extrínsecos dizem respeito a situações externas ao processo que podem lhe obstar o regular andamento. São exemplos a ausência de recolhimento de custas de feitos extintos na forma do artigo 268 do CPC, a litispendência, a coisa julgada e a convenção de arbitragem.
Para o processo de execução, valem, mutais mutandis, os mesmos apontamentos. [32]