O art. 32 da Lei no. 5.010/66 determina que:
"Art. 32 – Os Juízes Federais e os Juízes Federais Substitutos devem comparecer, nos dias úteis, à sede dos seus Juízos e aí permanecer durante o expediente, salvo quando em cumprimento de diligência judicial." (grifei)
O art. 35, inciso VI da LC no. 35/79 – LOMAN impõe ao magistrado, como dever funcional seu, "comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término". (grifei)
Mas, qual é o "horário do expediente" ?
A Lei no. 5.010/66, em seu art. 54, delegou ao Conselho da Justiça Federal a regulamentação da matéria, contudo, apenas no que se referia aos "serviços judiciários".
Eis a redação do dispositivo:
"Art. 54 – Os serviços judiciários funcionarão nos locais e horários estabelecidos pelo Conselho da Justiça Federal". (grifei)
No exercício dessa competência, o Conselho da Justiça Federal baixou os Provimentos nos. 19, de 29.11.1969; 29, de 01.10.1969; 103, de 04.11.1974; 138, de 23.9.1976; e 277, de 12.9.1985.
Os mais relevantes são os três últimos, que assim dispõem:
"PROVIMENTO no. 103 – O CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL, no uso das suas atribuições legais e em virtude da implantação do novo sistema de classificação de cargos na Justiça Federal de Primeira Instância, efetivada pelos Atos nos. 369 e 370, de 25 de outubro de 1974, resolve
I – RECOMENDAR aos Senhores Juízes Federais Diretores do Foro: a) que seja observado o regime de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais fixado nos artigos 7º. e 23º. dos Atos nos. 287 e 288, respectivamente, de 18 de abril de 1974; b) que o expediente diário das Secretarias seja cumprido em dois turnos, devendo ser submetidos à homologação do Conselho os horários que estabelecerem;" (grifei)
"PROVIMENTO no. 138 – O CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL, no uso de suas atribuições legais e tendo em vista a decisão proferida no julgamento do Processo no. 329/76-DF, em sessão de 22 de setembro de 1976, resolve
I - ...
II – DELEGAR competência aos MM. Diretores do Foro das Seções Judiciárias para decidirem acerca do horário a ser observado no cumprimento do expediente diário das respectivas Secretarias, desde que obedecido o regime de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais fixado nos arts. 7º. e 23 dos Atos nos. 287 e 288/CJF, respectivamente, de 18.04.1974.
III – Os horários, a serem estabelecidos na forma do item II, deverão ser encaminhados à homologação do Conselho." (grifei)
"PROVIMENTO no. 277, de 12 de SETEMBRO de 1985
O CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL, no uso de suas atribuições legais e tendo em conta a decisão proferida no julgamento do Processo no. 3658, resolve:
I – (...)
II – DELEGAR competência aos MM. Diretores do Foro das Seções Judiciárias para decidirem acerca do horário a ser observado no cumprimento do expediente diário da respectiva Seção Judiciária, desde que obedecido o regime de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais fixado nos artigos 7º. e 23, dos Atos nos. 287 e 288/CJF, respectivamente, de 18.04.74, devendo encaminhar para registro no Conselho os atos que fixarem o horário de trabalho.
III – (...)". (grifei)
Não é difícil perceber que a regulamentação teve por destinatários os servidores da Justiça Federal, e não os juízes.
E aqui não se pode pretender, sequer analogicamente, a extensão das normas estatutárias aplicáveis aos servidores da Justiça Federal, aos juízes federais.
É que a Lei no. 8.112/90, assim como já fora o caso quando em vigor a Lei no. 1.711/52 e suas modificações posteriores, só é extensível aos juízes federais, órgãos do Estado que são, e não simples prepostos, como são os servidores públicos federais em geral, naquilo que não for incompatível com a própria natureza da função jurisdicional.
Ora, constituindo-se os juízes federais em órgãos do Estado, à semelhança do que se dá com os agentes políticos, como o Presidente da República, os Ministros de Estado, os Deputados Federais e Senadores da República, e assim por diante, não podem ter eles jornada de trabalho fixa e predeterminada.
Os juízes são juízes 24 horas por dia, todos os dias da semana, todos os meses do ano, o ano inteiro.
Válido lembrar HELY LOPES MEIRELLES:
"Agentes políticos são os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para exercício de atribuições constitucionais. Esses agentes atuam com plena liberdade funcional, desempenhando suas atribuições com prerrogativas e responsabilidades próprias, estabelecidas na Constituição e em leis especiais. Não são servidores públicos, nem se sujeitam ao regime jurídico único estabelecido pela Constituição de 1988. Têm normas específicas para sua escolha, investidura, conduta e processo por crimes funcionais e de responsabilidade, que lhes são privativos."
(Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 16ª. ed., 2ª. tir., 1991, p. 67) (grifei)
E o ex-Ministro do STF, MÁRIO GUIMARÃES:
"Nos debates que se travaram por ocasião de ser julgado, no Supremo Tribunal Federal, o rec. ext. número 13.843, de que foi relator o ministro BARROS BARRETO, ponderou-se que, na Constituição de 46, a situação dos juízes como funcionários públicos está expressa no artigo 187, inserto no tít. VIII, sob a rubrica – Dos Funcionários Públicos.
"Nesse artigo se declara: "São vitalícios somente os magistrados, os ministros do Tribunal de Contas, os titulares de ofício de justiça e os professores catedráticos". Põe-se, na mesma linha, magistrados, titulares de ofícios da Justiça e professores.
"A objeção, na aparência, é muito forte. Note-se, porém, que, em outro passo, e este mais importante, distinguiu a Constituição entre juízes e funcionários, pois na Seção 1ª. do cap. IV, regulou condições de nomeação, direitos e vantagens dos juízes, sob a rubrica "Do Poder Judiciário" e no tít. VIII prescreveu direitos e deveres dos funcionários públicos. De onde se há de concluir que o baralhamento de situações heterogêneas, constantes do art. 187, é apenas falha de redação, incapaz, por si só, de autorizar se atribua ao constituinte de 46 o propósito de inovar no sistema da lei e de contrariar a tradição de nossa jurisprudência.
"E assim, o acórdão relatado pelo ministro BARROS BARRETO acentuou, ainda uma vez, que "os juízes não são considerados funcionários públicos no sentido próprio ou restrito da expressão". São órgãos do Poder Judiciário (art. 94 da Constituição). Não são prepostos de outro poder."
(O Juiz e a Função Jurisdicional, Ed. Forense, 1958, p. 38/39)
Sem pretender interpretar a Constituição Federal através da lei, veja-se o disposto no art. 15 da LOMAN:
"Art. 15 – Os órgãos do Poder Judiciário da União (art. 1º., I a VI) têm a organização e a competência definidas na Constituição, na lei e, quanto aos tribunais, ainda, no respectivo Regimento Interno."
E compare-se com o art. 21, incisos II e V desta mesma Lei Complementar:
"Art. 21 – Compete aos tribunais, privativamente:
"II – organizar seus serviços auxiliares, provendo-lhes os cargos, na forma da lei; propor ao Poder Legislativo a criação ou a extinção de cargos e a fixação dos respectivos vencimentos;
"V – exercer a direção e a disciplina dos órgãos e serviços que lhes forem subordinados." (grifei)
Nítida, portanto, a diferenciação entre órgãos judiciais (juízes) e serviços judiciários (servidores do Judiciário).
Então, se o "horário de expediente" ao qual os juízes federais, por dever funcional legalmente imposto, não poderia ser aquele que veio a ser regulamentado pelo Conselho da Justiça Federal nos supra transcritos Provimentos, já que, em todos, vê-se claramente que os destinatários são os servidores judiciários, eis que apenas eles são sujeitos a regime jurídico com jornada de trabalho fixada em lei, o que não se dá com os agentes políticos, dentre os quais, os juízes federais, é de perguntar-se: a que "horário de expediente", então, estarão se referindo o art. 32 da Lei no. 5.010/66 e o art. 35, VI da LOMAN?
A resposta somente poderá ser uma: ao expediente no qual se espera que o juiz venha a prestar a função jurisdicional àqueles que forem procurá-lo, inclusive, pessoalmente, sejam as partes, sejam seus procuradores.
Portanto, ao horário de funcionamento ordinário do foro para o público externo, e não, ao horário de funcionamento ordinário do foro para o público interno, ou seja, os servidores judiciários.
Horários de expediente esses que não são integralmente coincidentes.
Das 11.00 às 19.00 h, tem-se o expediente interno.
Das 12.00 às 17.00 h, tem-se o expediente externo.
Nos horários que não coincidirem os expedientes interno e externo é que se dará o regime de plantão judiciário, e haverá a competência judicial do juiz de plantão, para o atendimento a situações urgentes que reclamem decisão judicial em horário no qual os juízes, de ordinário, não mais estejam a prestar sua função ao público externo.
No âmbito desta 2ª. Região, o Provimento no. 01/2003 da Corregedoria – Geral do TRF-2ª. Região, ora contido no art. 51 da Consolidação de Normas da Corregedoria – Geral da Justiça Federal da 2ª. Região, diz que:
"Art. 51 – O período de plantão corresponde aos dias de sábado, domingo, feriado e recesso forense, e, nos dias úteis, fora do horário de expediente forense, entre as 17 h e 12 h do dia seguinte." (grifei)
O conceito de "expediente forense" está intrinsecamente ligado a institutos processuais, como o do juiz natural; e não pode ser diferente, já que a norma de organização judiciária que é a regulamentação do horário de funcionamento do expediente forense não terá como deixar de repercutir nas normas processuais que constituem o instrumento da atuação dos juízes nos casos concretos, e assim, na realização mesma do princípio do devido processo legal.
Como lembrado por JOSÉ FREDERICO MARQUES:
"Se há entrelaçamento tão grande entre processo e organização judiciária, entre jurisdição e leis referentes a seus órgãos – justamente porque da independência, garantias e composição destes depende em grande parte a atuação imparcial e justa do juiz na relação processual -, constituiria constante risco para a perfeita aplicação das leis processuais, deixar que os Estados estruturassem a sua magistratura sem uma vinculação bem estreita e obrigatória aos princípios que asseguram o exercício da jurisdição com plena e completa autonomia. (...)".
(Manual de Direito Processual Civil, Ed.
E como dito por ALBERTO NOGUEIRA:
"Ao lado do "processo" e do "juiz", a organização judiciária se constituiu na terceira componente estrutural do devido processo legal, abrangendo o próprio arcabouço do Poder Judiciário, na forma e também no conteúdo."
(Sistemas Judiciais das Liberdades Públicas, Rio de Janeiro, Renovar, 2006, p. 267)
O mesmo autor, um pouco mais adiante, lembrando a doutrina de PIMENTA BUENO:
"O conceito que segue, sobre o que é a organização judiciária, é uma lição ainda para a realidade que hoje vivenciamos, guardadas as proporções entre aquela época e a agenda que nos desafia, dos Estados Democráticos de Direito e dos Direitos Humanos (um Judiciário das Liberdades Públicas, dos Direitos Humanos). Ei-lo: "Por organização judiciária entende-se a constituição dos diversos órgãos, a composição ou coordenação sistemática dos tribunais, agentes ou instrumentos da administração da justiça, o complexo das condições que estabelecem o todo e cada um dos tribunais ou jurisdições, seus graus ou recursos instituídos para proteger os direitos individuais, ordem e paz pública."
"(...) As leis não servem senão por sua aplicação religiosa e exata. Os regimentos dos juízes, os códigos de processo, ou civil ou ciminal, não são senão os trâmites legais que eles devem observar para realizar essa aplicação; é pois preciso que a organização, as condições dos juízes ou tribunais sejam bem calculadas, para que em harmonia com tais trâmites eles possam e sejam adstritos a desempenhar bem a sua alta missão, de proteger os direitos dos cidadãos e a ordem da sociedade."
(op. cit., p. 305 e 306)
Ora, o regime de plantão não é modalidade de expediente forense.
Como, aliás, declarado expressamente em seus Considerandos pelo Provimento no. 194, de 12.12.1979, do Conselho da Justiça Federal, "verbis":
"CONSIDERANDO que a permanência de Juízes em plantões, segundo escalas pré-estabelecidas, em dias feriados, sábados e domingos, para atendimento de medidas judiciais de urgência ou de atribuições da Direção do Foro constituem encargos inerentes às atividades funcionais dos magistrados da Justiça Federal de Primeira Instância;
"CONSIDERANDO, porém, que os denominados "plantões’ não são modalidade de expediente forense, mas apenas forma adotada pelo Poder Judiciário para manter acessíveis aos jurisdicionados os instrumentos de garantia da liberdade e defesa dos direitos individuais, também, nos dias em que os Órgãos Judiciais não funcionam regularmente;
"CONSIDERANDO, dessa maneira, que nos sábados, domingos e nos dias feriados, inclusive nos do art. 62, I da Lei no. 5.010, de 30.5.66, não é necessária a permanência do Juiz no prédio – sede da Seção Judiciária, durante as horas que corresponderiam ao expediente normal, mas apenas se torna indispensável possibilitar aos interessados o conhecimento do endereço do magistrado de plantão;" (grifei)
Daí porque o art. 52 da mesma Consolidação estipula que:
"At. 52 – É vedada a prática de ato processual no período de plantão, salvo os casos de urgência, tal como o risco de lesão a direito enquanto perdurar o período de plantão, ou até o início do expediente, demonstrada a inexistência e a impossibilidade de postulação idêntica e anterior perante outro juízo no horário de expediente regular." (grifei)
Sendo evidente a relação desse dispositivo regulamentar com os arts. 173 a 175 do CPC.
Não obstante, e independentemente de iniciado ou encerrado o horário de expediente externo, se o juiz que já for o competente para conhecer da causa ou do recurso estiver no foro no qual funcionar, deverá atender o advogado que vier a procura-lo, no exercício de dever funcional seu, o que confirma a assertiva lançada logo no início deste trabalho, no sentido de que o juiz é juiz 24 (vinte e quatro) horas por dia, sempre que, competente, tiver que exercer sua jurisdição.
Sendo exemplos as decisões proferidas quando dos julgamentos dos ROMS no. ROMS no. 13262-SC, Rel. Min. Garcia Vieira, dec. p. maioria pub. DJU 30.9.2002, p. 157; 15706-PA, 2ª. Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, dec. un. pub. DJU 07.11.2005, p. 166; e ROMS no. 1275-RJ, 1ª. Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, dec. un. pub. DJU 23.03.1992, p. 3.429.
Há que concluir-se, portanto, que os juízes federais: a) não têm jornada de trabalho legalmente prefixada; b) não é possível aplicar analogicamente aos juízes federais as normas estatutárias de jornada de trabalho previstas para os servidores judiciários; c) os juízes federais têm dever funcional de encontrar-se na sede da Vara na qual lotados, ou designados, durante o horário de atendimento ao público externo; d) antes do início desse horário, ou depois do seu encerramento, apenas o juiz de plantão poderá exercer a função quanto aos casos urgentes que se lhe forem encaminhados, ausente o juiz natural da causa; e) entretanto, o regime de plantão não é prolongamento do horário de expediente ordinário; f) pelo que, encontrando-se no foro, em sua Vara, o juiz que já for o competente para conhecer da causa ou do recurso estará obrigado funcionalmente a atender o advogado que quiser com ele despachar, independentemente de já ter se iniciado ou encerrado o horário de expediente externo; g) em conclusão, é impossível aplicar-se, aos juízes federais, em particular, e a todos os demais órgãos políticos, em geral, jornada de trabalho semelhante à imposta aos trabalhadores do setor privado, ou aos servidores públicos estatutários, não – exercentes de funções de confiança ou de cargos em comissão.
BIBLIOGRAFIA
GUIMARÃES, Mário. O Juiz e a Função Jurisdicional. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1958.
MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Ed. Saraiva, v. 1, 5ª. ed., 1977.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 16ª. ed., 2ª. tir., 1991.
NOGUEIRA, Alberto. Sistemas Judiciais das Liberdades Públicas. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2006.