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Advogado de Estado. Defesa do interesse público. Independência funcional mitigada

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Agenda 25/02/2007 às 00:00

O artigo analisa que tipo de regime funcional os procuradores públicos se submetem, a hierarquia ou a independência funcional, questão fundamental no momento da escolha de qual interesse deverá ser defendido.

1- CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente artigo visa a analisar que tipo de regime funcional os procuradores públicos se submetem, a hierarquia ou a independência funcional, questão fundamental no momento da escolha de qual interesse deverá ser defendido.

Antes, porém, cabe uma breve análise da recente história da advocacia de Estado no Brasil, além de poucas palavras sobre o conceito de interesse público e suas ramificações.


2- ADVOCACIA DE ESTADO NAS CONSTITUIÇÕES

Em qualquer Estado que prime pelo respeito a suas instituições, é imanente o exercício da Advocacia Pública, como forma de defesa dos interesses estatais.

Na época imperial, a incumbência dessa atribuição era do Ministério Público, na pessoa do Procurador da Coroa. A Constituição imperial de 1824 [1] limitou-se a atribuir aos membros do MP, através dos Procuradores da Coroa e Soberania Nacional, a promoção do processo criminal, não se pronunciado acerca da atribuição da defesa do Estado.

A primeira Constituição Republicana, de 1891, reservou maior espaço ao Ministério Público, embora sua organização se dera em 1890, através do Decreto nº 848, que organizou a Justiça Federal, dispondo sobre sua estrutura e atribuições no âmbito federal, onde se destacam, dentre outras, a de "promover o bem dos direitos e interesses da União". [2]

Foi a Carta de 1934 que deu ares institucionais à Advocacia Pública da União, embora com a roupagem de Ministério Público, como um órgão de cooperação das atividades governamentais [3], juntamente com o Tribunal de Contas e os Conselhos Técnicos.

A competência penal e sobre interesses privados indisponíveis passou ao Ministério Público dos Estados, de tal sorte que o Ministério Público Federal tornou-se o órgão da defesa dos interesses da União em juízo [4], não sendo por outro motivo que seus membros passaram a se chamar Procuradores da República.

O tratamento destacado ao parquet na Constituição de 1934 foi suprimido na Constituição do Estado Novo (1937), impondo a ditadura de Vargas um ferrenho retrocesso à instituição ao retratá-la apenas em dois artigos [5].

A Carta de 1946 voltou a dar relevo ao Ministério Público como instituição constitucional, colocando-o em posição destacada ao inserir sus atribuições em um título próprio [6], e prevendo algumas garantias aos seus membros [7].

Foi além ao estabelecer que "a União será representada em Juízo pelos Procuradores da República, podendo a lei cometer esse encargo, nas Comarcas do interior, ao Ministério Público local" [8].

Por sua vez, a Constituição de 1967 colocou o Ministério Público na parte referente ao Poder Judiciário, não obstante tenha concedido a este órgão em sua esfera federal o poder de representar a União em juízo [9].

2.1- A CONSTITUIÇÃO DE 1988.

A Constituição de 1988 destacou à Advocacia de Estado, juntamente com o Ministério Público e a Defensoria Pública um capítulo à parte em sua estrutura, órgãos essenciais à justiça, separando-os de qualquer outro "poder", como forma de preservar a independência de suas atuações.

O Ministério Público passou a não mais exercer a defesa dos interesses do Estado, que em muitas vezes eram conflitantes com os direitos da sociedade, gerando uma contradição em si mesmo no que tange à colidência destes direitos.

A Defensoria Pública, por sua vez, passou a atuar na defesa dos necessitados, através da prestação de assistência jurídica gratuita.

Esses três órgãos, que exercem tarefas essenciais ao funcionamento da justiça, compõem a chamada Advocacia Pública em sentido lato [10].


3- ATENUAÇÃO DA CLÁSSICA TRI-PARTIÇÃO DOS PODERES PELO CONSTITUINTE DE 1988

O princípio de separação de poderes [11], que na sua acepção política originária visava a garantir a liberdade e segurança dos cidadãos frente ao Estado, assume novo viés democrático. Não somente se busca um dever de abstenção do Estado, mas um agir na busca de objetivos traçados pela Constituição.

Isso se deve à evolução do conceito de Estado de Direito, consubstanciada no aumento de suas atribuições.

Em sua origem, o conceito de Estado de Direito se lastreava em uma concepção liberal, cujas características foram: Submissão do Estado à Lei, divisão de poderes e o enunciado e garantia dos direitos individuais, daí surgindo os Direitos de primeira geração.

Parte-se da idéia de que o homem é anterior ao Estado, tendo aquele caráter ilimitado. Como forma de limitar ainda mais o poder estatal ocorre a separação de poderes, consubstanciada na técnica de freios e contrapesos.

Assentava-se na garantia dos indivíduos oponíveis ao poder estatal. Privilegiava-se o homem-singular e não havia qualquer compromisso estatal com a realidade política, social e econômica. Estado e Sociedade não andavam de mãos atadas.

Todavia, essa inação estatal, o individualismo do Estado Liberal gerou imensas injustiças, tendo em vista o fracasso da ordem econômica livre produzir justiça e harmonia, e os movimentos sociais do século XIX desvelaram a insuficiência das liberdades burguesas, permitindo que se tivesse consciência da necessidade da justiça social.

Surgiu o Estado Social de Direito para corrigir as injustiças do individualismo clássico liberal. Visa a compatibilizar em um mesmo sistema "dois elementos: o capitalismo, como forma de produção, e a consecução do bem-estar social geral, servindo de base ao neocapitalismo típico do Welfare State." [12]

Estado e Sociedade se aproximam, na medida em que aquele terá que intervir nas relações sociais para estancar as desigualdades geradas pela ordem econômica e social.

Todavia, percebeu-se que o Estado Social de Direito, não obstante sua tendência a criar uma situação de bem-estar geral, poderia se compatibilizar com qualquer regime político, desde a democracia até o fascismo [13].

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Por outro lado, as considerações mostram que nem sempre o Estado Liberal de Direito, tampouco o Estado Social de Direito, caracterizam-se como um Estado Democrático, já que este se funda na soberania popular, consubstanciada na participação efetiva e operante do povo na coisa pública. [14]

Daí, o surgimento do Estado Democrático de Direito, que almeja realizar o princípio democrático como garantia geral dos direitos fundamentais, fundante da plena participação de todo o povo nos mecanismos de controle das decisões.

E ao vincular a expressão democrática ao conceito de Estado, todos os valores dessa se propagam sobre os elementos do Estado e da ordem jurídica (igualdade material, liberdade e dignidade da pessoa humana).

A tarefa primordial do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais, sem se afastar da do regime democrático.

Há um fim solidário e democrático, até então inexistente, de solucionar os problemas da vida individual e coletiva, através de medidas assecuratórias ao cidadão.

E veja que na linha dessa evolução de modelo estatal, encontram-se os direitos fundamentais. Assim, nessa ordem, surgiram: direitos de status negativos, que permitem uma resistência à atuação estatal; direitos a prestações, que permitem do indivíduo exigir atuação do Estado no intuito de melhorar sua qualidade de vida; novos direitos coletivos, como ao meio ambiente, ao desenvolvimento econômico, a solidariedade, respeito ao interesse público, dentre outros.

Na verdade, entendem que estes últimos direitos seriam "propósitos e objetivos da atividade estatal e não de direitos fundamentais no seu sentido clássico e consolidado do termo. Mas, a partir do momento em que o constituinte brasileiro decidiu configurá-los como direitos fundamentais, coloca-se um problema dogmático que a doutrina não pode ignorar (...)" [15]

Nossa Magna Carta, na linha da evolução estatal, em seu art. 1º [16], abraçou a idéia do Estado Democrático de Direito.

Da mesma forma, no art. 3º, onde podemos visualizar a idéia de forma mais clara, in verbis:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

E com tamanha evolução do modelo de Estado, vislumbramos que a idéia de tripartição de poderes se tornou insuficiente diante das novas necessidades de controle democrático do exercício do poder, juntamente com o comprometimento em assegurar a justiça social.

Veja-se que na concepção originária do Estado liberal, no qual os direitos de liberdade e de propriedade eram prioritariamente protegidos pelo Estado, a separação de poderes foi suficiente para evitar o abuso do poder estatal.

Hodiernamente, diante da nova postura estatal, se impende necessário o surgimento de mecanismos que façam valer ao Estado o cumprimento de seus novos objetivos.

É imperioso remodelar a idéia das três funções, para chegar a uma organização de órgãos autônomos não subordinados aos clássicos três poderes.

Esse novo viés de organização estatal, onde ora se exige um dever de abstenção do Estado, ora se exige uma prestação estatal, aliada a uma efetiva participação popular, necessita de órgãos estranhos à estrutura tradicional de organização dos poderes.

Ademais, passa a haver uma abrangência maior no controle dos atos da Administração. Se antes se buscava apenas aferir a legalidade dos mesmos nos aspectos da competência, forma. Hoje, se analisa aspectos, tais como, finalidade, moralidade e legitimidade, interesse público, dentre outros. [17]

Isso se traduz na possibilidade de o Judiciário cada vez mais controlar os atos da administração, mormente o seu mérito, o que atenua ainda mais a noção clássica de separação de poderes.

Mas, cabe ressaltar que não obstante essa nova leitura de atuação estatal, mormente dirigida ao Poder Executivo como prestador social e ao judiciário como garantidor da ordem jurídica, este último continua preservando uma característica peculiar, a inércia.

Daí, o surgimento de órgãos que tenham capacidade postulatória no sentido de provocar o judiciário, quando suas atuações preventivas não forem suficientes para atingir seus fins, no caso o interesse público. São os chamados órgãos essenciais à justiça, que pela natureza de suas funções fiscalizadoras, são autônomos.

Suas funções visam, de modo geral, a fiscalizar indevidas e desproporcionais ingerências do Estado na vida dos cidadãos, bem como suas políticas, para que as mesmas proporcionem um mínimo necessário a uma vida pautada na dignidade humana.

E a inserção destes órgãos em um dos três poderes seria inadequada, eis que, além de poder causar desequilíbrio entre os mesmos, desvirtuaria suas funções, tendo em vista que estando subordinado a um dos poderes estatais tradicionais, não haveria a necessária autonomia para censurar certas práticas do ente ora subordinado.

Nessa esteira, andou bem nosso constituinte ao inserir advocacia de Estado, a Defensoria Pública e o remodelado [18] Ministério Público em um capítulo à parte. Os órgãos essenciais ao funcionamento da justiça.

Não obstante a importância da Defensoria Pública e do Ministério Público, órgão que já atuou na defesa do Estado em juízo, focaremos com maior densidade a advocacia de Estado, por ser o desiderato desta obra.


4- DEVER ESSENCIAL DE AUXÍLIO À JUSTIÇA.

A nossa Carta atual, não obstante tenha imposto funções distintas aos órgãos da Advocacia pública em sentido lato, os organizou em capítulo próprio.

Nesse sentido, a busca da função específica de sua atuação deve estar atrelada à posição em que ocupa no cenário da constitucional.

Veja que se inserida em capítulo do Poder Executivo, a atividade de advogado estatal se limitaria simplesmente à consultoria e representação do ente vinculado, com todos os atributos que são inerentes ao referido poder, como por exemplo, a hierarquia.

Contudo, a Magna Carta lhe reservou uma missão especial, inconfundível com qualquer outra função cometida aos órgãos dos tradicionais Poderes do Estado, na qual jamais fora aventada em Constituições passadas. Instituição essencial ao funcionamento da justiça. Mas no que consistiria essa finalidade específica?

Inicialmente, esse sentido de justiça é amplo, não se referindo apenas à função típica exercida pelo Poder Judiciário, mas também "a justiça abrangente da equidade, da legitimidade, da moralidade". [19]

Assim, entendemos que a referida função consistiria num dever de sustentação e aperfeiçoamento da ordem jurídica, que se aplicando à advocacia de Estado consistiria na atividade de orientação, fiscalização, promoção e representação judicial [20].

Isso significa que, ainda que o administrador, seja ele de qualquer instância hierárquica, se afaste da consecução dos ditames da ordem jurídica, deverá o advogado de Estado, no exercício de seu mister, restaurar o ato.


5- INTERESSE PÚBLICO

A existência do Estado só se justifica [21] ante a necessidade de promover a convivência humana. Os modelos de Estado variam de acordo com a parcela de poder que se encontra na mão do governante, podendo ser quase que total, tal qual no Estado absolutista, bem como pelo grau de atuação para consecução de um fim, podendo o Estado abster-se de algumas atividades, ou, ao revés, atuar positivamente na busca de um fim.

Analisando nossa Magna Carta, percebemos que estamos diante de um Estado Social de Direito, ou seja, há por parte estatal respeito às regras criadas e também uma atuação positiva na consecução do fim almejado pela mesma.

Qualquer que seja a forma de Estado, em tese, haverá sempre a busca do interesse público. E o que seria o interesse público? Lucia Valle Figueiredo [22] responde com maestria que é "aquele a que a Constituição e a lei deram tratamento especial".

E o verdadeiro interesse público é aquele que atende ao bem comum da sociedade, quer seja diretamente, ou indiretamente, com o reforço do aparato estatal para que este realize o bem comum.

Daí a distinção entre interesse público primário e interesse público secundário, sendo este último ligado ao Estado como pessoa jurídica sujeita de direitos próprios.

Celso Antônio Bandeira de Mello [23] nos traz à baila a distinção feita pela doutrina italiana entre as duas acepções de interesse público, in verbis:

Interesse público ou primário é o pertinente à sociedade como um todo e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social. Interesse secundário é aquele que atina tão-só ao aparelho estatal enquanto entidade personalizada e que por isso mesmo pode lhe ser referido e nele encarna-se pelo simples fato de ser pessoa.

Ora, veja-se que, às vezes, o aparelhamento estatal é importante para a consecução do interesse público. Todavia, se isso for às custas de meios inidôneos, verdadeiramente não se estará protegendo o interesse público.

Vejamos no exemplo citado pelo já citado pelo eminente professor Bandeira de Mello.

Se o Estado causar danos a terceiros e indenizá-los das lesões infligidas estará revelando-se obsequioso ao interesse público, pois é isto o que determina o art. 37 § 6º da Constituição. Se tentar evadir-se a este dever de indenizar (mesmo consciente de haver produzido danos), estará contrariando o interesse público, no afã de buscar o interesse secundário, concernente apenas ao aparelho estatal: interesse em subtrair-se a despesas (conquanto devidas) para permanecer mais "rico", menos onerado patrimonialmente, lançando, destarte sobre ombros alheios os ônus que o Direito pretende sejam suportados por todos.


6- ATRIBUIÇÃO DO ADVOGADO DE ESTADO

Conforme mandamento constitucional, cabe, especificadamente, ao advogado de Estado a consultoria e a representação judicial do ente ao qual esteja vinculado.

A primeira atividade tem um caráter eminentemente preventivo, no sentido de "orientar a atuação da Administração Pública, evitando, assim, o cometimento de injuridicidades". [24] A segunda, "cumpre demandar junto ao Poder Judiciário, a defesa dos interesses postos à cura do Estado". [25]

No exercício dessas atribuições, deve estar buscando uma atuação pautada no interesse público primário ou até o secundário, desde que este não colida com aquele.

Não obstante a sua atuação deva estar voltada para a consecução do interesse público, mormente o de viés primário, a natureza de vinculação constitucional com os demais poderes, principalmente a estreita ligação com o Poder Executivo poderá desvirtuar essa missão.

Movido à pressão de certos setores, sem poder fazer uso de prerrogativas inerentes a magnitude de sua função, inevitável seria o comprometimento com o seu mister constitucional de defesa do interesse público.

Por fim, todo órgão com status constitucional deve atuar na busca do interesse público. Mas esse conceito, demasiadamente aberto, pode suscitar dúvidas quanto à finalidade do órgão.

6.1- ATIVIDADE DE CONSULTORIA E ASSESSORAMENTO DO PODER EXECUTIVO

Em um regime de Estado Democrático e Presidencialista, a figura do chefe do executivo é a maior expressão da vontade popular. Logo, as diretrizes e determinações do mesmo devem ter tratamento relevante.

Cumpre salientar que, quanto a essas funções, a Magna Carta as restringiu ao Poder Executivo.

Todavia, em tese, o chefe do executivo não possui conhecimentos jurídicos. E para satisfazer sua vontade, é necessário um estudo do órgão técnico, no caso a Advocacia de Estado, para que analise se os atos estão em consonância com a ordem jurídica vigente.

Na verdade, os advogados de Estado são os maiores parceiros do governo, procurando dar soluções criativas, dentro da legalidade, para a implementação das diretrizes políticas.

Veja que se trata de verdadeira função de controlador interno da legalidade administrativa, aferindo-se a compatibilidade da atividade estatal com a ordem jurídica.

Em conseqüência desta atuação, há uma diminuição do inconformismo na atuação estatal o que reduz o número de contenciosos judiciais entre administrados e o ente, que em última instância causaria prejuízo a ambas as partes.

Ressalta-se que nessa função não há regime de hierarquia, uma vez que o advogado de Estado analisará tão-somente a legalidade dos atos, de acordo com a Constituição, as leis e principalmente com sua consciência, prestando contas somente com si próprio, ou seja, com a sua convicção jurídica que melhor dará embasamento à questão suscitada.

O parecer do Advogado não é impeditivo, mas sim opinativo quanto à juridicidade do ato. Exemplificando, se ao advogado lhe é dada a missão de analisar um projeto de lei ou uma licitação, não é cabível qualquer interferência em seu mister. Pode sim, o governante discordar dos argumentos ali postos e fundamentamente decidir de maneira diversa.

6.1.1- ASSESSORAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE GOVERNO

Conforme já enfocamos, o mundo moderno e globalizado trouxe mudanças na concepção dos deveres estatais. Passou o Estado de mero guardião das liberdades públicas a cumpridor de políticas sociais para a consecução do bem comum do povo.

Nessa esteira, as relações entre Estado e Sociedade se tornam mais complexas, precisando aquele se adaptar as novas exigências para o cumprimento de seus deveres, uma vez que sua atuação se torna mais positiva, pró-ativa.

Daí, a importância dos procuradores estatais, que, nas atividades de assessoramento e consultoria, devem efetuar a compatibilidade da política social ou econômica a ser implementada pelo Poder Executivo, com ditames das normas e princípios constitucionais.

Veja que a referida atribuição é de suma importância, pois visa dar juridicidade [26] à política a ser implementada, sem a qual quedar-se-ia ao insucesso. Nessa esteira, um plano político pode ser perfeito no que tange aos aspectos sociais, embora possa ser "um fracasso na prática, se não houver um lastro jurídico que lhe dê base e sustentação para prosperar". [27]

Daí, impossível a dissociação de Direito e Política, senão vejamos nas palavras de Dalmo de Abreu Dallari [28], in verbis:

Na verdade, é impossível compreender-se o Estado e orientar sua dinâmica sem o direito e a política, pois toda fixação de regras de comportamento se prende a fundamentos e finalidades, enquanto que a permanência de meios orientados para certos fins depende da inserção em normas jurídicas.

A função do procurador é a de aconselhamento jurídico junto ao Executivo, Poder responsável por "gerir o aparato estatal e de propor e de executar diretrizes e políticas a serem desempenhadas pelo Estado, para que se possa tornar concreta a consecução do bem comum". [29]

Para uma melhor compreensão das atividades dos procuradores, podemos exemplificar as medidas que são objeto de aconselhamentos:

A procuradoria de Estado pode elaborar minuta de projeto de lei, que o Poder Executivo encaminhará ao Congresso Nacional; demonstrar as razões de veto de projeto de lei, como também analisar a juridicidade de um plano econômico [30] ou social a ser implementado pelo Poder Executivo.

6.2- REPRESENTAÇÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL DO ENTE PÚBLICO

Caso a via administrativa não seja suficiente para dirimir o conflito, caberá ao procurador de Estado, na representação judicial da pessoa jurídica (seja no pólo ativo ou no passivo), atuar pautado na lealdade processual, não usando de artifício protelatório, tampouco da litigância de má-fé, como forma a preservar a ordem jurídica.

Isso, claro, se as pressões externas e internas não desvirtuassem sua atuação em juízo. Daí, a necessidade de garantias institucionais.

Sobre o autor
Claudio Geoffroy Granzotto

advogado da União no Rio de Janeiro (RJ), especialista em Direito Penal e Processo penal pela UERJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GRANZOTTO, Claudio Geoffroy. Advogado de Estado. Defesa do interesse público. Independência funcional mitigada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1334, 25 fev. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9533. Acesso em: 23 dez. 2024.

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