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Primeiros comentários à Medida Provisória nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021

Examina-se o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP) introduzido pela Medida Provisória nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021.

Sumário: Introdução. 1. Preâmbulo e histórico legislativo. 2) Âmbito de aplicação da Medida provisória. 3) Objetivos do Sistema Eletrônico de Registros Públicos. 4) Responsabilidade dos oficiais dos registros públicos pelo SERP. 5) Fundo para a Implementação e Custeio do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos. 6) Recepção de extratos eletrônicos por meio do SERP. 7) Normas complementares quanto à atribuição da Corregedoria Nacional de Justiça. 8) Acesso a bases de dados de identificação pelos tabeliães e oficiais de registros públicos. 9) Alterações legislativas. Conclusão.


Introdução

Em 27 de dezembro de 2021 foi publicada a Medida Provisória nº 1.085 para dispor sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP) e alterar diversos dispositivos da legislação correlatos aos registros públicos.

Sem o objetivo de esgotar todos as nuances e detalhes sobre o tema, são apresentadas as primeiras impressões a respeito dos dispositivos da Medida Provisória nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021 que tratam do SERP.

As alterações da legislação promovidas a partir do art. 10, embora relevantes, não serão objeto do presente artigo.

1. Preâmbulo e histórico legislativo

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.085, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2021.

Dispõe sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos - SERP, de que trata o art. 37 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, e altera a Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, a Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, a Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, a Lei nº 11.977, de 2009, a Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, e a Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62, da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:

Comentário: Inicialmente, cumpre destacar que os dispositivos sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos SERP foram veiculados por meio de Medida Provisória, nos termos do art. 62, da CF/88[1]. Sobre os requisitos constitucionais legitimadores da relevância e da urgência, conceitos jurídicos indeterminados, segundo a jurisprudência predominante no excelso STF, apenas em caráter excepcional é autorizada a submissão ao poder Judiciário, sob pena de ofensa à separação de poderes insculpida no art. 2º, da CF/88[2]. Em relação à iniciativa do Presidente da República, o art. 22, XXV, da CF/88[3], prevê a competência privativa da União para legislar sobre registros públicos, sem prejuízo de, por meio de lei complementar, autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas sobre a matéria. E o excelso STF possui julgados sobre a possibilidade de atuação da União na referida seara, em especial em matéria de emolumentos, concurso público, investidura e vacância[4].

Objeto

Art. 1º Esta Medida Provisória dispõe sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos - SERP, de que trata o art. 37 da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, e moderniza e simplifica os procedimentos relativos aos registros públicos de atos e negócios jurídicos, de que trata a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, e de incorporações imobiliárias, de que trata a Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964.

Comentário: o artigo faz referência à Lei nº 11.977/09[5], que trouxe a previsão do sistema de registro eletrônico. A previsão, todavia, advém de outros diplomas normativos, em especial o art. 16, da lei nº 11.419/06[6], § 6º do art. 659 do CPC/73[7], com redação dada pela Lei nº 11.382/06, art. 185-A, do CTN[8], com redação dada pela Lei Complementar nº 118/15, parágrafo único da Lei nº 6.015/73[9], com redação dada pela Lei nº 11.977/09, a Lei nº 8.159/91, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos, e seu Decreto Regulamentador nº 4.073/02, e nos incisos II e III do art. 3º, da Lei nº 12.965/14[10], que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.

Mais recentemente, a Lei nº 13.465/17 prevê o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), implementado e operado em âmbito nacional pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR), pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, com recente alteração legislativa quanto ao custeio[11].

Quanto à Proteção de Dados Pessoais, Lei nº 13.709/18 também contém dispositivos correlatos aos da presente medida provisória, em especial os artigos 1º, 2º, 6º, e 23[12].

No âmbito administrativo do Conselho Nacional de Justiça, havia inicialmente previsão no Provimento nº 25, de 12 de novembro de 2012, que dispõe sobre a regulamentação do uso do Malote Digital pelas serventias extrajudiciais de notas e de registro; Provimento nº 38 de 25 de julho de 2014, que dispunha sobre a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais - CRC; Provimento nº 46, de 16 de junho de 2015, que dispõe sobre a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais CRC; Provimento nº 47[13], de 18 de junho de 2015, que estabelecia o sistema de registro eletrônico de imóveis[14]; Provimento nº 48, de 16 de março de 2016, que estabelece diretrizes gerais para o sistema de registro eletrônico de títulos e documentos e civil de pessoas jurídicas; Provimento nº 18, de 28 de agosto de 2012, do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre a instituição e funcionamento da Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados CENSEC; Provimento nº 87, de 11 de setembro de 2019, que dispõe sobre as normas gerais de procedimentos para o protesto extrajudicial de títulos e outros documentos de dívida, regulamenta a implantação da Central Nacional de Serviços Eletrônicos dos Tabeliães de Protesto de Títulos CENPROT e dá outras providência.

Posteriormente, foi editado o Provimento nº 89, de 12 de dezembro de 2019, do Conselho Nacional de Justiça, para regulamentar o Código Nacional de Matrículas - CNM, o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis - SREI, o Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado SAEC e o acesso da Administração Pública Federal às informações do SREI[15], bem como estabelecer diretrizes para o estatuto do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico ONR[16].

Conforme se verá adiante, vários dispositivos da Medida Provisória nº 1.085/21 foram retirados ou inspirados nos referidos provimentos do Conselho Nacional de Justiça. Note-se que a nova regulamentação legal não se restringe a determinado registro ou tabelionato, abarcando todos indistintamente.

2) Âmbito de aplicação da Medida provisória

Art. 2º Esta Medida Provisória aplica-se:

I - às relações jurídicas que envolvam oficiais dos registros públicos; e

II - aos usuários dos serviços de registros públicos.

Comentário: a redação do art. 2º visa superar a limitação que as normas administrativas, como os provimentos do Conselho Nacional de Justiça, possuem quanto ao alcance dos usuários dos serviços de registros públicos, uma vez que eram direcionadas aos titulares das serventias extrajudiciais, nos termos do art. 5º, inciso II, da CF/88[17].

3) Objetivos do Sistema Eletrônico de Registros Públicos

Art. 3º O SERP tem o objetivo de viabilizar:

I - o registro público eletrônico dos atos e negócios jurídicos;

II - a interconexão das serventias dos registros públicos;

III - a interoperabilidade das bases de dados entre as serventias dos registros públicos e entre as serventias dos registros públicos e o SERP;

IV - o atendimento remoto aos usuários de todas as serventias dos registros públicos, por meio da internet;

V - a recepção e o envio de documentos e títulos, a expedição de certidões e a prestação de informações, em formato eletrônico, inclusive de forma centralizada, para distribuição posterior às serventias dos registros públicos competentes;

VI - a visualização eletrônica dos atos transcritos, registrados ou averbados nas serventias dos registros públicos;

VII - o intercâmbio de documentos eletrônicos e de informações entre as serventias dos registros públicos e:

a) os entes públicos, inclusive por meio do Sistema Integrado de Recuperação de Ativos - Sira, de que trata o Capítulo V da Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021; e

b) os usuários em geral, inclusive as instituições financeiras e as demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e os tabeliães;

VIII - o armazenamento de documentos eletrônicos para dar suporte aos atos registrais;

IX - a divulgação de índices e indicadores estatísticos apurados a partir de dados fornecidos pelos oficiais dos registros públicos, observado o disposto no inciso VII do caput do art. 7º;

X - a consulta:

a) às indisponibilidades de bens decretadas pelo Poder Judiciário ou por entes públicos;

b) às restrições e gravames de origem legal, convencional ou processual incidentes sobre bens móveis e imóveis registrados ou averbados nos registros públicos; e

c) aos atos em que a pessoa pesquisada conste como:

1. devedora de título protestado e não pago;

2. garantidora real;

3. arrendatária mercantil financeiro;

4. cedente convencional de crédito; ou

5. titular de direito sobre bem objeto de constrição processual ou administrativa; e

XI - outros serviços, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.

§ 1º Os oficiais dos registros públicos de que trata a Lei nº 6.015, de 1973, integram o SERP.

§ 2º A consulta a que se refere o inciso X do caput será realizada com base em indicador pessoal ou, quando compreender bem especificamente identificável, mediante critérios relativos ao bem objeto de busca.

§ 3º O SERP deverá:

I - observar os padrões e requisitos de documentos, de conexão e de funcionamento estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça; e

II - garantir a segurança da informação e a continuidade da prestação do serviço dos registros públicos.

§ 4º O SERP terá operador nacional, sob a forma de pessoa jurídica de direito privado, na forma prevista no incisos I ou III do caput do art. 44 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, na modalidade de entidade civil sem fins lucrativos, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.

Comentário: destaque-se que a previsão a respeito da interconexão, interoperabilidade, recepção e envio de documentos, entre outras tantas disposições, já constavam dos Provimentos nº 18/12, 46/15, 87/19 e 89/19 do CNJ quanto ao Tabelionato de Notas, Registro Civil de Pessoas Naturais, Tabelionato de Protesto e Registro de Imóveis:

Provimento nº 18/12 do CNJ:

Da Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados

Art. 1º. Fica instituída a Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados - CENSEC, disponível por meio do Sistema de Informações e Gerenciamento Notarial - SIGNO e publicada sob o domínio www.censec.org.br, desenvolvida, mantida e operada pelo Colégio Notarial do Brasil - Conselho Federal (CNB/CF), sem nenhum ônus para o Conselho Nacional de Justiça ou qualquer outro órgão governamental, com objetivo de:

I. interligar as serventias extrajudiciais brasileiras que praticam atos notariais, permitindo o intercâmbio de documentos eletrônicos e o tráfego de informações e dados;

II. aprimorar tecnologias com a finalidade de viabilizar os serviços notariais em meio eletrônico;

III. implantar em âmbito nacional um sistema de gerenciamento de banco de dados, para pesquisa;

IV. incentivar o desenvolvimento tecnológico do sistema notarial brasileiro, facilitando o acesso às informações, ressalvadas as hipóteses de acesso restrito nos casos de sigilo.

V. possibilitar o acesso direto de órgãos do Poder Público a informações e dados correspondentes ao serviço notarial.

Provimento nº 46/15 do CNJ:

Art. 1º. Instituir a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais CRC que será operada por meio de sistema interligado, disponibilizado na rede mundial de computadores, com os objetivos de:

I. interligar os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais, permitindo o intercâmbio de documentos eletrônicos e o tráfego de informações e dados;

II. aprimorar tecnologias para viabilizar os serviços de registro civil das pessoas naturais em meio eletrônico;

III. implantar, em âmbito nacional, sistema de localização de registros e solicitação de certidões;

IV. possibilitar o acesso direto de órgãos do Poder Público, mediante ofício ou requisição eletrônica direcionada ao Oficial competente, às informações do registro civil das pessoas naturais;

V. possibilitar a interligação com o Ministério das Relações Exteriores, mediante prévia autorização deste, a fim de obter os dados e documentos referentes a atos da vida civil de brasileiros ocorridos no exterior, bem como possibilitar às repartições consulares do Brasil a participação no sistema de localização de registros e solicitação de certidões do registro civil das pessoas naturais.

Parágrafo único. Os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais, pessoalmente, ou por meio das Centrais de Informações do Registro Civil - CRC, devem fornecer meios tecnológicos para o acesso das informações exclusivamente estatísticas à Administração Pública Direta, sendo-lhes vedado o envio e repasse de dados de forma genérica, que não justifiquem seu fim, devendo respeitar-se o princípio e a garantia previstos no inciso X do art. 5° da Constituição Federal de 1988.

Provimento nº 87/19 do CNJ:

DOS SERVIÇOS ELETRÔNICOS DOS TABELIÃES DE PROTESTO DE TÍTULOS CENPROT

(...)

Art. 17. A CENPROT deve disponibilizar, por meio da rede mundial de computadores (internet) pelo menos, os seguintes serviços:

I acesso a informações sobre quaisquer protestos válidos lavrados pelos Tabeliães de Protesto de Títulos dos Estados ou do Distrito Federal;

II consulta gratuita às informações indicativas da existência ou inexistência de protesto, respectivos tabelionatos e valor;

III fornecimento de informação complementar acerca da existência de protesto e sobre dados ou elementos do registro, quando o interessado dispensar a certidão;

IV fornecimento de instrumentos de protesto em meio eletrônico;

V recepção de declaração eletrônica de anuência para fins de cancelamento de protesto;

VI recepção de requerimento eletrônico de cancelamento de protesto;

VII recepção de títulos e documentos de dívida, em meio eletrônico, para fins de protesto, encaminhados por órgãos do Poder Judiciário, procuradorias, advogados e apresentantes cadastrados;

VIII recepção de pedidos de certidão de protesto e de cancelamento e disponibilização da certidão eletrônica expedida pelas serventias do Estado ou do Distrito Federal em atendimento a tais solicitações.

Provimento nº 89/19 do CNJ:

DO SISTEMA DE REGISTRO ELETRÔNICO DE IMÓVEIS - SREI

Art. 8º O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis - SREI tem como objetivo a universalização das atividades de registro público imobiliário, a adoção de governança corporativa das serventias de registros de imóveis e a instituição do sistema de registro eletrônico de imóveis previsto no art. 37 da Lei n. 11.977/2009.

§ 1º O SREI deve garantir a segurança da informação e a continuidade da prestação do serviço público de registro de imóveis, observando os padrões técnicos, critérios legais e regulamentares, promovendo a interconexão das serventias.

§ 2º Na interconexão de todas as unidades do serviço de registro de imóveis, o SREI deve prever a interoperabilidade das bases de dados, permanecendo tais dados nas serventias de registro de imóveis sob a guarda e conservação dos respectivos oficiais.

§ 3º São elementos do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis SREI:

I o registro imobiliário eletrônico;

II os repositórios registrais eletrônicos formados nos ofícios de registro de imóveis para o acolhimento de dados e para o armazenamento de documentos eletrônicos;

III os serviços destinados à recepção e ao envio de documentos e títulos em formato eletrônico para o usuário que fez a opção pelo atendimento remoto, prestados pelo SAEC e pelas centrais de serviços eletrônicos compartilhados nos estados e no Distrito Federal;

IV os serviços de expedição de certidões e de informações, em formato eletrônico, prestados aos usuários presenciais e remotos;

V o intercâmbio de documentos eletrônicos e de informações entre os ofícios de registro de imóveis, o Poder Judiciário e a administração pública.

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Cumpre destacar que há também referência à consulta de indisponibilidade de ativos, regulamentada pelo Provimento nº 39, de 25 de julho de 2014, do Conselho Nacional de Justiça[18].

Há referência também ao intercâmbio de informação[19] no âmbito do Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), previsto na Lei nº 14.195/21, cujos principais dispositivos são os seguintes:

CAPÍTULO V

DO SISTEMA INTEGRADO DE RECUPERAÇÃO DE ATIVOS

Art. 13. Fica o Poder Executivo federal autorizado a instituir, sob a governança da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), constituído de um conjunto de instrumentos, mecanismos e iniciativas destinados a facilitar a identificação e a localização de bens e de devedores, bem como a constrição e a alienação de ativos.

Art. 14. São objetivos do Sira:

I - promover o desenvolvimento nacional e o bem-estar social por meio da redução dos custos de transação de concessão de créditos mediante aumento do índice de efetividade das ações que envolvam a recuperação de ativos;

II - conferir efetividade às decisões judiciais que visem à satisfação das obrigações de qualquer natureza, em âmbito nacional;

III - reunir dados cadastrais, relacionamentos e bases patrimoniais de pessoas físicas e jurídicas para subsidiar a tomada de decisão, no âmbito de processo judicial em que seja demandada a recuperação de créditos públicos ou privados;

IV - fornecer aos usuários, conforme os respectivos níveis de acesso, os dados cadastrais, os relacionamentos e as bases patrimoniais das pessoas requisitadas, de forma estruturada e organizada; e

V - garantir, com a quantidade, a qualidade e a tempestividade necessárias, os insumos de dados e informações relevantes para a recuperação de créditos públicos ou privados.

Parágrafo único. O Sira zelará pela liberdade de acesso, de uso e de gerenciamento dos dados pelo seu titular, na forma do art. 9º da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, e obedecerá ao regime geral de proteção de dados aplicável.

Art. 15. São princípios do Sira:

I - melhoria da efetividade e eficiência das ações de recuperação de ativos;

II - promoção da transformação digital e estímulo ao uso de soluções tecnológicas na recuperação de créditos públicos e privados;

III - racionalização e sustentabilidade econômico-financeira das soluções de tecnologia da informação e comunicação de dados, permitida a atribuição aos usuários, quando houver, dos custos de operacionalização do serviço, na forma prevista em regulamento;

IV - respeito à privacidade, à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas e às instituições, na forma prevista em lei; e

V - ampla interoperabilidade e integração com os demais sistemas semelhantes, em especial aqueles utilizados pelo Poder Judiciário, de forma a subsidiar a tomada de decisão, bem como de racionalizar e permitir o cumprimento eficaz de ordens judiciais relacionadas à recuperação de ativos.

Art. 16. Ato do Presidente da República disporá sobre:

I - as regras e as diretrizes para o compartilhamento de dados e informações, observado que, para usuários privados, apenas poderão ser fornecidos dados públicos não sujeitos a nenhuma restrição de acesso;

II - a relação nominal das bases mínimas que comporão o Sira;

III - a periodicidade com que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional apresentará ao Ministério da Economia e ao Conselho Nacional de Justiça relatório sobre as bases geridas e integradas;

IV - o procedimento administrativo para o exercício, na forma prevista em lei, do poder de requisição das informações contidas em bancos de dados geridos por órgãos e por entidades públicos e privados e o prazo para o atendimento da requisição, sem prejuízo da celebração de acordos de cooperação, de convênios e de ajustes de qualquer natureza, quando necessário;

V - a forma de sustentação econômico-financeira do Sira; e

VI - as demais competências da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e do órgão central de tecnologia da informação no âmbito do Sira.

A constituição do SERP por meio de pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, já constava expressamente do Provimento nº 89/19 do CNJ quanto ao Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI):

DO ESTATUTO DO ONR

Art. 30. O Estatuto do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico ONR deverá ser aprovado pelos oficiais de registros de imóveis de todo o território nacional, reunidos em assembleia geral.

Parágrafo Único. A assembleia geral que trata este artigo será previamente convocada pelas entidades representativas dos oficiais de registros de imóveis, de caráter nacional, alcançando os filiados e não filiados, devendo ser realizada no prazo de 30 dias da convocação, sob supervisão da Corregedoria Nacional de Justiça.

Art. 31. O Estatuto do ONR deverá observar as seguintes diretrizes:

I A pessoa jurídica, constituída exclusivamente pelos oficiais de registros de imóveis, na forma prevista no art. 44 do Código Civil na modalidade de entidade civil sem fins lucrativos, deverá ser mantida e administrada conforme deliberação da assembleia geral dos oficiais de registro de imóveis, somente podendo fazer parte de seu quadro diretivo os delegatários que estejam em pleno exercício da atividade;

II Deverá constar dentre as atribuições do ONR:

a) implantação e coordenação do SREI, visando o seu funcionamento uniforme, apoiando os oficiais de registro de imóveis e atuando em cooperação com a Corregedoria Nacional de Justiça e as Corregedorias-Gerais de Justiça;

b) implantação e operação do Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado - SAEC, como previsto em Recomendação da Corregedoria Nacional de Justiça, com a finalidade de prestar serviços e criar opção de acesso remoto aos serviços prestados pelas unidades registrais de todo País em um único ponto na Internet;

c) coordenação e monitoramento das operações das centrais de serviços eletrônicos compartilhados, através do SAEC, para garantir a interoperabilidade dos sistemas e a universalização do acesso às informações e aos serviços eletrônicos;

d) apresentação de sugestões à Corregedoria Nacional de Justiça para edição de instruções técnicas de normalização aplicáveis ao SREI para propiciar a operação segura do sistema, a interoperabilidade de dados e documentos e a longevidade de arquivos eletrônicos, como também a adaptação eletrônica dos requisitos jurídico-formais implicados nos serviços, visando garantir a autenticidade e segurança das operações realizadas com documentos informáticos;

e) fornecimento de elementos aos órgãos públicos competentes para auxiliar a instrução de processos que visam o combate ao crime organizado, à lavagem de dinheiro, à identificação e à indisponibilidade de ativos de origem ilícita;

f) viabilização de consulta unificada das informações relativas ao crédito imobiliário, ao acesso às informações referentes às garantias constituídas sobre imóveis;

g) formulação de indicadores de eficiência e implementação de sistemas em apoio às atividades das Corregedorias-Gerais de Justiça e da Corregedoria Nacional de Justiça, que permitam inspeções remotas das serventias.

III Deverá constar previsão de observância:

a) dos princípios da legalidade, integridade, impessoalidade, moralidade, publicidade, representatividade, eficiência, razoabilidade, finalidade, motivação e interesse público, realizando e apoiando o Conselho Nacional de Justiça nas ações necessárias ao desenvolvimento jurídico e tecnológico da atividade registral.

b) das normas que regem o segredo de justiça, os sigilos profissional, bancário e fiscal, bem como a proteção de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, além das disposições legais e regulamentares.

c) do cumprimento das leis, regulamentos, normas externas e internas, convênios e contratos, notadamente as normas editadas pela Corregedoria Nacional de Justiça, seu agente regulador, como previsto no art. 76, § 4º, da Lei n. 13.465/2017.

d) da proibição de obtenção de quaisquer benefícios ou vantagens individuais por seus gestores em decorrência da participação em processos decisórios.

Art. 32. O Estatuto aprovado pela Assembleia-Geral e suas posteriores modificações deverão ser submetidos à Corregedoria Nacional de Justiça para homologação no exercício de sua função de agente regulador.

Embora haja referência aos oficiais de registro da Lei nº 6.015/73 no § 1º deste artigo, nota-se da leitura dos dispositivos que o SERP é integrado também pelos tabeliães de notas, de protestos e de contratos marítimos.

O § 2º destaca a importância do indicador pessoal como base de dados para o cumprimento das determinações legais e normativas, bem como, conforme se verá, em caso de ordem específica, a necessidade de busca manual, inclusive na nova previsão de indicador real do Registro de Títulos e Documentos[20].

4) Responsabilidade dos oficiais dos registros públicos pelo SERP

Art. 4º Compete aos oficiais dos registros públicos promover a implantação e o funcionamento adequado do SERP, com a disponibilização das informações necessárias, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, especialmente das informações relativas:

I - às garantias de origem legal, convencional ou processual, aos contratos de arrendamento mercantil financeiro e às cessões convencionais de crédito, constituídos no âmbito da sua competência; e

II - aos dados necessários à produção de índices e indicadores estatísticos.

§ 1º É obrigatória a adesão ao SERP dos oficiais dos registros públicos de que trata a Lei nº 6.015, de 1973, ou dos responsáveis interinos pelo expediente.

§ 2º O descumprimento do disposto neste artigo ensejará a aplicação das penas previstas no art. 32 da Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.

Comentário: nota-se a preocupação do legislador com o fornecimento de informações quanto às informações das operações mercantis, bancárias e financeiras, visando conferir segurança ao tráfego jurídico, bem como dados para fins de pesquisa e produção de conhecimento.

Os §§ 1º e 2º deixam claro a obrigatoriedade a adesão dos titulares das serventias extrajudiciais ao SERP, nos termos já previstos, por exemplo, no Provimento nº 89/19 do CNJ, quanto ao Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico (ONR), sob pena de responsabilidade funcional[21]:

Art. 9º O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis - SREI será implementado e operado pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico ONR.

Parágrafo Único. São integrantes do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis SREI, sob coordenação do ONR:

I - os oficiais de registro de imóveis de cada estado e do Distrito Federal;

II - o Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado - SAEC, de âmbito nacional;

III - as centrais de serviços eletrônicos compartilhados, criadas pelos respectivos oficiais de registro de imóveis em cada Estado e no Distrito Federal, mediante ato normativo da Corregedoria-Geral de Justiça local.

5) Fundo para a Implementação e Custeio do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos

Art. 5º Fica criado o Fundo para a Implementação e Custeio do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos - FICS, subvencionado pelos oficiais dos registros públicos.

§ 1º Caberá à Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça:

I - disciplinar a instituição da receita do FICS;

II - estabelecer as cotas de participação dos oficiais dos registros públicos;

III - fiscalizar o recolhimento das cotas de participação dos oficiais dos registros públicos; e

IV - supervisionar a aplicação dos recursos e as despesas incorridas.

§ 2º Os oficiais dos registros públicos ficam dispensados de participar da subvenção do FICS na hipótese de desenvolverem e utilizarem sistemas e plataformas interoperáveis necessários para a integração plena dos serviços de suas delegações ao SERP, nos termos estabelecidos pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça.

Comentário: a Lei nº 14.118/21 acrescentou dois novos parágrafos à redação do art. 76, da Lei nº 13.465/17, para prever a existência de fundo para a implementação e custeio do SREI, com estabelecimento de quotas de participação para os seus integrantes:

Art. 76. O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) será implementado e operado, em âmbito nacional, pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR).

(...)

§ 9º Fica criado o fundo para a implementação e custeio do SREI, que será gerido pelo ONR e subvencionado pelas unidades do serviço de registro de imóveis dos Estados e do Distrito Federal referidas no § 5º deste artigo.

§ 10. Caberá ao agente regulador do ONR disciplinar a instituição da receita do fundo para a implementação e o custeio do registro eletrônico de imóveis, estabelecer as cotas de participação das unidades de registro de imóveis do País, fiscalizar o recolhimento e supervisionar a aplicação dos recursos e as despesas do gestor, sem prejuízo da fiscalização ordinária e própria como for prevista nos estatutos.

A previsão da contribuição compulsória veio superar os problemas e dificuldades da previsão da adesão facultativa contida no Provimento nº 109, de 14 de outubro de 2020, do Conselho Nacional de Justiça:

DA SUSTENTABILIDADE DO ONR

Art. 13. O ONR observará as disposições estatutárias e as orientações gerais baixadas pela Corregedoria Nacional de Justiça para composição de receitas e execução de despesas, bem como prestará contas anuais, devidamente acompanhadas de pareceres produzidos por auditoria independente, aos respectivos órgãos internos e ao Agente Regulador.

§ 1º A prestação de contas e os pareceres deverão ser apresentados sempre que solicitado pelo Agente Regulador, na forma estabelecida do Regimento Interno do Agente Regulador.

§ 2º Aos Oficiais de Registro de Imóveis titulares de delegação será facultado aderir a uma contribuição voluntária, na condição de contribuinte-cotista optante, destinada ao financiamento de sistemas e plataformas compartilhadas, na forma estabelecida por ato próprio da Câmara de Regulação do Agente Regulador, salvo disposição legal diversa. (Revogado pelo Provimento nº 115, de 24.3.2021)

§ 3º Os interinos responsáveis pelo expediente das unidades vagas são tidos como contribuintes-cotistas necessários, e participarão do financiamento de sistemas e plataformas desenvolvidos pelo ONR, enquanto perdurar a vacância com a reversão do exercício do serviço da unidade para o Poder Público. (Revogado pelo Provimento nº 115, de 24.3.2021)

§ 4º Os contribuintes-cotistas, optantes ou necessários, escriturarão, no Livro Diário Auxiliar da Receita e da Despesa, a cota de contribuição como despesa compartilhada para a implantação do registro eletrônico, na forma que for estabelecida no ato próprio a que se refere o § 2º deste artigo. (Revogado pelo Provimento nº 115, de 24.3.2021)

Os §§ 2º a 4º, com a edição da Lei nº 14.118/21, foram revogados pelo Provimento nº 115/21, do CNJ, nos seguintes termos:

Art. 3º Constitui-se receita do FIC/SREI a cota de participação das serventias do serviço de registro de imóveis dos Estados e do Distrito Federal que integram o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis e são vinculadas ao ONR.

§ 1º A cota de participação é devida, mensalmente, por todas as serventias do serviço público de registro de imóveis, sob o regime de delegação ou oficializadas, providas ou vagas, instaladas e em funcionamento nos Estados e no Distrito Federal.

§ 2º A cota de participação corresponde a 0,8% (oito décimos por cento) dos emolumentos brutos percebidos pelos atos praticados no serviço do registro de imóveis da respectiva serventia.

§ 3º Na hipótese de a serventia acumular mais de uma especialidade, a cota de participação do FIC/SREI é devida apenas sobre os atos do serviço de registro de imóveis, excluídos os demais atos praticados na respectiva serventia que sejam relacionados com as competências das outras especialidades.

§ 4º Na apuração do valor da cota de participação do FIC/SREI, deverão ser tomados por base exclusivamente os emolumentos brutos destinados ao Oficial de Registro, desconsiderando-se outras parcelas, de qualquer natureza, mesmo que cobradas por dentro, nas respectivas tabelas de emolumentos da unidade federativa.

§ 5º Não devem ser consideradas na apuração dos emolumentos brutos as parcelas incluídas na tabela de emolumentos destinadas obrigatoriamente a repasses previstos em lei e não destinadas ao Oficial de Registro.

A despeito da nomenclatura, quota de participação, verifica-se que a compulsoriedade não deixa dúvida da natureza tributária da referida exação, sendo irrelevantes para qualificá-la a denominação adotada e a destinação legal do produto da arrecadação (para pessoa jurídica privada sem fins lucrativos), nos termos dos artigos 3º e 4º, do CTN:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:

I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.

Todavia, considerando a sua natureza jurídica, embora superado o óbice quanto à previsão legal, ainda deve obediência aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

(...)

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;

IV - utilizar tributo com efeito de confisco;

(...)

Quanto à espécie tributária, há cizânia doutrinária se se trata de taxa pelo exercício do poder de polícia, contribuição de intervenção no domínio econômico ou no interesse de categorias profissionais ou econômicas.

A redação dos artigos 77 e 78, do CTN, quanto à taxa pelo exercício do poder de polícia, é a seguinte.

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a impôsto nem ser calculada em função do capital das emprêsas.

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

E o excelso STF possui julgados nesse sentido:

Taxa em razão do poder de polícia: a Lei mato-grossense 8.033/2003 instituiu taxa em razão do exercício do poder de polícia. Poder que assiste aos órgãos diretivos do Judiciário, notadamente no plano da vigilância, orientação e correição da atividade em causa, a teor do § 1º do art. 236 da Carta Cidadã. É constitucional a destinação do produto da arrecadação da taxa de fiscalização da atividade notarial e de registro a órgão público e ao próprio Poder Judiciário. (ADI 3.151, rel. min. Ayres Britto, j. 8-6-2005, P, DJ de 28-4-2006).

Todavia, caso se adote o entendimento de que se trata de taxa pelo exercício do poder de polícia, emerge a dificuldade da adoção de base de cálculo sobre o valor total dos emolumentos recebidos, sem haver relação de razoável equivalência entre o custo real da atuação estatal e o valor exigido de cada contribuinte, sob pena de violação do art. 150, inciso IV, da CF/88, nos termos da jurisprudência do excelso STF:

Taxa: correspondência entre o valor exigido e o custo da atividade estatal. A taxa, enquanto contraprestação a uma atividade do poder público, não pode superar a relação de razoável equivalência que deve existir entre o custo real da atuação estatal referida ao contribuinte e o valor que o Estado pode exigir de cada contribuinte, considerados, para esse efeito, os elementos pertinentes às alíquotas e à base de cálculo fixadas em lei. Se o valor da taxa, no entanto, ultrapassar o custo do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, dando causa, assim, a uma situação de onerosidade excessiva, que descaracterize essa relação de equivalência entre os fatores referidos (o custo real do serviço, de um lado, e o valor exigido do contribuinte, de outro), configurar-se-á, então, quanto a essa modalidade de tributo, hipótese de ofensa à cláusula vedatória inscrita no art. 150, IV, da CF. (ADI 2.551 MC-QO, rel. min. Celso de Mello, j. 2-4-2003, P, DJ de 20-4-2006).

Por fim, independentemente da espécie tributária adotada, o excelso STF possui entendimento que o grau de indeterminação pode levar a degradação do princípio da reserva legal, em especial nos casos em que hão há fixação do limite máximo, como no presente caso, em que não há fixação de alíquota:

Respeita o princípio da legalidade a lei que disciplina os elementos essenciais determinantes para o reconhecimento da contribuição de interesse de categoria econômica como tal e deixa um espaço de complementação para o regulamento. A lei autorizadora, em todo caso, deve ser legitimamente justificada, e o diálogo com o regulamento deve-se dar em termos de subordinação, desenvolvimento e complementariedade. A Lei 11.000/2004, que autoriza os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas a fixar as anuidades devidas por pessoas físicas ou jurídicas, não estabeleceu expectativas, criando uma situação de instabilidade institucional ao deixar ao puro arbítrio do administrador o estabelecimento do valor da exação afinal, não há previsão legal de qualquer limite máximo para a fixação do valor da anuidade. O grau de indeterminação com que os dispositivos da Lei 11.000/2004 operaram provocou a degradação da reserva legal (art. 150, I, da CF/1988). Isso porque a remessa ao ato infralegal não pode resultar em desapoderamento do legislador para tratar de elementos tributários essenciais. Para o respeito do princípio da legalidade, seria essencial que a lei (em sentido estrito) prescrevesse o limite máximo do valor da exação, ou os critérios para encontrá-lo, o que não ocorreu. Não cabe aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas realizar atualização monetária em patamares superiores aos permitidos em lei, sob pena de ofensa ao art. 150, I, da CF/1988 (RE 704.292, rel. min. Dias Toffoli, j. 19-10-2016, P, DJE de 3-8-2017, Tema 540).

6) Recepção de extratos eletrônicos por meio do SERP

Art. 6º Os oficiais dos registros públicos, quando cabível, receberão dos interessados, por meio do SERP, os extratos eletrônicos para registro ou averbação de fatos, atos e negócios jurídicos, nos termos do disposto no inciso VIII do caput do art. 7º.

§ 1º Na hipótese de que trata o caput:

I - o oficial:

a) qualificará o título pelos elementos, pelas cláusulas e pelas condições constantes do extrato eletrônico; e

b) disponibilizará ao requerente as informações relativas à certificação do registro em formato eletrônico; e

II - o requerente poderá, a seu critério, solicitar o arquivamento da íntegra do instrumento contratual que deu origem ao extrato eletrônico, por meio de documento eletrônico, nos termos do disposto no inciso VIII do caput do art. 3º, acompanhado de declaração, assinada eletronicamente, de que corresponde ao original firmado pelas partes.

§ 2º No caso de extratos eletrônicos para registro ou averbação de atos e negócios jurídicos relativos a bens imóveis, ficará dispensada a atualização prévia da matrícula quanto aos dados objetivos ou subjetivos previstos no art. 176 da Lei nº 6.015, de 1973, exceto dos dados imprescindíveis para comprovar a subsunção do objeto e das partes aos dados constantes do título apresentado, ressalvado o seguinte:

I - não poderá ser criada nova unidade imobiliária por fusão ou desmembramento sem observância da especialidade; e

II - a dispensa de atualização se subordina à correspondência dos dados descritivos do imóvel e dos titulares entre o título e a matrícula.

§ 3º Será dispensada, no âmbito do registro de imóveis, a apresentação da escritura de pacto antenupcial, desde que os dados de seu registro e o regime de bens sejam indicados no extrato eletrônico de que trata o caput, com a informação sobre a existência ou não de cláusulas especiais.

Comentário: O termo qualificar significa avaliar o que está apto para produzir efeitos pretendidos, expressão advinda, segundo Vitor Frederico Kümpel, Carla Modina Ferrari e Ricardo Dip, do vocábulo em latim medieval qualificare[22].

A doutrina apreende o termo qualificação para a área jurídico-registral: juízo do que é próprio, inerente a determinado objeto, de sorte que pode ser apreendido e classificado em determinada categoria segundo sua qualidade[23].

A qualificação registral e notarial de títulos por meio de extratos recebidos já estava prevista para a lavratura e registro do protesto, nos termos do artigo 8º da Lei nº 9.492/97 com redação dada pela Lei nº 13.775/18.

Art. 8º Os títulos e documentos de dívida serão recepcionados, distribuídos e entregues na mesma data aos Tabelionatos de Protesto, obedecidos os critérios de quantidade e qualidade.

Parágrafo único. Poderão ser recepcionadas as indicações a protestos das Duplicatas Mercantis e de Prestação de Serviços, por meio magnético ou de gravação eletrônica de dados, sendo de inteira responsabilidade do apresentante os dados fornecidos, ficando a cargo dos Tabelionatos a mera instrumentalização das mesmas.

§ 1º Poderão ser recepcionadas as indicações a protestos das Duplicatas Mercantis e de Prestação de Serviços, por meio magnético ou de gravação eletrônica de dados, sendo de inteira responsabilidade do apresentante os dados fornecidos, ficando a cargo dos Tabelionatos a mera instrumentalização das mesmas.

§ 2º Os títulos e documentos de dívida mantidos sob a forma escritural nos sistemas eletrônicos de escrituração ou nos depósitos centralizados de que trata a Lei nº 12.810, de 15 de maio de 2013, poderão ser recepcionados para protesto por extrato, desde que atestado por seu emitente, sob as penas da lei, que as informações conferem com o que consta na origem.

Posteriormente, a alteração promovida nas cédulas de crédito expandiu a utilização do lançamento em sistema de escrituração autorizado a funcionar pelo Banco Central do Brasil, na redação dada pela Lei nº 13.986/20[24].

O § 1º do referido artigo prevê expressamente a qualificação exclusivamente pelo extrato, com possibilidade, a critério do requerente, e não do titular da serventia extrajudicial, do arquivamento da íntegra do instrumento contratual.

No caso de registros por inscrição, e não por inscrição, não se vislumbra necessidade de lançamento em livro próprio, mas de arquivamento em depósito eletrônico próprio, como já ocorre em relação ao Tabelionato de Notas e ao Registro de Imóveis.

Todavia, talvez a maior novidade trazida pela Medida Provisória nº 1.085/21, além das alterações promovidas na legislação correlata, a partir do art. 10, é a exceção contida no § 2º deste artigo quanto ao princípio da continuidade e da especialidade subjetiva e objetiva.

O próprio § 2º cria exceção à dispensa do cumprimento da especialidade quando exige os dados imprescindíveis para comprovar a subsunção do objeto e das partes aos dados constantes do título apresentado, ressalvando ainda as hipóteses de criação de nova unidade imobiliária e correspondência entre os dados das pessoas e do imóvel contidos na matrícula e no título.

Todavia, note-se que há dados que podem não estar na matrícula e no título e, mesmo assim, são essenciais à qualificação, como nos casos de transcrição e georreferenciamento.

O § 3º prevê a dispensa da escritura de pacto antenupcial se os dados estiverem no extrato. Em relação aos títulos por instrumento público não há maiores dificuldades, diante da existência da presunção de veracidade e fé pública do tabelião de notas. Todavia, em relação aos títulos por instrumento particular, podem emergir dificuldades, em especial na qualificação registral e, posteriormente, no caso de divergência, inclusive de interpretação, quanto às cláusulas especiais, lançadas apenas por extrato, sem a conferência com o título original.

7) Normas complementares quanto à atribuição da Corregedoria Nacional de Justiça

Art. 7º Caberá à Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça disciplinar os art. 37 a art. 41 e o art. 45 da Lei nº 11.977, de 2009, e o disposto nesta Medida Provisória, em especial os seguintes aspectos:

I - os sistemas eletrônicos integrados ao SERP, por tipo de registro público ou de serviço prestado;

II - o cronograma de implantação do SERP e do registro público eletrônico dos atos jurídicos em todo o País, que poderá considerar as diferenças regionais e as características de cada registro público;

III - os padrões tecnológicos de escrituração, indexação, publicidade, segurança, redundância e conservação de atos registrais, de recepção e comprovação da autoria e da integridade de documentos em formato eletrônico, a serem atendidos pelo SERP e pelas serventias dos registros públicos, observada a legislação;

IV - a forma de certificação eletrônica da data e da hora do protocolo dos títulos para assegurar a integridade da informação e a ordem de prioridade das garantias sobre bens móveis e imóveis constituídas nos registros públicos;

V - a forma de integração do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis - SREI, de que trata o art. 76 da Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017, ao SERP;

VI - a forma de integração da Central Nacional de Registro de Títulos e Documentos, prevista no § 2º do art. 3º da Lei nº 13.775, de 20 de dezembro de 2018, ao SERP;

VII - os índices e os indicadores estatísticos que serão produzidos por meio do SERP, nos termos do disposto no inciso II do caput do art. 4º, a forma de sua divulgação e o cronograma de implantação da obrigatoriedade de fornecimento de dados ao SERP;

VIII - a definição do extrato eletrônico previsto no art. 6º e os tipos de documentos que poderão ser recepcionados dessa forma;

IX - o formato eletrônico de que trata a alínea b do inciso I do § 1º do art. 6º; e

X - outros serviços a serem prestados por meio do SERP, nos termos do disposto no inciso XI do caput do art. 3º.

Art. 8º A Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça poderá definir, em relação aos atos e negócios jurídicos relativos a bens móveis, os tipos de documentos que serão, prioritariamente, recepcionados por extrato eletrônico.

Comentário: trata-se de disposição expressa sobre as atribuições do Corregedor Nacional de Justiça os artigos 37 a 41 da Lei nº 11.977/09 e os da Medida Provisória nº 1.085/21.

Cumpre ressaltar que a redação do art. 5º, § 2º, da Emenda Constitucional nº 45/14, que criou o Conselho Nacional de Justiça, assim dispõe:

Art. 5º O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público serão instalados no prazo de cento e oitenta dias a contar da promulgação desta Emenda, devendo a indicação ou escolha de seus membros ser efetuada até trinta dias antes do termo final.

(...)

§ 2º Até que entre em vigor o Estatuto da Magistratura, o Conselho Nacional de Justiça, mediante resolução, disciplinará seu funcionamento e definirá as atribuições do Ministro-Corregedor.

Por sua vez, o Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça disciplina as atribuições do Corregedor Nacional de Justiça nos seguintes termos quanto aos incisos mais relevantes do art. 8º em relação às serventias extrajudiciais:

Das Atribuições do Corregedor Nacional de Justiça

Art. 8º Compete ao Corregedor Nacional de Justiça, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I - receber as reclamações e denúncias de qualquer interessado relativas aos magistrados e tribunais e aos serviços judiciários auxiliares, serventias, órgãos prestadores de serviços notariais e de registro, determinando o arquivamento sumário das anônimas, das prescritas e daquelas que se apresentem manifestamente improcedentes ou despidas de elementos mínimos para a sua compreensão, de tudo dando ciência ao reclamante;

(...)

IV - promover ou determinar a realização de sindicâncias, inspeções e correições, quando houver fatos graves ou relevantes que as justifiquem, desde logo determinando as medidas que se mostrem necessárias, urgentes ou adequadas, ou propondo ao Plenário a adoção das medidas que lhe pareçam suficientes a suprir as necessidades ou deficiências constatadas;

(...)

X - expedir Recomendações, Provimentos, Instruções, Orientações e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos órgãos do Poder Judiciário e de seus serviços auxiliares e dos serviços notariais e de registro, bem como dos demais órgãos correicionais, sobre matéria relacionada com a competência da Corregedoria Nacional de Justiça;

XXI - promover, constituir e manter bancos de dados, integrados a banco de dados central do CNJ, atualizados sobre os serviços judiciais e extrajudiciais, inclusive com o acompanhamento da respectiva produtividade e geração de relatórios visando ao diagnóstico e à adoção de providências para a efetividade fiscalizatória e correicional, disponibilizando seus resultados aos órgãos judiciais ou administrativos a quem couber o seu conhecimento.

(...)

A disciplina das atribuições também por meio de lei visa assegurar o respeito aos direitos dos usuários dos serviços, nos termos do art. 5º, inciso II, da CF/88, uma vez que os dispositivos legais também influenciam na sua esfera de atuação perante os registros públicos.

O inciso I versa sobre os sistemas integrados ao SERP, por tipo de registro público e serviço prestado.

Frise-se que atualmente existem diversos sistemas integrados nas respectivas Centrais Nacionais de Serviços Eletrônicos Compartilhados, específicos para cada tipo de registro ou tabelionato e para cada serviço prestado.

Nos termos do art. 2º, do Provimento nº 18/12, do CNJ, a Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados - CENSEC possui os seguintes módulos: a) Registro Central de Testamentos On-Line - RCTO: destinado à pesquisa de testamentos públicos e de instrumentos de aprovação de testamentos cerrados, lavrados no país; b) Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários - CESDI: destinada à pesquisa de escrituras a que alude a Lei n° 11.441, de 4 de janeiro de 2007; c) Central de Escrituras e Procurações - CEP: destinada à pesquisa de procurações e atos notariais diversos; e d) Central Nacional de Sinal Público - CNSIP: destinada ao arquivamento digital de sinal público de notários e registradores e respectiva pesquisa.

Nos termos do art. 3º, do Provimento nº 46/15, do CNJ, as funcionalidades da Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais (CRC) são: a) CRCBuscas: ferramenta destinada a localizar os atos de registro civil das pessoas naturais; b) CRCComunicações: ferramenta destinada a cumprir as comunicações obrigatórias previstas nos artigos 106 e 107 da Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973; c) CRCCertidões: ferramenta destinada à solicitação de certidões; d) CRCe-Protocolo: ferramenta destinada ao envio de documentos eletrônicos representativos de atos que devem ser cumpridos por outras serventias; e e) CRC-Interoperabilidade: ferramenta destinada a interligar os serviços prestados através de convênios com os programas necessários para o seu desenvolvimento.

Segundo Braga Junior, há três níveis de integração do serviço de registro de imóveis: integração da prestação do serviço em si; integração da infraestrutura das centrais de serviços eletrônicos compartilhados; e integração da informação registral, do acervo dos cartórios[25].

8) Acesso a bases de dados de identificação pelos tabeliães e oficiais de registros públicos

Art. 9º Para verificação da identidade dos usuários dos registros públicos, as bases de dados de identificação civil, inclusive de identificação biométrica, dos institutos de identificação civil, das bases cadastrais da União, inclusive do Cadastro de Pessoas Físicas da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia e da Justiça Eleitoral, poderão ser acessadas, a critério dos responsáveis pelas referidas bases de dados, desde que previamente pactuado, por tabeliães e oficiais dos registros públicos, observado disposto na Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, e na Lei nº 13.444, de 11 de maio de 2017.

Comentário: a referência legislativa ao final é à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e a Identificação Civil Nacional (ICN), respectivamente.

Note-se que o segundo diploma prevê a utilização de dados biométricos da Justiça Eleitoral, do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (Sirc) e da Central Nacional de Informações do Registro Civil (CRC Nacional), havendo, portanto, alimentação e intercâmbio de dados com os Oficiais de Registro Civil de Pessoas Naturais[26].

O compartilhamento de bancos de dados, para fins de identificação civil dos usuários, já estava previsto no Provimento nº 88, de 01 de outubro de 2019, do Conselho Nacional de Justiça.

Sobre o autor
Carlos Eduardo Almeida Martins de Andrade

Mestre em Direito pela Universidade de Sevilha.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Carlos Eduardo Almeida Martins. Primeiros comentários à Medida Provisória nº 1.085, de 27 de dezembro de 2021. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6964, 26 jul. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/96223. Acesso em: 24 nov. 2024.

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