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Apontamentos sobre o fenômeno jurídico do auto de infração de trânsito

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Agenda 22/05/2007 às 00:00

DISTINÇÕES ENTRE O SUPORTE FÁTICO DA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO E O DO AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

A infração de trânsito é uma conduta, comissiva ou omissiva, praticada por qualquer pessoa, prevista, no Código de Trânsito Brasileiro, na legislação complementar e nas resoluções do CONTRAN [26] como infração.

Vemos que o suporte fático da infração de trânsito é bem diverso do suporte fático do auto de infração de trânsito. A infração é um ato ilícito e, por isso, não passa pelo plano da validade, possuindo apenas elementos nucleares, que, uma vez concretizados, fazem nascer o fato jurídico da infração de trânsito.

Uma vez existente o ato jurídico ilícito da infração trânsito, nascerá para autoridade de trânsito ou seu agente, o poder-dever de lavrar o auto de infração de trânsito.

Portanto, não se pode confundir o fato jurídico da infração com o fato jurídico da autuação, pois são dois atos jurídicos bem diferentes. Porém, o segundo necessitará da existência do primeiro.

AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

O auto de infração de trânsito é ato jurídico pelo qual a Administração dá início ao processo administrativo de trânsito, com a finalidade de punir o condutor ou proprietário de um veículo, que tenha praticado uma conduta, comissiva ou omissiva, descrita como infração de trânsito.

Por essa razão o AIT possui requisitos de existência, validade e eficácia totalmente diversos dos da infração de trânsito. A existência da infração interfere diretamente na validade do AIT, pois necessária para a produção de auto de infração válido, mas com ele não se confunde jamais.


CONCLUSÃO

Diante de tudo o que foi exposto, podemos concluir que o fenômeno jurídico do fato jurídico auto de infração de trânsito, como fruto da incidência de normas jurídicas, entrada, passagem e saída do mundo jurídico, pode ser expressado graficamente da seguinte forma:

Temos, assim, a incidência da norma jurídica sobre o suporte fático (suposta infração + conhecimento da Administração), que faz nascer o ato jurídico do auto de infração de trânsito, ato este composto de vários elementos: nucleares, complementares e integrativos. Cada um desses elementos é afeto a um plano do mundo jurídico. Assim, ao final da passagem do mundo jurídico, com o julgamento do auto de infração de trânsito e, por via oblíqua, da própria infração, constituir-se-á a relação jurídica entre a Administração e o Administrado, cabendo àquela o direito de impor e exigir o cumprimento da sanção de trânsito e a este o dever de cumpri-la. Observamos, por lógico, que até o julgamento do auto de infração de trânsito não há, ainda, o direito de impor e exigir o cumprimento da sanção por parte da Administração, para que esse direito nasça e se torne exigível é preciso concluir o processo administrativo de trânsito e constituir a relação jurídica entre eles.


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NOTAS

01 Não se tem como precisar o nascimento do direito, por isso, neste trabalho, colocaremos essa questão entre parênteses. Na verdade, o dado que admitimos por inicial é o fato de que, como bem anota Miguel Reale em suas Lições Preliminares de Direito, na solitária ilha de Robson Crusue, antes da chegado do índio Sexta Feira, não existia o Direito, isto porque, ele serve para regrar a minha conduta com o alter, como bem salienta Lorival Vilanova no prefácio da sua 4ª edição de sua obra Causalidade e Relação no Direito, in verbis: "E o ser humano, com sua internidade psicológica, sujeito a leis causais – nisso, também, é natureza -, transita para o plano do ser-pessoa, criando ou apropriando-se das objetivações de valor, que nesses suportes se estabilizam. Sem essa estabilização, o ingênito fluir da corrente psíquica, com sua infixidez, tornaria impossível o discurso humano na espécie superior da história.". Noutras palavras, a análise do direito só tem sentido quando investigada dentro de um sistema, composto não só do elemento eu, mas sim dos componentes eu, tu, eles, produzindo as relações intersubjetivas eu-tu, eu-eles ou tu-eles, nunca eu-eu ou tu-tu. Por isso, direito e sociedade, em que pese diferentes, são visceralemente ligados, um não sobrevive mais sem o outro, há entre eles uma relação de depedência, mas não de causalidade. Um não é causa do outro, são fenômenos diversos, mas totalmente dependentes.

02 Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 49.

03 Idem.

04 Ibidem.

05 Cumpre observar que, seguindo o entendimento do professor Adriano Soares da Costa, preferimos pontesiano a ponteano, pois como bem explica o professor referido, na sua obra teoria da incidência da norma tributária, crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho, nota de rodapé nº 29, p. 15, a expressão ponteana suprime a consoante ‘s’ do nome Pontes, passando a significar aquilo que pertence ao pensamento de Ponte, e como o que se quer significar é o pensamento pertencente a Pontes, preferimos pontesiano.

06 Idem.

07 Pontes de Miranda. Tratado das Ações, Tomo I, p. 21.

08 Pontes de Miranda, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 51.

09 Idem, p. 52.

10 Costa, Adriano Soares da. Teoria da Incidência da Norma Tributária – crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho, p. 2 e 3.

11 Bernardes de Mello, Marcos. Teoria do Fato Jurídico – plano da existência, p. 10.

12 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 50.

13 Tratado das Ações, Tomo I, p. 21.

14 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 53.

15 Idem, p. 62.

16 Idem, p. 63.

17 Ob. Cit.

18 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 57

19 Idem, p. 58.

20 Ibidem.

21 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 58.

22 Idem, p. 83.

23 Essa altercação perde sentido quando se questiona: se os fatos jurídicos lato sensu ilícitos não são jurídicos, como se explicar o nascimento de direito, para o lesado, e de obrigação, para o causador, decorrente de ato ilícito? Se não são jurídicos esses fatos, como explicar tal fenômeno? Simplesmente não há como explicar! O que se tem confundido é ser conforme ao direito ou contrário a direito, o que é completamente diferente do ser jurídico. Ser jurídico diz respeito a existir no mundo jurídico, a ter incidido sobre o suporte fático a norma jurídica, portanto, ser jurídico é ser relevante para o direito, independente se conforme ou contrário a direito.

24 Preferimos não denominar essa conduta como infração de trânsito, porque a conduta narrada no auto de infração de trânsito, algumas das vezes poderá não ser tipificada como infração de trânsito ou a tipificação contida no AIT, feita pela autoridade de trânsito ou agente da autoridade de trânsito, não tenha como suporte fático aquele fato narrado no auto de infração de trânsito, mas, nem por isso, o auto de infração de trânsito inexistirá, pelo contrário, existe, porém é inconsistente.

25 Teoria do Fato Jurídico – Plano da Existência, p. 98.

26 Apesar de o CTB fazer referência às resoluções do CONTRAN, como veículos introdutores de infrações de trânsito, desde já importa esclarecer que tal conduta legislativa é desprovida de compatibilidade com a Constituição Federal de 1988, pois fere o princípio da legalidade e, sobre tudo, fere o Poder Regulamentar constitucionalmente previsto no art. 84 da CF. As resoluções do CONTRAN são decretos regulamentares, que devem, exclusivamente regulamentar a lei nos limites estabelecidos por ela, sem criar direitos e obrigações, elas são meio de melhor aplicação da lei e não causa, em si mesmas, de aplicação de sanção. Por isso, apesar de estar previsto no CTB, a melhor interpretação é de considerar tal previsão como inconstitucional, de sorte que qualquer sanção imposta com fundamento, exclusivo, em Resolução do CONTRAN que introduza ilícito administrativo de trânsito será nula de pleno direito.

Sobre o autor
Alessandro Samartin de Gouveia

Promotor de Justiça do Estado do Amazonas. Possui graduação em Direito pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió (2004). Pós-graduado em nível de Especialização em Direito Processual pela ESAMC/ESMAL(2006). Formação complementar em política e gestão da saúde público para o MP - 2016 - pela ENSP/FIOCRUZ. Pós-graduando em prevenção e repressão à corrupção: aspectos teóricos e práticos, em nível de especialização (2017/2018), pela ESTÁCIO/CERS. Mestre em direito constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: súmula vinculante, separação dos poderes, mandado de segurança, controle de constitucionalidade e auto de infração de trânsito. http://orcid.org/0000-0003-2127-4935

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOUVEIA, Alessandro Samartin. Apontamentos sobre o fenômeno jurídico do auto de infração de trânsito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1420, 22 mai. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9893. Acesso em: 23 dez. 2024.

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