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Acumulação de benefícios e aplicação de redutores.

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Agenda 24/07/2022 às 09:00

2. PASSO A PASSO

Trataremos, a seguir, da aplicação prática das regras previstas no artigo 24 da Emenda.

2.1. Passo 1

Quando o interessado requerer qualquer um dos benefícios esposados item 1.17, o regime de previdência deverá indagar se ele já possui algum outro benefício. Caso o interessado responda que não possui qualquer outro benefício, não será o caso de aplicação dos redutores previstos no parágrafo segundo do artigo 24 da EC nº 103/19, uma vez que não há acumulação de benefícios. Caso, entretanto, ele responda que já percebe qualquer outro benefício, não se tratando das situações contidas nos dois próximos passos, os redutores deverão ser aplicados na forma do que estabelece o mencionado parágrafo segundo.

2.2. Passo 2

Ao se constatar a acumulação de benefícios, deve-se indagar ao interessado qual é o benefício previdenciário que ele já percebe. Caso ele já perceba uma aposentadoria e esteja a requerer uma outra aposentadoria, não será o caso de aplicação dos redutores previstos no parágrafo segundo do artigo 24 da EC nº 103/19, pois a acumulação de aposentadorias não está no elenco de acumulações admitidas no parágrafo primeiro para fins de aplicação dos redutores previstos no parágrafo segundo do artigo 24.

2.3. Passo 3

Da mesma forma, caso o interessado esteja requerendo pensões por morte dentro do RPPS de um mesmo ente federativo, também não será o caso de aplicação dos redutores previstos no parágrafo segundo do artigo 24 da EC nº 103/19, pois segundo o que estabelece o inciso I do parágrafo primeiro do artigo 24, somente a acumulação de pensões pagas por regimes de previdência distintos é que será objeto de aplicação dos redutores previstos no parágrafo segundo. Vale ressaltar que quando se trata de acumulação de pensões no âmbito do RPPS, considera-se regime distinto o RPPS de cada ente federativo. Assim, exemplificando, só se aplicam os redutores, se uma pensão for paga pelo RPPS do Estado e a outra pelo RPPS do município. Se ambas forem pagas pelo mesmo RPPS estadual, não será o caso de aplicação de redutores.

Outra hipótese de não redução é o beneficiário acumular pensão decorrente do óbito de filho com pensão decorrente do óbito de cônjuge ou companheiro, uma vez que o texto é específico sobre a acumulação de pensão decorrente de morte de cônjuge ou companheiro, não fazendo qualquer menção a pensão decorrente de óbito de filho. Vale ressaltar que, para a ocorrência de tal hipótese, é necessário que, no momento do óbito do filho, os pais comprovem que dele dependiam economicamente.

2.4. Passo 4

Caso as acumulações não sejam as mencionadas nos dois itens anteriores, deve-se solicitar ao interessado que opte expressamente pelo benefício de maior valor, para percebê-lo integralmente, sem a aplicação de qualquer redutor. Aqui, no que pese a lei já garantir o direito à percepção do benefício de maior valor (mais vantajoso), nos parece interessante que deva existir uma opção expressa do interessado para que se evite equívocos futuros, até porque, como já ressaltado, a qualquer momento, é direito do interessado requerer, por meio de opção expressa, a alteração da aplicação dos redutores em caso de alteração nos valores dos benefícios. Entretanto, devemos ressaltar a desnecessidade desta opção expressa quando o benefício de menor valor for de um salário-mínimo, já que, neste caso, não poderá haver aplicação de redutores que reduzam o benefício a um valor inferior ao mínimo.

O parágrafo segundo do artigo 24 diz que é assegurada a percepção do benefício mais vantajoso, o que poderia tornar desnecessária a opção expressa do segurado. Porém, como ensina José Antonio Savaris, verifica-se, de um lado, uma presumível hipossuficiência econômica e informacional da pessoa que reivindica uma prestação da previdência social.

Pergunta-se, assim: saberá, realmente, o beneficiário, qual é o benefício mais vantajoso? Não caberia à administração informá-lo a este respeito? Imagine-se que, por falta de conhecimento, o segurado opte por receber na integralidade um benefício de menor valor: como se comportarão os órgãos pagadores dos demais benefícios?

Em um exemplo, o cidadão recebe uma aposentadoria no valor de R$ 4.000,00; seu cônjuge vem a óbito, deixando uma pensão de R$ 5.000,00, para ser dividida entre dois dependentes (o aposentado e um filho inválido). O aposentado pode entender que a pensão é mais vantajosa (R$ 5.000,00), sem se atentar para o fato de que receberá apenas metade do valor (a outra metade vai para o outro dependente: R$ 5.000,00 ÷ 2 = R$ 2.500,00). Com isso, sua renda familiar acabará sendo reduzida. Vamos aos números:

Considerando, primeiro, que ele faça a opção correta (por continuar recebendo integralmente a aposentadoria): sua cota-parte da pensão (R$ 2.500,00) será reduzida para R$ 1.969,60 (ver regras de cálculo no passo 6), e a renda familiar será composta por sua aposentadoria, sua cota-parte da pensão e a cota-parte do filho inválido (R$ 4.000,00 + R$ 1.969,60 + R$ 2.500,00 = R$ 8.469,60).

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Considerando, agora, que ele expresse o desejo de receber integralmente a pensão: sua aposentadoria, de R$ 4.000,00, será reduzida para R$ 2.496,80, e a renda familiar será reduzida para R$ 7.496,80 (R$ 2.496,80 + R$ 2.500,00 + R$ 2.500,00), uma redução total de quase mil reais.

2.5. Passo 5

Pois bem, caso a opção do interessado recaia sobre o benefício que esteja sendo pleiteado no momento, sobre ele não serão aplicados os redutores previstos no parágrafo segundo do artigo 24 da EC nº 103/19, e, neste caso, a Administração Pública tem o dever de comunicar ao regime de previdência que paga o benefício de menor valor, a respeito da existência da acumulação de benefícios, para que este proceda com a aplicação dos redutores. Entretanto, caso a opção do interessado recaia sobre o benefício mais antigo, isto é, o benefício que já vinha percebendo, os redutores do parágrafo segundo do artigo 24 da EC nº 103/19, deverão ser aplicados sobre o benefício que está sendo atualmente pleiteado.

2.6. Passo 6

No processo de aplicação de redutores sobre o benefício de menor valor, deve-se fatiar o valor total do benefício em várias faixas de salários-mínimos, hoje no valor de R$ 1.212,00, garantindo-se os percentuais elencados no parágrafo segundo da seguinte forma:

  1. Até o primeiro salário-mínimo, R$ 1.212,00, garante-se 100% do seu valor. Portanto, sem aplicação de redutores;

  2. A partir do primeiro até o limite do segundo salário-mínimo, garante-se 60% deste valor. Portanto, aplica-se um redutor de 40% sobre R$ 1.212,00;

  3. Do segundo até o limite do terceiro salário-mínimo, garante-se 40% deste valor. Portanto, aplica-se um redutor de 60% sobre R$ 1.212,00;

  4. Do terceiro até o limite do quarto salário-mínimo, garante-se 20% deste valor. Portanto, aplica-se um redutor de 80% sobre R$ 1.212,00;

  5. E, por fim, garante-se 10% do valor que ultrapassar a quatro salários-mínimos. Portanto, aplica-se um redutor de 90% sobre a quantia que exceder a R$ 4.848,00;

  6. Por fim, soma-se todos os valores apurados e chega-se ao quantum final a ser pago naquele benefício.

Transformando a informação em números, considere-se que o segurado tem uma aposentadoria no valor atual de R$ 10.000,00, e passará a receber, cumulativamente, uma pensão por morte com valor igual ao teto do RGPS (R$ 7.087,22). A aposentadoria, mais vantajosa, será devida integralmente. A pensão será submetida aos cálculos acima:

Faixas

Percentuais

Faixa com redução

1

1.212,00

100%

1.212,00

2

1.212,00

60%

727,20

3

1.212,00

40%

484,80

4

1.212,00

20%

242,40

5

2.239,22

10%

223,92

Somas

7.087,22

2.890,32

O benefício de R$ 7.087,22 será reduzido para R$ 2.890,32.


3. CONCLUSÃO

Mais do que uma conclusão, destinamos este momento a uma crítica a este sistema de redução de benefícios cumulados com pensão por morte. Um dos objetivos da reforma do sistema previdenciário introduzido pela EC nº 103/19 foi o combate aos privilégios, e o Congresso Nacional entendeu como privilegiado quem recebe benefícios acumulados, especialmente quando este acúmulo inclui pensão por morte.

Desde a publicação da Emenda Constitucional nº 20/98 a Constituição Federal prevê que, tanto para o RGPS quanto para RPPS, devem ser observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. Significa dizer que, desde 15.12.1998, estes critérios são observados. O equilíbrio financeiro se dá pela equidade entre arrecadação de contribuições e pagamentos de benefícios; o equilíbrio atuarial ocorre com a aplicação de técnicas atuariais aos cálculos das prestações devidas pelo sistema. Se, isoladamente, existe a previsão de tal equilíbrio no pagamento de qualquer prestação previdenciária, o que justifica a redução do valor de um destes benefícios, quando pago acumuladamente com outro?

Outra crítica se faz e, para esta, considerar-se-á um exemplo: uma professora recebe duas aposentadorias. Uma é paga por um RPPS estadual (benefício de valor mais elevado), outra é paga por um RPPS municipal. Seu cônjuge vem a óbito, deixando-lhe uma pensão do RGPS (cujo valor é inferior às aposentadorias recebidas). Logo, ela deverá receber integralmente a aposentadoria paga pelo RPPS estadual, enquanto a outra aposentadoria e a pensão serão submetidas às reduções estudadas neste trabalho. Assim, o RPPS municipal passará a economizar no pagamento da aposentadoria, pelo fato do RGPS pagar uma pensão. Qual a justificativa para tal economia, sem que haja qualquer outro peso financeiro para aquele instituto? Lembrando, ainda, que para receber a aposentadoria, a professora verteu contribuições ao citado RPPS! Caso não ficasse viúva, o Município continuaria pagando-lhe a aposentadoria integral.

Enfim, muita discussão ainda se fará sobre os redutores aqui estudados.

Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. Acumulação de benefícios e aplicação de redutores.: O art. 24 da EC nº 103/19 como você nunca viu. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6962, 24 jul. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/99276. Acesso em: 22 dez. 2024.

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