2. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO PERANTE SEU CLIENTE
2.1. A responsabilidade civil do advogado e das sociedades de advogados
Como já vimos à exaustão no estudo da responsabilidade civil, há várias classificações doutrinárias e fundamentações legais para que o detentor de um direito ofendido acione os mecanismos ressarcitórios. Entretanto, insta destacar a responsabilidade civil atinente ao advogado.
Sob o aspecto histórico da responsabilidade civil do advogado perante seu cliente, declarou o Desembargador Luiz de Azevedo, do Tribunal de Justiça de São Paulo:
Desde de longa data tem as leis responsabilizado o advogado quando este, em razão de dolo, culpa ou ignorância, acaba causando prejuízo a seu patrocinado, Código de Justiniano, 4, 35, 13; Ordenações Afonsinas, 1, 13, § 3º e 7º; Ordenações Manoelinas, 1, 318, § 29º e 35º; Ordenações Filipinas, 1, 48, § 7º e 10º (Apelação 113.443-1, TJSP, em RJTJESP-Lex 125/177).
No tocante à responsabilidade do advogado, já sabemos que a relação cliente-advogado deriva de uma relação contratual, tem como fundamento uma obrigação de meio e quase sempre está alicerçada numa prestação de serviço autônomo. Essa relação tem como diferencial a incerteza do resultado da decisão judicial, como prescreve Silvio Venosa (2005):
As obrigações do advogado consistem em defender a parte em juízo e dar-lhe conselhos profissionais. A responsabilidade do advogado na área litigiosa é de uma obrigação de meio. O advogado está obrigado a usar de sua diligência e capacidade profissional na defesa da causa, mas não se obriga pelo resultado, que sempre é falível e sujeito às vicissitudes intrínsecas ao processo (p. 2).
Sérgio Novais Dias (1999) reafirma esse entendimento:
É cediço que o advogado exerce atividade de meio e não de fim. Ou seja, o advogado não é responsável pelo resultado da demanda, pois a decisão compete ao juiz e não a ele. É o advogado, entretanto, responsável pela boa utilização dos meios legais que estiverem a seu alcance para convencer o julgador de que o direito protege seu cliente (p. 17).
Essa posição é adotada por todos os doutrinadores, como conclui José de Aguiar Dias (1995): "é recordar que o contrato advocatício não impõe ao advogado sair vitorioso da causa" (p. 292). Essa é regra geral, mas há exceções derivadas de serviços que impõem obrigação de resultado, que serão abordadas oportunamente.
Nesse contexto, o advogado que causar prejuízo ao seu cliente está adstrito ao Código Consumerista, artigo 14, § 4º, sendo aplicada a exceção do CDC, ou seja, a responsabilidade subjetiva, que será confirmada com a verificação da culpa, ônus que será do cliente lesado. Essa é a regra geral, com suporte na Constituição Federal, no Código Civil, no Código de Processo Civil, bem como no próprio Estatuto de Advogado e seu código de ética que prescreve, em seu artigo 32, in verbis: "O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa".
Vejamos alguns julgados que confirmam esse entendimento:
responsabilidade civil. advogado. Prestação de serviços deficiente. Danos morais e materiais. Exigência de prova de dolo ou culpa, esta grave e inescusável a justificar responsabilização. A obrigação do profissional do direito é de meio e não de resultado, dependendo a responsabilidade civil da verificação de culpa (art. 159, do CC de 1916, e art. 14, § 4º, do CDC). Não havendo prova de que o profissional liberal haja obrado com culpa grave, ou errado grosseiramente, não há se falar em responsabilização. Não se tipifica desídia, negligência ou abandono da causa o não uso de todos os recursos ou prazos processuais, quando os pertinentes foram utilizados. Dir-se-á, inclusive, que a insistência, não raras vezes, provocando retardamento do feito, pode até tipificar litigância temerária, quando então sim poderia gerar responsabilização. Apelação desprovida (Apelação Cível Nº 70008064180, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 30/06/2004).
responsabilidade civil. advogado. danos material e moral. Não restando demonstrada a conduta culposa do réu na defesa dos interesses dos autores, em reclamatória trabalhista, conforme previsto no art. 14, § 4º, do CDC, é de ser desacolhida a pretendida reparação por dano material e moral. Situação em que o insucesso na reclamatória trabalhista não se deve à atuação do advogado, mas à falta de prova capaz de afastar a pretensão do reclamante. Obrigação de meio, não de resultado. Apelação desprovida (Apelação Cível Nº 70013132212, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 15/02/2006).
Porém, para toda regra existem exceções. Se o advogado estiver vinculado a uma pessoa jurídica, não prestará o serviço de forma autônoma, pessoal; será o executor de uma tarefa delegada por seus superiores, e o vínculo do consumidor é com a empresa, é dela que será cobrado eventuais prejuízos, mesmo que quem os tenha dado origem fosse o seu advogado contratado. Nesse caso, é aplicada a regra geral do CDC, a responsabilidade objetiva, como bem esclarece Alex Ribeiro (2003):
Não sendo pessoal, mas sim vinculada à pessoa jurídica, será objetiva a responsabilidade do empreendimento, posto despida a contratação do caráter intuitu personae, ocasião em que bastará a apuração da ocorrência do dano, o defeito do serviço e o nexo de causalidade (p. 11).
Também é possível que o advogado venha ser contratado a prestar determinado serviço, obrigando-se a certo resultado – em casos como a elaboração de um contrato ou estatuto de uma sociedade, entre outras hipóteses –, falamos então de obrigação de resultado. Neste caso, aplica-se a Teoria do Resultado, há culpa presumida do profissional – vejamos que não se trata de responsabilidade objetiva, o que ocorre é a inversão do ônus de prova, após a verificação da culpa, prevista no artigo 6, inciso VIII do CDC. A culpa permanece como elemento fundamental, pois se o advogado provar que não deu causa ao dano não deverá indenizá-lo. Entretanto há divergência doutrinaria quanto à aplicabilidade deste instituto de inversão do onus probandi para advogados, e Jadson Dias Correia (1999) se posiciona:
Existem algumas opiniões afirmando que a inversão do ônus da prova, previsto no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor, não se aplica aos advogados. No que pese o parecer dos doutrinadores, entendemos que tal opinião não nos parece absoluta, pois tal interpretação não pode prevalecer, quando houver, por exemplo, uma demanda entre um cliente lesado e um escritório de advocacia de porte empresarial, pois fica latente a hipossuficiência do lesado, devendo o juiz (em nossa humilde opinião) aplicar a inversão do onus probandi (p. 14).
Alex Ribeiro (2003) segue no mesmo sentido, citando José de Aguiar Dias:
Existem algumas opiniões afirmando que a inversão do ônus da prova, previsto no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor, não se aplica aos advogados. Pesem os respeitáveis entendimentos, data venia, afiguram-se-nos improsperáveis, sob pena de tal interpretação rechaçar a proteção integral do consumidor. Quando, por exemplo, numa demanda ente um cliente lesado e um escritório de advocacia de porte empresarial, ressoando latente a hipossuficiência do lesado, não caberia a inversão do ônus da prova? Evidente que sim, pois do contrário ficaria muito difícil para o lesado provar que a culpa foi do grande e estruturado escritório de advocacia. Esse modesto e singelo exemplo, citado alhures, mostra-se quantum satis para a compreensão do instituto. Além do que, para o constituinte lesado, a prova do erro profissional ‘do erro profissional pode ser feita por indícios e presunções’ (José de Aguiar Dias. Da responsabilidade civil, p. 351) (p. 12).
Além disso, há de se destacar que o advogado pode recusar a causa que o cliente lhe induz, com total liberdade, sem mesmo aduzir os motivos da recusa. Essa possibilidade decorre da peculiaridade da relação cliente-advogado, como bem relata Sérgio Novais Dias (1999):
A posição do advogado perante seu cliente, nesse contrato de prestação de serviços de advocacia, é bastante peculiar, pois, ao mesmo tempo em que não pode afastar-se ou contrariar a orientação do cliente, deve manter sua independência na direção da causa. Por isso que o advogado tem o direito de aceitar ou recusar, com ampla liberdade e sem explicações, a causa que o cliente lhe propõe patrocínio, com exceção, evidentemente, da assistência judiciária gratuita (p. 31).
E segue citando Paulo Luiz Lôbo:
O advogado tem o direito de recusar o patrocínio da causa, diz Paulo Luiz Neto Lobo, com proficiência, que: a ética do advogado é a ética da parcialidade, ao contrário da ética do juiz que é a da isenção. Contudo, não pode o advogado cobrir com o manto ético qualquer interesse do cliente, cabendo-lhe recusar o patrocínio que viole sua independência ou a ética profissional (DIAS, 1999, p. 32).
Nesse diapasão, caberá ao advogado atuar com independência técnica e ética, utilizando todo seu conhecimento e diligência que a profissão exige na tentativa de obter o melhor resultado para seu cliente. Caso contrário, poderá responder pelos danos que seu mandante vier a sofrer. Ademais, quando há interferência do cliente nos meios aplicados pelo mandatário, este deverá renunciar o mandato, respeitando as formalidades e prazo legal, para que não venha responder por atitudes que eventualmente não concordou, isentando-se de eventual ação ressarcitória, ou mesmo de problemas éticos e/ou disciplinares com a Ordem dos Advogados do Brasil.
Importante ressaltarmos a responsabilidade civil das sociedades de advogados.
Sabemos que é cada vez mais comum advogados reunidos em sociedade para seu exercício profissional. A necessidade de reduzir custos de instalação de escritório, o intercâmbio de idéias jurídicas imposto pela especialização do direito e a própria competitividade dos dias atuais, obriga a união de esforços que resultam nas Sociedades de Advogados. Não raro, encontramos sociedades de advogados que estabelecem escritórios de porte empresarial, com filiais em todo país e muitas vezes até no exterior, em que se aglomeram advogados empregados.
Devemos distinguir os advogados que compõem a pessoa jurídica como sócios daqueles advogados que são funcionários de determinadas sociedades de advogados, como explica Alex Ribeiro (2003):
Uma coisa é a pessoa jurídica e os advogados que compõem o seu quadro societário. Outra é o seu quadro de funcionários, compostas por advogados, estagiários, contadores, engenheiros, peritos de toda sorte. A prática tem-nos demonstrado, ainda, que esses grandes escritórios contam em seus quadros com profissionais mestres da oratória e da persuasão que se prestam apenas a atender e convencer o cliente. Depois, quando é contratado o escritório, a pendência jurídica é enviada para outros profissionais, que cuidarão de promover a ação e conduzi-la até o seu ápice. Em assim sendo, a questão da pessoalidade se esvai célere com o vento. Se esses funcionários do escritório de advocacia, no exercício de sua profissão e em razão dela, causarem danos ao cliente, quem deve ser responsabilizado civilmente é o ente jurídico (p. 15).
O Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) estabeleceu em seu artigo 15 a união de advogados em sociedade civil para prestação de serviços, mas no § 3º do mesmo artigo impõe que as procurações sejam outorgadas individualmente aos advogados com indicação da sociedade de que fazem parte. De outra banda, estabelece em seu artigo 17 que o sócio de uma sociedade de advogados responde "subsidiária e ilimitadamente" pelos danos causados a seus clientes. Ênio Santarelli Zuliani (2003) analisa e explica:
O novo Código Civil não inclui a sociedade de advogados (ou outros profissionais) entre as pessoas jurídicas de direito privado, exatamente porque não assume tal entidade responsabilidade obrigacional distinta da pessoa de seus membros (que é condição sinne qua non da pessoa jurídica regular) de modo que não há na sociedade de advogados, separação patrimonial dos sócios contra execuções por dívidas da sociedade (p. 148).
Essas sociedades possuem características distintas das demais sociedades civis, como relata Paulo Luiz Neto Lôbo (1994):
É uma sociedade profissional sui generis, que não se confunde com as demais sociedades civis... o Estatuto manteve a natureza da sociedade de advogados como sociedade civil exclusivamente de pessoas e finalidades profissionais... rejeitou-se o modelo empresarial existente em vários países, para que não se desfigurasse a atividade da advocacia (p. 76).
Quando os serviços advocatícios são prestados por sociedade de advogados, o cliente não busca no advogado individualmente os serviços, e, sim, no conjunto de serviços que esta sociedade oferece. Não há, assim, relação intuitu personae, e o preceito da responsabilidade subjetiva do profissional liberal, prevista no artigo 14, § 4º, de nosso código consumerista, é afastado, devendo ser aplicada a regra geral das relações de consumo, ou seja, a da responsabilidade objetiva. É como explica Ênio Santarelli Zuliani (2003):
O preceito do artigo 14, § 4º, da Lei nº 8.078-90 (responsabilidade subjetiva do profissional liberal), aplica-se ao advogado que trabalha individualmente. Quando o serviço é prestado por sociedades de advogados, a responsabilidade deixa de ser subjetiva (dependente de culpa) e regula-se pela objetiva, ou seja, independente de prova de culpa (p. 147).
Por outro lado, em face da natureza diferenciada da sociedade de advogados, Sérgio Novais Dias (1999) entende que a responsabilidade sempre será subjetiva:
Sendo o advogado subsidiariamente responsável para com a sociedade, conforme regra do artigo 17 do Estatuto do Advogado e da OAB, atribuir responsabilidade objetiva da sociedade decorrente da atuação de um de seus sócios ou de advogado empregado seria indiretamente derrogar o artigo 32 do Estatuto da Advocacia e o § 4º do artigo 14 do CDC, que atribuem ao advogado a responsabilidade subjetiva (p. 42).
Independente da divergência doutrinária quanto a responsabilidade ser objetiva ou subjetiva, e se for esta, ainda é possível, se verificada a hipossuficiência do cliente, a inversão do ônus da prova previsto no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), mas o importante é sabermos que a sociedade responde com seu patrimônio, em caso de dano causado por sócio ou por advogado empregado, e se o conjunto patrimonial da sociedade não satisfazer o quantum indenizatório, os demais sócios respondem subsidiariamente e de forma ilimitada no que toca a seu patrimônio pessoal, resguardado o direito de regresso contra quem deu causa ao prejuízo do cliente.
Quanto ao cliente e sua relação com a sociedade de advogados, são inúmeras as hipóteses. Pode o cliente procurar determinado profissional específico que é membro de uma sociedade, pode contratar um advogado amigo que trabalha com outro colega para reduzir custos, como também procurar um escritório de porte empresarial, especializado em determinadas demandas de grande volume, com relação totalmente impessoal. No entanto, dentro da dialética do direito, todo exame do tipo de responsabilidade civil a ser aplicada se dará no caso concreto.
Como podemos observar, tanto o advogado como a sociedade de advogados pode responder civilmente pelos danos causados a um cliente.
2.2. Fatos geradores da responsabilidade civil do advogado e das sociedades de advogados
Como verificamos ser possível a responsabilização do advogado e da sociedade em que ele atua, relevante examinarmos em que casos ela se dará, ou melhor, quais os atos desse profissional que podem ensejar a aplicação da teoria da responsabilidade civil.
2.2.1 .Responsabilidade por erro de fato e de direito
Os erros de fato e direito são causas que podem produzir prejuízos ao mandante com origens diversas, bem como é distinta a fundamentação probatória para que clientes dos profissionais do direito proponham eventuais demandas indenizatórias. O erro de fato é de fácil visualização, porque está na aplicação defeituosa das informações que seu cliente lhe entregou, já o erro de direito é complexo e possui relação direta do advogado com seu conhecimento e diligência para com seu dever profissional.
O erro de fato é a utilização incompleta ou errada das informações passadas pelo seu cliente, que na elaboração de um contrato, de uma petição inicial, no curso do processo, entre outras hipóteses, resulta em prejuízos relevantes para ele. No erro de fato não há escusa do profissional mesmo que este não seja grave, e a opinião de Alex Sandro Ribeiro (2003) é no sentido de que:
Erro de fato haverá toda vez que o acontecimento, que a realidade, for compreendida e interpretada incorretamente. Independente da gravidade do erro de fato, não se escusará o advogado da responsabilidade civil, acaso danos ocorram em virtude de sua desatenção (p. 11).
Sergio Novais Dias (1999) relata e exemplifica:
O advogado responde pelos erros de fato por ele cometidos, como, por exemplo, quando, ao elaborar uma defesa trabalhista admite que o reclamante trabalhava até às 20 horas todos os dias, fazendo jus a 2 horas extras por dia, conquanto no relatório escrito entregue a ele pelo cliente para a elaboração da defesa estivesse dito que o reclamante trabalhava apenas até às 18 horas (p. 34).
O erro de direito é mais abrangente e complexo, sua verificação está fundada na correta aplicação do remédio jurídico proposto pelo advogado frente ao caso concreto a ele confiado. É o dever de o advogado possuir os conhecimentos necessários da área em que milita, mantendo-se atualizado da lei, doutrina e jurisprudência. Não é admissível que um profissional do direito proponha uma demanda totalmente inadequada, ou pior, que perca prazos para interposição de recursos. José da Aguiar Dias (1995) esclarece o erro de direito:
Quanto aos erros de direito, é preciso distinguir: só o erro grave, como a desatenção à jurisprudência corrente, o desconhecimento do texto expresso da lei de aplicação freqüente ou cabível no caso, a interpretação abertamente absurda, podem autorizar a indenização contra o advogado, porque traduzem desinteresse pelo estudo da causa ou do direito a aplicar, ou então, caracterizando ignorância, que se torna indesculpável, porque o profissional é obrigado a conhecer o seu oficio sem que seja obrigado a mostrar um valor excepcional na profissão. O fato de ter um diploma não estabelece presunção a favor do profissional, mas e um índice que ele tem que honrar (p. 293).
Este erro está diretamente relacionado com o permanente estudo, atualização e cuidado do advogado com sua atividade laboral. Paulo Osório Gomes Rocha (2005), citando Eduardo Couture, prescreve que "o direito está em constante transformação. Se não acompanhas, serás cada vez menos advogado" (p. 21).
O erro de direito deriva da negligência do advogado com sua profissão, traduzindo seu despreparo ou irresponsabilidade com a matéria em questão. Sabemos que o legislador brasileiro sempre atende os reclames sociais com novas leis, o que impossibilita qualquer profissional conhecer todos os nossos diplomas legais; entretanto, sempre será exigido um dever médio de conhecimento e se necessário estudo para fazer jus à causa que lhe foi patrocinada.
2.2.2. Responsabilidade por conselhos e pareceres
Como já vimos, o advogado não precisa ser contratado necessariamente para demandar em juízo. É cada vez mais comum e freqüente uma postura preventiva de pessoas e empresas na busca de conselhos e pareceres jurídicos para evitar futuros problemas na esfera judicial ou mesmo para adequar sua demanda para que a probabilidade de resultado favorável seja maior.
Os conselhos e pareceres devem estar de acordo com a jurisprudência, com a lei e com a doutrina, e, além disso, o parecerista deve embasar e fundamentar com toda cautela, a indagação de seu cliente. É como ensina Aguiar Dias (1995):
Um parecer ou conselho visivelmente desautorizado pela doutrina, pela lei ou pela jurisprudência acarreta, para o advogado que o dá, a obrigação de reparar o dano resultante de lhe haver o cliente seguido o raciocínio absurdo, de cuja extravagância não poderia aquilatar... até na ausência de dolo, é possível verificar-se a responsabilidade do advogado... desde que o profissional tinha meios de saber que o resultado seria aquele, matéria que deve ser apreciada de acordo com as circunstâncias (p. 345-346).
Silvio Venosa (2005) trilha o mesmo entendimento:
Questão complexa é saber se o advogado responde pelo sucesso da causa nos pareceres e opiniões legais. A nosso ver, seu exame deve seguir a regra geral: o advogado deve responder quando comete erro crasso e injustificável, portanto com culpa. Não é necessário que se prove o dolo, como sustentam alguns (p. 3).
Há também a possibilidade do advogado responder pela omissão de um conselho que deveria ser auferido pelo cliente. É o caso em que a ausência ou insuficiência do conselho dado leva seu cliente ao insucesso de sua pretensão. Nesse sentido, Sergio Novais Dias (1999) prescreve:
Sendo mais raro, também não é impossível o caso de responder o advogado por omissão de conselho, o que pode suceder quando permite que seu cliente enverede por caminho errôneo, quando poderia aconselhá-lo a adotar fórmula garantidora de sucesso (p. 36).
No mesmo sentido, segue Paulo Luiz Neto Lôbo (1994):
Na hipótese de consulta jurídica, o conselho insuficiente deve ser equiparado a ausência de conselho, sendo, também, imputável ao advogado a responsabilidade civil. O parecer não é apenas uma opinião, mas uma direção técnica a ser seguida, e quando é visivelmente colidente com a legislação, a doutrina ou a jurisprudência, acarreta danos ao cliente que o acompanha (p. 120).
Sérgio Novais Dias (1999) traz casos concretos de tais situações:
Há um caso de um advogado que aconselhou seu cliente a não comparecer em audiência trabalhista onde deveria apresentar defesa, porque a notificação fora entregue ao porteiro na sede da empresa, pois pensava o advogado que a notificação só seria válida se entregue ao representante legal da empresa... Esse erro grosseiro de informação causou enorme dano ao seu cliente, que foi considerado revel e aplicado a pena de confissão quanto a matéria de fato, sendo condenado em quantia vultosíssima, conquanto existissem inúmeros documentos comprovadores do pagamento de várias parcelas pleiteadas, que deixaram de ser apresentados... as quais ficaram sem contestação (p. 36).
Relata também caso ocorrido no direito alienígena:
Na Inglaterra em Ross V. Counters... foi condenado o advogado que preparara deficientemente um testamento, porque não advertira, como lhe competia, que a esposa do beneficiário não poderia, segundo a lei inglesa, servir de testemunha. Constitui, pois em erro de direito por não-fornecimento de informação que o advogado tinha obrigação de saber e advertir o cliente (DIAS, 1999, p. 36-37).
Indiscutivelmente, assim como em outras atividades profissionais, no direito há uma especialização dentro de seus diversos ramos; de outra banda, é cada vez mais usual que os consumidores de serviços jurídicos adotem uma postura preventiva para evitar futuros problemas. Sergio Novais Dias (1999) explica:
É certo que, com a crescente especialização do conhecimento, pessoas e empresas passam a tomar várias decisões baseadas em consultas a especialistas. No caso dos advogados a falta de informação adequada ou a má informação podem gerar danos incomensuráveis aos seus clientes, razão da qual se faz necessário apreciar cada caso, de acordo com o padrão de conhecimento que se esperava do profissional que se habilitou a essa tarefa, para decidir ou não pela responsabilidade (p. 37).
Não se pode esconder que existe uma tendência mundial de responsabilizar os profissionais de nível superior, não só por suas atividades, mas também por opiniões e conselhos proferidos a pedido de cliente, e nesse contexto está o exercício da advocacia que pode produzir prejuízos por conselhos e pareceres ruinosos. Essa tendência tem suporte na atenção que os legisladores e os tribunais brasileiros têm em estabelecer um padrão mínimo no exercício da atividade profissional com o objetivo de proteger o interesse coletivo.
2.2.3. Responsabilidade pela desobediência às instruções do constituinte
O advogado, no exercício de sua atividade profissional, atua com independência técnica na condução do processo que busca satisfazer os interesses de seu cliente. Entretanto, essa independência não pode colidir ou exceder os poderes que lhe foram conferidos e, muito menos, pode ser utilizada para prejudicá-lo. Já vimos que o advogado pode recusar a causa sem dever de justificativa se não concordar com as instruções do constituinte. A desobediência às instruções do constituinte pode causar prejuízos ao mandante, e se provada, responderá por eles o profissional que deu causa, como prescreve Paulo Luiz Neto Lôbo (1994): "Incorre em responsabilidade civil o advogado que, imprudentemente, não segue as recomendações de seu cliente nem lhe pede instruções para as seguir" (p. 120). Aguiar Dias, segundo Lôbo (1995), segue na mesma direção: "A qualidade do advogado não lhe dá direito a dispor dos direitos alheios" (p. 297).
São diversas as possibilidades do advogado que, se afastando das instruções do seu cliente, pode causar-lhe danos. Porém, a mais comum é a transação realizada em desconformidade com a vontade do constituinte. Sérgio Novais Dias (1998), transcrevendo obra de Carvalho Santos, cita antiga decisão de juiz paulista que condenou advogado a compor os danos causados a seu cliente quando, à revelia deste, desatendendo à sua orientação, resolveu firmar acordo para evitar a falência da empresa devedora, recebendo 25% do crédito. Ocorre que seu cliente lhe havia recomendado que somente aceitaria o mínimo de 60% do crédito, pois, caso contrário, era para deixar que a falência fosse decretada (p. 38).
Os tribunais seguem o mesmo entendimento com o julgado que trazemos à baila:
Advogado – Transação. Renúncia de parte substancial de crédito do cliente sem o seu consentimento. Responsabilidade pelo dano. Indenização que deve corresponder à diferença entre o montante recebido e o que teria direito o autor - A desobediência às instruções do constituinte, seja variando as que foram traçadas, seja excedendo os poderes ou utilizando os concedidos em sentido prejudicial ao cliente é fonte de responsabilidade do advogado (TJSP - 14ª C. - Ap. Rel. Ruiter Oliva - j. 13.6.95. - JTJ-LEX 172/9).
Mais grave os casos a seguir, quando o advogado se apropriou de valores indenizatórios que eram de seu cliente:
Ordinária. Indenização. Advogado. Patrocínio em ação acidentária. Valores recebidos. Diferença a ser repassada. Existência demonstrada. Obrigação de compor o prejuízo. Injusto envolvimento do cliente no escândalo do INSS. Dano moral caracterizado. Dever reparatório que se impõe. Recurso improvido. Exibe conduta contraria à lei e à ética profissional o advogado que, no exercício do mandado que lhe foi confiado, para defesa dos interesses de seu constituinte em ação acidentária, recebe a indenização respectiva e não transfere ao patrocinado a integralidade desse valor. Identificada à diferença, é ela devida ao cliente, caracterizando-se aí a obrigação do advogado de compor o prejuízo por ele causado, cuja importância exige adequada atualização, tanto mais se transcorrido longo tempo. Por outro lado, se a causa, sob patrocínio do advogado acabou sendo colocada - até porque ele próprio o foi - no bojo do conhecido escândalo de desfalques no INSS, envolvendo de forma injusta o nome do cliente e autor dessa ação, caracterizado também está o dano moral sofrido, pela agressão à esfera íntima, a ocasionar dor, espanto, vergonha e exposição ao vexame público, que igualmente deve ser reparado, sendo certo, ademais, ser incabível a alegação de que tal diferença referia-se a honorários advocatícios contratados, sobretudo quando ao mencionado cliente foi deferida a gratuidade de justiça, o que presume inexistir dito encargo, face ao que dispõe a Lei nº 1.060/50 (TJRJ, Ap.Cív. 1264/98, Reg. 21/09/98 - Fls. 50852/50870 - Unân - Des. ANTONIO EDUARDO F. DUARTE - Julg: 06/08/98).
Ação de indenização por danos morais e materiais. Mandato mal cumprido por advogada que se apossa e não presta contas de dinheiro pertencente aos clientes, dentre os quais, uma menor. Equívocos da sentença, por incorreta observação das variações do padrão monetário brasileiro. Provimento da apelação. Providências junto às promotorias criminais da comarca de Pelotas. (5fls.) (Apelação Cível nº 70000481762, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 18/05/2000).
Resta incontroverso que o advogado desobediente em relação às instruções de seu constituinte deverá indenizá-lo, se por este motivo lhe trouxe prejuízo. Nunca é demais recordar que o advogado não está obrigado a aceitar a demanda, e se nela estiver atuando, poderá renunciar o mandato, respeitando a forma e o prazo legal, se discordar das orientações de seu cliente para proteger sua ética profissional e independência técnica.
2.2.4. Responsabilidade pela perda de uma chance
A perda de uma chance é o erro de direito que o advogado comete por não ser atento, diligente, no seu exercício profissional. Neste caso, o cliente é privado de seu direito ou tem sua pretensão prejudicada pela má atuação de seu mandatário. É uma forma muito peculiar das outras situações que envolvem perdas e danos, porque nunca – ou dificilmente – será visualizado, com certeza, o resultado do julgamento se o ato fosse praticado. "Chance" é uma palavra de origem francesa que significa "ocasião favorável, oportunidade".
Para Sérgio Novais Dias (1999), a perda de uma chance é:
a responsabilidade pela perda não de um bem presente, mas de um bem futuro, correspondente a chance de obtenção de provimento judicial favorável. Na perda de uma chance, no caso específico da atuação do advogado, nunca se saberá qual seria realmente a decisão do órgão jurisdicional que, por falha do advogado, deixou, para sempre, de apreciar a pretensão de seu cliente (p. 13).
Silvio de Salvo Venosa (2005) também se manifesta com proficiência:
Na esfera da responsabilidade do advogado, em muitas oportunidades vem à baila sua desídia ou retardamento na propositura de uma ação judicial; perda do prazo de contestar ou recorrer etc. Nesse campo tem aplicação a denominada perda de chance, matéria que por si só enseja um estudo monográfico. Sob esse prisma, deve haver cuidado ao se propiciar a indenização ao cliente ou mandante judicial (p. 2).
A perda de uma chance é a causa culposa mais freqüente de produzir danos ao cliente que o advogado comete, e por esse motivo nos remete a um profundo estudo, mesmo que com raras posições doutrinárias e poucas jurisprudenciais.
As hipóteses em que o advogado pode perder uma oportunidade em favor de seu cliente são inúmeras. No presente estudo, examinamos apenas os principais casos. É como relata Sérgio Novais Dias (1999):
A perda de uma chance não ocorre somente nas hipóteses de perda de prazo de interposição de recurso, sucede, por exemplo, no esquecimento de propor uma ação antes do prazo decadencial ou prescricional, perdendo, então, o cliente a chance de ver a pretensão da ação examinada pelo Poder Judiciário. Verifica-se, ainda, quando o advogado deixa de formular pedido essencial para o alcance da pretensão de seu cliente, ou de promover prova indispensável para o acolhimento de determinado pedido, ou ainda quando não promove a restauração de autos, ou quando não apresenta contra-razões de recurso, ou não comparece a sessão de julgamento no tribunal para a sustentação oral, ou, em determinadas circunstancias não propõe ação rescisória. Cada uma dessas situações tem suas características e peculiaridades que exigem exame específico (p. 14).
Outro aspecto que deve ser analisado na perda de oportunidade que o cliente sofre por culpa de seu mandatário é o fundamento do quantum indenizatório. A medida do quantum indenizatório em uma eventual condenação do advogado que perdeu uma chance não possui relação direta com a pretensão do cliente que não foi examinada, pois não há certeza de decisão favorável e dependerá sempre da análise do caso.
Esse é o posicionamento de Silvio Venosa (2005):
Na perda da chance por culpa do advogado o que se indeniza é a negativa de possibilidade de o constituinte ter o seu processo apreciado pelo Judiciário, e não o valor que eventualmente esse processo poderia lhe propiciar a final. O mesmo se diga quando a parte se vê obstada de o seu processo ser revisto em segundo grau porque o advogado deixa de interpor recurso: O prejuízo da parte consiste na perda da possibilidade de ver apreciado o mérito da causa na instância superior. Não se configurando qualquer causa de exclusão de responsabilidade civil do advogado, impõe-se a procedência do pedido indenizatório, com fixação da indenização através de arbitramento em liquidação de sentença, levando-se em conta que o dano corresponde apenas a perda de uma chance (TJPR, Ap. 833, Rel. Des. Carlos Hoffmann, 5ª Câmara Cível, publ. 22/04/1996) (p. 3).
Sérgio Novais Dias (1999) segue no mesmo caminho:
Nos casos de perda de uma chance o advogado é responsável pelos danos sofridos pelo cliente desde que exista uma relação de causalidade adequada entre o ato ou a omissão do advogado e o dano, ou seja, que, em termos de probabilidade, num prognóstico feito a posteriori os danos tenham decorrido necessariamente, direta e imediatamente, da falha cometida pelo advogado (p. 15).
O trato do fundamento do quantum indenizatório traz inúmeras dificuldades que somente poderão ser esclarecidas no caso em concreto. Há casos em que a pretensão do autor frente ao órgão julgador é plenamente favorável, em outros seu insucesso é absolutamente provável. Embora a doutrina seja escassa, quando requeridos, os tribunais têm dado respostas neste sentido, e trazemos a baila alguns julgados que demonstram essas possibilidades extremas, que variam da restituição dos honorários até a obrigação de indenizar a totalidade da pretensão do autor:
Contrato - Rescisão - Honorários de advogado - Excessiva demora da mandatária na propositura da demanda trabalhista para a qual fora contratada, não obstante a fluência do prazo prescricional - Arquivamento determinado - Negligência da ré configurada - Artigo 87, XVIII, da Lei 4.215/63 - Indenização devida pela perda da chance do autor de ver seu pleito analisado - Rescisão do contrato determinada, condenando-se a vencida ao pagamento de 50 salários mínimos mais despesas processuais e honorários de advogado arbitrados em 15% sobre o valor atualizado da condenação - Recurso parcialmente provido
(1º TACSP, Ap. 0680655-1. 8ª Câmara, Rel. Costa Telles, v.u., j. 23/10/1996).
Responsabilidade Civil - Advogado - Indenizatória ajuizada contra escritório de advocacia por cliente que perdeu demanda - Pretensão ao ressarcimento do prejuízo sofrido com a sucumbência sob a alegação de que houve erro inescusável do causídico ao não argüir prescrição da ação - Acolhimento - Indenizatória procedente - Sentença mantida - voto vencido
(1º TACSP - 2ª C. - Ap. - Rel. Jobina Rabello - JTACSP - RT 123/45).
Responsabilidade Civil. Advogado. Patrocínio em Medida Cautelar. Não comparecimento à audiência. Deserção do recurso por falta de preparo. Custas adiantadas. Negligencia configurada. Dever de indenizar. Restituição dos valores recebidos. Limitação na hipótese. Procedência parcial do pedido. Recurso provido em parte. Age com negligência no exercício do mandato o advogado que, em medida cautelar de arrolamento de bens, não comparece à audiência designada e deixa ocorrer, por falta de preparo, a deserção do recurso interposto, apesar de ter recebido, adiantadamente, a importância total das custas relativas à causa sob seu patrocínio. Em tal hipótese, considerando a espécie do processo patrocinado, de nítida característica preparatória, cuja possibilidade jurídica de reconhecimento do direito de seu cliente dependeria, então, da propositura de ação principal, o dever de indenizar do advogado, tendo-se em conta que é de meio a obrigação profissional que assume, limita-se a restituir os valores recebidos à título de honorários e de adiantamento das custas, não podendo, por conseguinte, abranger a reparação de suposto prejuízo decorrente da ação que restou inexitosa pela atuação negligente, visto que não é nesta que se faz presente o provável direito maculado e caracterizador de tal prejuízo, mas sim na ação principal
(TJRJ-Ap. Cív. 590. /97 - Reg. 18/07/97 - Fls.21023/21032-Unân.-DES. ANTONIO EDUARDO F. DUARTE - Julg: 29/04/97).
Indenização - Responsabilidade Civil - Propositura contra advogado que mal defendera os interesses dos autores em Juízo - Improcedência - Hipótese em que o mesmo se sujeita, eventualmente, à sanção disciplinar, mas não civil, mormente quando devolveu o que recebera a título de honorários - Pedido improcedente
(TJSP - 1ª C. - Ap. 113.443-1 - Rel. Luiz de Azevedo - j. 15.02.90).
Nesse sentido, devemos entender que o estudo da perda de uma chance fica diretamente vinculado à problemática da incerteza do resultado das decisões judiciais, pois é impossível prever com absoluta certeza em todos os casos o resultado do julgamento; aliás, a incerteza é constante nas demandas judiciais.
A interpretação das normas não é única e absoluta, a sociedade evolui e o direito é "levado a reboque". Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 400 que impossibilita recurso extraordinário de decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor. Por outro lado, devemos entender que a doutrina e a jurisprudência são referências essenciais para os advogados, possibilitando a realização de um juízo de resultado provável.
De forma intocável, Sérgio Novais Dias (1999) prescreve:
É impossível prever, com absoluta certeza em todos os casos, o resultado de um julgamento, porque o ato de julgar envolve um juízo de valor e há sempre a irredutível margem de livre apreciação por parte do juiz...Isso não quer dizer que as decisões judiciais sejam absolutamente incertas e que, portanto, não há como fazer um juízo de probabilidade do resultado da decisão que não ocorreu, na perda de uma chance. Não se deseja, nem espera que as decisões sejam absurdas, destemperadas e totalmente destoantes da melhor doutrina e jurisprudência. Na avaliação da probabilidade do julgamento, deve-se contar sempre com decisões razoáveis (p. 47-48).
No mesmo sentido, segue José de Aguiar Dias (1995), explicando a natureza do dano na perda de uma chance:
Confundiram o an debeatur e o quantum debeatur, por má informação sobre o conceito do dano. Sem dúvida que este deve ser certo e provado desde loga na ação. Mas o dano, na espécie, era a perda de um direito, o de ver a coisa julgada em instancia superior. Se a vitória não podia ser afirmada, também o insucesso não o podia. E este, ainda que não ocorresse, correspondia a um quantum debeatur, o que muda muitas vezes do que supõem os que desconhecem a distinção, pois, ainda que ganha a causa, a liquidação pode ser negativa, isto é, não apresentar valor pecuniário (p. 297).
Quanto à demonstração judicial na perda de uma chance, caberá ao cliente provar (responsabilidade subjetiva do profissional liberal, CDC, art. 14, § 4º) que seu advogado deixou de promover determinado ato que impediu o exame judicial que pretendia, e agindo assim lhe produziu prejuízos que poderão ser morais e/ou materiais, como veremos adiante.
O pedido não formulado é uma falha profissional do advogado que impossibilita a apreciação judicial da pretensão do cliente. Cabe ao profissional, por sua formação, identificar, diante dos fatos apresentados pelo cliente, todos os pedidos possíveis para assegurar as vantagens que a lei autoriza no caso. O mesmo vale para o advogado do cliente-réu que não formula requerimento que deveria ser feito na defesa. Vejamos julgado abaixo:
Apelação cível. Ação ordinária de responsabilidade civil. Advogado que recebe citação em nome de seus clientes. Omissão e falta de zelo na defesa dos interesses e direitos dos outorgantes. Se recebida a citação em nome dos mesmos, e entendendo que não era mais seu procurador, seu dever era imediatamente comunicar aos clientes e a seus novos procuradores. Pretendem as apelantes obter o que não foi objeto do pedido inicial, importando em infringência ao art. 294, do CPC. Desprovimento de ambos os recursos
(TJRJ, Ap. Cív. 7931. /96 - Reg. 12/12/97 - Fls.39065/39069 - Unân.- Des. JOSÉ PIMENTEL MARQUES - Julg: 30/09/97).
A não-interposição de recurso é a perda de uma chance com peculiaridades próprias, porque, em determinados casos, havendo poucas chances de êxito no recurso, frente à doutrina e jurisprudência, sua não-interposição implica uma relação de custo-benefício favorável ao cliente que não será onerado com mais custas e honorários; de outra banda, na maioria dos casos, a não-interposição impede a reapreciação do interesses do cliente da decisão do juiz ou tribunal a quo.
Em ambos os casos, nunca se saberá qual seria a decisão da instância superior, o que possibilita uma ação indenizatória por parte do cliente por ter perdido uma oportunidade que a legislação lhe faculta. Já o advogado, para evitar uma eventual demanda indenizatória, deverá advertir seu cliente da possibilidade recursal e de suas conseqüências, e se a decisão for de não recorrer, que esta seja formalizada.
Vejamos alguns julgados neste sentido, inclusive do Superior Tribunal de Justiça:
direito civil. responsabilidade civil do advogado. Indenização. Ausência de interposição de recurso ordinário cabível. O advogado que recebe e aceita mandato que veicula poderes para defender o seu constituinte em juízo assume os deveres e responsabilidades inerentes à sua nobre profissão enquanto atuar no patrocínio da causa. A omissão, sem o consentimento prévio do constituinte quanto à interposição, de qualquer recurso ordinário que se impunha necessário para defesa dos interesses do patrocinado, configura-se desídia de todos os outorgados do mandado judicial, quando os poderes foram conferidos para atuação em conjunto ou isoladamente de cada advogado. Recurso especial não conhecido
(Recurso Especial nº 2003/0177102-6, Quarta Turma Cível, Superior Tribunal de Justiça, Ministro CESAR ASFOR ROCHA, julgado em 19/02/2004).
responsabilidade civil. advogado. 1. Profissional constituído pelos autores, a fim de defendê-los em ação reivindicatória contra eles intentada. Atuação desidiosa do bacharel, não mantendo seus constituintes a par do andamento do feito, deixando de apelar contra sentença desfavorável, bem como omitindo-se em fase posterior do processo. confirmação da sentença que condenou-o a indenizar os prejuízos advindos aos autores. 2. Dano moral. Reconhecimento de que os transtornos padecidos pelos autores foram primitivamente originados pela ma conduta profissional do réu-apelante. Redução do ‘quantum’ indenizatório para 25sm. Apelo provido em parte
(Apelação Cível n. 70000290536, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Lúcio Merg, Julgado em 01/06/2000).
ação ordinária de indenização por inexecução de obrigação contratual ação movida pelo demandante contra ex-advogado a quem outorgara mandato para defesa, em processo crime. Sentença penal condenatória. Processo de liquidação da indenização. Sentença de procedência. Inexistência de recurso. Alegação de desídia profissional pela não interposição de recurso. Sentença de improcedência. Nega-se provimento. Prova idônea e suficiente, no sentido de que o demandante foi aconselhado pelo demandado a não recorrer e anuiu com a orientação. Razoabilidade de tal procedimento ou orientação profissional, ante às circunstâncias do caso concreto
(Apelação Cível Nº 596191353, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Hanke, Julgado em 17/12/1996).
Já nos casos de não-interposição de recursos de natureza extraordinária, como os recursos para o Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal Justiça e Tribunal Superior do Trabalho, respectivamente, recurso extraordinário, recurso especial e recurso de revista, que exigem requisitos mais rigorosos para seu processamento, o cliente deverá provar que este recurso era viável e sua pretensão deixou de ser apreciada em última instância por culpa de seu advogado.
É como explica Sérgio Novais Dias (1999):
Nestes casos, caberá ao cliente, ao alegar a ocorrência de dano por falta desse recurso, demonstrar que este tinha viabilidade, porque a situação permitia o enquadramento da hipótese num dos permissivos legais. Caso contrário, dano não houve em face da ausência de recurso, porque, não sendo ele cabível, o tribunal que por último proferiu a decisão era, à luz da lei processual, a última instância para aquela decisão (p. 77).
A falta de propositura de ação judicial que resulta na prescrição ou decadência do direito do cliente é a situação mais evidente da perda de uma chance. Se o cliente provar que contratou o profissional e entregou a documentação e as informações antes do prazo que impossibilitou a apreciação de sua pretensão, é evidente a falha de seu procurador-mandatário, não restando dúvida quanto ao dever de indenizar seu mandante, e nesta hipótese de perda de uma chance é comum a condenação ser equivalente ao desejo originário do cliente, mas cada caso deve ser analisado individualmente.
Seguem julgados que reforçam esse entendimento:
Responsabilidade Civil - Advogado - Negligência na atuação profissional. Caracterização. Ação trabalhista proposta só após o decurso do prazo de prescrição. Impossibilidade, entretanto, de avaliar o direito do reclamante. Indenização pela perda da chance de ver o pleito examinado pelo Judiciário. Modalidade de dano moral. Recurso provido para julgar procedente a ação
(1º TACIVIL - 8ª C.; Ap. n.º 680.655-1 Martinópolis; Rel. Juiz José Araldo da Costa Teles; j. 23.10.1996).
Responsabilidade civil. Patrocínio de causa trabalhista por advogado que permite ser decretada prescrição. Dever de indenizar o cliente. Há reciprocidade de culpas se o cliente, a seu turno, não entrega toda a documentação exigida. 1. O fato, só por si, de o cliente não ter entregue toda a documentação pedida pela advogada, não a exime também de responsabilidade em face da prescrição ocorrida, porque a prova documental poderia ter sido complementada durante a instrução, sendo certo que o direito processual civil é fonte subsidiaria do direito trabalhista, não tendo, ademais, a causídica avisado seu cliente da possibilidade de ver sua ação prescrita. Reconhece-se a culpa recíproca, mas condena-se a advogada a pagar indenização apenas por dano moral, em face da perda da expectativa de ver o autor julgada sua pretensão trabalhista. 2. Impossibilitada a condenação pelos danos materiais, de difícil fixação, uma vez que não se pode afirmar que o autor viesse a ganhar a ação trabalhista, fixa-se o valor do dano moral em 50 s.m. vigentes à época do pagamento e se aplica a regra do art. 21, processual, quanto à sucumbência
(TJRJ-Ap. Cív. 3933. /95 - Reg. 01/11/95 - Fls. 28667/28673 - Unân. - DES. GUSTAVO KUHL LEITE - Julg: 15/08/95).
A omissão na produção de provas também pode prejudicar o cliente, na medida em que uma prova essencial deixa de ser produzida por omissão do advogado e o mandante vê prejudicada a justa decisão de sua demanda. São situações específicas em que somente será identificado o dano pela inércia do advogado na profunda análise do caso concreto e se a prova não produzida era fundamental na decisão do feito.
Sergio Novaes Dias (1999) explica a omissão do advogado na produção de provas:
Inúmeras são as situações em que o advogado pode deixar de produzir provas consideradas essenciais e seu cliente ver julgada contra si à pretensão, vindo então a acusá-lo de ter promovido a perda de uma chance de ter a pretensão decidida de maneira diferente, se a prova houvesse sido produzida (p. 75).
As contra-razões significam uma oportunidade que, se não aproveitada pelo advogado, pode produzir graves prejuízos a seu cliente, na medida em que impossibilita a defesa no recurso, evitando que este seja julgado sem contraditório ou que se apresentem documentos novos essenciais para o resultado da demanda. Indiscutivelmente, a ausência de contra-razões é menos grave que a falta de contestação ou de interposição do próprio recurso, mas pode, dependendo do caso, ocasionar danos. É como prescreve Sérgio Novais Dias (1999): "Caberá ao juiz da ação indenizatória fazer uma avaliação cuidadosa, em cada caso, para perceber em que medida a ausência de contra-razões implicou mesmo o prejuízo ao cliente" (p. 79).
Dito isto, passa-se à hipótese da responsabilidade do advogado pelo extravio dos autos.
2.2.5. Responsabilidade pelo extravio dos autos
A guarda dos autos é responsabilidade do profissional que os retirou do cartório, e no caso de extravio compete ao advogado promover sua restauração, mesmo que não tenha dado causa. Na hipótese de extravio, caberá ao advogado comunicar o juiz e a OAB de tal ocorrência, com a devida explicação, para evitar as medidas previstas no artigo 196, parágrafo único do Código de Processo Civil. A responsabilidade por tal fato está fundamentada no artigo 1.069 do CPC, in verbis: "Art. 1069. Quem houver dado causa ao desaparecimento dos autos responderá pelas custas da restauração e honorários de advogado, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal em que incorrer".
Nelson Nery Junior (2006) esclarece esse entendimento:
O desaparecimento dos autos, se provocado por dolo ou culpa de alguém, pode ser subsumível ao tipo do artigo 356 do Código Penal, e os danos civis dele decorrentes podem ensejar, do responsável pelo desaparecimento, obrigação de indenizar pelo artigo 186 do Código Civil, sem prejuízo da sanção processual que o juiz pode aplicar ao faltoso, em virtude da litigância de má-fé (p. 1.044).
De outra banda, podem estar relacionados à demora da prestação jurisdicional, como esclarece Sérgio Novais Dias (1999): "Quando, porém, o processo é, por hipótese, extinto em face do longo tempo em que os autos estiveram extraviados, porque o autor não promoveu os autos que lhe competiam, poderá o cliente requerer do advogado uma indenização" (p. 76).
O extravio dos autos pode impossibilitar a apreciação da ação proposta, o que configura, de certa forma, a perda de uma chance em que o juiz, ao analisar a proposta indenizatória, atuará presumidamente em favor do cliente, pois compete ao advogado a restituição dos autos, bem como produzir provas do provável resultado da decisão que não ocorreu.
2.2.6. Responsabilidade pela quebra do dever de sigilo profissional
O dever de sigilo na relação cliente-advogado é uma obrigação ao desempenho da profissão. A sua violação é uma infração ética, prevista no artigo 34, inciso VII, do Estatuto da Advocacia: "violar, sem justa causa, sigilo profissional"; e Penal, conforme artigo 154 do Código Penal: "Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem".
Também poderá ser acionado e responderá civilmente o advogado que divulgar as informações que lhe foram confiadas no exercício profissional, pois são inúmeras as situações em que o cliente pode vir a suportar prejuízos pela quebra do sigilo. Imaginemos um advogado contratado para orientar uma transação societária de grande vulto, em que cada informação pode fazer com que as ações da empresa em questão subam ou caiam significativamente num curto espaço de tempo, o que, por vezes, pode até inviabilizar o negócio, ou alertar outros interessados com o vazamento de informações a respeito do negócio. É como prescreve José de Aguiar Dias (1995): "O segredo profissional é imposição de ordem pública, e o advogado, como qualquer outro membro das profissões liberais, responde pela sua infração" (p. 351).
Silvio Venosa (2005) explica:
O segredo profissional é outra imposição ao advogado, como em outras profissões liberais. Assim, responde perante o cliente se divulgar fatos que soube em razão da profissão e, dessa forma, acarretou prejuízos à parte. Nesse sentido, é direito do advogado recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional (artigo 7º, inciso XIX, da Lei n. 8906/94) (p. 4).
Comungando desse entendimento, segue Alex Ribeiro (2003):
Muitas são as confissões feitas ao advogado. Culpas e responsabilidades são assumidas. Ouve-as, atentamente o advogado. Não pode, jamais, torná-las pública, à míngua das recomendações do cliente e das próprias disposições ético-profissionais. Se o fizer, será indisputavelmente responsabilizado pelos danos causados, ainda que de cunho estritamente moral (p. 16).
Cabe salientar em nosso estudo que as violações das normas contidas no Estatuto do Advogado e da Ordem dos Advogados do Brasil, por si só, não configuram responsabilidade civil do advogado perante seu cliente. É necessário o procedimento adequado, para verificar a culpa, a existência do dano e o nexo causal dessa relação obrigacional, para que a pretensão indenizatória do cliente seja reconhecida. Tal procedimento, lembramos, também deve ser adotado no caso de uma eventual pretensão indenizatória por quebra do sigilo profissional.
2.3. A invalidade da cláusula contratual de exclusão de responsabilidade civil
Já analisamos as quatro causas que excluem a responsabilidade civil, quais sejam: culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito e força maior, por eliminarem a relação causal do dano com o suposto agente lesante. De outra banda, no mundo dos contratos, é comum determinados acordos, mesmo que contrários à regra geral – seria, por exemplo, o caso do cliente firmar ajuste com seu advogado isentando este da responsabilidade civil.
Como já vimos, o advogado, como profissional liberal, está vinculado ao nosso código consumerista, e nele consta expressa vedação de acordo que exclui a responsabilidade do fornecedor, bem como de transferi-las para terceiros, vejamos, in verbis:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
Há quem defenda uma situação de limitação da responsabilidade, nunca de exclusão, somente admitida se o cliente for pessoa jurídica, quando o advogado, em demandas vultosas, concordar com a redução de seus honorários, em troca de determinados benefícios, como a limitação de sua responsabilidade civil como profissional contratado. Este é o entendimento de Sérgio Novais Dias (1999): "Somente em situações justificáveis, em se tratando de cliente de pessoa jurídica, poderá haver cláusula contratual de limitação da responsabilidade civil do advogado" (p. 87).
Em quase todo estudo nos reportamos à necessidade da análise do caso concreto, e, neste contexto, uma exceção a open legis, prevista no CDC e acima citada, do advogado pactuar com seu cliente a exclusão da sua responsabilidade civil somente poderá ser analisada verificando-se o caso concreto.
2.4. A pretensão indenizatória do cliente lesado
Verificamos que são inúmeras as situações em que o advogado, no exercício de seu munus, pode vir a causar prejuízos a seu próprio cliente, também analisamos que a responsabilidade civil designa o encargo que alguém tem de reparar os danos resultantes da violação de um dever jurídico estabelecido em contrato ou lei.
De outra banda, concluímos que a relação cliente-advogado é obrigacional, e é nesta relação que consta um dever originário de prestação de serviços; a responsabilidade civil do advogado é um dever jurídico decorrente da violação desta relação obrigacional.
Com proficiência, Sergio Cavalieri (2006) relata:
Se alguém se compromete a prestar serviços profissionais a outrem, assume uma obrigação, um dever jurídico originário. Se não cumprir a obrigação (deixar de prestar os serviços), violará o dever jurídico originário, surgindo daí a responsabilidade, o dever de compor o prejuízo causado pelo não cumprimento da obrigação (p. 24).
Quanto aos danos que o mandatário pode sobrevir a responder, estes poderão ser morais, materiais ou ambos, em face da relação existente, bem como da natureza do serviço prestado, situação somente identificada na análise do caso concreto.
Como esclarece Ênio Santarelli Zuliani (2003):
É preciso escrever que a inexecução de uma obrigação ou falha contratual poderá resultar em prejuízos morais e materiais. O que particulariza o prejuízo não é a relação do direito subjetivo que se rompeu, mas, sim, o efeito da lesão. O próprio Superior Tribunal de Justiça, pela Súmula nº 37, admite a cumulação dos danos materiais e os morais, oriundos do mesmo fato (p. 143).
Vale dizer que o Código Civil faz distinção entre responsabilidade e obrigação (como relatamos acima) no seu artigo 389, in verbis: "Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado".
"As perdas e danos incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito direto e imediato da inexecução", como prescreve Nelson Nery Junior (2006, p. 393). Entretanto, não devemos esquecer que os fundamentos legais norteadores para a ação ressarcitória estão previstos nos artigos 186 e 927 do mesmo diploma.
O grande problema é que na maioria dos casos de responsabilidade civil do advogado, nunca se saberá efetivamente o resultado da demanda judicial. Essa característica peculiar dificulta a quantificação das perdas e danos. Por isso, na maioria dos julgados pela perda de uma chance, as indenizações têm fundamentação no dano moral pela impossibilidade do cliente ver apreciada sua pretensão por falha de seu advogado.
Outro aspecto a ser analisado na pretensão indenizatória do cliente é a teoria da causalidade adequada. O cliente, além de provar a culpa do profissional na inexecução dos serviços, deve identificar a relação causal entre os prejuízos e o ato profissional falho, como relata Pontes de Miranda (1981): "as perdas e danos não se estendem ao que está fora da relação de causalidade" (p. 184).
Sergio Novais Dias (1999) explica a situação com ênfase nos casos de perda de uma chance:
Os danos que o cliente pode sofrer correspondem àquilo que efetivamente teve reduzido em seu patrimônio ou aquilo que deixou de ganhar. Constatada a existência do dano, bem como a falta do advogado que causou a perda de uma chance, o estudo que se segue, importante e complexo, é o exame do nexo de causalidade. Caberá ao juiz decidir se o dano ocorrido decorreu realmente – num juízo de probabilidade – do ato ou omissão do advogado (p. 67).
Quanto ao procedimento judicial reparativo, este deverá ser especifico, através de rito ordinário por ato ilícito e/ou por inexecução contratual, respeitando as possibilidades advindas da Lei nº 9.099 de 1995, que prevê o procedimento sumaríssimo para causas de valor limitado, e atendendo aos requisitos que cada caso exige dos inúmeros que analisamos.
Ressaltamos que a fundamentação legal e o trabalho probatório do cliente terão relação direta com o tipo de responsabilidade aplicada, se a obrigação é de meio ou de resultado, o serviço contratado e, em especial, as peculiaridades que todo caso concreto nos apresenta. Além disso, devemos destacar que as características privativas da responsabilidade civil do advogado podem produzir julgados heterogêneos em casos análogos, frutos da escassa doutrina e jurisprudência da matéria em questão.