ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO JUIZO DE DIREITO DA PRIMEIRA VARA DA COMARCA DE BALSAS
REF:. PROCESSO N.º 639/01
AÇÃO:. EXECUÇÃO FISCAL -
EXEQUENTE: CREA/MA
EXECUTADO: C.A. Perfuração de Poços Artesianos Ltda
CARTÓRIO DO 1º OFICIO
VISTOS ETC.
Trata-se de Ação de Execução Fiscal ajuizado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Maranhão CREA/Ma - contra C.A. Perfuração de Poços Artesianos Ltda., ambos qualificados nos autos, cujo montante não supera R$ 1.000,00 (mil reais).
É cediço que o processo, como uma relação jurídica que é, reclama certos requisitos para se formar e se desenvolver validamente.
Necessário se faz, também, para que se obtenha a prestação jurisdicional através do direito
de ação, o atendimento a determinadas condições, quais sejam: a possibilidade jurídica do pedido, a legitimidade de parte para a causa e o interesse jurídico na tutela jurisdicional, localizando-se este não apenas na necessidade, mas também - e principalmente - na utilidade do processo como remédio apto à aplicação do direito objetivo no caso concreto.
In casu, tenho que o enxequete, utilizando-se do Poder Judiciário, com vista à cobrança judicial de dívidas de valores visivelmente acanhados, acaba subjulgando a atividade jurisdicional do Estado, vez que ocupa desnecessariamente o seu aparelho judicial, de forma a tornar patente o desequilíbrio na relação custo-benefício, em face do dispêndio que acaba ocorrendo, com seu próprio funcionamento, pelo que não há que se permitir perdure tais situações.
Nesse sentido, em caso semelhante, manifestou com a costumeira desenvoltura e singular objetividade o ilustre Juiz Federal José Carlos do Vale Madeira, cuja sentença transcreve-se, verbis:
"Cuida-se à espécie de Ação de Execução Fiscal cujo valor não ultrapassa a importância de R$ 1.000,00 (mil reais).
Em casos assim a movimentação do aparelho jurisdicional deve ser contida, pois ausente ontologicamente qualquer utilidade prática. E mais: o princípio econômico, em uma visão essencialmente pragmática, depõe contra a própria angularização (formação) do
processo, de sorte que sua extinção, com desprezo à questão
de mérito que lhe é subjacente, é medida necessária.
No plano doutrinário, convém anotar, o entendimento supradistinguido não se apresente teratológico, desde que o moderno conceito de interesse processual (elemento da lide) assenta-se precisamente na idéia de utilidade do provimento pretendido do Estado Juiz (binômio custo-benefício). Assim, o abalizado pronunciamento de CÂNDIDO JOSÉ DINAMARCO:
"Prometendo exercer a jurisdição, o Estado faz antes de tudo com vista a seu próprio interesse de pacificação social e manutenção de ordem político-jurídica; ele o faz então, limitadamente aos casos em que, segundo seus critérios insondáveis e soberanos, a utilidade do provimento esperada possa ser de maior significado social e político que o custo social do processo" (Execução civil, 3º ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1993, p.397).
E mais:
O sistema processual oferece oportunidades precoces para a extinção do processo quando uma das condições falta (logo ao nascedouro, sempre que possível), com vista a evitar não
só a prolação de provimentos ineficazes, dispensáveis ou mesmo injustos, como ainda a desestimular a formação de processos ou sua permanência, se indevidos (CPC, art. 267, esp. inc.I c/c art. 295, arts 616, 618 etc.).
A finalidade com que a ordem jurídica estabelece tais requisitos é anunciar, sem levar ainda em conta a posição dos possíveis litigantes perante a relação jurídico-substancial a ser posta em juízo (legitimidade adcausam), que o Estado não se dispõe a dar o provimento jurisdicional, quando em concreto ele não seja capaz de trazer uma utilidade a quem o demanda.
A utilidade, conforme investigações bem sucedidas em sede de teoria geral do direito, é que caracteriza o interesse" (op. cit., p. 398).
Perfilhando, por assim dizer, esse entendimento pragmático, o
Estado-Administração vem emprestando significativa contribuição ao Poder Judiciário, com vista a torná-lo menos burocrático, e, assim, mais dinâmico e objetivo. Nesse sentido, e dentre outros: 1) o DL 1793/80 autoriza o Poder Executivo a não ajuizar ações em geral, cujo valor originário seja inferior a 20 OTN`s; 2) a Lei 9.469, de 10 de julho de 1997, que convalidou os atos praticados com base na MP 1.561-5, de 15 de maio de 1997, e autoriza a Advocacia-Geral da União e os dirigentes máximos das autarquias, das fundações e das empresas públicas federais a realizarem acordos ou transações, em juízo, para terminar o litígio, nas causas de valor até R$ 50.000,00, a não-propositura de ações e a não-interposição de recursos, assim como "requerimento de extinção das ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos, atualizados, de valor igual ou inferior a R$ 1.000,00, em que interessadas essas entidades na qualidade de autoras, rés, assistentes ou oponentes"; e 3) Portaria n.º 289, de 31 de outubro de 1997, do Ministério da Fazenda, através
da inscrição, como Dívida Ativa da União, de débitos para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$
1.000,00 (mil reais), autorizado também o não ajuizamento das execuções fiscais de débito para com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Assim, o próprio Estado-Administração constata, ainda que tardiamente e sem amplitude necessária, que a provocação da função jurisdicional não pode ser feita inutilmente.
Deve a Administração, no entanto, para não perder por inteiro os seus créditos de menor expressão econômica, buscar meios diversos daqueles que reclamem a intervenção do Poder Judiciário, criando, p.e., um arcabouço jurídico que, preservando os princípios do contraditório e da ampla defesa, possibilite sua cobrança extrajudicial, bem ainda a realização de acordo ou transações.
De assinalar, finalmente, que o enxequete não suportará nenhum prejuízo processualmente
relevante, ante a extinção do processo em debate, sabido que
somente a sentença de mérito é alcançada pelo fenômeno da coisa julgada material, restando sempre aberta a possibilidade do crédito ser cobrado - o direito creditório, à larga evidencia, permanece íntegro - em outra oportunidade, v.g, quando, após o surgimento de outros créditos seja alcançado mediante singela operação aritmética, valor que não se mostre antieconômico. Nesse caso, o Exeqüente cuidará do ajuizamento de nova ação, veiculando título originariamente exibido no processo arquivado sem conhecimento da questão de fundo (LEF 28 c/c CPC 268).
ANTE O EXPOSTO, julgo o Exeqüente carecedor de ação (CPC 267 VI c/c LEF, 1º).
Custas processuais e honorários advocatícios indevidos.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Exaurido o prazo de recurso voluntário, e não havendo a correspondente interposição, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.
Imperatriz, 17 de Agosto de 1998
JOSÉ CARLOS DO VALE MADEIRA
JUIZ FEDERAL
Sobre o tema, igualmente já se manifestou o eg. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em acórdão da lavra do eminente Juiz Tourinho Neto que,
em similar linha de raciocínio deu origem a seguinte ementa:
"PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - QUANTIA IRRISÓRIA - I- Se o interesse econômico não existe, por ser o valor da execução irrisório, não pode o credor exercitar a jurisdição. II- Ao impedir a execução de quantias irrisórias, não está o Juiz tendo simpatia pelo devedor, característica, não dizer de lhering, de épocas de decadência, e sim pensando em milhares de cidadãos que não podem ter os seus direitos apreciados porque o Judiciário está assoberbado de questões, e, letárgico, não tem como resolvê-las. III- Os Conselhos profissionais precisam entender que a Justiça Federal não é um órgão cobrador, que deve localizar o devedor, diligenciar se tem bens penhoráveis e cobrar qualquer tostão. (TRF 1ª R. AC 01000401655-DF-3ª T. - Rel. Juiz Tourinho Neto - DJU 24.10.1997)".
Ressalte-se, ainda, que em manifesto reconhecimento do real custo do funcionamento da atividade jurisdicional, e com a finalidade de evitar o seu
inútil funcionamento, é que restou sancionada a Lei 9.441, de 15/03/97, que extinguiu créditos oriundos de contribuições arrecadadas pelo Instituto Nacional de Seguro Social-INSS, cujo valor: I - Total das inscrições em
Dívida Ativa, efetuadas, até 30/11/96, relativamente ao mesmo devedor, seja igual ou inferior a R$ 500,00 (quinhentos reais); e II - Por lançamento feito até 30/11/96, decorrente de notificação ou auto de infração não inscrito em Dívida Ativa, seja igual ou inferior a R$ 500,00 (quinhentos reais).
Desta forma, tenho que, na hipótese dos autos, ausentes se acha uma das condições essenciais a demonstração da idoneidade da pretensão objetivo da atividade jurisdicional, qual seja, o interesse de agir.
Com estas razões, na esteira dos abalizados julgados, acima mencionados, julgo o Exeqüente carecedor da ação, e declaro extinto o processo sem julgamento do mérito, com fulcro no artigo 267, inciso VI, do CPC c/c 1º, da Lei de Execução Fiscal.
Transcorrido in albis o prazo de recurso voluntário, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
- R. I.
Balsas, 21 de março de 2001
Sebastião Joaquim Lima Bonfim
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Juiz de Direito da 1ª Vara