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Incorporação imobiliária:

sentença em ação civil pública contra cláusulas ilegais

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Agenda 11/11/2005 às 00:00

2. DO MÉRITO

Acolho a alegação do autor de publicidade enganosa, sob o fundamento de que o anúncio das vendas dos imóveis representou falsa idéia de que pagando as parcelas anunciadas teriam o imóvel adquirido quitado, sem acréscimos ao final, bem como reconheço a prática abusiva na cobrança de valores excedentes às cem (100) parcelas contratadas.

Como se vê, o folheto de promoção de vendas acostado aos autos à fl. 204 anuncia:

"Compre o seu apartamento e pague prestação de terreno!"

E mais abaixo:

"Pequena entrada e prestações de 2,95 Salários mínimos!"

A publicidade enganosa, nos termos do art. 37, §§ 1º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, acoplada à prática abusiva prevista no art. 39, XI do mesmo estatuto*, caracteriza-se no ato de

não conter indicação de que haja valor residual no pré-contrato nos campos "condições de venda" e "forma de pagamento do saldo", bem como inexistente em todo o documento e posterior cobrança de valor residual não previsto no contrato.

O art. 52, V do Código de Defesa do Consumidor* dispõe que deverá ser informado prévia e adequadamente a soma do total a pagar, com e sem financiamento, no fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor.

Esta não é regra isolada do Código de Defesa do Consumidor, mas norma também editada pela lei 4.591/64, consoante se extrai do art. 56 e §§ 1º e 2º*.

Praticaram os réus a conduta de publicidade enganosa por omissão capaz de induzir a erro os consumidores acerca do preço dos imóveis ofertados, tanto por meio dos folhetos, quanto na proposta de aquisição firmada, conduta esta expressamente vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, no art. 37, §1º e 3º*.

Com efeito, ADALBERTO PASQUALOTTO define publicidade como "toda forma de comunicação feita no quadro de uma atividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o fim de promover o fornecimento de bens ou de serviços compreendidos os bens imóveis, os direitos e as obrigações."*

Conclui-se que no presente caso, a publicidade ultrapassou a unilateralidade da oferta prescindível de aceitação para produção de efeitos e ganhou importância jurídica própria, representada pela oferta ou proposta consistente no pré-contrato, como geralmente ocorre nos contratos de adesão em massa. Assim, aperfeiçoada a proposta no momento em que os compradores a esta aderiram, a publicidade assumiu feição contratualista e força vinculante.

É a adesão dos consumidores, na qualidade de público alvo que corporificou a prática abusiva com força suficiente para viciar a vontade de qualquer homem de raciocínio mediano, ante a omissão dos valores exorbitantes não contratados, mas cobrados.

Verifica-se que os requeridos, principalmente a ré NOVA CAP, detentora do dever de administração das vendas, descumpriram mais que o dever de informar adequadamente, transgrediram a obrigatoriedade da proposta externada no pré-contrato firmado, o qual integra o contrato de compromisso de compra e venda, posteriormente celebrado, de forma que aquele é gerador deste, pois os consumidores basearam-se nas estipulações preliminares e iniciaram o cumprimento das contraprestações. Concretizando, portanto, o dever de os fornecedores subjugarem-se ao acordo firmado, nos termos do art. 30 do Código de Defesa do Consumidor*.

2.2. DAS CLÁUSULAS RECONHECIDAMENTE ABUSIVAS

A revisão contratual não se trata de violação ao princípio pacta sunt servanda, mas sim de sua relativização, pela aplicação do princípio da proporcionalidade, o que implica em limitações ao princípio da intangibilidade dos contratos, pois os princípios do contrato pós-moderno dentre os quais o da boa-fé objetiva, o da função social da empresa, hoje, normas supra-legais de ordem pública, são, portanto, de observância obrigatória e aplicáveis de ofício.

Ademais, as cláusulas do contrato de financiamento habitacional referem-se a contrato de adesão, os quais estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, de acordo com o artigo 52*. Assim, ocorrendo cláusulas contratuais que violem quaisquer das normas protetivas do consumidor devem ser revistas para corrigir a irregularidade. Entendimento este já sedimentado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos´:

"ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL. COMPETÊNCIA. FORO DE ELEIÇÃO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DOMICÍLIO DO DEVEDOR. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da aplicação do CDC aos contratos de financiamento habitacional, inclusive para determinar a competência do domicílio da parte hiposuficiente na relação jurídica, no caso o mutuário, para a propositura de ação revisional dos referidos contratos, a fim de facilitar o exercício de sua defesa. 2. Recurso especial provido. (RESP571649 - Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI - DJ DATA:27/09/2004 PG:00236)."

Deste modo, passo a identificar as cláusulas que reconheço como abusivas.

cláusula quarta

CLÁUSULA QUARTA:

o preço certo e ajustado e a forma de pagamento da unidade habitacional, ou seja, de cada cota parte será discriminado da seguinte forma:

a)Valor total: R$ 34.300,00 (trinta e quatro mil e trezentos reais);

b) Forma de pagamento:

- sinal e princípio de pagamento de R$ 500,00 (quinhentos reais)

– saldo de R$ 33.800,00 (trinta e três mil, oitocentos reais e centavos), será pago através de 100 (cem) parcelas mensais e sucessivas de R$ 338,00 (trezentos e trinta e oito reais);

- a 1ª parcela vence no dia 24/03/1995 e as demais nos meses subsequentes.

– no mês de dezembro serão pagas 02 (duas) prestações, totalizando 13 (treze) por ano.

Parágrafo Primeiro: Por força da Medida Provisória que implantou o Plano Real, fica convencionado, que o reajuste das parcelas deste contrato será anual, ou no menor espaço de tempo em que a legislação permitir, tomando-se por base a variação do Índice Nacional do Custo de Construção (INCC), coluna 35 editado pela Fundação Getúlio Vargas, base o mês de início do contrato.

Parágrafo Segundo: O saldo devedor será reajustado mensalmente conforme o índice pactuado, mas será aplicado nos termos do parágrafo primeiro desta cláusula.

Parágrafo Terceiro: Caso haja extinção do índice pactuado como indexador, adotar-se-á como parâmetro de atualização do saldo devedor deste contrato, o que vier a medir a variação dos custos e insumos da construção civil, no Estado de Mato Grosso do Sul.

Parágrafo Quarto: As prestações serão reajustadas, de acordo com o índice pactuado no parágrafo primeiro desta cláusula, MAS NÃO PODERÃO SER SUPERIORES ao valor correspondente a 3,0 (Três) salários mínimos, vigentes na data do vencimento, inclusive suas antecipações.

Parágrafo Quinto: O resíduo (diferença entre o valor da prestação prevista na letra "b" e o limite máximo de 3,0 (Três salários mínimos) e ou as eventuais diferenças que forem apuradas mensalmente em decorrência da variação do INCC/FGV em relação ao salário mínimo, será reposto, a favor da VENDEDORA, nas seguintes condições:

Quanto à cobrança de duas parcelas no mês de dezembro (prevista no item b) é abusiva, por ser contrária à estipulação contratual de pagamento em parcelas mensais e sucessivas, de forma que se apresenta como restrição ao direito do consumidor de pagar as parcelas sucessivamente a cada mês, conforme contratado.

É presumível a intenção do fornecedor requerido de tirar proveito do décimo terceiro salário de grande parte dos trabalhadores assalariados no mês de dezembro, contudo a prática é reprovável, pois além da obrigação de prévia informação sobre a periodicidade das prestações (art. 52, IV do CDC)*, sobretudo há imposição legal (art. 51, XIII do CDC) * que não lhe permite alterar as cláusulas contratuais ao seu alvitre, efetivando o repique das parcelas nos meses de dezembro baseado na gratificação natalina, direito que nem todas as pessoas possuem.

Por outro lado, manifesta a vantagem excessiva em prol do fornecedor que exige pagamento extrapolante ao limite fixado para as parcelas mensais com base no teto máximo de determinadas quantias de salário mínimo nos moldes de cada contrato.

Assim, a cláusula que coloca o consumidor em desvantagem em relação ao fornecedor, restringindo até mesmo estipulação prevista no próprio contrato, deve ser extirpada por caracterizar prática abusiva, nos termos dos arts. 39, V e 52, V,* ambos do Código de Defesa do Consumidor, pois a exigência é de que o consumidor tenha conhecimento do total a pagar à vista ou financiado, com o que somente poderá avaliar a conveniência ou não do financiamento.

Procedem as alegações do autor quanto as estipulações dos parágrafos primeiro ao quarto.

Primeiramente, é ilegal a previsão de reajuste anual das parcelas como menciona o contrato (cláusula 4.1), devendo ser expurgada.

As parcelas foram ajustadas em valor fixo, consoante se comprova do item "b" da citada cláusula, não podendo ser reajustadas; todavia, podem ser corrigidas, pois a correção é a atualização da moeda para manutenção do seu real valor aquisitivo e neste sentido não se constitui em um plus, mas, tão somente, na reposição do valor, desde que não exceda o limite fixado nas quantias referentes ao salário mínimo.

Trata-se de contrato de empreitada a preço fixo, nos moldes do art. 55, § 1º da mencionada Lei 4.591/64*, que dispõe sobre condomínios e incorporações imobiliárias.

Por isso, o contrato deve ser analisado em seu conjunto e não em cláusulas isoladas; deve-se atentar para o que dispõe o parágrafo quarto ainda da citada cláusula quatro. É a exata aplicação do que foi estabelecido pelos próprios réus.

De modo que são vedadas eventuais exorbitâncias, as quais se houverem, devem ser desconsideradas e não postergadas ao final das cem parcelas combinadas, sem extrapolar como já dito, os valores percentuais correspondentes ao salário mínimo avençados em cada contrato.

A nulidade da cláusula contratual do compromisso de compra e venda que prevê a cobrança de valor residual é nula face a falta de estipulação contratual no contrato preliminar, nos termos do art. 51, X e XIII do Código de Defesa do Consumidor*.

Atente-se, ainda, para que não haja aplicação cumulativa da correção, utilizando-se o salário mínimo como índice de correção monetária juntamente com o INCC- Índice Nacional da Construção Civil. O salário mínimo não deve ser admitido como índice, mas é possível como limitação a eventual resíduo decorrente da aplicação do citado INCC pactuado.

Oportuna a colocação de VENOSA:

"Com muito cuidado e cautela deve ser concedido qualquer reajuste sob fundamento na excessiva onerosidade ou teoria da imprevisão, utilizada pelos incorporadores, no mais das vezes, como confissão de malícia ou incompetência. Em país de inflação endêmica, a desvalorização da moeda não é elemento conclusivo para a imprevisão, pois não configura surpresa.(...). Contratada a empreitada a preço reajustável, as revisões de preços devem ser feitas somente em épocas convencionadas nos contratos, levando em consideração índices também previamente estipulados". [21]

Do contrato como um todo e no conjunto dos parágrafos da cláusula quarta, o que se observa é que existe um índice de correção pactuado, qual seja o INCC, ressalvada a sua substituição em caso de extinção; todavia, há a segurança para os adquirentes de que as parcelas são divididas em cem (100) unidades mensais que não irão ultrapassar as quantias referentes a um determinado número de salários mínimos fixados em cada contrato.

Portanto, ao contrário do que pretende o autor, são legais as cláusulas de substituição do índice pactuado caso seja extinto o INCC, bem como é legal a estipulação do limite do valor das parcelas ao salário mínimo, até como garantia ao consumidor de limitação à correção monetária do débito, visando assegurar que em caso de eventual desproporção avantajada do índice em relação ao reajuste do salário mínimo, não ultrapasse o teto fixado com base neste.

Para que não pairem dúvidas, a visualização de ter sido corretamente aplicada a correção monetária na forma contratada, deve ser obtida através do cálculo da soma de todo valor pago, dividindo-se pela quantidade de parcelas pagas, verificando-se se cada uma delas, aplicado o INCC como correção monetária, não ultrapassa o número de salários mínimos pactuados em cada contrato.

Assim, conclui-se pela ilegalidade do reajuste anual, devendo ser excluído, aplicando-se tão somente a correção monetária mensal pelo índice ajustado que, repetidamente, é o INCC, plenamente utilizado em contratos de compra e venda de imóvel em fase de construção, desde que o valor final não supere o número de salários mínimos contratados às prestações. De forma que se houver excesso deve ser desconsiderado por não constar do acordo firmado.

Neste sentido o julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

EMENTA: Ação de cobrança. Contrato de consórcio. Bem imóvel. Demanda movida contra o devedor principal e fiadores. Aplicação do CDC. Juros remuneratórios. Capitalização de juros. Correção Monetária. Incidência do Índice Nacional de Custo de Construção - INCC. Encargos de mora. Responsabilidade dos fiadores. Preliminares. Falta de interesse de agir e ausência de pressuposto de constituição válida do processo. Rejeição. Agravo retido. Nulidade do processo. Alegação de cerceamento de defesa. Desprovimento. Mérito. Incidência do Código de Defesa do Consumidor sobre o contrato em exame, o que não determina, de per se, a abusividade ou ilicitude dos valores objeto da cobrança. É da natureza do contrato de consórcio que o valor das parcelas seja atualizado de acordo com a variação do valor do bem objeto da avença. Inexistência de previsão de juros remuneratórios ou de correção monetária. Inexistência, pelo mesmo motivo, de juros capitalizados. Licitude da aplicação do INCC. Juros de mora. Juros convencionais compreendidos no pedido. Inviabilidade da cumulação com os juros legais, determinada pela sentença. Inteligência da Súmula n. 254 do STF. Fiança. Responsabilidade solidária dos fiadores. Inaplicabilidade do benefício da ordem. Decaimento mínimo da demandante. Agravo retido desprovido. Apelação do devedor e da co-ré Clair desprovida. Apelação do co-réu Paulo provida em parte. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70011176005, VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: CARLOS CINI MARCHIONATTI, JULGADO EM 20/04/2005)

Do exposto acima e da existência do parágrafo quinto da cláusula ora analisada, conclui-se que mais que publicidade enganosa, há prática abusiva de cobrança de valores não contratados ou alteração posterior do preço do produto.

Como é sabido, o preço é elemento objetivo determinante na relação de consumo, essencial à influência na manifestação de vontade, sendo imperativo que os fornecedores indiquem expressamente qual o seja, a vista, a prazo e se sofrem eventuais acréscimos ou não em razão do custo do financiamento.

Ademais, repita-se, o contrato incorporativo é de empreitada por preço fixo e não pode ser reajustado, de modo que se aplica ao caso os princípios do Código de Defesa do Consumidor quanto à responsabilização civil da "equipe incorporativa" formada pelos requeridos NOVACAP e PROGEMIX, e seus representantes legais, pelos riscos da execução da obra, sua solidez e segurança, presumindo-se que tenha fixado o preço com base no amplo conhecimento de seu mister, com aptidão para projeção do custo da obra sem prejuízos ao consumidor.

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Assim, imperativa a aplicação das regras de interesse público, da honestidade e lealdade, contidas no princípio da boa-fé contratual e, sobretudo, do princípio da transparência, que assegura ao consumidor o direito de informação clara e correta sobre o produto vendido ou o contrato firmado desde a fase negocial até a execução do acordo.

O princípio da transparência é instituído pela legislação consumerista no art. 4º, caput,* como norteador das relações de consumo.

Sobre o tema é importante destacar os comentários de CLAÚDIA LIMA, ANTONIO HERMAN E BRUNO MIRAGEM:

" A idéia central é possibilitar uma aproximação e uma relação contratual mais sincera e menos danosa entre consumidor e fornecedor.Transparência significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre fornecedores e consumidor, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial dos contratos de consumo.(...) O princípio da transparência rege o momento pré-contratual, rege a eventual conclusão do contrato. É mais do que um simples elemento formal, afeta a essência do negócio, pois a informação repassada ou requerida integra o conteúdo do contrato (arts. 30,33,35,46 e 54), ou, se falha, representa a falha na qualidade do produto ou serviço oferecido (arts. 18,20 e 35). [22] (sem grifo no original)

A inadequação entre a publicidade, a contratação e a execução do contrato, caracterizando a estipulação de cláusula abusiva pelos fornecedores se comprova, ainda pelos depoimentos prestados pelos adquirentes às fls. 1112-1120, onde todos afirmam categoricamente que a informação e o pré-contrato entabulado garantiam a quitação dos imóveis após o pagamento das cem (100) parcelas acordadas, alegações estas corroboradas pelo documento de fl. 55.

No mesmo vértice, as testemunhas ouvidas às fls. 1121-1127, corretores que trabalhavam para a requerida NOVA CAP no oferecimento das propostas afirmaram constar do pré-contrato a existência do valor residual; o que se pode verificar do documento de fl. 55 não condiz com a realidade. Ademais, todos asseveraram terem informado verbalmente sobre os ditos valores residuais e demonstrado por cálculos; todavia, essas assertivas restaram vazias, pois nenhuma prova há nos autos da efetivação da conduta ou de sua prestação de forma adequada, quanto mais se avaliadas em contraposição aos folhetos promocionais que anunciam venda de imóveis por preço de terreno, como acima transcrito. Ademais, é convenção que implica em ônus financeiros aos aderentes.

Do exposto, é imperativo que os requeridos guardem as estipulações feitas previamente e abstenham-se de cobrar quaisquer valores que ultrapassem o das cem (100) parcelas fixadas nos pré-contratos e, por conseguinte, devem ser declaradas nulas as cláusulas que descrevam estipulações que levem ao entendimento contrário.

cláusula sexta

CLÁUSULA SEXTA:

Fica convencionado entre as partes, que a unidade descrita na cláusula segunda, faz parte integrante de um empreendimento que totaliza 240 (duzentos e quarenta) unidades, divididas em 04 (quatro) apartamentos por bloco, a serem entregues mediante as seguintes condições:

a) As obras serão iniciadas 120 (cento e vinte) dias após o pagamento da primeira prestação;

b) O primeiro bloco será entregue no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após o início das obras;

c) A cada 90 (noventa) dias, da primeira entrega, e assim sucessivamente, a VENDEDORA entregará um bloco;

d) As unidades habitacionais prontas serão entregues ao COMPRADOR que tiver o menor saldo devedor, ou seja, o maior valor pago e, esteja em dia com suas obrigações junto à VENDEDORA;

(...)

Parágrafo segundo :o prazo de entrega das unidades será de no máximo 80 (oitenta) meses contados a partir do início das obras.

No tocante ao item "d", da cláusula sob análise, o critério de contemplação preferencial ao comprador que tiver menor saldo devedor, igualmente é abusiva.

Isto porque tem o condão de forçar os consumidores adquirentes a pagarem maior número de parcelas para que tenham assegurado o direito de posse aos imóveis que pagam; há, assim, abuso de direito praticado pelo fornecedor, tornando-se imperativa a principiologia protetiva composta na legislação consumerista, combativa de métodos comerciais coercitivos ou desleais, a teor do disposto no inciso IV do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor*.

Perfeitamente cabível a adoção de critério mais isonômico como a data de adesão contratual, por exemplo.

cláusula oitava

CLÁUSULA OITAVA:

O atraso no pagamento de qualquer das parcelas ou encargos fixados neste instrumento, obrigará o COMPRADOR ao pagamento de juros moratórios de 1% (hum por cento) ao mês, multa contratual de 10% (dez por cento), sobre o valor do débito devidamente corrigido pelo índice pactuado.(...)

Cláusula que prevê multa contratual de dez por cento (10%) é ilegal mesmo para os contratos firmados antes do advento da Lei n. 9.298, de 1º de agosto de 1996.

Isto porque as normas consumeristas decorrem imediatamente de mandamento da Constituição Federal de 1988, portanto de ordem pública e aplicação imediata para alcançar inclusive contratos firmados antes do advento da lei inovadora de 1996 e que ainda vigem, ressalvados apenas os pactos extintos.

É certo que não seria razoável que consumidores na mesma situação prejudicial recebam tratamento diferenciado pela data de assinatura do contrato, como bem menciona BOBBIO:

"A lei deve ser igual para todos, e significa que a lei deve ser imparcialmente aplicada, e deve ser imparcialmente aplicada porque apenas desse modo assegura igual tratamento dos iguais.(...) uma coisa é dizer que "a lei não é igual para todos" outra é dizer que "nem todos têm igual lei". [23] Para que a lei seja igual para todos o julgador deve aplicá-la segundo o ordenamento da imparcialidade e para que todos tenham igual lei é preciso que seja aplicada a já citada regra da justiça que ordena tratamento igual aos iguais visando garantir a igualdade de direitos.

Em que pese a Súmula 285 do STJ dispor sobre a aplicação da multa moratória prevista no Código de Defesa do Consumidor somente aos contratos bancários posteriores à lei 9.298, não pode ser aplicada analogicamente in casu, tendo em vista a homogeneidade das situações, devendo ser aplicado o princípio da isonomia dos contratos e o expresso reconhecimento legal de vulnerabilidade do consumidor.

É que com o advento da Constituição Federal o ordenamento jurídico passou por uma releitura de todo o sistema jurídico, situação esta que passa desapercebida pela maioria da comunidade jurídica que ainda acredita que as normas constitucionais são dirigidas ao legislador e não têm aplicação imediata; muito pelo contrário, o fato é que o ordenamento jurídico deve ser interpretado sobre o prisma da dignidade da pessoa humana como valor absoluto a ser aplicado em todas as searas do direito, principalmente no direito civil contratual.

Afinal o Código de Defesa do Consumidor, conforme já explicitado na parte histórica da sentença, veio atender anseios dos consumidores prejudicados pela produção em massa efetivada unilateralmente pelos fornecedores.

Ademais, igualmente já dito, no presente caso, há que se observar a função social da moradia, direito garantido constitucionalmente, atinente a dignidade da pessoa humana.Assim, em que pese haverem contratos firmados antes da atual redação do Código de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078/90), trata-se este Código de legislação que estipula normas de ordem pública, cuja promulgação é conseqüência do surgimento de situação concreta de desigualdade que necessitava de regulamentação, assim, referido diploma legal destina-se exatamente a corrigir o desequilíbrio inegável que havia entre as partes nas relações de consumo, não sendo razoável dar-lhe aplicação apenas nos contratos firmados a partir de sua vigência.

Não há falar, portanto, que as disposições inseridas nas cláusulas contratuais devem prevalecer da forma como foram pactuadas, por haver contratos em discussão anteriores à redução legal do percentual legal de multa, pois tratam-se de contratos antigos e deve haver a adaptação da cláusula à luz da nova redação do artigo 52, § 1°, do Código de Defesa do Consumidor, emprestada ao dispositivo pela Lei n° 9.298/96, de 1° de agosto de 1.996.

Firmado, portanto, o contrato antes da vigência do novo percentual legal, este o máximo a incidir na avença, afastado o que lhe superar.

Neste sentido, vale transcrever o brilhante voto proferido pelo eminente relator DES. JORGE EUSTÁCIO DA SILVA FRIAS em julgamento de recurso de apelação:

Ementa: AÇÃO REVISIONAL - COMPRA E VENDA COM FINANCIAMENTO PELO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PRIVADA INTEGRANTE DO SFH - APLICAÇÃO DO REGIME ESPECIAL DO SFH - CONTRATO CELEBRADO ANTES DA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - REVISÃO DE CLÁUSULAS INVÁLIDAS, NO ENTANTO, POSSÍVEL, SEJA NO SISTEMA DO CDC, SEJA À LUZ DO CCB - TAXA REFERENCIAL COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA: INCONSTITUCIONALIDADE JÁ DECLARADA PELO STF - SUBSTITUIÇÃO POR OUTRO ÍNDICE QUE APENAS ATUALIZE O PODER DE COMPRA DO DINHEIRO - AMORTIZAÇÃO MEDIANTE TABELA PRICE - OFENSA AO ART. 6º, C, DA LEI 4.380/64 - DISPOSIÇÃO QUE ONERA EXCESSIVAMENTE O CONTRATO PARA O DEVEDOR - SEGURO CONTRA DANOS - DUPLICIDADE - PREVALÊNCIA DA CONTRATAÇÃO MAIS ANTIGA - HONORÁRIOS DE ADVOGADO: ARBITRAMENTO COM BASE NO § 4º, ART. 20, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - VALOR RAZOÁVEL - RECURSOS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (...) a faculdade que têm os tribunais de suprimir cláusulas contratuais contrárias ao direito vigente não surgiu com a Lei 8.078/90 (CDC). Tal possibilidade é inerente ao sistema de nulidades que faz parte das normas de Direito Privado desde épocas imemoriais. Ainda que assim não fosse, verifica-se que o Código de Defesa do Consumidor estipula normas de ordem pública, cuja promulgação é conseqüência de uma situação fática que necessitava de regulamentação. Referido diploma destinava-se exatamente a corrigir o desequilíbrio inegável que havia entre as partes nas relações de consumo, não sendo razoável dar-lhe aplicação apenas nos contratos firmados a partir de sua vigência. Isto, que alguns chamam indevidamente de "retroatividade", tem ocorrido sempre que se revele de caráter público a lei cujos valores ela protege. É o exemplo da Lei n.º 8.009/90, que regulamentou a impenhorabilidade do bem de família, cujas regras passaram a ser aplicadas imediatamente, mesmo aos contratos firmados anteriormente à sua promulgação. É do Superior Tribunal de Justiça a seguinte decisão. Veja-se: EXECUÇÃO. IMOVEL RESIDENCIAL. PENHORA EFETIVADA ANTES DA EDIÇÃO DA LEI N. 8009, DE 29.03.90.Não sendo suscetível de operar-se a expropriação do bem para pagamento do credor (art. 1º da Lei n. 8009, de 29.03.90), insubsistente torna-se a penhora, mesmo realizada antes da vigência da citada lei.Recurso Especial não conhecido. O mesmo se passa na aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações de consumo: surgiu ele para resolver relações tensas que eram de interesse público resolver, de modo que se aplica, por seu caráter de ordem pública, a todas as relações em curso.(...) Não há falar, portanto, que as disposições inseridas nas cláusulas contratuais devem prevalecer da forma como foram pactuadas, se confirmadas as ilegalidades reconhecidas na sentença. Aplicado o Código de Defesa do Consumidor ou o Código Civil, a cláusula nula não poderá prevalecer.(...) Não é interessante para nenhuma das partes, tampouco para a sociedade, que haja desequilíbrio contratual e imposição de cláusulas excessivamente onerosas para o mutuário. (DJ:10.2.2004 - Primeira Turma Cível - Apelação Cível - Ordinário - N. 1000.075446-7/0000-00 - Campo Grande. Relator: Des. Jorge Eustácio da Silva Frias - Publicação: 19/02/2004 - Nº Diário: 749)

Deste modo, tanto aos contratos celebrados antes, como após a citada lei 9.298/96, que alterou o §1º do art. 52 do CDC*, é imperativo o limite de aplicação de multa de dois por cento (2%) sobre as parcelas vencidas e não pagas.

Outro ponto de abusividade da referida cláusula oitava identifica-se na redação que estipula aplicação da multa sobre o valor do débito corrigido; vez que certo é que deve incidir somente sobre as parcelas devidas e não pagas, e não sobre o saldo devedor ou encargos e valores considerados excessivos cobrados pelos fornecedores.

É que a redação tal como está lançada pode levar à interpretação de que a multa incide sobre o valor integral da dívida, devendo ser adequada de modo a constar claramente sua incidência tão somente sobre as parcelas vencidas e inadimplidas.

Neste sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

Ementa: Agravo. Recurso especial. Cédula rural. Correção monetária. IPC de março de 1990. Multa moratória. 1. A jurisprudência desta Corte é pacífica quanto à aplicação do BTN de 41,28%, no mês de março de 1990, nas cédulas rurais cujo débito esteja vinculado aos índices da caderneta de poupança. Não aplicável à espécie decisão pertinente ao reajuste das prestações e dos saldos devedores nos financiamentos imobiliários vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação. 2. A multa moratória não é devida quando justificada a inadimplência do devedor na cobrança de encargos e valores excessivos pelo credor. Precedentes. 3. Agravo improvido. (Processo AgRg no RESP 216647 / RS ; AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 1999/0046391-9 Relator(a) Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (1108) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 19/11/1999 Data da Publicação/Fonte DJ 07.02.2000 p. 160)

Assim, se comprovada que a mora foi ocasionada pelo excesso praticado pelos fornecedores, deve ser descaracterizada e expurgada a aplicação da multa, pois não pode o consumidor como parte obrigada ser responsabilizado por situação a que não deu causa; do mesmo modo que não pode o fornecedor exigir adimplemento de contraprestação sem haver cumprido adequadamente sua prestação contratual.

cláusula nona

CLÁUSULA NONA: O COMPRADOR, poderá ceder ou transferir os direitos e obrigações decorrentes deste contrato, desde que esteja em dia com suas obrigações e mediante prévia anuência, por escrito, da VENDEDORA.

Parágrafo Primeiro: A transferência será efetuada através da VENDEDORA, mediante o pagamento da taxa de 2% (dois por cento) sobre o valor atualizado do contrato, correndo por cota do COMPRADOR, as demais despesas desta transferência. (...)

Quanto à obrigatoriedade de que seja efetuada a cessão ou transferência de direitos do adquirente por meio da vendedora e mediante o pagamento da taxa de dois por cento (2%), segundo disposto no parágrafo primeiro da dita cláusula, é ilegal na parte da exigência da referida porcentagem, pois como se pode observar a cessão contratual será efetuada pela fornecedora por expressa exigência sua e em benefício exclusivamente seu, como forma de garantir-lhe o conhecimento do desejo do adquirente em transferir sua posição contratual.

Deste modo, é justo que o fornecedor pretenda garantir seu direito de ciência de toda e qualquer transação efetuada pelo consumidor-devedor em relação às obrigações que o envolvam; todavia, o percentual exigido é infundado, não podendo ser pretendido, imposto, nem mesmo a título de serviços prestados, uma vez que é ela, fornecedora, quem exige tomar frente à celebração da cessão contratual, o que perfeitamente poderia ser efetivado pelo consumidor-cedente da maneira que melhor lhe aprouvesse, respeitado tão somente o dever ter a anuência da fornecedora-cedida.

cláusula décima primeira face a cláusula terceira do pré-contrato

CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA:

Ocorrida a rescisão prevista na cláusula décima desse instrumento, o COMPRADOR, perderá em favor da VENDEDORA, a título de indenização por intermediação, despesas administrativas, multa contratual, o equivalente a 30% (trinta por cento) sobre o valor pago, acrescido de despesas concernentes à notificação, taxas de cartório, correspondências, bem como todas as despesas oriundas da cobrança judicial ou extrajudicial, inclusive honorários.

Parágrafo único: Fica assegurado ao COMPRADOR o direito de ter ressarcido as despesas oriundas de medidas judiciais ou extrajudiciais contra a VENDEDORA, inclusive honorários advocatícios na base de 20% (vinte por cento)

Pedido de reserva de imóvel – cláusula terceira:

3) Em caso de arrependimento e desistência do negócio, se pela vendedora esta devolverá as importâncias recebidas em dobro, se pelo (a) (s) adquirente (s), este (a)a (s) perderá (ão) as importâncias pagas.

No atinente à multa rescisória, é abusiva a sua estipulação unicamente em favor dos fornecedores, devendo ser estipulada em favor de ambas as partes, nos moldes da máxima que estabelece a distribuição da igualdade ou desigualdade na medida das situações igualitárias ou não.

Igualmente é excessiva a previsão no importe de 30% (trinta por cento) do valor pago, porque em se tratando de contrato de compromisso de compra e venda há primeiramente a venda do produto sem a fruição e, ainda que haja a desistência do adquirente, o imóvel foi ou será construído, em parte, com seu dinheiro, partindo daí a desvantagem do consumidor.

Deste modo, cabe ao Poder Judiciário a revisão do seu valor, pautando-se sempre na garantia do equilíbrio contratual, e desta forma, a multa deve ser fixada no patamar de dez por cento (10%) dos valores pagos, como medida justa de retenção pelos gastos com a administração do imóvel, pois haverá ainda o direito de revenda.

Não pode ser admitida a estipulação que impute ao consumidor a obrigação de arcar com as despesas de cobrança da dívida e honorários advocatícios, nos termos do art. 51, XII do Código de Defesa do Consumidor*.

É que com o advento do Código de Defesa do Consumidor passou a ser admitida tão somente a dedução integralizada em dez por cento (10%) do total pago pelo consumidor-adquirente, como taxa pelos serviços de administração, caracterizada como cláusula penal.

Está sedimentado pela jurisprudência majoritária que deve haver pena compensatória em desfavor do consumidor desistente; contudo, é ilegal a cláusula terceira (3ª), segunda parte, do pré-contrato, onde estipula a perda total das importâncias pagas pelos adquirentes em caso de desistência, por expressa vedação dos artigos 51, II e 53, ambos do Código de Defesa do Consumidor.*

No mesmo sentido, a lei n. 6.766/79 dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências, e regulamentou o Dec-Lei n. 58/37, que dispunha sobre o loteamento e a venda de terrenos para pagamento em prestações e no seu art. 26, inciso V, previa que "(...) a cláusula penal, nunca excedente a 10% (dez por cento) do débito e só exigível nos casos de intervenção judicial ou de mora superior a 3 (três) meses (...)"

Conforme já exposto e por razões lógicas, ante a contribuição do adquirente na construção da obra, é patente a injustiça em não alçar nem uso, nem a propriedade do imóvel e nem reembolso da quantia que adiantou e demais acréscimos, sob pena de enriquecimento sem causa, face o art. 51, IV, do CDC.

Assim, a cláusula de decaimento ou perda das quantias pagas, na forma exposta, é tipicamente abusiva.

Noutra vertente, prevê o pré-contrato integrante do contrato de promessa de compra e venda, na cláusula terceira (fl.81,verso) a devolução dos valores pagos em dobro pela vendedora aos adquirentes.

Referida medida é justa, pois o fornecedor que recebe o dinheiro e não conclui o contrato apropria-se de parte do patrimônio do consumidor, indevidamente, no momento em que desiste do negócio; portanto, deve devolver as quantias que recebeu e em dobro pelas perdas e danos causados.

Assim, como já exposto, não se justifica a cobrança de saldo residual pela vendedora sem autorização legal ou contratual, de forma que em se tratando de típica relação de consumo, a preservação do equilíbrio das partes não pode ser obtida sem observância das normas que impõem a interpretação das cláusulas da maneira mais favorável ao consumidor, nos termos dos arts. 47 e 51, § 1º, inciso II do Código de Defesa do Consumidor*.

De outra parte, o consumidor cobrado em quantia que passa a ser indevida quando o fornecedor desiste do negócio que ele próprio ofertou, tem aquele o direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, em observância ao art. 42, p. único, do citado código*.

Contudo, a Lei 4.591/64 no art. 36*, assegura ao incorporador prazo de até trinta (30) dias para devolução dos valores em caso de desistência do incorporador, pois não se pode exigir deste a descapitalização imediata, como pretende o autor.

Rescindindo o contrato, os fornecedores-agentes incorporativos que devolvam o dinheiro corrigido ao verdadeiro dono, os consumidores-adquirentes, e em dobro pelas perdas e danos, como forma de penalidade apta a evitar negócios aventureiros capazes de prejudicar os consumidores de boa-fé, que pagam por uma expectativa, sem nada que lhes assegure materialmente a concretude do contratado.

cláusula décima segunda

CLÁUSULA DÉCIMA SEGUNDA:

Se ocorrer a hipótese prevista na cláusula décima, a devolução das parcelas pagas, sofrerão as deduções fixadas neste contrato, e após serem corrigidos pelo índice pactuado, serão devolvidas em parcelas mensais e sucessivas em número idêntico ao de prestações pagas, devidamente corrigidas, a partir de 60 (sessenta) dias da rescisão.

Ante a exposição precedente, a cláusula décima segunda deve ser reformulada, e com base na aplicação do equilíbrio contratual, deverá passar a constar do seu texto a obrigatoriedade do fornecedor desistente devolver em dobro aos consumidores aderentes os valores que recebeu, corrigidos monetariamente, no prazo de até trinta dias da rescisão contratual.

cláusula décima quarta

CLÁUSULA DÉCIMA QUARTA:

Se o COMPRADOR estiver na posse precária do imóvel e ocorrer a hipótese prevista na cláusula décima, ficará obrigado a desocupar o imóvel no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da rescisão, sob pena de pagar uma indenização diária de 10% (dez por cento) sobre o valor de uma prestação atualizada do imóvel, até sua efetiva desocupação.

Parágrafo Único: O COMPRADOR deverá restituir a unidade imobiliária em perfeitas condições de uso, sem direito a retenção ou indenização por quaisquer benfeitorias, ainda que necessárias, as quais ficarão desde logo incorporados aos imóvel.

A cláusula que estipula multa diária de 10% (dez por cento) sobre o valor de uma prestação em caso de não desocupação do imóvel ocorrida a rescisão contratual, merece ser reparada parcialmente.

É certo que rescindido o contrato, seus efeitos aplacam ambas as partes, cabendo ao consumidor-adquirente que não chegou a adquirir a propriedade plena do imóvel, ante a resolução do contrato, devolver o bem ao seu dono, e se assim não fizer deverá pagar pela ocupação ilícita do imóvel, sob pena de enriquecimento indevido.

A boa-fé, assim entendida como a conduta honesta e igualitária das partes na formação do negócio jurídico, impõe a fixação de multa para o caso de não desocupação do imóvel ocorrida a rescisão contratual.

Assim como é dado ao comprador recorrer aos meios legais de indenização em eventual atraso na entrega das obras pelo vendedor, igualmente deve ser assegurado a este o direito de ressarcimento relativo ao período de fruição e permanência do compromissário comprador no imóvel, tal providência faz-se necessária para evitar o enriquecimento indevido da parte que, se assim não fosse, teria usufruído de graça do imóvel por um dado período de tempo, sendo agraciado apesar de descumprir com a obrigação de entrega do imóvel, o que é inadmissível ante a aplicação do princípio do equilíbrio contratual.

Ao contrário do entendimento exposto em grande parte dos julgados no sentido de que o adquirente ficaria comprometido ao pagamento do percentual imposto a título de alugueres, tenho que na prática referido instituto é inaplicável por ser de natureza integralmente adversa ao contrato firmado, de modo que o correto é efetivamente a aplicação da multa.

A permanência do promissário comprador no imóvel após a rescisão contratual, caracteriza esbulho possessório passível de ser remediado por meio de ação possessória ou petitória para correção da agressão e não por meio de cobrança de valores sob a roupagem de aluguéis.

No contrato que envolve produto de incorporação imobiliária, não satisfeito o débito, após determinado período de tempo previsto no contrato, há a rescisão contratual e o alienante fica autorizado a vender o bem a outrem, de forma que se não houver a entrega voluntária do imóvel, a multa visa a penalização do descumpridor da obrigação de dar desde então gerada.

É que no momento em que há a rescisão contratual, para o consumidor que detém a posse imediata do imóvel surge a obrigação de restituir, característica da posse precária, e pelo descumprimento desta obrigação é que o contrato prevê a cominação de multa.

Isto se dá por serem manifestas as perdas e danos experimentadas pelo promitente vendedor com a ocupação ilícita do promissário comprador, todavia, não podem justificar enriquecimento sem causa deste, que, inclusive, voltará à posse do imóvel e, novamente o alienará e, disso extrairá lucros.

Deste modo, o valor previsto no importe de 10% (dez por cento) diário sobre a quantia relativa a uma prestação convencionada é estimativa de multa cominatória; todavia abusiva porque ultrapassa e em muito o percentual da própria cláusula penal legalmente admitida por descumprimento do contrato em si, pois atinge a exorbitância de 310% (trezentos e dez por cento) ao mês.

É a consagração da ganância e da abusividade.

Por tais razões, com base no princípio do equilíbrio contratual, a multa em caso de não desocupação do imóvel deve ser reduzida para o importe do valor em dobro da prestação mensal acordada, equitativamente à condenação imputada ao promitente vendedor em caso de descumprimento contratual.

A medida é justa para evitar o enriquecimento indevido por ambas as partes do contrato.

cláusula décima oitava

CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA:

Será admitida uma tolerância no prazo para conclusão da obra, bem como sua prorrogação, de até 180 (cento e oitenta) dias pela ocorrência de casos fortuitos ou força maior, nos termos do artigo 1058 do Código Civil, ou no caso de inadimplência das parcelas por mais de 25% (vinte cinco por cento) do total de adquirentes, desde que a VENDEDORA tenha tomado as medidas contratuais e legais para o restabelecimento da normalidade no pagamento das parcelas.

É abusiva a cláusula que estipula prazo de tolerância em caso de ocorrência de caso fortuito e força maior, pois nos termos do art. 393 do Código Civil* tratam-se de hipóteses de descumprimento da obrigação sem culpa do devedor, de modo que somente poderá ser apreciada a sua ocorrência, extensão e consequências no caso concreto, com o que, só então, se poderá verificar a necessidade de prorrogação e a quantidade de tempo necessários para que o devedor contorne o inesperado e cumpra sua parte na avença.

Deve ser assim para evitar que o fornecedor esteja munido de dispositivos contratuais que lhe permitam fixar arbitrariamente a ocorrência de caso fortuito ou de força maior.

Igualmente, quanto a pretensão de previsão de caso fortuito consistente na inadimplência de mais de 25% (vinte cinco por cento) do total dos adquirentes, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu pela ilegalidade como situação permissiva da inobservância do prazo de entrega dos imóveis. Senão vejamos.

Ementa: Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Contrato de incorporação Cláusula ilegal. 1. No tocante à multa de 10%, nada versou o Acórdão, carecendo o tema do indispensável prequestionamento. 2. Impertinentes as alegações de ocorrência de força maior e caso fortuito, já que o Tribunal afirmou, expressamente, ser nula a cláusula que permite a inobservância do prazo de entrega em caso de inadimplência de mais de 30% dos compradores, dada a contrariedade ao Código de Defesa do Consumidor, permanecendo incólumes os fundamentos do Acórdão. 3. A correção monetária deve incidir desde o desembolso de cada parcela. 4. Agravo regimental improvido.(Processo AgRg no AG 259799 / SP ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO1999/0078788-9 Relator(a) Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (1108) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 10/12/1999 Data da Publicação/Fonte DJ 08.03.2000 p. 114)

A ilegalidade da referida cláusula pauta-se no princípio do risco do empreendimento por conta do fornecedor-incorporador, conforme já exposto acima, sendo incabível a pretensão de transferência do risco do negócio ao consumidor-adquirente.

Acerca da matéria merece transcrição o voto do eminente Desembargador ÊNIO SANTARELLI ZULIANI, do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação Cível nº 085.852-4/4, julgada pela sua Terceira Câmara da Seção de Direito Privado, verbis:

"(...) Os transtornos do consumidor decorrem da frustração temporária do direito de consumar o sonho da casa própria, uma vez tendo cumprido a sua parte no contrato de compra e venda. O atraso na entrega do imóvel adquirido repercute na diminuição de sua auto-estima com maior ou menor intensidade, dependendo dos reflexos do fato no seu meio social, podendo gerar no lesado uma imagem de relativa incapacidade volitiva, como vítima de um engodo. (...)Esses desafortunados não recebem indulgência e sofrem pressão e estresse que os aproximam do desprezo pela própria integridade física e mental. São lançados no fogo ou no caldeirão dos otários cada vez que repetem as justificativas da frustração e do prejuízo, perdem o respeito em casa e tornam-se alvos das piadas de salão, dos risinhos cínicos, da complacência que mais lhes agrava a situação do que os salva do desprezo que lhes dilacera a alma. A sentença condenatória cala a maldade e, sem terapia, cura o psíquico abalado, servindo de referencial para que se respeitem mais do que o patrimônio material do comprador lesado pelo comportamento doloso das ENCOLS da vida (...)"

Como se vê, é fato presente em todo o país a intenção de algumas empresas do ramo habitacional, dentre outros, institucionalizar o desrespeito ao cidadão-consumidor, e o prévio intuito transgressor dos direitos é facilmente verificável por meio da formulação de contratos de adesão com cláusulas que estipulam prazos e mais prazos de prorrogação do cumprimento da obrigações, como no caso apresentado, que estipula prorrogação temporal para o inesperado (caso fortuito e força maior).

cláusula décima quinta e cláusula vigésima quinta

CLÁUSULA DÉCIMA QUINTA:

Juntamente com as prestações mensais o COMPRADOR pagará obrigatoriamente o prêmio do seguro de vida, tendo como cobertura o pagamento integral do saldo devedor, em caso de morte ou invalidez permanente do contratante.Parágrafo único: O valor do prêmio do seguro será acrescido à prestação e será a partir da assinatura do presente contrato (...)

CLÁUSULA VIGÉSIMA QUINTA: O presente contrato obriga em todos os seus termos, não só as partes contratantes, como também seus herdeiros e sucessores.

As cláusulas décima quinta (15) e vigésima quinta (25) serão analisadas conjuntamente por guardarem estreita consonância temática entre si.

Com razão salienta o autor a exorbitância do valor pago a título de seguro de vida face a excessiva correção monetária, já combatida, devendo amoldar-se aos fundamentos deste decisum na forma lançada.

Contudo questão ainda carecedora de julgamento e visivelmente ilegal é a cobrança a partir da assinatura do contrato imobiliário, sem a comprovação de que já tenha sido contratado o seguro do empreendimento em favor do adquirente.

Ora, não pode o fornecedor-incorporador-promitente exigir do consumidor-adquirente-promissário contraprestação de serviço que não comprove contratado, como no caso o seguro.

Como é sabido, o contrato de seguro é bilateral, oneroso, aleatório, consensual e de adesão e execução continuada. Diz-se bilateral porque somente se aperfeiçoa quando há o estabelecimento da obrigação recíproca, ou seja, o segurado assume principalmente a obrigação de pagar o prêmio, e no mesmo momento, o segurador obriga-se a pagar o valor contratado em caso de sinistro.

Assim, segundo dispõe o art. 476 do Código Civil, aplica-se ao contrato o denominado princípio da exceção de contrato não cumprido, segundo o qual nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.

Deste modo, primeiramente, deve o fornecedor comprovar ao consumidor a contratação do seguro, com o que, só então poderia exigir-lhe a contraprestação acoplada às parcelas mensais referentes ao imóvel objeto do contrato.

Cumpre observar que a obrigação de contratação do seguro compete ao incorporador em benefício do adquirente que poderia exigir prova de sua contratação por ocasião da compra ou assumir o risco.

Frise-se que assim deve ser estipulado com a finalidade de garantir ao consumidor adquirente exigir o pagamento da contraprestação em caso de sinistro.

Por isso, igualmente deve ser deferida a pretensão do autor de que o fornecedor envie cópia da apólice e comprovação mensal do repasse aos consumidores mutuários, para que sejam postos a salvo seus direitos.

Da mesma forma, também a alteração do dispositivo contratual faz prevalecer a segurança aos direitos do consumidor na medida em que visa evitar o recebimento de valores a título de seguro sem o repasse à seguradora, como corriqueiramente acontece em empreendimentos imobiliários.

Como bem pondera o autor, a data correta de início da cobrança do seguro é a da efetiva comprovação da contratação da seguradora, entregando a cópia da apólice aos segurados e enviando mensalmente os comprovantes de pagamento.

Dada a contratação do seguro, é ilegal a cláusula que prevê a responsabilização dos herdeiros e sucessores dos contratantes-adquirentes pelo cumprimento do contrato, ante a existência de seguro prestamista, disposto na cláusula vigésima quinta (25).

O seguro é contratado justamente para assegurar ao contratante que em caso de morte ocorra a quitação do débito.

Com efeito, o contrato de seguro, segundo dispõe o art. 757 do Código Civil, é aquele em que o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados, ou seja, o que caracteriza o objeto do seguro é justamente o que a doutrina denomina interesse segurável.

Assim, firmado o contrato de seguro às expensas do consumidor-devedor com objetivo de garantir ao fornecedor-credor o recebimento integral do débito, em caso de morte do devedor, é contrária à boa-fé cláusula que estipule a responsabilização dos herdeiros e sucessores, sob pena de enriquecimento sem causa, porque a morte do mutuário-comprador tem o efeito precípuo de quitar o saldo devedor do mútuo hipotecário, porque o prêmio de seguro foi pago pelo promitente comprador.

Neste sentido os julgados do Superior Tribunal de Justiça:

Ementa: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE IMÓVEL SFH. ÓBITO DO MUTUÁRIO. QUITAÇÃO PARCELAS VINCENDAS PELO SEGURO SÚMULA Nº 31/STJ. APLICAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. DECISÃO ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS NºS 282 E 356/STF. INCIDÊNCIA DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO CARACTERIZADO.I - Embargos à execução acolhidos em sede de sentença e confirmados em apelação com base no óbito do mutuário, passando, assim, a responsabilidade pela quitação de parcelas remanescentes de financiamento de imóvel à seguradora. II - Visto que o acórdão recorrido perfilou-se nos argumentos da sentença para ratificar a procedência dos embargos à execução, não há que se falar em decisão ultra petita. III - A menção pelo Colegiado a quo da incidência da Súmula nº 31, deste STJ, ao presente caso deu-se com o fito de corroborar a tese de que, independentemente do fato de ter havido financiamento de dois imóveis na mesma localidade, remanesce a responsabilidade da seguradora quanto à quitação de parcelas remanescentes de financiamento, diante da morte do mutuário-varão. IV - Inviável apreciar-se a violação de artigos de lei federal se não foram ventilados pela decisão hostilizada. Ausência de prequestionamento constatada. Incidência dos enunciados sumulares nºs 282 e 356, do STF. V - Dissídio jurisprudencial não demonstrado nos moldes do art. 255 e parágrafos do RI/STJ. Ademais, os acórdãos paradigma e recorrido tratam de bases fácticas diversas. VI - Recurso especial improvido.(Processo RESP 166797 / SP ; RECURSO ESPECIAL1998/0016961-0 Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCÃO (1116) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 27/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 24.05.2004 p. 153)

Ementa: CIVIL. REPETIÇÃO DO INDEBITO. ERRO. SE O SEGURO HABITACIONAL QUITOU AS OBRIGAÇÕES DO MUTUO EM RAZÃO DA MORTE DO MUTUARIO, NADA JUSTIFICAVA A CONTINUIDADE, PELA VIUVA, DO PAGAMENTO DAS RESPECTIVAS PRESTAÇÕES A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA; ERRO QUE JUSTIFICA A REPETIÇÃO DO INDEBITO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.(Processo AgRg no AG 181716 / SP ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 1998/0017456-7 Relator(a) Ministro ARI PARGENDLER (1104) Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 19/05/1998 Data da Publicação/Fonte DJ 08.06.1998 p. 85 RT vol. 756 p. 203 )

Por oportuno, a contraprestação em caso de morte do mutuário, quitando o saldo devedor constitui o objeto da obrigação do segurador, como bem anota VENOSA, segurador é a pessoa jurídica que recebe o prêmio, assume o risco e obriga-se a efetivar a contraprestação, se ocorrer o sinistro. [24]

Assim, caso hajam valores remanescentes resultantes de quantias pagas a título de seguro, até mesmo decorrentes dos efeitos da presente sentença, deverá haver a devolução dos valores aos mutuários ou seus sucessores, pena de enriquecimento sem causa, vedado expressamente pelo ordenamento jurídico, nos termos do art. 884 do Código Civil*.

cláusula décima sétima

CLÁUSULA DÉCIMA SÉTIMA:

Correrão por conta do COMPRADOR, todas as despesas e os encargos fiscais relativos a unidade imobiliária a partir da data de concessão do "habite-se", tais como: impostos, taxas, escritura, registro e transferência do imóvel, seguro, emolumentos, taxa de autorização de escritura junto à Administradora, e outros encargos que incidam, na data da entrega das chaves, ou que venham a incidir, ainda que lançados em nome da VENDEDORA, e os acessórios que não estejam relacionados expressamente no memorias descritivo.

Parágrafo Único: A taxa de autorização de escritura será paga no valor de 01 (uma) prestação atualizada, somente se o COMPRADOR, após o decurso do prazo de 15 (quinze) dias de sua notificação via carta registrada, não comparecer ao escritório da Administradora com toda a documentação em dia para a efetiva escrituração

Escancarado o caráter abusivo do caput da cláusula ao responsabilizar os compradores ao pagamento de despesas sob a denominação de "outros encargos", sem especificação de quais o sejam, citado dispositivo choca-se com o princípio da informação que deve visar sempre a melhoria do mercado de consumo, nos termos do art. 4º, IV do Código de Defesa do Consumidor.

A cláusula igualmente deve ser extirpada dos contratos, pois não se pode admitir a exigência de valores sem menção expressa sobre o que se está cobrando; ou seja, segundo dispõe o art. 6º, II do Código de Defesa do Consumidor, deve haver informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com a especificação correta de preço.

Assim se existem despesas cobráveis na data da entrega do imóvel, devem ser especificadas previamente, discriminando-as de antemão, sem estipulações genéricas como encargos, sob pena de violação do princípio da boa-fé, levantando a presunção de margem a cobranças arbitrárias e ilegais.

O parágrafo único do mencionado dispositivo será analisado mais adiante, por ser reconhecido como legal.

cláusula vigésima

CLÁUSULA VIGÉSIMA:

Em garantia do pagamento total da dívida constituída neste instrumento, inclusive atualização monetária e demais encargos pactuados, valor este que o COMPRADOR confessa dever a VENDEDORA, aquele dará a esta, em primeira, única e especial hipoteca, o imóvel objeto deste contrato, ciente, desde já, de que se incorporarão à garantia, todos os melhoramentos, construções, acessões e instalações que se acrescerem ao imóvel.

Parágrafo Único: A hipoteca ora constituída permanecerá em vigor o tempo necessário ao completo pagamento e cumprimento de todas as obrigações aqui assumidas

Deve também ser anulada, por abusiva, a cláusula que prevê a incorporação de todas as benfeitorias acrescidas ao imóvel no intuito de retirar do consumidor o direito de indenização ou levantamento conforme a espécie de benfeitoria.

O art. 51, XVI do Código de Defesa do Consumidor* dispõe expressamente serem nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias, assim como a Lei do Parcelamento Urbano n. 6766/79, que em seu art. 34*, prevê a ineficácia da cláusula contratual que disponha não serem indenizáveis as benfeitorias necessárias ou úteis.

Neste sentido, inclusive, o entendimento jurisprudencial:

Ementa: PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMOVEL -BENFEITORIASINVALIDADE DA CLAUSULA QUE ESTABELECE A PERDA DAS BENFEITORIAS, SEM DIREITO A INDENIZAÇÃO, EM CASO DE RESCISÃO DO CONTRATO, EM VIRTUDE DE MORA NO PAGAMENTO DO PREÇO - LEI 6766/79, ARTIGO 34. A CLAUSULA QUE PREVE NÃO TENHA DIREITO O PROMITENTE COMPRADOR A DEVOLUÇÃO DAS IMPORTANCIAS PAGAS DEVE CONSIDERAR-SE COMO DE NATUREZA PENAL, COMPENSATORIA, PODENDO SER REDUZIDO SEU VALOR COM BASE NO ARTIGO 924 DO CODIGO CIVIL. POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO ESPECIAL E LHE DAR PROVIMENTO EM PARTE. (STJ - RECURSO ESPECIAL ( RESP ) - Nº 12074 - SP - RIP: 199100126985 – RE)

No mesmo sentido, o art. 1219 do Código Civil*, correspondente ao art. 516 do Código Civil de 1916*, disponibiliza o direito à indenização ao possuidor de boa-fé pelas benfeitorias necessárias, úteis e voluptuárias, conceituadas no art. 96 e parágrafos do referido estatuto, garantido o direito de retenção quanto àquelas e levantamento destas últimas, e sendo norma posterior e mais benéfica deve ser aplicada em favor do consumidor.

Tenho por imperativa a análise conjunta dos citados dispositivos face a nova regulamentação disposta no ordenamento jurídico hodierno, que a meu ver é existente não apenas a partir do Código Civil de 2002, mas preexiste ao surgimento das relações humanas e conseqüentes negócios jurídicos entabulados; todavia, dadas as transgressões escancaradas aos princípios da boa-fé e equidade contratual que assolava as relações jurídicas, o legislador viu-se obrigado a mencionar expressamente na codificação de direito privado civil representada pela lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.

Sobre essa aproximação, aliás, foi aprovado o Enunciado nº 167 na III Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em dezembro último, com a seguinte redação: "Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor, no que respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos".

Assim, todas as benfeitorias realizadas no imóvel pelo consumidor adquirente devem ser indenizadas ou levantadas se for possível sem a depreciação do imóvel.

cláusula vigésima segunda

CLÁUSULA VIGÉSIMA SEGUNDA:

O COMPRADOR, desde já, permite que a VENDEDORA, mesmo após a instalação do condomínio e enquanto existirem apartamentos a serem construídos, mantenha no empreendimento, corretores e placas promocionais, a serem afixados em local escolhido pela VENDEDORA.

A estipulação contratual que determina a fixação de placas de promoção de venda dos imóveis que restam, em local escolhido pela vendedora, é abusiva.

Com base no art. 51, incisos I e II, conclui-se que restringe direitos do consumidor inerentes à natureza do contrato, na medida em que ameaça o direito constitucionalmente garantido de pleno uso e gozo da propriedade, conforme disposto nos arts. 5º, XXII e 170, III, ambos da Carta Magna*.

O art. 1.228 do Código Civil atual*, correspondente ao art. 524 do Código Civil de 1916* e prevê, dentre outros, os direitos do proprietário de uso e gozo do bem de sua propriedade, isto significa a liberdade de utilização do imóvel, de maneira a não limitar o bem-estar do proprietário, ressalvado, é claro, a função social da propriedade como impõe a norma de ordem pública disposta nos dispositivos constitucionais supramencionados.

Assim, as placas promocionais de venda não podem ser dispostas ao livre arbítrio dos fornecedores, deve haver a estipulação contratual que delimite os locais de fixação de maneira a não causar incômodos aos adquirentes dos imóveis, evitando-se danos patrimoniais e morais, nos termos do art. 6º, VI do Código de Defesa do Consumidor*.

cláusula vigésima sexta

CLÁUSULA VIGÉSIMA SEXTA:

Os contratantes, em comum e recíproco acordo elegem o foro desta comarca, com renúncia de outro por mais privilegiado que seja, para dirimirem dúvidas, ações ou atos oriundos deste contrato.

É potestativa a cláusula contratual que elege foro competente para ação judicial em contrato de adesão, tendo em vista os repetidos princípios da vulnerabilidade do consumidor e do equilíbrio contratual.

Ademais, manifesta a nulidade da cláusula de eleição do foro que prejudique a defesa do consumidor, com amparo no princípio da facilitação do acesso do consumidor à justiça, expressamente previsto como norma-objetivo no inciso VIII do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor*.

É com a preocupação do efetivo acesso à justiça que o Código de Defesa do Consumidor estabelece no art. 93, incisos I e II, a competência do juízo do foro do local do dano.*

Em sentido idêntico é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos.

Ementa: ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL. COMPETÊNCIA.FORO DE ELEIÇÃO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DOMICÍLIO DO DEVEDOR. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da aplicação do CDC aos contratos de financiamento habitacional, inclusive para determinar a competência do domicílio da parte hiposuficiente na relação jurídica, no caso o mutuário, para a propositura de ação revisional dos referidos contratos, a fim de facilitar o exercício de sua defesa. 2. Recurso especial provido. (Processo AgRg no AG 547829 / DF ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2003/0161512-0 Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 01/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 26.04.2004 p. 170)

Ementa: Processo civil. Agravo no agravo de instrumento. Recurso especial. Ação de execução hipotecária. Sistema Financeiro da Habitação. CDC. Aplicabilidade. Cláusula de eleição de foro Declaração de nulidade de ofício. - Aplica-se o CDC aos contratos de financiamento para aquisição de casa própria regidos pelo SFH. - É possível a declaração de ofício de nulidade de cláusula de eleição de foro se caracterizada dificuldade para o exercício da defesa do devedor. Agravo não provido. (Processo AgRg no AG 495742 / DF ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2002/0171686-4 Relator(a) Ministro BARROS MONTEIRO (1089) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 29/06/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 04.10.2004 p. 304)

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SANTOS, Dorival Moreira. Incorporação imobiliária:: sentença em ação civil pública contra cláusulas ilegais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 861, 11 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16649. Acesso em: 23 dez. 2024.

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