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Incorporação imobiliária:

sentença em ação civil pública contra cláusulas ilegais

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11/11/2005 às 00:00
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Extensa sentença proferida em ação civil pública contra incorporadoras imobiliárias e seus responsáveis legais, declarando a nulidade de diversas cláusulas e determinando a devolução de valores pagos a maior.

Estado de Mato Grosso do Sul
Poder Judiciário
Campo Grande
Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos

Autos n. 001.98.003877-9
Ação: Ação Civil Pública
Autor: Ministério Publico Estadual
Réus: Nova Cap Empreendimentos Imobiliários, Marcos Augusto Netto, Nelson Benedito Júnior, Progemix – Programas Gerais de Engenharia e Construção Ltda. e Anagildes Caetano de Oliveira.


Ementa: Ação Civil Pública – Parcialmente Procedente – Incorporação Imobiliária – Preliminar de ilegitimidade passiva afastada. Mérito: Cláusulas contratuais: Abusividades e ilegalidades reconhecidas parcialmente – Observância das normas do CDC: ordem pública e interesse social. Princípios específicos das relações de consumo: aplicação pelo juiz para adequação e adaptação das estipulações contratuais – Efetividade da prestação jurisdicional: Concessão das tutelas: ressarcitória; de obrigação específica; de remoção do ilícito e inibitória – Abrangência da Sentença: Direitos Transindividuais: Difusos e Coletivos.


Vistos etc.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, por seu representante propôs a presente Ação Civil Pública em face de NOVA CAP EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS, MARCOS AUGUSTO NETTO, NELSON BENEDITO JÚNIOR, PROGEMIX – PROGRAMAS GERAIS DE ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA. E ANAGILDES CAETANO DE OLIVEIRA.

Aduz, em síntese:

1-) que os requeridos atuam em conjunto no mercado imobiliário, promovendo a edificação e venda de imóveis, e em união de esforços utilizaram-se de publicidade enganosa em face dos consumidores, representada pela falsa idéia de que pagando as parcelas anunciadas teriam o imóvel adquirido quitado, fato este que não aconteceu;

2-) abusividade nas cláusulas do contrato de compra e venda de imóveis que firmaram quanto à:

a-) cobrança de duas parcelas no mês de dezembro (cláusula 4.3. b);

b-) não fixação específica da periodicidade do reajuste (cláusula 4.1);

c-) cumulação de reajuste mensal e anual do saldo devedor gerando resíduo(cláusula 4.2);

d-) substituição do índice pactuado caso este seja extinto (cláusula 4.3);

e-) vinculação das parcelas ao salário mínimo (cláusula 4.4);

f-) forma de pagamento do valor residual em três parcelas, sem a cientificação dos consumidores ocasionando surpresa extraordinária (cláusula 5.5);

g-) redação confusa das cláusulas 5.1 e 6, "h", e repetição na cláusula 5.2;

h-) contagem do prazo de carência e entrega dos imóveis, bem como na utilização do critério de contemplação preferencial ao comprador que tiver menor saldo devedor (cláusulas 6 e 6.2);

i-) prazo para desistência de 120 (cento e vinte) dias (cláusula 6.3);

j-) multa contratual de 10% (dez por cento), bem como sua aplicação sobre o valor total do débito(cláusula 8);

k-) previsão de pagamento em dia e anuência prévia da vendedora como condição para cessão ou transferência de direitos e obrigações contratadas (cláusula 9), assim como a obrigatoriedade de que seja efetuada pela vendedora, mediante o pagamento da taxa de dois por cento (cláusula 9.1), e consequentemente a extinção das cláusulas 9.2 e 10, item b;

l-) multa rescisória excessiva no importe de 30% (trinta por cento) do valor pago, mais as despesas de cobrança, incluindo honorários advocatícios de 20% (vinte por cento), estipulada unicamente em desfavor dos consumidores (cláusula 11);

m-) devolução dos valores pagos de forma parcelada em caso de rescisão contratual e com início a partir de sessenta dias da data desta (cláusula 12);

n-) estipulação de posse precária ao consumidor e previsão de ação possessória de retomada do imóvel em favor dos requeridos em caso de descumprimento contratual(cláusula 13);

o-) multa diária de 10% (dez por cento) do valor da prestação em caso de não desocupação do imóvel ocorrida a resolução (cláusula 14);

p-) exorbitância do valor pago a título de seguro de vida (cláusula 15) face a cobrança a partir da assinatura do contrato imobiliário, pretendendo seja correta a data da contratação da seguradora (cláusula 15.1);

q-) não envio de cópia do contrato de seguro aos adquirentes, sob a alegação de que deveria haver o acréscimo de cláusula com previsão de devolução aos mutuários ou seus sucessores dos valores remanescentes pagos pelo seguro (cláusula 15.2);

r-) responsabilização dos compradores ao pagamento de despesas sob a denominação de "outros encargos", sem especificação de quais o sejam, assim como imputação ao pagamento de "taxa de autorização de escritura junto à administradora" que equivale a uma prestação, e ausência de disposição da obrigatoriedade de notificação aos beneficiários (cláusula 17);

s-) condições e prazos de tolerância e prorrogação para conclusão das obras, incluindo a previsão de prazo para ocorrência de caso fortuito e força maior (cláusula 18);

t-) previsão unilateral de garantia hipotecária do imóvel contratado em favor das empresas rés, com menção a incorporação de todas as benfeitorias acrescidas (cláusula 20), pretendendo sejam estas indenizadas mesmo em caso de execução da hipoteca;

u-)desnecessidade da cláusula que prevê a impenhorabilidade do imóvel como bem de família (cláusula 20.2);

v-) falta de dispositivo que ressalve ao comprador o direito de fiscalização do andamento das obras no intuito de verificação dos prazos de conclusão estipulados (cláusula 21);

x-) fixação de placas de promoção de venda dos imóveis que restam, em local escolhido pela vendedora, dizendo que devem ser afixadas em locais autorizados pelos adquirentes dos demais imóveis (cláusula 22);

y-) responsabilização dos herdeiros e sucessores dos contratantes-adquirentes pelo cumprimento do contrato, ante a existência de seguro prestamista (cláusula 25), dizendo que a cobrança deveria ser iniciada somente após a contratação da seguradora, mediante envio de cópia da apólice e comprovação mensal do repasse aos mutuários;

w-) eleição do foro competente para dirimir controvérsias (cláusula 26).

Assegura ainda ser ilegal a previsão de pagamento do "sinal" por parte dos compradores, prevista no pedido de reserva de imóvel, sem a contraprestação de serviço ou bem, ocasionando o enriquecimento ilícito dos fornecedores.

Assevera que também é abusivo o item 03 do pedido acima mencionado, onde contém a disposição de retenção do valor do sinal em caso de desistência do adquirente, dizendo que deve ser fixada a importância equivalente a 10% (dez por cento) do valor pago pelo contrato ou pré-contrato. Afirma que a redação da dita disposição é duvidosa quanto a expressão de devolução das importâncias recebidas em dobro, devendo constar "... se pela vendedora, esta devolverá, em dobro, as importâncias recebidas." Sustenta que deve haver a exclusão do item quatro (4) por ser encargo prejudicial ao consumidor.

Por fim, requer a aplicação da legislação consumerista, inclusive inversão do ônus da prova e desconsideração da personalidade jurídica das rés, anulando-se as cláusulas que pretende abusivas (4,5,6,8,9,10,11,12,13,14,15,17,18,21,22,25,26 e parágrafos), retirando-as ou reformulando-as, e alterando as que possuem redações afastadas do princípio da informação.

Requer ainda a condenação das rés:

a-) em obrigação de não fazer, consistente na abstenção de inserção das cláusulas anuladas em seus contratos e regulamentos futuros, sob pena de multa;

b-) na restituição das quantias recebidas indevidamente, corrigidas e acrescidas de juros;

c-) na devolução dos valores repassados a maior pelos mutuários à seguradora;

d-) apresentação da lista de nomes e demais dados de todos os mutuários do conjunto residencial Nova Europa que seriam abrangidos pela decisão;

e-) dar quitação do imóvel pelo qual houverem sido pagas cem (100) prestações;

f-) inserção no contrato de cláusulas que garantam aos contratantes adquirentes o recebimento de juros e multas ou abatimento destes nas prestações futuras, nas mesmas proporções que pagam às contratadas, caso haja atraso na entrega das obras, com opção de rescisão contratual, inclusive se não houver o cumprimento adequado ou verificada a impossibilidade, devolvendo-se tudo quanto foi pago, acrescido de juros, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

Protestando por provas requer a procedência dos pedidos e a fixação de multa pelo descumprimento das determinações judiciais. Juntou os documentos de fls. 47-247.

Recebida a inicial (fl.249), determinou-se a citação dos requeridos, a juntada da lista de nome dos mutuários, conforme requerido na inicial e a expedição de editais de intimação de eventuais interessados.

Deferida à fl. 252 a concessão dos benefícios previstos no art. 191 do CPC.

Os requeridos Progemix – Programas Gerais de Engenharia e Construção Limitada, seu representante legal Analgides Caetano de Oliveira, Nova Cap – Empreendimentos Imobiliários Ltda, seus representantes legais Marcos Augusto Netto e Nelson Benedito Netto, apresentaram contestação, respectivamente, às fls. 255-405 e 500-658, rebatendo as alegações do autor.

Os requeridos Nova Cap – Empreendimentos Imobiliários Ltda, seus representantes legais Marcos Augusto Netto e Nelson Benedito Netto, suscitaram a preliminar de ilegitimidade passiva, sob o fundamento de que que as atividades que desenvolvem refere-se unicamente a intermediação de vendas e administração das unidades de propriedade da incorporadora Progemix, agindo exclusivamente em nome e sob o comando desta, percebendo remuneração pelos serviços prestados sob as vendas, afirmando agir na qualidade de mandatária da empresa Progemix Ltda.

No mérito defendem as seguintes teses:

1-) má interpretação das normas do CDC, ao argumento de que o contrato faz lei entre as partes, ante o princípio da autonomia da vontade, afirmando que a resistência em cumprir o avençado caracteriza má-fé em sacrifício da outra parte, aduzindo que a força vinculante do contrato somente pode ser relativizado ante as cláusulas leoninas ou abusivas;

2-) que o contrato de compromisso de compra e venda do Parque Residencial Nova Europa foi elaborado dentro dos parâmetros dispostos no CDC, sendo analisado pelo Ministério Público e só então foi impresso, dando-se início ao empreendimento;

3-) que não deve haver proteção de modo a despojar o consumidor de sua inteligência e vontade, independentemente de se tratar de contrato de adesão, denominados contratos de massa;

4-) as cláusulas contratuais foram estipuladas visando a garantia do equilíbrio contratual e que o contrato deve ser rigorosamente cumprido, afirmando a legalidade:

a-) do plano de equivalência salarial e do valor residual;

b-) que a convenção do número anual de parcelas não onera o consumidor, nem lhe permite vantagem exagerada;

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c-) que é legal a fixação de periodicidade alternativa de reajuste, por tratar-se de simples correção monetária, ante a inflação e a desvalorização da moeda

d-) que o saldo devedor deve ser atualizado mensalmente como forma de equilíbrio do contrato, e que havendo limite para o valor das prestações, origina valor residual, o que diz ser permitido pela lei, por consistir na diferença entre o valor pago e o custo real da construção da unidade habitacional;

e-) que não houve publicidade enganosa, pois ficou contratado o valor residual a ser pago ao final;

f-) a legalidade da substituição do índice pactuado com fundamento no art. 1º da Lei 7.774/89;

g-) da correção, sob a alegação de que não majora a dívida, mas apenas atualiza o débito ante inflação;

h-) que o salário mínimo não é índice de reajuste, mas limite máximo de valor das prestações;

i-) que é de conhecimento do consumidor as quantias que devem ser pagas ao final das prestações, mediante simples cálculo aritmético;

j-) clareza na redação das cláusulas 5.1, 5.2 e 6, "h";

k-) no prazo de carência e entrega dos imóveis e de início das obras, sob o fundamento de que o empreendimento está sendo realizado com base no art. 33 da Lei n. 4.591/94, e que a utilização do critério de contemplação preferencial ao comprador que tiver menor saldo devedor é forma de evitar empate;

l-) que o prazo de entrega das obras é fixado em favor do consumidor como forma de estabelecer a tolerância máxima de prorrogação da entrega das obras por ocorrência de caso fortuito ou força maior, ou pela inadimplência de mais de 25% (vinte cinco por cento), e que expirado o prazo, às rés passariam a responder pelo atraso;

m-) na cobrança de juros moratórios no importe de 1% ao mês e multa contratual de 10%, ao argumento de que o contrato foi assinado anteriormente à Lei n. 9.868/96 e que é lastreado pelas normas de corretagem, obedecendo inclusive à tabela de preços dos serviços de intermediação imobiliária;

n-) legalidade na devolução dos valores pagos de forma parcelada em caso de rescisão contratual com início a partir de sessenta dias da data desta, por considerar rescindido o contrato efetivamente, somente a partir de 135 dias do inadimplemento;

o-) que a estipulação de posse precária ao consumidor visa proteger o fornecedor de eventual dívida fiscal e que a impenhorabilidade é importante porque a garantia hipotecária pode ser desconstituída judicialmente;

p-) que o valor pago a título de seguro de vida beneficia o consumidor, seus sucessores e herdeiros, havendo a quitação do débito em caso de falecimento, se houver a pontualidade no pagamento das prestações, e que os herdeiros e sucessores são responsabilizados pelo cumprimento do contrato na medida em que os imóveis integrarem a herança que responde pelas dívidas;

q-) da proibição da interferência dos adquirentes, dizendo que é importuna ante as normas de segurança no trabalho da construção civil, bem como pelo fato de não haver a especificação da propriedade de cada um antes da entrega das chaves dos imóveis;

r-) da eleição do foro da celebração do contrato.

Pugnam pela improcedência dos pedidos formulados pelo autor. Juntaram documentos e colacionaram fartas citações doutrinárias, bem como extenso julgado.

O Ministério Público às fls. 841-854 impugnou as contestações apresentadas, repisando integralmente as alegações firmadas na exordial, rebatendo a tese de que o contrato foi revisto pelo Ministério Público, ao argumento de falta de prova e que tal fato não desconstitui o direito à propositura da presente ação civil pública, bem como não produz efeito jurídico. Juntou documentos de fls. 855-881 e 884-904.

Oportunizado aos réus manifestarem-se sobre os documentos (fl.905), os requeridos Nova Cap, Marcos Augusto e Nelson Benedito o fizeram às fls. 906-914.

À fl. 917 determinou-se a especificação de provas, designando-se audiência preliminar.

Especificadas provas às fls. 926.

Realizada audiência de tentativa de conciliação à fl. 927, restou inexitosa.

O Ministério Público formulou pedido liminar de antecipação dos efeitos da tutela às fls. 929-931, indeferido às fls. 938-941, sendo designada audiência de instrução.

Formulado novo pedido liminar pelo Ministério Público às fls. 950-955, foi deferido às fls. 998-1000, determinando-se a suspensão da exigência do pagamento das parcelas referentes aos imóveis do Conjunto Habitacional Nova Europa que ultrapassasse a centésima prestação, sob pena de multa.

Realizada audiência de instrução às fls. 1111-1127, foram tomados depoimentos testemunhais e juntados documentos de fls. 1128-1186, abrindo-se prazo para apresentação de memoriais.

Em alegações finais, os requeridos Nova Cap, Nelson Benedito e Marcos Augusto impugnaram os documentos de fls. 1149-1153 e 1155-1186, ratificaram as teses defendidas em contestação e pugnaram pela revogação da tutela antecipatória.

Os requeridos Progemix e Analgides ofertaram razões derradeiras às fls. 1223-1306, idênticas à peça contestatória.

O Ministério Público apresentou memoriais às fls. 1200-1218, repisando a inicial.

Petição informando descumprimento da liminar pelos requeridos às fls. 1345, instruída pelos documentos de fls. 1346-1351.

A requerida Progemix formulou pedido de suspeição, juntado indevidamente às fls. 1353-1354, no entanto desistiu à fl. 1365, o que foi homologado à fl. 1366.

Os autos vieram-me conclusos.


Relatei o necessário. Decido.

A presente ação foi proposta em 27.02.98 (fl. 248), regularmente instruído o feito encontra-se apto a ser sentenciado desde meados do mês de agosto de 2002; contudo, foi remetido a esta Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos na data de 12.04.2005, pendente de julgamento.

São pontos controvertidos enfocados nesta ação:

1-) publicidade enganosa;

2-) abusividade e ilegalidade das cláusulas contratuais;

3-) aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor face a alegada livre manifestação da vontade e pacta sunt servanda;

4-) regularidade do cumprimento das obrigações assumidas;

5-) concessão das tutelas: ressarcitória, de remoção do ilícito, de obrigação específica e inibitória.


1- Breve escorço histórico

A sociedade de consumo é fenômeno recente característico da sociedade em massa que surgiu após a Revolução Industrial ocorrida no século XVIII e se intensificou após a Segunda Grande Guerra Mundial.

Todavia, o ordenamento jurídico do Século XIX era ainda representado pelas grandes codificações de direito privado e marcado pela acentuada divisão clássica do direito em público e privado, com a consolidação de um sistema normativo fechado, auto-suficiente, ao qual o juiz deveria ficar preso, orientado pela previsão de todas as condutas do fenômeno social que interessassem ao direito, especialmente o direito obrigacional, traçado pela máxima da autonomia da vontade e igualdade formal das partes. Entretanto, a sociedade em massa gera consumo em massa, fenômeno característico das sociedades industriais em que a economia é orientada para satisfação das carências dos consumidores, gerando diversos reflexos sociais, tanto positivos (dentre os quais: facilitação do acesso aos bens de consumo), quanto negativos (por exemplo: inadequação do sistema jurídico clássico para resolução justa dos litígios).*

Assim, as consequências geradas pelo fenômeno da sociedade de massa fizeram surgir novas relações jurídicas não regulamentadas pelos sistemas fechados, de forma que o consumidor visivelmente passou a figurar como parte fraca e sem efetiva proteção jurídica.

Ciente da inadequação do sistema do direito civil clássico, incapaz de tutelar efetivamente os consumidores, a Constituição Federal de 1988, instituindo o Estado Democrático de Direito, com o intuito de implantação da justiça material, veio a implementar a transformação do sistema jurídico brasileiro, estabelecendo a defesa do consumidor como direito fundamental (art. 5º, inciso XXXII), e princípio da ordem econômica (art. 170, inciso V)*. Ordenou, ainda, a Carta Magna, a elaboração de um código de defesa do consumidor no art. 48 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias*, rompendo com a doutrina do monossistema e implantando a doutrina dos microssistemas.

Promulgado o Código de Defesa do Consumidor – Lei n. 8078/90, como norma de ordem pública e interesse social, de caráter eminentemente protetivo ao consumidor, decorrente diretamente de mandamento constitucional e pautado nos princípios constitucionais.

Tanto é assim que denominou-se como sistema jurisdicional coletivo o ordenamento composto, na base, pela Constituição Federal, a Lei de Ação Civil Pública, o Código de Defesa do Consumidor e subsidiariamente o Código de Processo Civil, sem prejuízo da aplicação das legislações específicas no que for compatível.

É necessário no processo coletivo, que haja o desprendimento da tradição privativista, por ser inadequada para julgamento de conflitos da sociedade de massa do século XX, por isso é que o Código de Defesa do Consumidor traz regras específicas de proteção ao consumidor na sociedade capitalista contemporânea e gera toda sorte de dificuldades de interpretação quanto às questões contratuais.

Por sorte, o Juiz no sistema jurisdicional coletivo atua amparado pelos princípios constitucionais, de maneira que os textos legais são aplicados de acordo com os valores da Constituição buscando a efetividade da prestação jurisdicional invocada.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Dorival Moreira. Incorporação imobiliária:: sentença em ação civil pública contra cláusulas ilegais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 861, 11 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16649. Acesso em: 19 abr. 2024.

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