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Juiz de Tucuruí usa WhatsApp para notificar partes no Suriname

O Juiz do Trabalho Ney Maranhão, Titular da Vara do Trabalho de Tucuruí (PA), utilizou o aplicativo de mensagens por celular WhatsApp para notificar e dar ciência da sentença aos reclamados que se encontram no Suriname.

O uso de redes sociais e aplicativos de mensagens pelo Poder Judiciário é cada vez mais frequente. As vantagens são inúmeras, desde a agilidade até a redução de gastos. E o objetivo principal é entregar uma prestação jurisdicional efetiva ao cidadão.

Um bom exemplo aconteceu no último mês de junho. O Juiz do Trabalho Ney Maranhão, Titular da Vara do Trabalho de Tucuruí (PA), utilizou o aplicativo de mensagens por celular WhatsApp para notificar e dar ciência da sentença aos reclamados que se encontram no Suriname. O caso, movido pelo Ministério Público do Trabalho, envolve empresa do setor madeireiro e possui fortes indícios de tráfico humano internacional. A urgência da ação deve-se ao fato de que o trabalhador desenvolveu grave doença ocupacional.

Após várias tentativas convencionais, com utilização de carta rogatória, gastos com tradutor juramentado e os trâmites envolvendo o Ministério das Relações Exteriores, o que restou como efetivo foi o uso da inovação, que permitiu o andamento do processo. Na entrevista, abaixo, entenda melhor o caso.


ASCOM - Em que processo aconteceu a notificação?

Juiz Ney Maranhão - A notificação pela via do WhatsApp aconteceu nos autos do processo 0002736-51.2013.5.08.0110, que tramita perante a Vara do Trabalho de Tucuruí (PA). Trata-se de reclamação trabalhista ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em favor de Manoel Martins Pereira e em face de Brokopondo Watra Wood International N.V., pessoa jurídica de direito privado do ramo madeireiro, constituída e sediada na República do Suriname, bem como Jessé Oliveira Ferreira, cidadão brasileiro, com último domicílio nacional na cidade de Tucuruí/Pa, apontado como intermediador de mão de obra para a 1ª reclamada e que atualmente também reside no Suriname. O caso envolve fortes indícios de tráfico humano internacional, sendo que o reclamante, por conta de suas atividades laborais, desenvolveu grave doença ocupacional.

ASCOM - Qual motivo o levou a utilizar o aplicativo de mensagens?

Juiz Ney Maranhão -  Tendo em vista a ausência de domicílio dos reclamados em território nacional, foi expedida carta rogatória para notificação a respeito da sessão inaugural, o que exigiu gastos com tradutor juramentado e sujeição ao trâmite burocrático que envolve o Ministério das Relações Exteriores. Passado longo tempo e mesmo diante de diversos contatos por e-mail e telefone, até a data da audiência não obtivemos informações sobre o cumprimento regular da carta rogatória. No entanto, em audiência, apresentaram-se para depor diversas pessoas, cujos relatos subsidiaram o meu convencimento de que, apesar da ausência de resposta oficial, a carta rogatória expedida tinha cumprido o seu propósito, tendo ficado provado que, verdadeiramente, os demandados detinham pleno conhecimento do trâmite do processo, inclusive da sessão inaugural. Entre as pessoas ouvidas, estavam os irmãos de criação do 2º reclamado, bem como a esposa de outro trabalhador que continua no Suriname. Na ocasião, informaram o número de telefone celular do 2º reclamado, inclusive destacando que o mesmo usava WhatsApp. Com base nessa prova oral colhida em sessão, dei como regularmente intimados os demandados, reconhecendo a ausência injustificada e aplicando-lhes a pena de confissão ficta quanto à matéria de fato. Na mesma sessão prolatei a sentença de condenação (anotação de CTPS, verbas contratuais e rescisórias, além de indenização por dano moral), de cujo conteúdo os reclamados deveriam ser novamente notificados. Mas, a se seguir o procedimento tradicional, outra carta rogatória deveria ser expedida, com novos gastos com tradutor juramentado e sujeição ao mesmo lento e burocrático procedimento, o que exigiria, também, enfrentar a mesma problemática, por tempo indefinido, quanto à certeza da efetiva intimação. Diante desse cenário desmotivador e como o trabalhador beneficiário da ação ajuizada pelo MPT, infelizmente, está com situação de saúde delicadíssima, há muito se sujeitando a diversas e agressivas sessões de quimioterapia, a ilustre Procuradora do Trabalho, Dra. Verena Borges, pediu e eu deferi, em sentença, a intimação de ambos os reclamados pelo número de WhatsApp do 2º reclamado, agenciador de mão de obra da 1ª reclamada, Brokopondo Watra Wood International N.V. 

ASCOM -  Qual o fundamento legal para utilização do meio?

Juiz Ney Maranhão - Considerei que as circunstâncias do caso impunham o uso excepcional de tal recurso tecnológico, pelo que, à luz dos artigos 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, e 765 da CLT, bem como o próprio princípio da instrumentalidade das formas, determinei que assim se fizesse. Depois de me certificar com novos depoimentos a respeito do número de celular e da foto que havia no respectivo registro no WhatsApp, confirmando se tratar do 2º reclamado, a íntegra da sentença e o cálculo foram remetidos, respectivamente, por texto e fotografia, do aparelho celular do Oficial de Justiça, com relato claro acerca do que se tratava e disponibilizando números de telefone da Secretaria e e-mails da Vara, para eventual contato e saneamento de dúvidas. No mesmo dia, o aplicativo acusou a leitura pelo destinatário (duas linhas azuis), o que foi objeto de certificação nos autos. A certeza da eficácia da intimação da sentença pelo WhatsApp veio alguns dias depois, quando a empresa Brokopondo Watra Wood International N.V. encaminhou expediente para a Secretaria da Vara com suas alegações e impressões a respeito do caso.  

ASCOM -  O que o senhor achou da experiência?

 Juiz Ney Maranhão - A medida era realmente necessária e atingiu a sua finalidade. Em apenas algumas horas e utilizando-se de um famoso recurso tecnológico, conseguimos evitar gastos de dinheiro com tradução juramentada e ganhar um lapso temporal precioso para o caso, pois o reclamante está muito doente. É preciso refletir com mais intensidade a prática de atos processuais por meio de outros recursos tecnológicos e até redes sociais, como o Facebook, que já fazem parte do nosso dia a dia e também precisam ser incorporadas, caso a caso, como ferramentas viabilizadoras de uma boa e adequada prestação jurisdicional. Atualmente, estamos entrando na fase de execução do título executivo. Novas dificuldades surgirão. E todas serão enfrentadas ao seu tempo e por meio das medidas jurídicas adequadas.

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ASCOM – Algum fato que o senhor destacaria?

Juiz Ney Maranhão - É preciso destacar o elogiável empenho do MPT nesta ação. Primeiro, na pessoa do Dr. Hideraldo Luiz de Sousa Machado, competentíssimo Procurador que subscreveu a petição inicial e, ousadamente, defendeu a tese de que o MPT também pode atuar, excepcionalmente, em defesa de direitos individuais, argumentação jurídica que também acolhi em sentença. Em segundo lugar, na pessoa da Dra. Verena Vieira Sanches Sampaio Borges, arguta Procuradora que requereu a intimação dos reclamados sobre o teor da sentença pela via do WhatsApp e, em sessão, convenceu-me da pertinência dessa medida para aquela situação que estava sob meu crivo. Bom registrar que o uso dessa ferramenta tecnológica deve ser excepcional, à luz das circunstâncias de cada caso concreto. No processo em destaque, a angustiante fragilidade da saúde do reclamante, a denúncia de tráfico humano internacional e as enormes dificuldades financeiras e burocráticas que a via clássica de intimação nos oferecia me levaram a concluir que a expedição de nova carta rogatória, decididamente, não atenderia ao direito fundamental do autor de receber uma tutela jurisdicional adequada e efetiva. Ao fim, a intimação pela via do WhatsApp atendeu às peculiaridades da causa, resguardou um mínimo de segurança jurídica e, certamente, expressou a concreção dos princípios da informalidade, simplicidade e celeridade, tão caros ao processo do trabalho.

Fonte: ASCOM - TRT 8ª Região

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