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Menor sob guarda judicial é dependente previdenciário

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Agenda 16/02/2011 às 08:16

Parecer pela inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, de forma a garantir ao menor sob guarda judicial, provada a dependência econômica ao guardião segurado, a condição de dependente para fins de gozo dos benefícios previdenciários.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

Nº 115/2011 – BPS

ARG. INCONST. NO RECURSO ESPECIAL N° 720706/SE

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECURSO ESPECIAL. PREVIDÊNCIA SOCIAL. LEI 8.213/91, ART. 16, § 2º, COM A MODIFICAÇÃO DADA PELA LEI 9.528/97, QUE EXCLUIU O MENOR SOB GUARDA JUDICIAL DA PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ARGUIÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE.

- O menor posto sob guarda judicial, e provada a dependência econômica relativamente à pessoa do guardião, faz jus aos mesmos benefícios previdenciários devidos aos demais dependentes do segurado, haja vista a insofismável inconstitucionalidade de que padece o art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, após a redação dada pela Lei 9.528/97, que teve por escopo excluí-lo do rol de dependentes do segurado.

- Norma legal que colide com a Constituição Federal (art. 227, § 3º, II) porque exclui relativamente ao menor a garantia dos direitos previdenciários expressamente assegurada pela Lei Maior:"garantia de direitos previdenciários".

- Além disso, a Constituição Federal (art. 227, § 3º, VI) também assegura o "estímulo do poder público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado".

- Argüição incidenter tantum de inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, redação da Lei 9.528/97, que, desde que ocorra a sua admissão como prejudicial de mérito, pela Egrégia 5ª Turma, implicará a suspensão do julgamento do presente recurso especial e a submissão deste incidente ao julgamento prévio da Corte Especial, conforme previsto nos arts. 97 da Constituição Federal, 480 e 481 do CPC e 200 do RISTJ, além da Súmula Vinculante do STF n° 10.

- A discriminação introduzida pelo art. 16, § 2º, Lei 8.213/91, após a redação dada pela Lei 9.528/97, ao excluir o menor sob guarda judicial da condição de dependente do segurado, afronta igualmente o princípio constitucional da isonomia, previsto no art. 5º, caput, da CF/88, pois, do ponto de vista essencial, independente do nomen iuris do instituto jurídico sob cuja proteção estejam as crianças e adolescentes sujeitos à guarda judicial de outrem necessitam dos mesmos cuidados e da mesma proteção estatal dispensada aos demais dependentes.

- A declaração de inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, após a redação que lhe atribuiu a Lei 9.528/97, implicará a restauração do direito anterior que garantia ao menor sob guarda judicial a proteção previdenciária, porque tal declaração de inconstitucionalidade, no caso, implicará a restauração da vigência tanto do art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, na redação originária, ficando nulos ou inexistentes os efeitos da modificação introduzida pela Lei 9.528/97.

- Haja vista que a jurisprudência dominante tem recusado vigência e validade ao art. 33, § 3º, da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), após a nova redação dada ao art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, tal dispositivo certamente será integralmente restaurado em decorrência da inconstitucionalidade ora suscitada, até porque o Estado da Criança teve por finalidade disciplinar, na legislação ordinária, o princípio da "proteção integral à criança e ao adolescente", conforme expressamente previsto em seu art. 1º.

- A norma revogadora introduzida no art. 16, § 2º, Lei 8.213/91, após a redação dada pela Lei 9.528/97, também ofende o art. 5º, caput, e § 2º, da Lei Fundamental, por motivo de contrariedade à "Convenção Internacional dos Direitos Humanos da Criança", que o Brasil ratificou e cujo art. 26 dispõe:

"Art. 26. Os Estados Partes reconhecerão a todas as crianças o direito de usufruir da previdência social, e adotarão as medidas necessárias para lograr a plena consecução desses direitos, em conformidade com sua legislação nacional."

- Sendo certo que houve ofensa à regra de um tratado internacional firmado e ratificado por nosso País, agrediu a lei, por via de conseqüência, também a regra do § 2º do art. 5º da Constituição, que elegeu, como fonte de direito, a nível constitucional, "os tratados internacionais em que a República Federativa seja parte".

- Pedido de submissão do incidente de inconstitucionalidade à deliberação prévia da Egrégia 5ª Turma que, admitindo-o, deverá, por sua vez, submetê-lo à prévia deliberação da Egrégia Corte Especial, com a imediata suspensão do julgamento do presente recurso especial, até deliberação final da questão incidental pela Egrégia Corte Especial.

- Declarada a inconstitucionalidade do dispositivo em comento, pela Colenda Corte Especial, o que certamente ocorrerá, deverá ser necessariamente desprovido o presente recurso especial e, por via de consequência, mantido incólume o v. acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no julgamento do recurso de apelação do INSS, que garantiu ao menor sob guarda judicial, provada a dependência econômica ao guardião segurado, a condição de dependente para fins de gozo dos benefícios previdenciários.

O Ministério Público Federal, através do Subprocurador-Geral da República que esta subscreve, dirige-se respeitosamente à presença de Vossa Excelência para argüir, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei 8.213/91, após a redação que lhe atribuiu a Lei 9.528/97, que teve por finalidade excluir do menor sob guarda judicial o direito a ser considerado dependente do guardião, para fins de proteção previdenciária, tudo consoante o que se passa a expor, declarar e requerer nas linhas que se seguem.


1. DO PROCEDIMENTO ACERCA DA DECLARAÇÃO INCIDENTER TANTUM DE INCONSTITUCIONALIDADE

Antes de adentrarmos na discussão meritória da inconstitucionalidade, que nos seja lícito registrar, em avant première, que a arguição "incidenter tantum" de inconstitucionalidade, como por demais trivial, é questão prejudicial ao julgamento da causa principal pela Colenda 5ª Turma, julgamento que deverá ficar sobrestado, desde o momento em que vier a ser admitida a procedência do juízo de inconstitucionalidade, até a solução final deste, que compete à Colenda Corte Especial, consoante, aliás, vem inscrito, respectivamente, no art. 97 da CF [01], nos arts. 480 e 481 do CPC [02], e no art. 200 do RISTJ [03], na Jurisprudência do STF consolidada na Súmula Vinculante n° 10 [04], caso, por exemplo, do RE-AgR 156557, RTJ 151/302; RE-AgR 142652, RTJ 148/923; e RE-AgR 147702-RTJ 147/1079.

Por outro lado, o parágrafo único do art. 481 do CPC [05] exige que semelhante arguição de inconstitucionalidade não tenha sido ainda objeto de pronunciamento da Corte Especial do STJ ou do Plenário do STF, o que é exatamente o caso sob exame.

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A propósito, esclarece o Ministério Público Federal que, durante as pesquisas realizadas para a elaboração deste incidente, não se encontrou (tanto na Corte Especial do STJ como no Plenário do STF) sequer referência a algum feito em que haja sido apreciada a arguição de inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213/91, com a redação atual, que excluiu do menor sob guarda judicial a qualidade de dependente do segurado.


2. QUESTÕES RELEVANTES PARA A ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE

Conforme consta dos autos, o Ministério Público Federal propôs ação civil pública contra o INSS, objetivando compelir a autarquia previdenciária recorrente a promover a inclusão do menor sob guarda judicial como dependente equiparado ao filho do segurado.

Rejeitada a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, arguida pelo INSS, o eminente Juiz Federal em 1º Grau julgou procedente o pedido, confirmando a liminar deferida, para que o INSS, no Estado de Sergipe, considerasse o menor sob guarda judicial como dependente equiparado ao filho do segurado, no atinente ao direito aos benefícios previdenciários.

Da Decisão concessiva da liminar, podem ser transcritos os seguintes fundamentos, que tão bem revelam a necessidade da proteção previdenciária ao menor sob guarda judicial posto sob o pálio do Judiciário (fls. 13):

"O Ministério Público Federal, por um dos seus ilustres Procuradores, propõe a presente ação civil pública contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com pedido de liminar, objetivando compelir o réu a considerar o menor sob guarda judicial como dependente equiparado ao filho do segurado.

Fundamenta seu pedido na doutrina, jurisprudência e na inconstitucionalidade da MP 1.523-13/97, que excluiu 'o menor protegido pela guarda da proteção previdenciária.'

Com efeito, o M.P.F. revela-se perplexo com a 'urgência' do Presidente da República em excluir o menor sob guarda da proteção previdenciária, mas a medida provisória questionada, ao contrário, revela toda a filosofia do Governo que é, sempre, retirar proteção aos mais fracos, como menor e aposentado velho, pensando, assim, talvez, como forma mais eficaz de eliminá-los do seio da sociedade, num retrocesso histórico de ressurgimento dos párias, de forma institucional.

Em sua brilhante inicial, a inconstitucionalidade da famigerada medida provisória emerge de forma evidente, como inconstitucional é e será todo e qualquer dispositivo que negue, ao menor sob guarda, os benefícios previdenciários. Basta, para tanto, a leitura, ainda que desatenta, das regras do art. 227, § 3º, II, e art. 6º, da Constituição.

O bom direito, aqui, não se revela por qualquer fumaça, é explosivo, capaz de produzir nuvem de fumaça, que só não tira a visão das pessoas, porque é santa, balsâmica, confortante.

Quanto ao perigo da demora, desnecessário dele falar, salvo para lembrar o óbvio. O menor sob guarda, em quase 100% das hipóteses, é carente, e afastado de proteção previdenciária, seu destino é a rua, incomodando, inclusive, as elites, que temem e, muitas vezes, são vítimas também da violência dos miseráveis.

Isto posto, por todos esses fundamentos e pelos fundamentos da inicial que integram a este como se aqui estivessem transcritos, defiro a liminar para que o INSS em Sergipe considere o menor sob guarda judicial como dependente equiparado ao filho do segurado, na forma da Lei 8.213/91 e protegido pela Constituição Federal e pela Lei 8.069/90.

Deve ainda o réu receber os pedidos apresentados e deferi-los, nas condições acima e comunicar o teor desta decisão a todos os pontos de benefícios para que a observem." [São nossos os destaques].

E da Sentença podem ser trasladadas as seguintes passagens, por sua especial relevância (fls. 44):

"Cuidando-se exclusivamente de matéria de direito, opto pelo julgamento antecipado da lide.

Sobre a preliminar de ilegitimidade passiva do INSS, pouco importa a distinção que se proceda entre previdência e assistência. O que vale é a regra do art. 227 da Constituição, que impõe ao Estado assegurar uma série de direitos da criança e do adolescente.

....................................................

No mérito, a inconstitucionalidade da regra da Lei 9.528/97, que retirou, da proteção previdenciária, o menor sob a guarda judicial, afronta a regra do art. 227, § 3º, II, e art. 6º, da Constituição, de forma insofismável, a desmerecer maiores considerações. Quem quer que leia, ainda que superficialmente, a regra constitucional, não chegará a outra conclusão, senão a manifesta inconstitucionalidade.

Por outro lado, a Lei 9.528/97 ofende o art. 26 da Convenção Internacional sobre Direitos Humanos da Criança, que o Brasil ratificou, e cuja regra é a seguinte:

'Art. 26. Os Estados Partes reconhecerão a todas as crianças o direito de usufruir da previdência social, e adotarão as medidas necessárias para lograr a plena consecução desses direitos, em conformidade com sua legislação nacional.'

Ora, se houve ofensa à regra de um tratado internacional firmado pelo nosso País, agrediu a lei, por via de consequência, também à regra do § 2º do art. 5º da Constituição, que elegeu, como fonte de direito, a nível constitucional, 'os tratados internacionais em que a República Federativa seja parte'."

Inconformado, o INSS apelou, mas seu recurso foi desprovido pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, estando a tese do v. acórdão assim resumida na ementa a seguir transcrita (fls. 88/89):

"PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CABIMENTO. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. PENSÃO POR MORTE. SUPRESSÃO. INCONSTITUCIONALIDADE. EXISTÊNCIA.

- Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, visando a compelir o INSS a considerar o menor sob guarda como dependente equiparado ao filho do segurado da Previdência Social, a despeito da supressão de tal possibilidade pela Lei nº 9528/97.

- Em sede de controle difuso de constitucionalidade, a verificação da compatibilidade das normas concretamente aplicadas à lide, com o Texto Constitucional pode ser feita independentemente de provocação pelas partes, considerando-se a máxima de que o juiz conhece o direito aplicável (jura novit curia).

- Considerando-se que se cuida de discussão acerca de direitos indisponíveis de menores e a repercussão social da decisão, abrangendo todo o universo de segurados da Previdência no Estado de Sergipe, é cabível a ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal (CF, arts. 127 e 129).

- A criança e o adolescente, através da Constituição Federal de 1988 (art. 227), gozam de proteção dos direitos fundamentais à vida e à dignidade humana com todas as repercussões deles emanadas, não cabendo ao legislador ordinário impor-lhes qualquer limitação ao exercício desses direitos.

- Dentre o direito à proteção especial, conferido pelo legislador constituinte, à criança e ao adolescente, encontra-se a garantia de direitos previdenciários e trabalhistas.

- A guarda está definida no art. 33 do ECA como a situação jurídica constituída que obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais e o seu § 3º, também, confere à criança ou adolescente à condição de dependente para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários, como não poderia deixar de ser, tendo em vista a subordinação de seu texto aos ditames constitucionais.

- O Estatuto da Criança e do Adolescente, instituído pela Lei nº 8069/90, é de cunho especial e, portanto, há de prevalecer suas disposições sobre todas as demais de natureza genérica, tal como a da Lei nº 8.213/91, ou a de nº 9528/97 que, ao modificar-lhe a redação, excluiu o menor sob guarda do rol de dependentes dos segurados da Previdência Social, negando-lhe, assim, a proteção previdenciária inscrita no texto constitucional.

Preliminares rejeitadas e apelação do INSS improvida." (fls. 100/101). [São nossos os destaques].

Irresignado, o INSS interpôs o presente recurso especial, às fls. 103/121, buscando arrimo nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, além de reagitar a preliminar de ilegitimidade ad causam do Ministério Público Federal.

Além da preliminar, no mérito, o INSS sustenta que o v. acórdão recorrido divergiu da jurisprudência do Egrégio STJ, além de haver negado vigência à lei federal, no caso, a Lei 9.528/1997, que deu nova redação ao § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991, "que previa a figura do menor sob guarda, na condição de dependente equiparada ao filho" e, assim, "excluiu aquele último do rol de beneficiários do Regime Geral de Previdência Social" (fl. 105).

Prossegue a autarquia recorrente alegando que a aludida alteração legislativa somente permitiu a equiparação "ao filho do segurado, para fins previdenciários, unicamente do enteado e do menor tutelado, afastando – repita-se – o menor sob guarda da condição de dependente de segurado da previdência social" (fl. 112).

Sustenta ainda o recorrente que o instituto da guarda detém caráter provisório, tanto que pode ser revogado a qualquer momento; daí, encontrar-se o menor sob guarda "em situação transitória, contingente e precária, o que não ocorre, p. ex., com a tutela, instituto mais amplo e definitivo, por se tratar de sucedâneo do pátrio poder" (fl. 112).

No atinente à tese da inconstitucionalidade do art. 16, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 9.528/1997, tese acolhida pelo v. acórdão recorrido, sustenta o INSS que essa tese não pode prosperar, porque, conforme o art. 195 da CF, o legislador constituinte atribuiu ao legislador ordinário o disciplinamento do regime da Previdência Social, de sorte que, segundo o recorrente, é plenamente possível à lei ordinária, no caso, a Lei nº 9.528/1997, "fixar e alterar a relação daqueles que podem ser beneficiários dos segurados do INSS, sem que isso implique qualquer pecha de inconstitucionalidade" (fl. 114).

Assim sendo, no entender do recorrente, o art. 227, § 3º, II, da CF, quando assegura "direitos previdenciários" ao menor, "também não deixa de estar remetendo a disciplina de tais direitos ao âmbito da lei ordinária que, inelutavelmente, é a legislação previdenciária, e não o estatuto do menor" (fl. 114).

A seguir, o INSS sustenta que, ao contrário do entendimento acolhido pelo acórdão do Tribunal Regional Federal, a Lei nº 9.528/1997 revogou o § 3º do art. 33 da Lei nº 8.069/1990 (ECA), isto porque, embora o Estatuto da Criança e do Adolescente seja considerado lei especial, no caso, "a lei mais especial é a previdenciária, não aquele Estatuto" (fl. 115).

O recurso do INSS, contra-arrazoado pelo MPF às fls. 183/191, admitido por decisão da Presidência da egrégia Corte Federal da 5ª Região à fl. 193, ascendeu ao Superior Tribunal de Justiça, onde mereceu parecer "pelo conhecimento e não provimento", da lavra do eminente Subprocurador-Geral da República Antônio Fonseca (fls. 199/202).

Todavia, por r. decisão monocrática do eminente Relator, à época, Ministro Felix Fischer, às fls. 204/215, foi dado provimento ao recurso especial, para reconhecer a "ilegitimidade ativa do Ministério Público", tendo sido consideradas como "prejudicadas as demais alegações do recorrente".

Irresignado, o MPF interpôs o agravo regimental, às fls. 223/231, que foi desprovido, consoante v. acórdão às fls. 233/244, conforme entendimento resumido na ementa do v. acórdão à fl. 246, nestes termos:

"AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITOS INDIVIDUAIS DISPONÍVEIS. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE O INSS E O SEGURADO. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM.

A quaestio objeto da ação civil pública diz respeito a direito que, conquanto pleiteado por um grupo de pessoas, não atinge a coletividade como um todo, não obstante apresentar aspecto de interesse social. Sendo assim, por se tratar de direito individual disponível, evidencia-se a inexeqüibilidade da defesa de tais direitos por intermédio da ação civil pública. Destarte, as relações jurídicas existentes entre a autarquia previdenciária e os segurados do regime de Previdência Social não caracterizam relações de consumo, sendo inaplicável, in casu, o disposto no art. 81, III, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Precedentes.

Agravo regimental desprovido."

Na sequência foi interposto recurso extraordinário (RE 491.762-SE) pelo MPF, com as razões às fls. 255/270, contra-arrazoado às fls. 277/290, admitido às fls. 292/293, tendo sido provido, por r. decisão monocrática da lavra da eminente Ministra Carmen Lúcia, Relatora, para reconhecer a legitimidade ativa do MPF para a propositura da ação civil pública, conforme fls. 301/304, estando a r. decisão embasada nos seguintes fundamentos:

"3.

Razão jurídica assiste ao Recorrente.

4. A controvérsia em debate cinge-se à legitimidade do Ministério Público para a interposição de ação civil pública na qual se pleiteia a equiparação de menor sob guarda judicial a filho de segurado, para efeitos previdenciários.

5. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de ser legítima a atuação do Ministério Público na defesa de direitos que, embora individuais, possuam relevante interesse social, pois os chamados direitos individuais homogêneos estariam incluídos na categoria de direitos coletivos abrangidos pelo art. 129, inc. III, da Constituição da República (RE 163.231, Rel. Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, DJ 29.6.2001).

Ressalte-se, nesse sentido, o voto proferido pelo Relator do Agravo de Instrumento no Recurso Extraordinário 472.489, Ministro Celso de Mello, no qual se reconheceu o direito de segurados da Previdência Social à obtenção de certidão parcial de tempo de serviço e a legitimidade do Ministério Público para interpor ação com esse objetivo:

"Na realidade, o que o Ministério Público postulou nesta sede processual nada mais foi senão o reconhecimento − e conseqüente efetivação − do direito dos segurados da Previdência Social à obtenção da certidão parcial de tempo de serviço.

Nesse contexto, põe-se em destaque uma das mais significativas funções institucionais do Ministério Público, consistente no reconhecimento de que lhe assiste a posição eminente de verdadeiro ‘defensor do povo’ (...), incumbido de impor, aos poderes públicos, o respeito efetivo aos direitos que a Constituição da República assegura aos cidadãos em geral (CF, art. 129, II), podendo, para tanto, promover as medidas necessárias ao adimplemento de tais garantias, o que lhe permite a utilização das ações coletivas, como a ação civil pública, que representa poderoso instrumento processual concretizador das prerrogativas fundamentais atribuídas, a qualquer pessoa, pela Carta Política, ‘(...) sendo irrelevante o fato de tais direitos, individualmente considerados, serem disponíveis, pois o que lhes confere relevância é a repercussão social de sua violação, ainda mais quando têm por titulares pessoas às quais a Constituição cuidou de dar especial proteção’ (fls. 534 – grifei)" (Segunda Turma, DJ 29.8.2008 – Grifos nossos).

No mesmo sentido: RE 514.023-AgR, Rel.: Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe 5.2.2010; e RE 470.135-AgR-ED, Rel.: Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, DJe 29.6.2007.

6.

Na espécie vertente, pretende o Recorrente ver declarada sua legitimidade para a propositura de ação civil pública na qual se discutirá a equiparação de menores sob guarda judicial a filhos de segurados, para fins previdenciários.

Não há como deixar-se de reconhecer o relevante interesse social que a questão apresenta, ainda que não trate de relação de consumo, como afirmado a título de óbice pelo Tribunal de origem. Além disso, é de se considerar que a Constituição da República dispensa atenção especial aos cuidados e direitos da criança (art. 227, § 3º, inc. II). [São nossos os destaques].

O acórdão recorrido, portanto, diverge da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

7.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso extraordinário (art. 557, § 1ª-A, do Código de Processo Civil e art. 21, § 2º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal) para declarar a legitimidade do Ministério Público Federal para propor ação civil pública nos termos postos e determino o retorno dos autos ao Superior Tribunal de Justiça para que prossiga no julgamento da ação."

Digna de destaque a relevância social atribuída pelo Supremo Tribunal Federal à proteção especial devida à criança e ao adolescente, com fundamento no art.l 227, § 3º, II, da Lei Maior, que deverá constituir o objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça, uma vez que restou afastada a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal.

Sobre o autor
Brasilino Pereira dos Santos

procurador regional da República, mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Brasilino Pereira. Menor sob guarda judicial é dependente previdenciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2786, 16 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/18505. Acesso em: 25 nov. 2024.

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