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Mandado de segurança contra exame de admissão na OAB

Mandado de segurança pugnando pela inconstitucionalidade da exigência de Exame de Ordem para o exercício da advocacia.

EXMO. SR. DR. JUIZ FEDERAL DA ___ VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO CEARÁ:

MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO

COM PEDIDO DE LIMINAR

(DISTRIBUIÇÃO COM URGÊNCIA)

"Praesumptio juris a jure introducta est de jure,
super tali praesumptione lex inducit firmum jus et habet eam pro veritate"

brasileiro, casado, bacharel em direito, residente e domiciliado na rua Assunção, 1024, bairro José Bonifácio, nesta urbe, vem, respeitosamente, por intermédio de seu Advogado in fine subscrito(documento procuratório anexo - doc.1), com fulcro na CF/88 art.50, LXIX , leis 1.533/51 e 4.348/64, propor MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR contra o Sr. Presidente da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DO CEARÁ, pessoa jurídica de direito privado, com sede na Av. Pontes Vieira, 1713, nesta urbe, o que faz na forma dos fatos e fundamentos jurídicos adiante delineados:

PRELIMINARMENTE:

, com fulcro no art. 5o, inc. XXXIV,alínea "a", da Carta Magna em vigor, declarando, assim, ser pobre sob as penas das leis 1060/50 e 7115/83.

I - DO CABIMENTO DO WRIT


Estatui a Constituição Federal em vigor:

art.5o. (...)

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

Nos dizeres do saudoso Hely Lopes Meirelles:

Mandado de segurança é o meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça (Constituição da República, art. 5.o, LXIX e LXX - Lei 1.533/51, art. 1.o)


(in Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, "Habeas Data", Ed. RT, 12a. Ed., São Paulo, 1989.)

Face a inconstitucional restrição ao livre exercício da profissão(CF/88, art. 5.o, XIII), conforme será demonstrado, imposta por lei ordinária(Lei 8.906/94) e pela Ordem dos Advogados, a afronta aos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade e do direito à vida, fica evidente o cabimento do mandamus.

Para evidenciar tal direito, citamos, mais uma vez, o ilustrado mestre Hely Lopes Meirelles:

A lei em tese, como norma abstrata de conduta não é atacável por mandado de segurança (STF, Súmula 266), pela óbvia razão de que não lesa, por sí só, qualquer direito individual. Necessária se torna a conversão da norma abstrata em ato concreto, para expor-se à impetração, mas nada impede que, na sua execução, venha a ser declarada inconstitucional pela via do mandamus. Somente as leis e decretos de efeitos concretos tornam-se passíveis de mandado de segurança, desde a sua publicação, por equivalentes a atos administrativos nos seus resultados imediatos


(Ob. cit. pp.16/17).

II - DOS FATOS


No ano de 1993, o impetrante ingressou na Universidade de Fortaleza - UNIFOR, instituição particular de ensino superior reconhecida, através da Portaria nº 427, de 15 de julho de 1980, do Ministério da Educação.

Após cumpridas todas as exigências curriculares, o IMPETRANTE graduou-se Bacharel em Direito em 10/07/98 (doc.2).

Com o advento da lei 8.906/94, de 04.07.94, em total afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do livre exercício das profissões e do direito à vida, conforme será demonstrado , foi negado ao Bacharel em Direito, o exercício legal de sua profissão, sem a prestação do exame de ordem instituído pelo controverso inciso IV, do art. 8º. da lei supramencionada.

É fato notório Ínclito Julgador, que os graduados em outras áreas, após a colação de grau, bastam dirigir-se aos seus respectivos Conselhos, cuja função é meramente regulamentadora do exercício da profissão, para estarem habilitados ao exercício das mesmas.

Os Conselhos Regionais e Federais pertinentes ao exercício de profissões liberais (médico, odontólogo, famacêutico, contador, advogado, etc...) têm por objetivo precípuo o controle do exercício profissional, principalmente no que se refere à questão da ética profissional e aos conseqüentes prejuízos causáveis à sociedade em decorrência de mau procedimento no exercício da profissão.

A instituição desta exigência, que é o exame para ingresso na Ordem dos Advogados, somente ocorreu porque o Congresso Nacional, sem as cautelas devidas, vota leis pós-constituinte que permitem atropelos de toda espécie aos mais primários princípios de nossa Carta Política.

"A universidade, por expressa delegação do poder público(art. 207 da CF/88 e Lei 9.394/96, art.53,VI), detém a prerrogativa legal de outorgar ao aluno o diploma de Bacharel em Direito. Essa formalidade de outorga de grau é pública e solene, proclamada pelo Reitor, que, neste ato, representa o Chefe de Estado, sua Excelência o Presidente da República, com as seguintes palavras: " Estais, de agora em diante, habilitado e qualificado para o exercício de vossa profissão". Em face disto, invade a Ordem dos Advogados a esfera de competência das universidades pois, somente a elas, foi delegado o poder de habilitar e qualificar seus bacharéis para o exercício de sua faina"


( trecho da entrevista do Dr. Habib Tamer Badião, professor de Direito e História, publicada na revista Consulex no 1, de 31.01.97).

Ora Exa., o que vem ocorrendo é que, a IMPETRADA, impossibilita o trabalho de quem está legalmente habilitado para o exercício de sua profissão, por força da delegação concedida pelo Poder Público às universidades (CF/88 e Lei 9.394/96), com base em dispositivo de lei infraconstitucional(Lei 8.906/94), engrossando, desta forma, a legião de desempregados existentes em nossa Nação, como se já não bastasse o índice elevado de desemprego existente e notório.

Por isso, cabe à Justiça, a exclusão do mundo jurídico, de dispositivos legais inconstitucionais, para que possa, acima de tudo, prevalecer o Estado Democrático de Direito, conforme consubstanciado no caput do art.10, do Diploma Legal Fundamental de nossa pátria.



III - DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS:


1.1 - DA SUPREMACIA CONSTITUCIONAL

governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas atribuições nos termos nela estabelecidos. Por outro lado, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição federal
(Obra citada, Malheiros Editores, São Paulo, 1993, 9a. Edição, p.47).

O princípio da supremacia requer que todas as situações jurídicas se conformem com os princípios e preceitos da Constituição


(Ob.cit.p.48)

Inconstitucionalidade por ação ocorre com a produção de atos legislativos ou administrativos que contrariem normas ou princípios da constituição. O fundamento dessa inconstitucionalidade está no fato de que do princípio da supremacia da constituição resulta o da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com as normas de grau superior, que é a constituição. As que não forem compatíveis com ela são inválidas, pois a incompatibilidade vertical resolve-se em favor das normas de grau mais elevado, que funcionam como fundamento de validade das inferiores. Essa incompatibilidade vertical de normas inferiores(leis, decretos etc.) com a constituição é o que, tecnicamente, se chama inconstitucionalidade das leis ou dos atos do poder público, e que se manifesta sob dois aspectos: a) (...); b) materialmente, quando o conteúdo de tais leis ou atos contraria preceito ou princípio da constituição". Essa incompatibilidade não pode perdurar, porque contrasta com o princípio da coerência e da harmonia das normas do ordenamento jurídico, entendido, por isso mesmo, como reunião de normas vinculadas entre si por uma fundamentação unitária


(Ob.cit. p.48).

Por afronta aos princípios constitucionais adiante consignados, a exigência do "Exame de Ordem" manifesta-se na forma de inconstitucionalidade material, posto que, contraria preceitos e princípios contidos na Carta Magna. A incompatibilidade, conforme será demonstrada, entre o dispositivo legal(art. 8.o, inc. IV, da Lei 8.906/94 - Estatuto da Advocacia -) e a CF/88, não pode perdurar sob pena de infringência aos princípios da coerência e da harmonia do ordenamento jurídico; não bastasse o conflito gritante com a Lei 9.394/96, suscitado no presente mandamus.

Também, nos dizeres de Yoshiaki Ichihara, magistrado e professor de direito paulista:

Toda norma que contrariar ou não se fundamentar em uma norma hierarquicamente superior, será sempre inválida.


(ICHIHARA, Yoshiaki. Direito tributário. 6a. Edição. São Paulo. Editora Atlas. 1994).

Na sábia observação dos doutrinadores, todos excercem suas funções dentro dos parâmetros limitadores das normas constitucionais. As limitações servem precípuamente ao princípio da segurança jurídica, sem o que, estabelecer-se-ia o caos com a invasão dos diversos agentes na esfera de competência uns dos outros.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação

(Lei 9.394/96), que contém em seu seio os comandos constitucionais atinentes ao Título VIII, Capítulo III, Seção I, da CF/88, é o grande círculo demarcador da esfera de competência das universidades, e, dentre elas, está a de capacitar e qualificar seu corpo discente para o exercício de sua atividade laboral após a colação de grau(art.20, do mencionado diploma legal - cópia fiel do art.205 da CF/88- e arts.43,II e 53,VI da mesma lei ). Em momento algum, atribui a CF/88 ou a Lei de Diretrizes e Bases tal delegação a qualquer órgão, que não as escolas de nível superior, muito menos à Ordem dos Advogados do Brasil.

1.2 - DA AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE HUMANA, DA IGUALDADE, DO DIREITO AO TRABALHO E DO DIREITO À VIDA


Estatui a Carta Magna em vigor, em seu art. 10, incisos III e IV, verba legis:

Art.10 . A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I) ..........................

II) .........................

III) a dignidade da pessoa humana;

IV) os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V) ..........................

De forma sábia, vislumbrou o legislador constituinte, a dignidade e o trabalho como pilares básicos não só do Estado como da própria existência humana. Negar o direito ao trabalho, ou ao exercício da profissão, é negar o direito à dignidade da pessoa humana, é afrontar estes dois princípios lapidares e fundamentais à existência do homem e, por conseqüência, do próprio Estado.

Nos dizeres de J. Cretella Jr., in Comentários à Constituição de 1988, encontramos o binômio trabalho-dignidade como algo que jamais poderá ser alijado um do outro, senão vejamos:

O ser humano, o homem, seja de qual origem for, sem discriminação de raça, sexo, religião, convicção política ou filosófica, tem direito a ser tratado pelos semelhantes como "pessoa humana", fundando-se o atual Estado de direito, em vários atributos, entre os quais se inclue a "dignidade"do homem, repelido, assim, como aviltante e merecedor de combate qualquer tipo de comportamento que atente contra esse apanágio do homem. Sob dois ângulos, pelo menos, o trabalho pode ser apreciado: pelo individual ("o trabalho dignifica o homem") e pelo social, afirmando-se, em ambos os casos, como valor que na escalonação axiológica se situa em lugar privilegiado. Dignificando a pessoa humana, o trabalho tem valor social dos mais relevantes, pelo que a atual Constituição o coloca como um dos pilares da democracia


(Obra citada, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 3a. ed., 1992, p.139/140)

1.2.2 - DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E DO DIREITO À VIDA


Estatui o art. 5º., caput da Carta Política em vigor, verba legis:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem dinstinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à propriedade, nos termos seguintes:(...).

Viola o art.80, inc.IV,da lei 8.906/94, um dos mais elementares princípios constitucionais, o da igualdade, na medida que cria um impedimento para o exercício profissional que não existe para os demais bacharéis, ou seja, a exigência absurda de um exame, que de modo algum, prova a capacidade profissional para o exercício da advocacia (vide docs. 04/05).

O bacharel em medicina, para clinicar, basta tão somente ser graduado pela sua escola superior e depois dirigir-se ao Conselho Regional de Medicina para se inscrever. O mesmo acontecendo com os odontólogos, engenheiros, contabilistas, químicos, arquitetos, veterinários, administradores, economistas, farmacêuticos, etc. Isto porque, o reconhecimento da profissão se exaure na simples colação de grau que lhes é proclamada pelo Reitor da universidade, detentor exclusivo de tal prerrogativa.

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A exceção criada pelo controverso art.80, inc. IV, da lei 8.906/94, esbarra frontalmente com o princípio da igualdade que, nos ditos de Celso Ribeiro Bastos e Yves Gandra Martins consiste em: " tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida que eles se desigualam" ( in, Comentários à Constituição do Brasil, 2.vol., Ed. Saraiva, São Paulo, 1989, 1a. Edição, p.9).

No caso em tela, tratam-se de bacharéis(iguais) que são submetidos a tratamento diferenciado(desigual), o que ocasiona a flagrante violação a um princípio constitucional.

Vale aqui ressaltar a lição de Celso Ribeiro Bastos e Yves Gandra Martins, na obra citada, pp. 9/10:

Mais uma vez resulta claro que o problema da isonomia só pode ser resolvido a partir da consideração do binômio elemento discriminador - finalidade da norma. Com relação a este último elemento - finalidade da norma - podemos concluir que qualquer texto legal se situará perante a Constituição em uma das três posições: a) adaptado às finalidades encampadas pelo Texto Maior, implícitas ou explícitas; b) antagônicos aos referidos objetivos; e c) neutro, nas hipotéses em que o Texto Constitucional não trata da Teleologia visada pela norma, quer para acolhê-la, quer para rejeitá-la. Nos dois primeiros casos a solução é curial: constitucional na letra a e inconstitucional na letra b (...).

Corroborando o antedito, citamos o eminente jurista José Afonso da Silva(ob.cit.,p.208), numa brilhante alusão ao tema:

A outra forma de inconstitucionalidade revela-se em se impor obrigação, dever, ônus, sanção ou qualquer sacrifício a pessoas ou grupos de pessoas, discriminando-as em face de outros na mesma situação que, assim, permaneceram em condições mais favoráveis. O ato é inconstitucional por fazer discriminação não autorizada entre pessoas em situação de igualdade. Mas aqui, ao contrário, a solução da desigualdade de tratamento não está em estender a situação jurídica detrimentosa a todos, pois não é constitucionalmente admissível impor constrangimentos por essa via. Aqui a solução está na declaração de inconstitucionalidade do ato discriminatório em relação a quantos o solicitarem ao poder judiciário, cabendo também a ação direta de inconstitucionalidade por qualquer das pessoas indicadas no art.103.

Quanto ao direito à vida inserido no mesmo texto já suscitado(art.5o, caput da CF/88), trata-se de norma de aplicabilidade imediata, como são a maioria das normas atinentes aos direitos individuais, não necessitando portanto, de qualquer norma regulamentadora.

A doutrina, acerca do assunto, expôe fartamente comentários que apoiam o direito dos requerentes, posto que, direito à vida e direito ao trabalho que gera renda e mantém o ser vivo, são duas coisas que jamais poderão ser dissociadas, senão vejamos:

"O "direito à vida" é o primeiro dos direitos invioláveis assegurados pela Constituição. "Direito `a vida" é expressão que tem no mínimo dois sentidos, (a) o "direito de continuar vivo, embora se esteja com saúde e

(b) "o direito de subsistência": o primeiro, ligado à segurança física da pessoa humana, quanto a agentes humanos ou não, que possam ameaçar-lhe a existência; o segundo, ligado ao "direito de prover a própria existência, mediante trabalho honesto". O trabalho, como meio de subsistência é poder-dever do Estado, que deve protegê-lo, assegurando-lhe condições necessárias para concretizar-se"


(JÚNIOR. Cretella. Comentários à Constituição de 1988. Vol.I. 3a. Edição.Rio de Janeiro. Ed. Forense Universitária. 1992.Pág. 183).

1.2.3 - DO DIREITO CONSTITUCIONAL AO TRABALHO


Aqui, faz-se necessário um parênteses, invocando a Lógica, a Semântica e a interpretação restritiva, valiosos auxiliares na interpretação hermenêutica da ciência jurídica pois, verbum ex legibus, sic accipiendum est: tam ex legum sententia, quam ex verbis - "O sentido das leis se deduz, tanto do espírito como da letra respectiva". Não se trata de noção comezinha de hermenêutica(como dito pelo douto representante da IMPETRADA em uma das informações prestadas), e sim, de meios colocados à disposição do raciocínio lógico, pela própria hermenêutica, para uma melhor interpretação do sistema normativo objetivo.

Para que possamos atingir o verdadeiro âmago do significado de "qualificações profissionais que a lei estabelecer", é preciso mais que mera retórica sofista (como a usada pela IMPETRADA quando das informações prestadas em processo semelhante), devemos deduzir, o real significado dado pelo Legislador Constituinte à expressão "qualificações profissionais que a lei estabelecer", de forma restritiva, como vem fazendo o Supremo Tribunal Federal, na interpretação dos dispositivos constitucionais vigentes.

São as palavras signos que encerram um sentido. Agrupadas, enfeixam, em reduzida síntese, um processo complexo de pensamentos.

A análise semântica, aliada à Lógica, é fundamental em tal mister. Ensina-nos o grande mestre Aurélio Buarque de Holanda em sua monumental obra, Novo Dicionário Aurélio, o verdadeiro sentido da palavra qualificação: "Qualificação. S.f. 1. (...). 3. Cabedal de conhecimentos ou atributos que habilitam alguém ao desempenho de uma função". É certo que, conhecimento se adquire através de estudo sistemático, em instituições próprias, e não através de exames meramente auferidores dos mesmos.

Já exame, nos dizeres do mestre, significa: " Exame (z). [Do lat. examen.] S.m. 1. Ato de examinar; interrogatório. (...)".

Importante se faz a distinção entre "qualificação profissional", cabedal de conhecimentos,e "exame de ordem", mero auferidor de conhecimentos e não qualificador do exercício profissional. Isto por que, na maioria das vezes, o aplicador do direito não vislumbra o mesmo como um todo harmônico, e sim, impregna sua compreensão, desviado por aspirações, preferências e preconceitos pessoais, desviando-se do sentido teleológico da norma.

Com o auxílio da lógica deduzimos que, cada palavra carrega em sí um significado, da mesma forma, uma expressão traz em sí um conteúdo. Daí a necessidade de dissecá-las e diferenciá-las, se não o fizermos, chegaremos ao absurdo de dizer que a palavra "casa", tem o mesmo significado da palavra "carro".

A dessemelhança constatada a nível semântico é fundamental para externar a verdadeira diferença entre "qualificação profissional" e "exame de ordem". "Qualificação" se dá através do ensino em instituições próprias, reconhecidas pelo poder público (CF/88, art.205 e Lei 9.394/96 art.1.o, § e art. 2.o) , enquanto "exame", é mera auferição de conhecimentos.

E, exatamente neste ponto, a Constituição Federal é de clareza solar no tocante ao livre exercício das profissões, "atendidas as qualificações profissionais estabelecidas em lei", e não a "exames prestados ou estabelecidos em lei". As exceções ao disposto neste artigo, são estabelecidas pelo próprio Legislador Constituinte, como na prestação de concurso público para o exercício de cargos públicos(CF/88, art. 37,II). Observemos o Texto Magno:

Art. 5º. TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI, SEM DISTINÇÃO DE QUALQUER NATUREZA, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XIII - É LIVRE O EXERCÍCIO DE QUALQUER TRABALHO, OFÍCIO OU PROFISSÃO, ATENDIDAS AS QUALIFICAÇÕES PROFISSIONAIS QUE A LEI ESTABELECER;

Nenhuma outra restrição é imposta pelo Legislador Constituinte e, onde tal não acontece, não pode fazê-lo o legislador ordinário.

Se não bastasse, a Carta Magna em vigor, estabelece ainda em seu artigo 205, o seguinte:

art.205. A educação direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercicio da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

A simples associação entre o dispositivos constitucionais em tela , mostra claramente, a educação como fonte única e geradora da qualificação para o trabalho . Neste ponto, a Carta Magna é taxativa.

Aqui vale ressaltar a lição sempre atual do eminente jurista Carlos Maximiliano, ex-Ministro da Corte Suprema, vejamos:

Não se presumem antinomias ou incompatibilidades nos repositórios jurídicos ; se alguém alega a existência de disposições inconciliáveis, deve demonstrá-la até a evidência. Supõe-se que o legislador, e também o escritor do Direito, exprimiram o seu pensamento com o necessário método, cautela, segurança; de sorte que haja unidade de pensamento, coerência de idéias; todas as expressões se combinem e harmonizem. Militam as probalidades lógicas no sentido de não existirem, sobre o mesmo objeto, disposisões contraditórias ou entre sí incompatíveis, em repositório, lei, tratado ou sistema jurídico.


(Maximiliano, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. Forense. Rio de Janeiro. 13a. Ed. 1993. p. 134)

Precisamente aqui (na associação entre o art. 5.o, XIII e art.205 da CF/88), vemos dois dispositivos constitucionais complementando-se, um dando sentido lógico ao outro. A educação é condição sine qua non para o exercício laboral e, pressuposto essencial na qualificação para seu exercício. Esta interpretação presume-se correta, posto que, tratam-se de dispositivos encontrados no mesmo corpo legal(CF/88), o que notoriamente não ocorre com o inc. IV, do art. 8.o da Lei 8.096/94, lei ordinária e infraconstitucional que impõe o Exame de Ordem como qualificador do exercício profissional.

Endossando tal ponto de vista, vemos que uma lei é constitucional, na medida em que se aproxima do sentido denotado no texto da Lei Maior. Para melhor explicitar tal afirmação, recorremos, mais uma vez, ao saudoso hermenêuta, Carlos Maximiliano, in verbis:

(...). O estatuto ordinário, embora contemporâneo do Código supremo, não lhe pode revogar o texto, destruir-lhe o sentido óbvio, estreitar os limites verdadeiros, nem alargar os limites naturais (...).

367- IV. Sempre que for possível sem fazer demasiada violência às palavras, interprete-se a linguagem da lei com reservas tais que se torne constitucional a medida que ela institui, ou disciplina.


(Ob. cit. p. 315).

Neste ponto, Perleúdo Julgador, suscitado o conflito entre o Texto Maior(art.5.o, XIII e art.205), a Lei 9.394/96(art.2.o) que lhes complementa o sentido e o controverso inc.IV, do art 8.o , da Lei 8.096/94, é que reside o cerne da questão, vez que, a própria Carta da República prevê, em seu art. 5º, XIII, ser livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer."

A qualificação profissional para o exercício da advocacia é outorgada na forma da legislação vigente, pelo Magnífico Reitor de cada universidade (CF/88, art. 207 e Lei 9.394/96). Os condicionamentos capacitários para o exercício de uma profissão ocorrem através do aprendizado ministrado em cursos específicos, e não através do Exame de Ordem. Obviamente, a própria Carta Política cria exceções a este princípio, como é o caso da investidura em cargo ou emprego público que depende de prévia aprovação em concurso (CF/88, art.37,II).

Ex positis, os argumentos aduzidos nas informações prestadas pela mesma autoridade em diversos processos em trâmite na Justiça Federal do Ceará, dentre eles o de que, se para o exercício do munus de magistrado, promotor, procurador, defensor e afins, os bacharéis em direito submetem-se a processo seletivo, o devem fazer também para o exercício da advocacia, são frágeis e inconsistentes, não merecendo prosperar. Ademais, tais certames aos quais se refere a IMPETRADA tem o objetivo precípuo de cumprir a exigência constitucional do concurso público (Art.37, II CF/88).

Ora, Excelência, tal raciocínio simplista, por si só, já fere a ISONOMIA consagrada no Texto Constitucional, posto que, todos os bacharéis, após a colação de grau, encontram-se aptos a exercerem suas respectivas atividades profissionais, o que não ocorre com os bacharéis em direito.

Quanto a tese de que, por exercer o Advogado função essencial a Justiça, deva este se submeter ao Exame de Ordem sob pena de prejuízo à sociedade em decorrência de possíveis danos causados por maus profissionais, pergunta se:

E os bacharéis em engenharia, que após colarem grau iniciam o LIVRE exercício da profissão, bastando apenas inscreverem-se no respectivo Conselho, não estão sujeitos a causarem danos à sociedade? E os médicos que lidam com a vida humana, fonte de todos os bens jurídicos, enfermeiros, arquitetos, ...? Pergunta-se ainda: o poder fiscalizador da Ordem dos Advogados do Brasil, consubstanciado no artigo 105, I do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB e artigo 50 do Código de Ética da OAB, não seria mais eficaz no combate aos maus profissionais que um simples exame?

Na realidade, o que a Carta Magna garante é o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, desde que não seja ilegal. Na atual conjuntura jurídica do país, a OAB não tem legitimidade para, em substituição ou equiparação a qualquer Universidade ou Faculdade, dizer se este ou aquele bacharel em Direito está ou não apto a exercer a advocacia. Essa função não é sua, mas tão-só das respectivas instituições de ensino superior, segundo as leis que lhes são aplicáveis.

Se o aluno colou grau e se a Faculdade lhe outorgou o título correspondente, por força de delegação que lhe deu o Poder Público, seja Federal, seja Estadual ou mesmo Municipal (art.211, CF/88), por que a OAB, com fundamento em uma simples norma infraconstitucional (Lei 8.906/94), tem poderes para negar tudo isso e impedir que o cidadão exerça sua profissão? Com outras profissões isso não ocorre, porquanto o formando, de posse do diploma, se registra automaticamente no seu respectivo Conselho Regional e parte para o trabalho. Porque só o advogado tem de se submeter a um "Exame de Ordem"?".(...). Tal discriminação imposta é clara afronta ao princípio constitucional da ISONOMIA.

Com o fito de reforçar tal argumento, usamos trecho da sentença exarada pelo Dr. Carlos Humberto de Souza, Juiz Federal da 3a. Vara da Seção Judiciária de Goiás - Proc. 96.10250-3:

A qualificação profissional do bacharel em Direito exaure-se, na atual conjuntura jurídico/ constitucional, na outorga do grau de bacharel em Direito, com a respectiva entrega do diploma, que produz efeitos jurídicos segundo as leis do país. Cabe à OAB, simplesmente, respeitar a referida outorga e o diploma. Continuo afirmando: se o curso foi bem ou mal feito, isto não interessa à OAB. Num segundo momento, ou seja, da inscrição do Bacharel em Direito nos quadros da OAB, e daí em diante, cabe à própria OAB e a mais ninguém, exercer todos os atos de controle do exercício profissional.

Sobre o tema, já manifestou-se o STF, mostrando, claramente que, o nexo lógico, conexo com a função a ser exercida é o conhecimento adquirido:

A legislação somente poderá estabelecer condicionamentos capacitários que apresentem nexo lógico com as funções a serem exercidas, jamais qualquer requisito discriminatório ou abusivo, sob pena de ferimento do princípio da igualdade

(STF - 1a. T. - Agravo regimental em agravo de instrumento no 134.449/SP - rel. Min. Sepúlveda Pertence, Diário da Justiça, Seção I, 21 set. 1990, p. 09.784 e STF - RT 666/230).

Não passou ao largo da apreciação da sã doutrina, matéria que de fato é empolgante. Vejamos nos dizeres de Celso Ribeiro Bastos e Yves Gandra Martins:

(...) Mas a liberdade de trabalho encontra outra fundamentação na própria condição humana, cumprindo ao homem dar um sentido à sua existência. É na escolha do trabalho que ele vai impregnar mais fundamentalmente a sua personalidade com os ingredientes de uma escolha livremente levada a cabo.

A escolha do trabalho é pois uma das expressões fundamentais da liberdade humana(...). (...) Uma forma muito sutil pela qual o Estado por vezes acaba com liberdade de opção profissional é a excessiva regulamentação. Regulamentar uma profissão significa exercer a competência fixada na parte final do dispositivo que diz: "observadas as qualificações profissionais que a lei exigir."

"Para obviar este inconveniente é necessário que esta faculdade seja sempre exercida nos termos constitucionais. Em primeiro lugar, é necessário que exista lei da União, excetuadas as hipóteses dos servidores públicos estaduais e municipais (...). Mas é evidente que esta lei há de satisfazer requisitos de cunho substancial, sob pena de incidir em abuso de direito e conseqüentemente tornar-se inconstitucional."

"Assim é que hão de ser observadas qualificações profissionais. Para que uma determinada atividade exija qualificações profissionais para o seu desempenho, duas condições são necessárias: uma, consistente no fato de a atividade em pauta implicar em conhecimentos técnicos e científicos avançados (...). Outras contudo demandam conhecimento anterior de caráter formal em instituições reconhecidas. As dimensões extremamente agigantadas dos conhecimentos aprofundados para o exercício de certos misteres, assim como o embasamento teórico que eles pressupõem, obrigam na verdade a este aprendizado formal. É óbvio que determinadas atividades ligadas à medicina, à engenharia, nas suas diversas modalidades, ao direito, poderão ser geradoras de grandes malefícios, quer quanto aos danos materiais, quer quanto à liberdade e quer ainda quanto à saúde do ente humano. Nestes casos, a exigência de cumprimento de cursos específicos se impõe como uma garantia oferecida à sociedade (...). A atual redação deste artigo deixa claro que o papel da lei na criação de requisitos para o exercício da profissão há de ater-se exclusivamente às qualificações profissionais. Trata-se portanto de um problema de capacitação, técnica, científica ou moral.

(Ob.Cit. pp. 76, 77 e 78).

Como pudemos observar, através do exposto, a qualificação profissional ocorre através de aprendizado formal em cursos específicos, em instituições reconhecidas. Não há qualquer outra conotação restritiva imposta pela Lei Maior e, onde ela não restringe, a lei infraconstitucional não poderá restringir.

É uníssona a doutrina em relação ao tema. Observemos a posição de J. Cretella Jr. em relação ao mesmo:

(...) Nenhum gênero de trabalho pode ser proibido uma vez que não se oponha aos costumes, à segurança e à saúde dos cidadãos". A contrario sensu, sob a forma de juízo afirmativo, "todo trabalho é permitido", "o exercício de todo e qualquer trabalho é livre", sem restrições, sem discriminações, desde que observadas as condições - iguais para todos, sem privilégios e sem discriminações - de capacidade e as qualificações que a lei exigir.(...) Nessas condições, o exercício de qualquer tipo de trabalho, ofício ou profissão é livre, não podendo, assim, ter como causa impeditiva discriminação "para mais" ou "para menos", feita por entidade - corporação profissional - pública ou privada, que se levantasse contra aquele que pretendesse o exercício da atividade em causa


(Ob. Cit. pp. 273,274).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação

(Lei 9.394/96), que contém em seu seio os comandos constitucionais atinentes ao Título VIII, Capítulo III, Seção I, da CF/88, traz em seu bojo, o verdadeiro sentido do que vem a ser "qualificação profissional" e de que forma ela se adquire, vejamos:

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania "e sua qualificação para o trabalho".


(A redação deste artigo é semelhante a do art.205 da CF/88).

Sendo a qualificação profissional, "Cabedal de conhecimentos ou atributos que habilitam alguém ao desempenho de uma função", é notório que tais conhecimentos são adquiridos única e exclusivamente através da formação acadêmica. Deduzimos, desta forma, silogisticamente que, somente a universidade é detentora exclusiva de tal função. Portanto, cabe à universidade e tão somente a ela a função de qualificar seus corpo discente. Caso a Ordem dos Advogados do Brasil, reconhecida fosse, como escola de nível superior, certamente gozaria da prerrogativa de qualificar ou não seu alunato para o exercício da profissão.

Ainda, o art. 22, XVI, da Carta Magna estabelece, verba legis:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

(...)

XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões.

Com a devida vênia, às doutas opiniões em contrário, entendemos que as condições para o exercício das profissões encontram-se consubstanciadas no art. 205 da CF/88, e no diploma legal pertinente à educação(Lei 9.394/96, de 20.12.96), o qual estabelece, entre outras condições, a educação como fator único e preponderante na formação e qualificação profissional dos educandos.

Isso posto, com o advento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, NORMA DE CARÁTER GERAL, QUE PREENCHE A EXIGÊNCIA CONTIDA NO ARTIGO 5º, INCISO XIII DA CF e posterior ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei n.º8.906, de 04 de julho de 1994, ficou patente, de maneira cristalina e incontestável a INCONSTITUCIONALIDADE do artigo 8º, inciso IV, do mencionado Estatuto da Advocatura.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional contém em seu bojo NORMAS DE CARÁTER GERAL APLICÁVEIS A TODAS AS CATEGORIAS PROFISSIONAIS, SEM EXCEÇÃO, vindo a regular a qualificação profissional mencionada no artigo 5º, XIII do Código Supremo.

Vale aqui, ressaltar novamente, o art.205, da Carta Magna em vigor:

art.205. A educação direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercicio da cidadania e sua qualificação para o trabalho

Observemos o corpo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, verbo ad verbum:

LEI 9.394/96, de 20.12.96

TÍTULO I

Da Educação

Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

§ 1º Esta Lei disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias.

§ 2º A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social.

Aqui é bastante claro o texto legal no que concerne à educação como um processo formativo que se desenvolve no trabalho e sua total vinculação ao mesmo. É a educação o meio único e apropriado para a qualificação profissional exigida em lei, desenvolvida por meio do ensino em instituições próprias. Pelo que consta, na forma do disposto no art.44, caput, da Lei 8.904/96, é a Ordem dos Advogados -OAB, serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, e não uma instituição de ensino, se assim o fosse, teria o amparo legal para habilitar seus alunos.

TÍTULO II

Dos Princípios e Fins da Educação Nacional

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania "e sua qualificação para o trabalho".


(A redação deste artigo é semelhante a do art.205 da CF/88).

Mais uma vez, expressa o legislador que a educação visa o pleno desenvolvimento do educando e mostra-a como meio único e insubstituível na qualificação para o trabalho. É a formação acadêmica e não o exame de ordem que, segundo a lei, capacita o educando para o exercício de sua atividade laboral.

CAPÍTULO IV

Da Educação Superior

Art. 43. A educação superior tem por finalidade:

I — estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo;

II — formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, APTOS para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;

Na leitura do enunciado legal, observamos a finalidade primordial da educação que é a de "formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais". A inserção em setores profissionais é incondicionada, não submetendo-se portanto, a exames ou quaisquer outras exigências ilegais por parte de qualquer ente, seja ele qual for. É A EDUCAÇÃO QUE QUALIFICA O CIDADÃO PARA O TRABALHO, ou seja, uma vez diplomado por instituição de ensino superior, este ENCONTRA-SE APTO, nos termos da lei, PARA O EXERCÍCIO PROFISSIONAL.

Como é cediço, não se constitui a Ordem dos Advogados do Brasil em instituição de nível superior, nada mais sendo que entidade regulamentadora do exercício profissional.

Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular.

É o diploma de curso superior o instrumento hábil de comprovação de que o bacharel está habilitado para o exercício da profissão. É o meio de prova por excelência e, mais uma vez volto a insistir, não o exame de ordem.

(...) o exercício da advocacia exige, como condição sine qua non, a conclusão do curso de Direito, satisfeitas as exigências legais, pertinentes ao término do 2o grau ou equivalente, vestibular, matrícula, grade curricular, formatura e colação de grau


(trecho de sentença exarada pelo Dr. Carlos Humberto de Souza, Juiz Federal da 3a. Vara da Seção Judiciária de Goiás - Proc. 96.10250-3).

Isso posto, é inadmissível que essa entidade de classe, sob o argumento de ser o advogado "indispensável à administração da justiça" (artigo 183 do Código Supremo), RESTRINJA O LIVRE EXERCÍCIO PROFISSIONAL DAQUELES REGULARMENTE HABILITADOS POR INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR.

Em face de tese levantada (em informações prestadas pela IMPETRADA) de que, por exercer o Advogado função essencial a Justiça, deva este se submeter ao Exame de Ordem sob pena de prejuízo à sociedade em decorrência de possíveis danos causados por maus profissionais, pergunta se, mais uma vez: E os bacharéis em engenharia, profissão que causa perigo potencial à vida humana, que após colarem grau iniciam o LIVRE exercício da profissão, bastando apenas inscreverem-se no respectivo Conselho, não estão sujeitos a causarem danos à sociedades? E os médicos que lidam com a vida humana, fonte primária de todos os bens jurídicos, enfermeiros, arquitetos, farmacêuticos...? Pergunta-se ainda: e o poder fiscalizador da Ordem dos Advogados do Brasil, consubstanciado no Estatuto da Advocacia e da OAB e no Código de Ética da OAB, não seria mais eficaz no combate aos maus profissionais que um simples exame?

Não se coaduna, portanto, com os ideais de Justiça e Igualdade da Carta Cidadã, a exigência de exame para que os bacharéis em direito inscrevam-se em sua entidade de classe e exerçam a atividade profissional para a qual encontram-se regularmente habilitados.

Se não bastasse, a Carta Magna em vigor, estabelece ainda em seus artigos 170 , 193 , o seguinte:

art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observando os seguintes princípios:(...)

art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça social.

Observamos à vista dos preceitos constitucionais acima que, o trabalho é direito fundamental, alçado a essa categoria, pela própria Lei das Leis.

Fica claro que, qualquer ato impeditivo ao livre exercício da atividade laboral, importa em afronta a princípios básicos da Carta Política que é farol e bússola de todo o ordenamento jurídico.

Não se entende por que, a Ordem dos Advogados do Brasil que, segundo o disposto no art.44, I, da Lei 8.906/94(Estatuto da Advocacia), tem por finalidade defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, os direitos humanos, a justiça social e pugnar pela boa aplicação das leis, insiste na tese inconstitucional de que é parte legítima para referendar a capacidade profissional dos bacharéis em Direito.

1.3 - DO "FUMUS BONI IURIS"


A "fumaça do bom direito" evidencia-se pela agressão clara a todos os princípios constitucionais anteditos, mormente o do livre exercício de qualquer trabalho(CF/88, art. 5.o, XIII), e à Lei 9.394/96, de de 20.12.96 (Lei posterior ao Estatuto da Advocacia), que específicamente trata da Educação, suas finalidades e da competência das insituições de nível superior na formação e qualificação profissional de seus bacharéis.

1.4 - DO "PERICULUM IN MORA"


O "perigo na demora" materializa-se no fato do impetrante continuar sempre impossibilitado de exercer a sua profissão sem que venha a se submeter à exigência manifestamente inconstitucional do certame em questão, estando, assim, inteiramente impedido de exercer a advocacia, enquanto o provimento liminar não for deferido, causando sérios danos de difícil reparação a sua pessoa , vez que, ao continuar impedido de exercer livremente a sua profissão, face à inconstitucional exigência, fica afetado o seu direito constitucional ao livre exercício de sua profissão e, por consequência, o seu direito de viver dignamente.

1.5 - DO PEDIDO

, confiante que prevalecerá o bom senso jurídico, a justiça, os princípios da legalidade, da segurança jurídica e do primado da Constituição Federal sobre normas inconstitucionais e hierarquicamente inferiores que lhe afrontam o espírito, requer a V.Exa.:

1) A concessão initio litis e inaudita altera pars, de provimento liminar ,com a declaração incidenter tantum da inconstitucionalidade do inciso IV, do art. 8º., da Lei 8.906/94, frente aos dispositivos constitucionais art. 1º. , inciso III e IV, art. 5º. "caput" e seu inciso XIII, art. 170 , art. 193 e art. 205, determinando à OAB(CE) que, num prazo razoável de 10(dez) dias, reúna o Conselho (art. 8.o, VII, da Lei 8.906/94) e colha do impetrante o seu compromisso, materializando-se, em definitivo, sua inscrição na Ordem, sob pena de ser aplicada multa cominatória no valor de R$ 1.000,00(hum mil reais) por cada dia de atraso na inscrição do impetrante, na forma do art.287 do CPC;

2) a notificação da autoridade coatora para, querendo, no prazo legal, prestar as informações que entender convenientes;

3) determinar a ouvida do ilustre representante do Ministério Público Federal;

4) Alfim, seja concedida a segurança do presente mandamus no seu julgamento final.

Dá-se à causa, o valor de R$ 100,00 (cem reais).

ITA SPERATUR JUSTITIA

Fortaleza(CE), 10 de setembro de 1998.

Layer Leorne Mendes Júnior

OAB(CE). 8.871

Leonardo Capelo Martins

OAB/CE n.º2.515-E

Marcello Martins

OAB(CE). 2.297-E

Sobre os autores
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENDES JÚNIOR, Layer Leorne; MARTINS, Leonardo Capelo et al. Mandado de segurança contra exame de admissão na OAB. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16119. Acesso em: 23 dez. 2024.

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