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Mandado de segurança contra presidente do TSE por indeferimento de impugnação das urnas eletrônicas

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Tendo sido negada a petição do PDT impugnando os programas das urnas eletrônicas utilizadas nas eleições de 2000, o partido ajuizou mandado de segurança contra o relator do processo, Ministro Néri da Silveira, aprofundando a questão e abordando aspectos da decisão proferida.

          EXCELENTÍSSIMO SR. MINISTRO PRESIDENTE DO COLENDO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

         O PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT, partido político nacional, pessoa jurídica de direito privado, com sede em Brasília, Distrito Federal, devidamente registrado no Tribunal Superior Eleitoral - TSE, vem, por intermédio de seus advogados, procuração inclusa, interpor o presente:

MANDADO DE SEGURANÇA com PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR

1. O Tribunal Superior Eleitoral – TSE apresentou aos partidos políticos nos dias 1º a 6 de agosto do corrente ano, os sistemas e programas de computador a serem utilizados nas eleições municipais do presente ano.

2. Na oportunidade, o Impetrante, por intermédio de seus advogados, técnicos em segurança de informática e delegados, fez-se presente com o objetivo de conferir a segurança e confiabilidade dos programas apresentados.

3. Para surpresa do Impetrante, nos dias da apresentação desses programas, o TSE, por intermédio de seu Diretor-Geral, Sr. Ney Natal de Andrade Coelho, expediu a Portaria nº 142/2000, a qual dispunha a vedação ao acesso dos programas referentes ao sistema de segurança e o algoritmo de criptografia.

4. Vislumbrando desrespeito à Lei nº 9.504/1997, que em seu art. 66 disciplina as regras jurídicas essenciais ao sistema eletrônico de votação, no prazo legal, o Impetrante interpôs impugnação em 6 de agosto p.p., requerendo pronunciamento do C. Tribunal a respeito das razões jurídicas das seguintes determinações emanadas do TSE, consubstanciadas na Portaria nº 142/2000:

i)o acesso restrito dos partidos políticos aos programas de computador a serem utilizados nas eleições;

ii) restrição ao acesso das cargas das urnas eletrônicas; e

iii) a indevida participação do CEPESC, integrante da Agência Brasileira de Inteligência, do Gabinete da Segurança Institucional, órgão vinculado à Presidência da República, na elaboração de programa de criptografia.

5. Apesar da importância da matéria, a decisão sobre o pedido de impugnação somente veio ocorrer em Sessão Administrativa do TSE, do último dia 5 de setembro, cuja publicação deu-se no dia 13 de setembro no Diário da Justiça da União.

6. O Tribunal, através da Resolução nº 20.714, ato ilegal que ora se ataca, juntamente com a Portaria nº 142/2000, julgou improcedente as razões da impugnação, não anulando a Portaria retrocitada, dessa forma, não tornando público aos partidos políticos todos os programas de computador a serem utilizados nas eleições; e, também, não equacionou às questões atinentes às cargas das urnas e a participação do CEPESC nos sistemas de segurança das eleições.

7. Como lançado no pedido da impugnação, reafirmamos que a inércia do Tribunal Superior Eleitoral perante esses fatos terá o condão de macular todo o processo eleitoral, ensejando graves suspeitas sobre a lisura e imparcialidade das eleições.

8. Pela importância do pleito eleitoral para o País, cujos procedimentos, a juízo do Impetrante, são passíveis de fraudes, ferindo princípios constitucionais da inviolabilidade do voto, da legitimidade e da soberania popular, é que utiliza-se desta ação mandamental na certeza de que os vícios apontados naquela peça impugnatória, e reafirmados nesta, fragilizam a segurança das eleições de outubro próximo, e, pior, que atos administrativos relativos à aplicação da Lei Eleitoral, cujo bem maior é resguardar a segurança das eleições, afrontam esse texto legal, bem como a Constituição Federal.


II – O DIREITO VIOLADO

          DO ACESSO RESTRITO DOS PARTIDOS POLÍTICOS AOS PROGRAMAS DE COMPUTADOR A SEREM UTILIZADOS NAS ELEIÇÕES

9. O caput do art. 66 da Lei 9.504/97 estabelece amplo acesso dos partidos políticos aos programas de computador a serem utilizados nas eleições. Eis o inteiro teor do dispositivo legal citado:

          "Art. 66. Os partidos e coligações poderão fiscalizar todas as fases do processo de votação e apuração das eleições, inclusive o preenchimento dos boletins de urna e o processamento, eletrônico da totalização dos resultados, sendo-lhes garantido o conhecimento antecipado dos programas de computador a serem usados. "

10. De forma clara e inequívoca, o dispositivo legal assegura o amplo e irrestrito acesso a todos os programas, desde a fase de votação à apuração das eleições. Inclui-se, expressamente, a fase do preenchimento de boletins de urna e do processamento eletrônico da totalização dos resultados.

11. No voto do eminente ministro relator, Néri da Silveira, apreciando a impugnação do Impetrante, de que resultou a Resolução nº 20.714, ora atacada, fls. 12, assim se referiu a respeito dos sistemas de segurança e ao programa de criptografia, para fundamentar a Portaria que vedou acesso a determinados programas:

"...não dizem eles respeito ao registro e coleta de voto e sua apuração, inexistindo, desde logo, qualquer risco, por sua aplicação, quanto à normalidade e regularidade de funcionamento da urna eletrônica." (grifamos)

E, continuou:

          "O ‘sistema de segurança’ (SIS) concerne às outras fases do processo eleitoral, consoante está perfeitamente esclarecido nas informações transcritas. O ‘programa de criptografia’, acionado e usado após a emissão do Boletim de Urna, é sistema de segurança a garantir a incolumidade do conteúdo do disquete emitido pela urna eletrônica, durante seu transporte, desde a Seção Eleitoral até o local de ‘totalização de votos’, bem assim a garantir a autenticidade do disquete como proveniente do programa oficial da Justiça Eleitoral constante da urna que o gerou."

12. Pretende caracterizar, o Sr. Ministro Relator, a não vinculação desses programas às fases do processo de votação e apuração, assegurando a inexistência de riscos à segurança do sistema. Vale-se o d. Relator das informações prestadas pelo Setor Técnico do TSE, consoante certifica-se em seu voto.

13. Vejamos, então, as informações prestadas por esse Setor, com referência ao programa de criptografia, a fls. 7, do Voto em apreço:

          "O ‘programa de criptografia’ é utilizado com a finalidade de proteger os dados gravados no disquete, contra qualquer tentativa de sua adulteração, além de garantir, ao ‘sistema totalizador de votos, a autenticidade do disquete como proveniente do programa oficial da Justiça Eleitoral constante da urna que o emitiu." (grifamos)

E, acrescentou:

          "Trata-se, portanto, de um programa com o objetivo de proteger os dados do disquete, durante seu transporte, desde o ambiente da Seção Eleitoral até o local de totalização dos votos."

14. Dessas informações podemos extrair algumas conclusões:

  1. não há dúvida que os sistemas de segurança e a criptografia constituem-se em programas de computador; e
  2. admite-se o risco de violação dos votos computados, quando gravados em disquete para irem à totalização.

15. O próprio Ministro Relator, a fls. 13, da Resolução, contraditoriamente, reconhecerá a importância do programa, aduzindo:

          "Não é admissível, a respeito dessa matéria, pretender que sistemas e programas concernentes precisamente à segurança do processo eleitoral devam ser apresentados, como quer o suplicante, a interessados, ainda que representantes partidários, sem expressa autorização legal, pois, a partir de seu amplo conhecimento, se tornariam suscetíveis de vulneração por ato de terceiro, pondo-se em risco a segurança das eleições, o que, de maneira alguma, é cabível acolher, por parte da Justiça Eleitoral (...)Somente a lei pode, na espécie, autorizar a quebra da confidencialidade inerente aos sistemas e programas de segurança."

16. Outro aspecto: o programa aplicativo, ao qual é ligada a biblioteca de funções chamada de "algoritmo de criptografia", está escrito em linguagem "C", na qual toda biblioteca de funções possui um código de inicialização que sempre é chamado antes de passar o controle ao programa aplicativo em si. Dessa forma, mesmo que as chamadas às funções de criptografia só sejam feitas no final do processo, após o preenchimento do boletins de urna, uma chamada de inicialização à biblioteca que contém o algoritmo de criptografia é feita sempre no início do programa, muito antes da impressão dos boletins de urna.

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17. Assim, há risco de inserção de código desonesto em qualquer parte dos programas da urna, seja no programa aplicativo, no sistema operacional ou numa biblioteca de funções, por parte de quem faz o programa – o CEPESC neste caso -, sempre que a conferência do código-fonte for impedida de verificar o conteúdo completo de todo o código de todos os programas da urna.

18. Retomamos o que diz a Lei nº 9.504/97. O art. 66 garante o acesso a todos os programas, inclusive os que digam respeito à totalização de votos. Se há um programa protegendo os votos inseridos nos disquetes que irão à totalização, como impedir seu acesso aos partidos políticos para que atestem se realmente ali estará um programa de criptografia e se o mesmo não irá adulterar as informações ali gravadas, seja por mau funcionamento do programa ou por ação criminosa de terceiros.

19. Compreendemos que se esses programas nada tivessem com a segurança das eleições, com a inviolabilidade do voto e sua adulteração, não teria razão a indisponibilização para acessá-lo. Entretanto, os técnicos em segurança do Impetrante reconhecem sua importância, bem como o próprio TSE admite esse fato.

20. Outro dado relevante, lançando luzes quanto à importância dos programas de criptografia, diz respeito ao contrato firmado entre o TSE e o CEPESC, nos termos do Decreto nº 2.910, de 29 de dezembro de 1998, obrigando este a manter o sigilo dos módulos criptográficos, bem como não cedê-los a terceiro, no todo ou em parte do objeto contratado.

21. Isso denota a preocupação do TSE em não se ver surpreendido por ações interferindo na segurança das eleições eletrônicas. É a confissão, traduzida em decreto normativo, da possibilidade de fraude a partir dos programas de criptografia.

22. Data vênia ao entendimento do Ministro Relator, mas a legislação determina o amplo acesso aos programas de computador. Ao contrário, é justamente a confidencialidade é que deve ser garantia via lei, como ora não ocorre.

23. Se há pessoas que conhecem os programas e sistemas de segurança, portanto são elas que têm a condição de interferir no processo eleitoral, alterando a realidade das urnas. Chegamos, sem dificuldades, a essa conclusão, pois se aos partidos políticos é negado esse acesso, sob o pretexto da possibilidade de violarem os programas e colocar em risco a segurança das eleições, mais razão assiste aos partidos políticos em colocarem sob suspeição justamente quem concebeu os programas,- a empresa vencedora do certame licitatório -, juntamente com os técnicos vinculados ao TSE que a eles tiveram acesso.

24. Portanto, urge franqueá-lo aos partidos políticos, legitimados pela legislação eleitoral, para tomar conhecimento quanto ao programa destinado a proteger os votos digitados nas urnas, os quais irão contabilizar o somatório dos votos nas eleições vindouras.

25. Ainda no rol de programas sigilosos, a juízo do Sr. Diretor-Geral do TSE, estão os programas operacionais conhecidos como padrão de mercado.

26. O TSE, mediante procedimento licitatório, adquiriu o programa denominado sistema operacional VIRTUOS.

27. Como o próprio Tribunal reconhece, desse programa só foi franqueado aos partidos políticos os chamados códigos executáveis, conforme se vê a fls. 11, do voto do Sr. Ministro Relator:

          "Desse modo, estiveram ao exame e fiscalização dos partidos e seus representantes todos os programas de computador referentes às eleições que, segundo a lei, são suscetíveis de conhecimento. De fato, o ‘código fonte’ do ‘sistema operacional VIRTUOS’, que é produto de mercado, e está amparado por regra legal (Lei nº 9.609/1998), não poderia em realidade, ser exibido pela Secretaria de Informática, porque reserva de propriedade da empresa que o desenvolve." (grifamos)

28. Fundamenta o d. Relator, a fim de justificar a malsinada Portaria, que tal programa (VIRTUOS) estaria protegido por lei da propriedade intelectual. Em outras palavras, a segurança e a legitimidade das eleições, interesse público maior, acima de qualquer outro, curvam-se ao argumento da propriedade da empresa.

29. No choque entre o interesse público e o interesse particular, entendeu o Sr. Diretor-Geral de Informática que vale a lei que protege a propriedade intelectual das empresas que venderam seus produtos ao TSE; e, infelizmente, tal entendimento foi respaldado pela Corte maior da Justiça Eleitoral.

30. Todavia, não convencido totalmente da prevalência do interesse particular sobre o interesse público, o TSE, por intermédio da Secretaria de Informática, tomou a seguinte providência, conforme as informações prestadas ao d. relator, ministro Néri da Silveira, a fls. 11:

          "Certo está, porém, que os técnicos do Tribunal tomaram conhecimento do "código fonte" do sistema "VIRTUOS", como explicam as informações, tendo verificado a autenticidade desse sistema, tal como é adquirível no mercado, bem assim não existir no ‘código fonte’ qualquer elemento que possa constituir razão de risco à regularidade de funcionamento da urna eletrônica." (grifamos)

31. Cumpre ressaltar, também nesse caso trata-se de programa amparado pela Lei nº 9.504/97, felizmente, desta vez, não rebatido pelo TSE. Em razão disso, os programas deveriam ser abertos aos partidos políticos sem qualquer invocação legal de proteção de produto. Esclareça-se que não se trata de um direito (direito de propriedade intelectual) indisponível. Pelo contrário, configura-se um direito disponível e a providência correta a ser tomada pelo TSE, quando da aquisição do programa, era a inserção de cláusula contratual permitindo que o código fonte do programa de computador fosse disponibilizado aos partidos políticos.

32. Por outro lado, sublinhe-se não haver nenhuma condição impositiva a obrigar o TSE a utilizar o programa VIRTUOS na urna eletrônica. As alternativas citadas pela equipe técnica do TSE (EOS, SCO, UNIX e WINDOWS CE) também se referem a programas de propriedade privada, mas existem sistemas operacionais consagrados no mundo todo, como o LINUX, por exemplo que é utilizado oficialmente por órgãos públicos da França e da China, e cujo código-fonte é de domínio público. São chamados de Sistemas de Código Aberto e cada vez mais estão sendo adotados em todo o mundo, devido as suas vantagens de manutenção e custos.

33. Curioso notar, mesmo invocando o direito de proteção, o código fonte foi franqueado aos técnicos do TSE. Entrementes a Lei Eleitoral assegura expressamente o acesso sobretudo aos partidos políticos, até agora não efetivado.

34. Demonstra esse fato a ilegalidade e inconstitucionalidade da Resolução nº 20.714 e da Portaria nº 142/2000, violando frontalmente o disposto no art. 66 da Lei nº 9.504/97, interferindo na lisura, na segurança, na legitimidade das eleições, princípios de nosso sistema constitucional.         

35. À preocupação da segurança das eleições, garante, peremptoriamente, o Ministro Néri da Silveira, que os técnicos verificaram a autenticidade dos programas em cotejo com os vendidos no mercado, bem como asseguraram não haver elementos capazes de colocar em funcionamento as urnas eletrônicas !!!

36. Pelas garantias dadas ao Ministro, escorado nas informações do Setor Técnico, estaremos voltando as eleições à base da confiança, do "fio-do-bigode", o que, evidentemente atenta contra a República, contra a democracia, contra tudo aquilo que foi muito caro às gerações de brasileiros, que pugnaram pelos amplos direitos políticos no Brasil.

          DA FISCALIZAÇÃO DA CARGA DA URNA ELETRÔNICA

37. Tanto a Lei nº 9.504/97, em seu art. 66, caput, como a Resolução nº 20.563, em seu art. 8º, inciso I, estabelecem que os partidos têm direito à ampla fiscalização da carga das urnas eletrônicas, ou seja, a habilitação das urnas para operarem nas eleições.

38. No entanto, ficou patente pela apresentação realizada no Tribunal Superior Eleitoral que esta fiscalização reduzir-se-á ao acompanhamento visual da colocação do cartão de memória de carga e do cartão de memória de votação nas urnas.

39. Do ponto de vista técnico, este simples acompanhamento visual não pode ser chamado de fiscalização. Para que a fiscalização da carga da urna fosse efetiva, seria necessário conferir se o conteúdo do cartão de memória de carga e do cartão de memória de votação nas urnas é idêntico ao programa que foi apresentado para análise no Tribunal Superior Eleitoral, o que, pelas informações prestadas pelos técnicos do TSE, não será permitido aos partidos políticos.

40. Neste sentido, seria imprescindível o cumprimento de algumas etapas para que sejam criadas condições reais para fiscalizar a carga da urna, consistindo em:

  1. acompanhamento do processo de geração do arquivo com o código compilado;
  2. assinatura digital imediata deste arquivo;
  3. fornecimento aos partidos do código fonte e compilado do programa de geração e verificação da assinatura digital;
  4. fornecimento aos partidos da senha para verificação da assinatura;
  5. definir normas e criar condições, nos ambientes onde haverá carga de urnas, para que os fiscais dos partidos possam conferir as assinaturas digitais dos programas contidos nos flash de carga.

41. Somente cumpridas as etapas anteriormente mencionadas poder-se-á dizer que está assegurada a ampla fiscalização dos partidos políticos no que concerne à carga das urnas.

42. Os partidos deveriam, pois, por força expressa do texto legal, conhecer TODOS os programas da urna eletrônica para poder avaliá-los efetivamente.

43. Não bastasse a clareza do texto legal, adotamos para reforçar nosso ponto de vista quanto à matéria o entendimento do Exmº Sr. Ministro Nelson Jobim, membro desta Colenda Corte, que em audiência pública realizada em 1º de Junho de 2000, na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania do Senado Federal, declarou, sobre a apresentação dos programas do Programa Básico da urna eletrônica para os fiscais dos partidos políticos, verbis:

" ... o fato é que a auditagem é posta nos 60 dias anteriores à eleição e os sistemas estão submetidos à apreciação dos partidos.... Todos eles. Tanto o programa fonte como todos os outros. Todos eles estão submetidos a auditagem pelos partidos. Não há dúvida. E se não estivessem, estariam a partir deste momento, mas estão. "(grifamos)

44. No entanto, a Portaria nº 142/2000, da lavra do Diretor-Geral do TSE (anexo 1), de 31 de junho de 2000, que "Constitui normas a serem seguidas durante a apresentação e análise dos Sistemas das Eleições 2000", estabelece no parágrafo único do art.2º, verbis:

          "Art. 2º Os sistemas ficarão disponíveis aos interessados para análise, no auditório do 2º andar do edifício sede do Tribunal Superior Eleitoral, diariamente, das 8h30min às 19h, de 2 a 6 de agosto de 2000.

Parágrafo único. Os sistemas disponíveis de que trata o caput deste artigo não incluem os sistemas operacionais por ser padrão de mercado, o Sistema de Segurança(SIS) e o algoritmo de criptografia por constituírem o bloco de segurança." (grifamos)

45. Sobre a conferência da carga das urnas, assim se manifestou o d. Ministro Relator, Néri da Silveira:

          "A eventual disponibilização aos partidos políticos da senha de verificação da assinatura digital dos programas, para serem conferidos no momento da carga da urna eletrônica, só seria possível, se houvesse prévia norma legal de autorização, por se tratar de dispositivo de segurança."

46. Respeitosamente voltamos a discordar no nível técnico e jurídico do d. Relator. A assinatura digital, assim com assinatura comum, é um procedimento que existe para que se faça autenticação de documentos, isto é, uma pessoa assina e outra confere a assinatura. Não há razão lógica assinar digitalmente os programas das urnas e, ao mesmo tempo, impedir que os fiscais dos partidos políticos confiram se a assinatura dos programas, no momento da carga, está correta. Não existem normas autorizando o TSE a impedir a fiscalização das assinatura digital. Pelo contrário, a legislação atual assegura a mais ampla fiscalização o que inclui a possibilidade de verificar a autenticidade da assinatura, digital ou manual, dos documentos.

47. Percebe-se, dessa forma, que o disponibilizado à análise dos partidos políticos foi apenas uma parte dos programas. Nenhum argumento de conveniência, nenhuma justificativa poderia se sobrepor à Lei que obriga o acesso irrestrito dos partidos políticos aos programas informatizados.

48. Não há, pois, como aprovar e legitimar os programas de computador referidos sem que o conteúdo completo da urna seja dado ao conhecimento dos partidos.

49. É impossível, e seria leviano referendar, no nível técnico, um programa cujo conhecimento é apenas parcial. Há que se deixar bastante claro e expresso que, pelas razões expostas, o Impetrante não pode, até o momento, aprovar os programas de computadores a serem utilizados nas urnas eletrônicas para as eleições de 2000, pois não há como aprovar o que não se conhece em sua inteireza.

          DA INTERFERÊNCIA INDEVIDA DE ÓRGÃO DO PODER EXECUTIVO NA ELABORAÇÃO DO PROGRAMA DA URNA ELETRÔNICA

50. Um dos programas que não foi apresentado para a análise dos partidos é o denominado algoritmo de criptografia, consoante já referimos. Este programa é trocado por outro a cada eleição e ocupa um espaço significativo dentro do programa aplicativo da urna.

51. Este programa, que compõe o bloco de segurança do sistema, também não é do conhecimento do próprio Tribunal Superior Eleitoral que o recebe, pronto, do Centro de Pesquisas em Segurança das Comunicações - CEPESC.

52. E o que vem a ser o CEPESC ? É um órgão singular da estrutura da Agência Brasileira de Inteligência - ABIN, do Gabinete de Segurança Institucional vinculado diretamente à estrutura da Presidência da República.

53. Assim, um órgão vinculado diretamente à Presidência da República é o responsável pela elaboração de parcela significativa do programa a ser introduzido nas urnas eletrônicas e nos disquetes de transporte de votos à totalização, com o agravante do conteúdo não ser dado ao conhecimento dos partidos políticos e tampouco do Tribunal Superior Eleitoral.

54. Trata-se, no nosso entender, de fato gravíssimo que macula a normalidade e legitimidade das eleições, pois não há como admitir a interferência direta de órgão do Poder Executivo nos sistemas informatizados de votação e totalização.

55. Como admitir que o referido órgão da Presidência da República seja o responsável por parte do programa da urna eletrônica e do programa que dará segurança aos votos quando de seu transporte, capaz, no nível técnico, de desvirtuar a vontade soberana do eleitor ?

56. E mais, como admitir que esta parte do programa seja hermética a todos os constitucional, legal e legitimamente interessados no processo eleitoral que são os partidos políticos e o próprio Tribunal Superior Eleitoral.

          FULMINAÇÃO DE NORMAS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

57. É gravíssima a distorção mencionada com repercussões, inclusive, na órbita constitucional. A Constituição Federal em seu art. 121 e o art. 23 do Código Eleitoral – Lei nº 4.737, de 15.07.65, que, recepcionado, complementa e integra o texto constitucional, estabelecem as competências do Tribunal Superior Eleitoral no disciplinamento e organização das eleições.

58. Admitir a interferência de órgão da Presidência da República cujos titulares pertencem, por força constitucional, a partidos políticos diretamente interessados no resultado das eleições significa permitir a usurpação de competência constitucional e legalmente fixada ao Tribunal Superior Eleitoral, bem como violar princípio fundamental da República que repousa na independência e harmonia dos Poderes, ex-vi do art. 2º da Lei Maior.

59. Ademais, a preservação deste estado de coisas estaria a malferir a soberania popular consignada no caput do art. 14 da Constituição Federal, na medida em que a vontade legítima do eleitor manifestada pelo voto direto e secreto poderia ser desvirtuada pela parte do programa a ser inserido nas urnas eletrônicas e nos disquetes contendo os votos quando em transporte à totalização, elaborado pelo órgão vinculado à Presidência da República.

60. A legitimidade e normalidade das eleições previstas no § 9º do art. 14 da Constituição Federal estariam, por conseqüência, irremediavelmente afetadas por esta inconstitucional usurpação de competências e interferência indevida do Poder Executivo na administração do processo eleitoral.

61. Não afastada esta inconstitucional e indevida ingerência, o Impetrante, desde logo, deixa registrada sua impugnação quanto à participação do CEPESC na elaboração do programa a ser inserido nas cerca de 353 mil urnas eletrônicas.

62. A vedação ao acesso a todos os programas de computador a serem utilizados nas eleições de 1º de outubro pela Portaria nº 142/2000, respaldada pela Resolução nº 20.714, não só viola a Lei nº 9.504/97, bem como fulmina princípios fundamentais e normas constitucionais.

63. Das mais graves violações à ordem jurídica, com certeza, afrontar princípios estremece os pilares do Estado democrático e de direito. Nas lições de Jorge Miranda é destacada a função ordenadora dos princípios:

          "ação imediata dos princípios consiste, em primeiro lugar, em funcionarem como critério de interpretação e de integração, pois são eles que dão coerência geral ao sistema."(1)

64. Nos ensinamentos quanto a extensão da gravidade da violação de um princípio constitucional, exaramos as lições de Celso Antônio Bandeira de Melo:

          "...e não se pode tolerar uma lei que fira um princípio adotado na Carta Magna. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremessível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra."(2)

65. Como demonstrado os atos ora atacados por esta ação mandamental agridem os direitos fundamentadores da legitimidade do Estado, do exercício da soberania popular, do exercício da cidadania e do pluralismo político.

66. Vejamos onde esses princípios estão consignados no Texto Maior. São os princípios estruturadores da República brasileira, inscritos no art. 1º:

          "A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania;

(...)

(...)

V – o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."

67. Depreende-se desse artigo o princípio republicano. Princípio cuja substância revela-se na eletividade, periodicidade e responsabilidade dos agentes políticos, e, por conseguinte, dos Poderes que o compõem, especialmente os poderes Executivo e Legislativo, respaldados que os são por eleições populares.

68. Ao não permitir a realização de eleições livres, transparentes, assegurando-se o voto secreto, atenta-se contra o princípio republicano.

69. É na idéia da responsabilidade que encontramos a prerrogativa do cidadão em fiscalizar em exigir a prestação de contas dos mandatários. O momento da eleição é o ápice da realização da idéia da responsabilidade, oportunidade conferida ao cidadão em exigir de seu representante aquilo que fez durante quatro anos. A não transparência do exercício do voto; a incerteza do cidadão quanto a efetividade do voto dado tem como consectário a violação dessa idéia. Ao tema colacionamos o magistério de Geraldo Ataliba:

          "Na idéia de responsabilidade vêm envolvidas, necessariamente, as noções de prestações de contas e fiscalização dos mandatários pelo mandantes. Sem esses ingredientes, idoneamente formulados – e dotados de um instrumental que lhes assegure plena eficácia -, não se pode falar legitimamente em mandato, e nem, em conseqüência, em república representativa."(3)

70. No mesmo sentido, as idéias de periodicidade e eletividade, conteúdos, ao lado responsabilidade, do princípio republicano estão sendo maculadas pela inobservância da ampla fiscalização nas eleições prevista na legislação eleitoral.

71. No mesmo diapasão vem o princípio da cidadania. "Significa aí, também, que o funcionamento do Estado estará submetido à vontade popular. E aí o termo conexiona-se com o conceito de soberania popular(..), com os direitos políticos..."(4)

72. Não restam dúvidas, a Resolução nº 20.714, que se baseia diretamente na Portaria nº 142/2000, está eivada de ilegalidades e inconstitucionalidades. Faz-se imperioso expungi-la da ordem jurídica, juntamente com a malsinada Portaria, sob pena de validar atos tendentes a interferir na lisura, na segurança e na legitimidade das eleições.

73. Por oportuno, saliente-se que o Impetrante não busca às vésperas das eleições criar obstáculos ao cumprimento dos prazos eleitorais pelo TSE. A presente ação é intentada neste momento, tendo em vista que a decisão quanto à impugnação protocolada em 6 de agosto último só foi publicada dia 13 de setembro último. Ou seja, não tomamos medidas administrativas e judiciais antes pois não havia chegado o prazo para demonstração dos programas; e não podemos fazer após a realização das eleições pela ineficácia da medida, como mais adiante demonstraremos.

Sobre os autores
Peterson de Paula Pereira

Procurador da República no Distrito Federal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Peterson Paula; VIEIRA JUNIOR, Ronaldo Jorge Araujo. Mandado de segurança contra presidente do TSE por indeferimento de impugnação das urnas eletrônicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16152. Acesso em: 5 nov. 2024.

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