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Agravo contra seqüestro de dinheiro em execução contra a Fazenda Pública

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Agenda 01/04/2002 às 00:00

III – OS FUNDAMENTOS DE MÉRITO

A decisão ora embargada considerou válido o CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS DE PRPCURADORIA JUDICIAL de fls. 11/13, do qual decorrem os supostos créditos em favor do proponente da "Execução Especial".

Entretanto, conforme se verá facilmente, referido contrato está eivado de nulidades, não podendo servir como título executivo, como passaremos a analisar a seguir.

III.I.I - A EXCLUSIVA REPRESENTAÇÃO DO ESTADO PELA SUA PROCURADORIA GERAL

A Constituição Federal, em seu art. 132, dispõe claramente que "os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas" (grifamos). Em outras palavras: a representação judicial do Estado é atribuição institucional e exclusiva da Procuradoria Geral do Estado.

Seguindo esta mesma orientação, a Constituição do Estado de Alagoas determina, em seus arts. 151 e 152, o seguinte:

"Art. 151. A Advocacia-Geral do Estado, exercida pela Procuradoria Geral do Estado, é instituição permanente essencial à Justiça, tendo por finalidade a preservação dos interesses públicos e o resguardo da legalidade e da moralidade administrativa.

Art. 152. São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado:

I – exercer a representação judicial e extrajudicial do Estado; (...).

Parágrafo único. O Estado centralizará, na Procuradoria Geral do Estado, a orientação normativa das atividades de assessoramento jurídico e de procuradoria judicial das autarquias e das fundações públicas" - grifamos.

A Lei Orgânica da Advocacia Geral do Estado de Alagoas (LC nº 7/91) é ainda mais incisiva ao afirmar que é função institucional da Advocacia Geral do Estado o exercício da representação judicial e extrajudicial do Estado (art. 3º, inc. I).

O texto constitucional acima citado é claro: compete aos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, e somente a estes, a representação judicial das esferas federativas a que estejam vinculados.

Em igual sentido, o Min. Néry da Silveira, na Ação direta de Inconstitucionalidade (Medida Liminar) nº 8811/6 – DF, bem acentuou:

"Penso que o art. 132, da Constituição, quis, relativamente à Advocacia do Estado, no âmbito dos Estados-membros e do Distrito Federal, conferir às Procuradorias não só a representatividade judicial, mas, também, o exame da legalidade dos atos, e o fez com a preocupação de atribuir essa função a servidores concursados e detentores do predicamento da efetividade" – os grifos não estão no original.

Deste modo, resta evidente que os membros da aludida carreira representam, em juízo, de forma indelegável, a respectiva unidade, aí incluídos os Poderes que a compõem – Legislativo, Judiciário e Executivo – porquanto o sistema tripartite não implica a constituição de três pessoas jurídicas distintas no âmbito do mesmo ente federativo.

A lição de BERNARDO SESTA sobre o assunto é de inquestionável valia para a correta solução do presente caso:

"são incompatíveis com a caracterização da Advocacia do Estado, salvo em hipóteses excepcionais, as formas de investidura marcadas pela precariedade, tais como o comissionamento, a contratação e qualquer outra modalidade de admissão de Advogados para o exercício dessa competência, que os deixe sujeitos ao nuto de quem os tenha nomeado admitido ou contratado" (SESTA, Mário Bernardo. Advocacia de Estado: Posição Institucional. Rev. de Inf. Legislativa, nº 117, jan./mar. 1993. Brasília. p. 198 – grifamos).

Com efeito, a representação judicial e extrajudicial do Estado (da Assembléia Legislativa, por conseguinte), diz a Carta no art. 132 compete à Procuradoria Geral do Estado. A Constituição não prevê qualquer exceção. Em nenhum de seus artigos — nem expressa nem implicitamente — se encontra permissão para que outra Instituição ou mesmo alguma autoridade possa representar judicial e extrajudicialmente o Estado. Logo, só a Procuradoria-Geral do Estado tem competência para a representação judicial e extrajudicial do Estado. Esta competência é, conseqüentemente, exclusiva, quer dizer, própria dos Procuradores de Estado, é peculiar à Instituição, com exclusão de qualquer outra instituição, de qualquer outro órgão, de qualquer autoridade que não integre a PGE.

Por esse motivo, nulo é o contrato firmado entre a Assembléia Legislativa e o ora agravante, não gerando qualquer efeito no mundo jurídico. Quanto a esse ponto, o Superior Tribunal de Justiça, em caso semelhante ao que ora é submetido ao crivo jurisdicional, assim decidiu: "EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DO SISTEMA NACIONAL DE PREVIDENCIA SOCIAL. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADOS AUTONOMOS NAS COMARCAS DAS CAPITAIS. IMPOSSIBILIDADE. LEIS NOS. 2.123/53 E 6.539/78. 1. A motivação inspiradora da autorização para contratação de advogados autônomos nas comarcas interioranas, para a representação judicial de entidades integrantes do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social, não conforta interpretação extensiva, com o fim de contratá-los nas comarcas das capitais, cuja representação é exclusiva dos Procuradores do quadro pessoal (leis nos. 2.123/53 e 6.539/78, art. 1.). 2. Contratação órfã de autorização legal não gera efeitos, nulificando-se no mundo juridico. 3. Recurso provido". (RESP 36371/RJ; (1993/0017904-7) Min. MILTON LUIZ PEREIRA DJ DATA:07/02/1994 PG:01140) – grifos nossos A respeito da (im)possibilidade de contratação de advogados para representar os interesses do ente da federação em juízo a doutrina pátria é unânime quanto ao fato de que, em face do art. 132, da CF/88, tal contratação não se mostra possível, salvo na excepcional hipótese de impedimento declarado de todos os Procuradores (o que não houve, nem há). Bruno Espiñeira Lemos, no seu artigo ÉTICA, MORALIDADE E ADVOCACIA PÚBLICA (Com um enfoque voltado à atividade dos Procuradores dos Estados), assim se pronunciou sobre o tema: "O Procurador do Estado, diante da própria previsão constitucional, exerce uma função típica de Estado, não havendo, pois, jamais, por exemplo, exceto em caso de impedimento de todos os Procuradores, outra possibilidade de contratação de advogados para o exercício das funções de representação judicial e consultoria das unidades federadas, a não ser através de concurso público de provas e títulos, ingressando-se na primeira classe da carreira legalmente organizada" – grifou-se.

Da mesma forma, o emérito constitucionalista JOSÉ AFONSO DA SILVA tem posicionamento incensurável:

"Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal hão de ser organizados em carreira em que ingressarão por concurso público de provas e títulos (art. 132), estando, pois, vedada a admissão ou contratação de advogados para o exercício das funções de representação judicial (salvo, evidentemente, impedimento de todos os Procuradores) e de consultoria daquelas unidades federadas, porque não se deram essas funções aos órgãos, mas foram diretamente imputadas aos Procuradores" (Curso de Direito Constitucional Positivo. 9ª ed. Malheiros, São Paulo, 1994, p. 540) - grifamos.

In casu

, embora haja expressa proibição de os Procuradores de Estado litigarem com o Poder Público, nem todos os integrantes da Procuradoria Geral do Estado estavam impedidos de peticionar judicialmente em favor da Assembléia Legislativa contra o Governador do Estado.

Realmente, os membros da Defensoria Pública do Estado, que são detentores do cargo de Procuradores do Estado, podem litigar contra o Poder Público, razão pela qual não havia impedimento de todos os Procuradores.

A par disso, a Assembléia Legislativa possui, em seu quadro, juristas incumbidos de prestar assessoria jurídica para aquele Poder, contando, inclusive, com um Procurador-Geral da Assembléia.

Logo, nessa situação excepcional, em que haveria litígio entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo, afigura-se óbvio que os Procuradores da Assembléia possuiriam a capacidade postulatória para defender os interesses institucionais daquele Poder.

A propósito, bastante interessante foi o posicionamento do Procurador-Geral da Assembléia. Num primeiro momento, justificou a contratação do advogado, alegando que não poderia representar a Assembléia Legislativa em juízo. E, em um segundo momento, representando a Assembléia em juízo, firmou acordo judicial com o advogado contratado. Maior contradição não poderia haver.

Sobre o assunto, manifestando-se acerca da possibilidade de a Procuradoria da Assembléia atual judicialmente na defesa dos interesses institucionais desse Poder em juízo, vale reproduzir voto do Min. Otávio Gallotti, na ADIn 1557-5 – DF:

"‘Vê-se, desde logo, que, no pertinente ao assessoramento jurídico do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem alguma para a alegação, ínsita na petição inicial, de invasão da competência natural de Procuradoria-Geral do Estado.

É certo que não possuindo – as Assembléias e os Tribunais – personalidade jurídica própria, sua representação, em juízo, é normalmente exercida pelos Procuradores do Estado. Mas têm, excepcionalmente, aqueles órgãos, quando esteja em causa a autonomia do poder, reconhecida capacidade prossessual, suscetível de ser desempenhada por meio de Procuradorias especiais (se tanto for julgado conveniente, por seus dirigentes), às quais também podem ser cometidos encargos de assessoramento jurídico das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembléia e Tribunais)" - grifamos.

Por tudo isso, mostra-se patente que o malsinado contrato é manifestamente inconstitucional, por incompatibilidade vertical com o art. 132 da Constituição Federal.

Como explicou o Min. Celso de Mello ao interpretar o art. 132 da Constituição Federal (Ação direta de Inconstitucionalidade - Medida Liminar nº 8811/6 – DF):

"A outorga dessas funções jurídicas à Procuradoria-Geral do Estado – mais precisamente aos Procuradores do Estado – decorre de um modelo estabelecido pela própria Constituição Federal, que, ao institucionalizar a Advocacia do Estado, delineou o seu perfil e discriminou as atividades inerentes aos órgãos e agentes que a compõem.

O conteúdo normativo do artigo 132 da Constituição da República revela os limites materiais em cujo âmbito processar-se-á a atuação funcional dos integrantes da Procuradoria-Geral do Estado e do Distrito Federal. Nele contém-se norma que, revestida de eficácia vinculante e cogente para as unidades federadas locais, não permite conferir a terceiros – senão aos próprios Procuradores do Estado e do Distrito Federal, selecionados em concurso público de provas e títulos – o exercício intransferível e indisponível de representação estatal e de consultoria jurídica do Poder Executivo"

Daí a exata observação de TOMÁS PARÁ FILHOS, que, ao examinar a natureza e os fins jurídico-institucionais da Advocacia do Estado, assinalou:

"Institucionalizada a Advocacia do Estado (...), as respectivas funções devem ser-lhe atribuídas de modo exclusivo (...)" (RPGESP, vol. 2/286-287).

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Em seguida, arremata o eminente Ministro da Corte Excelsa com a desenvoltura que lhe é peculiar:

"Os Procuradores do Estado são, na realidade, os Advogados do Estado. Essa expressiva condição funcional decorre de um título jurídico fundado na própria Constituição Federal: o ato de sua investidura, mediante prévia aprovação em concurso público de provas e títulos, no relevantíssimo cargo de membro integrante da Advocacia do Estado.

Operou-se, nesse referido preceito da Constituição, uma inderrogável imputação de específica atividade funcional cujos destinatários são, exclusivamente, os Procuradores do Estado, agentes públicos cujo processo de investituda originária no cargo que exercem depende, sempre, de aprovação em concurso público.

(...)

Essa prerrogativa institucional, que é de ordem pública, encontra assento na própria Constituição Federal. Não pode, por isso mesmo, comportar exceções e nem sofrer derrogações que o texto constitucional sequer autorizou ou previu

".

Dada a manifesta nulidade do contrato ora vergastado, tendo em vista a sua incopatibilidade vertical com o art. 132 da Constituição Federal, impõe-se a aplicação do art. 59, da Lei de Licitação:

"art. 59 – A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos".

III.I.II - A NECESSIDADE DE LICITAÇÃO PARA CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO

Se, através de um verdadeiro malabarismo jurídico, numa afronta aos mais basilares princípios de Direito Público, se considerar que a Assembléia Legislativa poderia contratar advogado para prestar a sua representação jurídica, mesmo assim seria nulo o contrato, tendo em vista a imperiosa necessidade de licitar.

De fato, verifica-se a sujeição à obrigação de licitar de quaisquer entes da Administração Pública, independentemente da esfera à qual pertençam, conforme se depreende da leitura do art. 117 do Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos, que dispõe:

"Art. 117. As obras, serviços, compras e alienações realizados pelos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Tribunal de Contas regem-se pelas normas desta Lei, no que couber, nas três esferas administrativas".

Portanto, a contratação do serviço deveria ser precedida de licitação, garantindo-se a observância do princípio da isonomia, com vistas a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração.

Informa-se que, no presente caso, sem qualquer critério objetivo, foi simplesmente escolhido o executor do serviço, afrontando-se todas as normas que regem o procedimento licitatório.

Ora, qualquer contratação de serviço deve iniciar-se com a definição do objeto e não do seu executor.

No caso, foi simplesmente designado um advogado (totalmente estranho aos quadros da Procuradoria-Geral do Estado) para representar judicialmente a Assembléia Legislativa. A exigência constitucional de licitação foi simplesmente relegada a um segundo plano.

Alegou-se, é certo, que, na hipótese, a licitação seria inexigível. Não procede a alegação. Vale dizer: a licitação era absolutamente necessária.

Com efeito, dispõe o art. 25, da Lei 8.666/63:

"Art. 25 - É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I -...

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; (...)"

O art. 13, a que faz remissão o dispositivo, tem a seguinte redação:

"art. 13 – Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

I – estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;

II – pareceres, perícias e avaliações em geral;

III – assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

IV – fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;

V – patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;

VI – treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

VII – restauração de obras de arte e bens de valor histórico;

VIII – vetado" – grifamos a parte que nos interessa.

Pela leitura sistemática dos referidos dispositivos legais, verifica-se que se configura a inexigibilidade de licitação toda vez que for inviável a competição, considerando a existência de apenas um fornecedor ou prestador de serviço capaz de satisfazer as aspirações da Administração.

Comentando a regra do art. 25, o Procurador do Ministério Pública Jorge Ulisses Jocoby Fernandes (in: A Contratação Direta por Notória Especialização) assim se pronuncia:

"A inviabilidade da competição ocorrerá na forma desse inciso se ficar demonstrado o atendimentos dos requisitos, que devem ser examinados, na seguinte ordem:

a) referentes ao objeto do contrato;

- que se trate de serviço técnico;

- que o serviço esteja elencado no art. 13 da Lei 8.666/93;

- que o serviço apresente determinada singularidade;

- que o serviço não seja de publicidade ou divulgação

b) referentes ao contratado.

- que o profissional detenha a habilitação pertinente;

- que o profissional ou empresa possua especialização

na realização do objeto pretendido;

- que a especialização seja notória;

- que a notória especialização esteja relacionada com a singularidade pretendida pela Administração;

2.1. - do requisito da inviabilidade de competição

Todos esses requisitos, se tomados isoladamente não garantem que a licitação seja inexigível, pois será possível e viável a competição.

O estudo da inexigibilidade de licitação repousa numa premissa fundamental: a de que é inviável a competição, seja porque só um agente é capaz de realizá-la nos termos pretendidos, seja porque só existe um objeto que satisfaça o interesse da Administração. Daí porque não se compreende que alguns autores e julgados coloquem lado a lado dois conjunto de idéias antagônicos, quando firmam o entendimento de que há singularidade, que o agente é notório especialista, mas que mesmo existindo mais de um agente capaz de realizá-lo a licitação é inexigível, abandonando exatamente o requisito fundamental do instituto, constante do caput do art. 25, da Lei 8.666/93.

Em escólio ao dispositivo análogo do Dec.-lei 2.300/86, Hely Lopes Meirelles, com lapidar clareza assere: "Serviços técnicos profissionais são todos aqueles que exigem habilitação legal para sua execução. Essa habilitação varia desde o simples registro do profissional ou firma na repartição administrativa competente, até o diploma de curso superior oficialmente reconhecido. O que caracteriza o serviço técnico é a privatividade de sua execução por profissional habilitado, seja ele um mero artífice, um técnico de grau médio ou um diplomado em escola superior." Já o serviços técnicos profissionais especializados são aqueles que, "além da habilitação técnica e profissional normal, são realizados por quem se aprofundou nos estudos, no exercício da profissão, na pesquisa científica, ou através de cursos de pós-graduação ou de estágios de aperfeiçoamento. São serviços de alta especialização e conhecimentos pouco difundidos entre os demais técnicos da mesma profissão. Esses conhecimentos podem ser científicos ou tecnológicos, vale dizer, de ciência pura ou de ciência aplicada ao desenvolvimento das atividades humanas e às exigências do progresso social e econômico em todos os seus aspectos". pág. 49

É preciso ter em mente, portanto, que não é pelo fato de o serviço de patrocínio ou defesa de causas jurídicas estar elencado no art. 13 que não haverá necessidade de licitação. Essa interpretação seria, no mínimo, absurda, para não dizer maliciosa.

Aliás, a própria letra da lei leva a esse entendimento quando determina que "ressalvado os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração" (§1º, do art. 13, da Lei 8.666/93). Em outras palavras: mesmo nos casos de serviços técnicos profissionais especializados a licitação é possível, na modalidade concurso.

Os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello sobre o assunto são bastante pertinentes:

"Parece-nos certo que, para compor-se a inexigibilidade concernente aos serviços arrolados no art. 13, cumpre tratar-se de serviço cuja singularidade seja relevante para a Administração (e que o contratado possua notória especialização). Se assim não fosse, inexistiria razão para a lei haver mencionado ‘de natureza singular’, logo após a referência feita aos serviços arrolados no art. 13. Se o serviço pretendido for banal, corriqueiro, singelo e por isto irrelevante que seja prestado por "a" ou por "b", não haveria razão alguma para postergar-se o intuito de licitação. Pois, é claro que a singularidade só terá ressonância para o tema, na medida em que seja necessária, isto é, por força dela caiba esperar melhor satisfação do interesse administrativo a ser provido. (...) Assim, o entendimento correto perante a primeira questão suscitada pelo art. 25, II, é o de que, para configurar-se a hipótese de ‘inexigibilidade de licitação, não basta que se esteja perante um dos serviços arrolados no art. 13. É preciso, além disto, que, tendo natureza singular, a singularidade nele reconhecível seja necessária para o bom atendimento do interesse administrativo posto em causa. Donde, é preciso que seu desempenho demande uma qualificação incomum". (Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores, 8ª edição, 1996, pp. 331 e 333 - grifamos).

Dessume-se, pois, que a contratação dos serviços jurídicos exigiria, além da habilitação legal do contratado, a presença concomitante dos seguintes requisitos:

a) a inviabilidade da competição no mercado para a prestação dos serviços desejados;

b) o serviço haveria de ser singular, vale dizer, não poderia ser tarefas rotineiras, de fácil elaboração (singularidade objetiva);

c) por fim, o contratado haveria de possuir notória especialização (singularidade subjetiva).

Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União, julgando sobre a (ir)regularidade na contratação de advogados pela RFFSA, afirmou o seguinte:

"Com relação ao Contrato no 028/SR-5-DEJUR-5, com o escritório de Advocacia França e Ribas S/C, a analista refutou as alegações da entidade, que sustentavam a inexigência de licitação, com base na singularidade dos serviços (singularidade objetiva). como também na notória especialização dos sócios e profissionais da firma contratada (singularidade subjetiva). Demonstrou a instrução tratar-se, na realidade, de serviços rotineiros de advocacia e, portanto, passíveis de competição no mercado próprio. E, circundando essa manifestação, asseriu o Minstro-Relator que como bem salientou a instrução, o cerne da questão, na espécie, não é a competência ou mesmo a notoriedade da contratada e de seus profissionais, mas a possibilidade de competição no mercado para a prestação dos serviços desejados, que vão desde a defesa de direitos e interesses da RFFSA, em processos judiciais, nas esferas civil, trabalhista, criminal e fiscal, até a confecção de pareceres jurídicos sobre quaisquer assuntos relacionados à sua esfera de atuação. (Decisão nº 314/94 - TCU - 1ª Câmara, adotada em 22.11.94).

Da mesma forma, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, julgando a Apelação Cível 599261096, rel. Celeste Vicente Rovani, assim decidiu:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO TÉCNICO NA ÁREA DE LICITAÇÕES. CELEBRADO COM ADVOGADO. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DO REQUISITO DA ESPECIALIZAÇÃO PROFISSIONAL. CONTRATO DESCONSTITUÍDO. AÇÃO PROCEDENTE. 1. A exceção à obrigatoriedade de licitação, no caso de contratação de serviços técnicos profissionais especializados, tem em mira tão-somente os serviços que se exigem do executor, além de sua habilitação técnica e profissional, conhecimentos profundos e alta técnica em sua área de atuação. 2. A prestação de serviços técnicos profissionais na área de licitações, como emitir pareceres, perícias, avaliações, assessorias, consultorias, auditorias, defesas judiciais e administrativas pode ser feita por qualquer bacharel formado em direito, mormente Procurador de município, com a experiência que deve ter sobre licitações. 3. Sentença confirmada. Apelo improvido. (APC Nº 599261096, PRIMEIRA CAMARA CIVEL, TJRS, RELATOR: DES. CELESTE VICENTE ROVANI, JULGADO EM 16/06/1999)

Semelhantemente, a esse respeito, no julgamento do Processo TC-013.263/93-5 (Decisão nº 324/94 - TCU - 2ª Câmara), o Tribunal de Contas considerou irregular a contratação de profissionais renomados, inclusive Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, porque os serviços contratados não eram, a rigor, de natureza singular a ponto de justificar a inviabilidade de competição.

Como visto, para a regularidade da contratação direta impõe-se, ainda, que o profissional ou empresa possua especialização na realização do objeto pretendido pela Administração. A especialização, como indica a própria palavra, se faz no direcionamento na busca do conhecimento e no desenvolvimento de certa atividade. Na atualidade é um atributo que, por si só, não tem o condão de afastar a realização de processo licitatório, nem muito menos credenciar a declaração de inviabilidade de competição.

Exige a Lei, igualmente, que a especialização seja notória, e mantendo coerência com os seu propósito de elaborar uma Lei didática, o legislador albergou no § 1º, do mesmo art. 25, o conceito desse termo:

"§ 1º Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato".

Acerca da relação entre notória especialização e o serviço que é pretendido, sumulou o Tribunal de Contas da União, no enunciado nº 39, que a

"notória especialização só tem lugar quando se trata de serviço inédito ou incomum, capaz de exigir na seleção do executor de confiança, um grau de subjetividade, insusceptível de ser medido pelos critérios objetivos de qualificação inerentes ao processo de licitação".

No caso dos autos, nulo é o contrato pelas seguintes razões:

a) havia possibilidade de competição

: caso fosse possível a contratação de advogado pela Assembléia Legislativa para representá-la em juízo, existia, na Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Alagoas, inúmeros profissionais habilitados a prestar o serviço; a licitação, portanto, não apenas era viável como também interessante à Administração Pública, visando selecionar a proposta mais vantajosa e o profissional mais competente (modalidade concurso);

b) o objeto do contrato não possui a nota da singularidade

: tratou-se de mera interposição de mandado de segurança, que não exigiria maiores conhecimentos técnicos específicos por parte do advogado; qualquer bacharel que tenha cursado a disciplina Prática Forense seria capaz de elaborar um mandado de segurança;

c) o advogado contratado não demonstrou a notória especialização

: não ficou em momento algum demonstrada a notória especialização do contratado; não foi anexado ao processo de inexigibilidade (ou melhor, nem houve processo de inexigibilidade) sequer o currículo do contratado.

Em face disso, não ficou justificada a inexigibilidade da licitação, pelo que há de ser anulado o contrato.

Seguindo esse posicionamento, do voto do Min. do STJ JOSÉ DELGADO, proferido no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 268460/SP (1999/0096755-0), extrai-se a seguinte passagem:

"Ação civil pública. 1. Contratação pela Municipalidade de empresa que não se enquadra no conceito de notória especialização, ou dentro do caráter da singularidade, para realização de serviços que poderiam ser prestados por servidores municipais, ou outras empresas do mesmo diapasão, a exigir a licitação. 2. Ato administrativo declarado nulo, estadeada a lesividade tendo em conta a própria ilegalidade do ato praticado. 3. Precedentes da Excelsa Corte de Justiça, em casos idênticos. 4. Recursos improvidos."

III.I.III - DA PUBLICIDADE COMO REQUISITO DE VALIDADE E EFICÁCIA DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

A par do que foi exposto, o fato de a Lei dispensar ou inexigir, em determinados casos, a realização de certame licitatório, não significa que não devam ser obedecidos certos procedimentos, ainda que mais simplificados, com a finalidade de atender ao interesse da Administração, sempre tendo em vista os princípios constitucionais e infraconstitucionais da licitação. Dessa forma, todos os atos realizados para que se efetivasse determinada contratação devem ser motivados, além de ser necessário que integrem os autos de processo administrativo competente, a fim de que fique clara a intenção do administrador, bem como sua preocupação em atuar com transparência, em especial, no exercício de seu poder discricionário. O administrador não pode atuar na "penumbra". Ele possui maior e não total discricionariedade.

Essa necessidade decorre, principalmente, do princípio da indisponibilidade do interesse público. Não pode o administrador realizar a contratação direta ao seu talante, de modo que a existência de um processo vem comprovar que foram obedecidos todos os requisitos para que se opere desta forma, visando sempre alcançar a proposta mais vantajosa para a Administração, qual seja, aquela que melhor atender ao interesse público.

A essa série de procedimentos, chama-se "procedimento administrativo" da contratação direta, o qual é estabelecido pelo art. 26 da Lei nº 8.666/93, que dispõe:

"Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2º e 4º do art. 17 e nos incisos III a XXIV do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8º, deverão ser comunicados dentro de 3 (três) dias à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para eficácia dos atos.

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

II - razão da escolha do fornecedor ou executante;

III - justificativa do preço;

IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados".

Os contratos administrativos, como não poderiam deixar de ser, regem-se, primordialmente, pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público.

A falta de qualquer um dos seus requisitos essenciais, ou mesmo a existência de defeitos relativos a sua forma podem, como bem ensina HELY LOPES MEIRELLES, "viciar a manifestação de vontade das partes e comprometer irremediavelmente o conteúdo obrigacional do ajuste".

A publicidade dos atos e contratos administrativos, por exemplo, constitui um princípio elementar de Administração Pública, previsto no art. 37, caput, da CF/88.

Destarte, a publicidade dos atos administrativos ou contratos celebrados pela Administração Pública é requisito essencial para a sua validade, constituindo-se essa obrigatoriedade em um dos sustentáculos da atividade pública.

Transcrevendo lapidar lição de HELY LOPES MEIRELLES:

"Os atos e contratos administrativos que omitirem ou desatenderem a publicidade necessária não só deixam de produzir seus regulares efeitos como se expõem a invalidação por falta desse requisito de eficácia e moralidade" (In Direito Administrativo Brasileiro, 19.ª edição, Malheiros Editores, p. 88).

Inexistindo a publicação, no Diário Oficial do Estado de Alagoas, do Contrato de Prestação de Serviços que o exeqüente se louva como título executivo, resulta que dele não pode ser produzido qualquer efeito, exigência constante nos textos da Constituição Federal e Estadual, como também norma cogente prevista no parágrafo único do art. 61 e do art. 62,§ 3.º da Lei n.º 8666, de 21 de junho de 1993, que regulamenta o art. 37, XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública:

"Art. 61. Omissis

Parágrafo Único. A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na Imprensa Oficial, que é condição indispensável para sua eficácia,..."

"Art. 62. Omissis

§ 3.º Aplica-se o disposto nos arts. 55 e 58 a 61 desta Lei e demais normas gerais, no que couber:

I- aos contratos de seguro, de financiamento, de locação em que o Poder Público seja locatário, e aos demais cujo conteúdo seja regido, predominantemente, por norma de direito privado;"

As conseqüências que acarretam a falta de publicação dos contratos administrativos é muito bem definida pelo eminente magistrado JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR, da seguinte maneira:

"A conseqüência para a falta de publicação é a ineficácia do contrato, isto é, o pacto existe, nada se lhe aponta de inválido, porém não está aptos a produzir efeitos. A norma considera tal contrato de eficácia contida porque impede que os direitos e obrigações nele previstos sejam exigíveis reciprocamente enquanto não ocorrer a publicação do respectivo extrato. Postas em inércia pela falta de publicação, as partes atentam contra os princípios da continuidade, da finalidade e da prevalência do interesse público..." (In Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública, Editora Renovar, p. 374).

Com efeito, é a prevalência do interesse público a razão maior de o legislador constituinte inserir o princípio da publicidade no texto constitucional, orientação seguida pelo legislador alagoano, ao inserir, na Constituição do Estado de Alagoas, a necessidade de publicação desses contratos para que tenham validade:

"Art. 45. Os órgãos da Administração Direta e Indireta Estadual, na execução de suas atividades administrativas, observarão rigorosamente os seguintes princípios:

I – divulgação prévia, no órgão da imprensa oficial do Estado, para conhecimento público, de todos os atos ou contratos que celebrem, como condição essencial a que tenham validade".

Ademais, como foi frisado na preliminar suscitada, se não tem a ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA ESTADUAL personalidade jurídica própria, por ser mero órgão da Administração, não tem também capacidade para celebrar contratos de prestação de serviços de representação judicial.

Prescreve o artigo 82 do Código Civil que a validade do ato jurídico requer agente capaz, objeto lícito e possível e forma prescrita ou não defesa em lei.

A nulidade do contrato de prestação de serviços, no qual se fundamenta a "Execução Especial", resta, pois, de uma clareza indiscutível, tanto porque foi praticado por agente incapaz, quanto por não seguir a forma prevista na lei (publicidade), segundo o disposto no art. 145, incisos I e II, do Código Civil.

III.I.IV - DA FIXAÇÃO ABUSIVA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E A CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E O DA IMPOSSIBILIDADE DE VINCULAÇÃO DE PAGAMENTOS SEM PRÉVIA DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA AOS RECURSOS PROVENIENTES DOS DUODÉCIMOS

Ademais, apesar de todos os argumentos expostos, caso se considere válido o contrato (!!!), o óbice do agravado esbarra em um princípio ainda maior: a moralidade, que galgou status constitucional.

De fato, sempre que se verificar que o comportamento da Administração ou do administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de eqüidade, a idéia comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa.

No caso específico da licitação não é diferente. Ou seja, a conduta moralmente reprovável acarreta a nulidade do ato ou do procedimento. Existindo imoralidade, afasta-se a aparência de cumprimento à lei ou ao ato convocatório. O administrador público deve sempre atentar para o que dispõe a lei, na condição de regra geral, bem como no ato convocatório, em decorrência do princípio da legalidade. Entretanto, tal não é suficiente para que os atos praticados pelo administrador sejam válidos, sendo necessário, também, que sua conduta siga os ditames morais que regem a atividade pública (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo : Dialética, 1998. p. 65).

Com efeito, o Administrador Público, ao celebrar contratos administrativos, não pode deixar de considerar os princípios constitucionais que norteiam a sua elaboração, sob pena de incorrer em violação a Carta Magna. Nesse âmbito, destaca-se o princípio da moralidade. Para que o ato ou contrato tenha validade, mister se faz que o mesmo esteja revestido de preceitos éticos e morais que atendam a finalidade pública.

Prescreve o art. 37 da Constituição Federal de 1988:

"Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte".

O cumprimento aos preceitos constitucionais supra aludidos não se insere no âmbito da conveniência administrativa, mas de imperativo condicionante de toda a atividade pública. Já dizia RUY BARBOSA:

"Toda medida, legislativa ou executiva, que desrespeite preceitos constitucionais, é, de sua essência, nula." (In A Constituição e os Atos Inconstitucionais, p. 49).

Passemos à análise da inconstitucional cláusula segunda do contrato de prestação de serviços:

"CLÁUSULA SEGUNDA – Garantirá o CONTRATANTE, ao CONTRATADO, honorários profissionais em valor correspondente a 4% (quatro por cento) do somatório das parcelas duodecimais relativas a setembro, outubro, novembro e dezembro de 1996 e janeiro de 1997, devidas à Assembléia Legislativa, seja por força da ordem judicial objetivada, seja em virtude de acordo que venha a ser celebrado, judicial ou extrajudicialmente."

Tendo por base os cálculos feitos pelo próprio agravado, aplicando-se o percentual de 4% (quatro por cento), chega-se a assombrosa quantia de R$ 2.225.935,33 (Dois Milhões, Duzentos e Vinte e Cinco Mil, Novecentos e Trinta e Cinco Reais e Trinta e Três Centavos).

Para se ter uma idéia da vultosa quantia a que o exeqüente alega fazer jus, faremos a seguinte comparação. Um magistrado, com proventos mensais de R$ 5.000,00 (Cinco Mil Reais) líquidos, teria que passar 37 (trinta e sete) anos trabalhando sem gastar um mísero centavo de seus salários para poder acumular esse valor. A conclusão a que se chega é inevitável: nunca, um magistrado, mesmo trabalhando por toda a vida, dedicando-se de corpo e alma ao seu labor, privando-se de diversos prazeres, com a desumana sobrecarga de trabalho a que o mesmo é submetido, sendo obrigado a trabalhar de madrugada e nos finais de semana, tudo em nome do interesse público, chegaria a acumular essa quantia. Será justo que, em uma única causa, um advogado perceba valor tão significativo, principalmente às custas dos já combalidos cofres públicos de um Estado com tantos problemas sociais como ALAGOAS?

Certamente que não. Aliás, não é apenas injusto. É inconstitucional e desarrazoado. Não se está querendo desmerecer a nobre função do advogado nem de seu direito aos honorários. No entanto, esse direito sofre limitações, sobretudo quando o contratante é o poder público.

A propósito, trazemos à colação as lúcidas considerações do Professor PAULO LUIZ NETO LÔBO:

"O direito aos honorários não é ilimitado. Há limites postos pela ética e pela razoabilidade que não podem ser ultrapassados. (...)

Será imoral, infringindo a ética profissional, se não guardar relação com o trabalho prestado ou importar em vantagem excessiva, considerando-se que ordinariamente seja cobrado, por idêntico serviço e ainda se houver proveito do estado de necessidade e inexperiência do cliente." (In Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, Brasília Jurídica, 1994).

Além de infringir o princípio da moralidade, a cláusula segunda, ora em análise, também é nula porquanto vincula o pagamento da verba honorária (prevista contratualmente e sem prévia dotação orçamentária) ao recebimento dos duodécimos por parte do PODER LEGISLATIVO.

Tal vinculação é inadmissível. Não poderia a MESA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE ALAGOAS assumir dívida sem anterior previsão em lei orçamentária. Incidem os princípios da legalidade e da anterioridade orçamentária. Não há despesa sem lei orçamentária anterior que a preveja. Se a simples assunção dessa obrigação pecuniária, por si só, já era inadmitida, imagine se tal despesa for vinculada aos duodécimos.

Para melhor compreensão da matéria, transcreveremos o art. 168 da Constituição Federal, ad litteram:

"Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, ser-lhe-ão entregues até o dia 20 de cada mês, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9.º "

Destarte, os chamados "duodécimos" são destinados a cobrir as despesas com previsão na lei orçamentária. Não podem ser subtraídos dos mesmos valores destinados a pagar dívidas sem qualquer previsão legal. A retirada de valores expressivos dos duodécimos do PODER LEGISLATIVO, por meio de ordem judicial, para cobrir pagamento de quantias assombrosas de honorários advocatícios, por atuação em uma única causa, importa em grave prejuízo ao livre exercício das nobres funções do PODER LEGISLATIVO, colocando em situação instável esse PODER, com sérios riscos para a manutenção do Estado Democrático de Direito, uma vez que restaria comprometida a independência dessa função estatal. Sem esquecer o prejuízo para a sociedade alagoana, haja vista que, sem um LEGISLATIVO forte e independente, a voz do povo não encontraria a mesma ressonância que tem através de seus legítimos representantes.

À luz do próprio contrato de prestação de serviços, a dedução pretendida pelo exequente e ordenada pelo Eminente Relator não encontra respaldo. Com efeito, dispõe a cláusula sétima da avença:

"CLÁUSULA SÉTIMA. As despesas decorrentes da execução deste contrato correrão à conta de dotações orçamentárias próprias."

Ora, o próprio contrato prevê a forma de pagamento dos honorários, qual seja, através de dotações orçamentárias próprias. È o único meio de pagamento que o próprio pacto admite. Não há nenhuma cláusula contratual que garanta a dedução de quantias dos duodécimos para cobrir o pagamento dos honorários, e mesmo que houvesse, seria nula de pleno direito.


IV- DO PEDIDO

Diante do exposto, vem o agravante requerer de Vossa Excelência que se digne

a) receber o presente agravo regimental, reconsiderando o seu respeitável despacho que determinou a dedução da quantia requestada e sua liberação ao exeqüente ou, no caso de a importância ter sido sacada, determinar a sua devolução, acatando, assim, a relevante fundamentação sustentada de ilegalidade da decisão;

b) reconsidere a homologação de acordo, publicada no Diário Oficial do Estado, em 30 de novembro 2000;

c) caso Vossa Excelência mantenha a decisão consubstanciada no respeitável despacho objurgado, que seja remetido o presente Agravo em Mesa ou Regimental ao Plenário dessa Colenda Corte de Justiça, nos moldes previstos no artigo 87, IX, "q", do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Alagoas, a fim de que seja processado e julgado o presente recurso, esperando o seu deferimento no sentido de tornar sem efeito o despacho de fls. 24/30 e, como conseqüência, determinar a devolução pelo exeqüente do dinheiro que, por ventura, tiver sido sacado indevidamente dos cofres públicos, reformando, outrossim, a decisão que homologou o acordo, por entender o Estado de Alagoas ser esse um ato de altaneira JUSTIÇA.

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

Maceió, 3 de novembro de 2.000.

GEORGE MARMELSTEIN LIMA

Procurador de Estado

MARCELO LOPES BARROSO

Procurador de Estado

ALUÍSIO LUNDGREN RÉGIS

Procurador de Estado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Agravo contra seqüestro de dinheiro em execução contra a Fazenda Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 56, 1 abr. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16479. Acesso em: 17 mai. 2024.

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