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A poluição visual e sonora no Direito Imobiliário

14/06/2007 às 00:00
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O Poder Público pretendeu extinguir uma atividade lícita ao proibir a publicidade através de outdoors, quando bastaria a regulamentação da atividade, com a fixação de limites e parâmetros para a sua execução.

Penso não ser possível desenvolver um artigo voltado à poluição visual ou sonora no direito imobiliário se não comentarmos sobre a finalidade da publicidade e da propaganda e sua regulação pelo Direito positivo. No mundo em que vivemos, a velocidade dos fatos acaba por alterar diversos segmentos do mercado econômico. Em épocas passadas, as sucessivas intervenções do Governo na economia provocaram uma onda de instabilidade no país, e as empresas foram obrigadas, num primeiro momento, a diminuir o volume de seus negócios e investimentos e cortar despesas para suportar aquele período difícil e tumultuado.

O setor de produtos e prestação de serviços, através de seus proprietários, denominados empresários, demonstraram aptidão para vencer as situações adversas do mercado com muita criatividade. O superavit da balança comercial e o aumento das reservas cambiárias dão mostra de que, não raro, os grandes problemas requerem projetos simples e de fácil implementação.

O quadro econômico passou por mudanças radicais, com a implantação do Plano Real, e, como conseqüência, as empresas têm procurado se amoldar ao novo plano econômico, para enfrentar a concorrência existente no mercado.

Nesta mesma velocidade em que as empresas disputam o mercado para colocação de seus produtos e serviços, elas se deparam com a figura daquele que precisa e daquele que quer consumir. Na verdade, estamos apontando para o consumidor que, unido a outros tantos, acaba por formar a sociedade de consumo e de massa.

Esta sociedade cresce à medida que cresce o desejo de se ter mais, e cada vez mais. É uma verdadeira competição. Para alguns, o objetivo alcançado hoje torna-se desprezível no dia seguinte.

Aproveitando essa tendência do mercado de consumo, aquele mesmo empresário habilidoso aproveita a oportunidade para dirigir esse movimento. Ele acaba na maioria das vezes por ditar o que e quando consumir através da publicidade. Transforma um bem, sem influência na vida do consumidor, como se fora um produto vital para sua sobrevivência. É uma verdadeira manipulação, uma aberração no sentido etimológico da palavra.

O ser humano possui necessidades infindáveis, as quais nem sempre são realizadas. Não se pode, evidente, comprar tudo o que se deseja e para tanto é necessário realizar uma escolha ainda que contrária à vontade expressa, posto que há um custo o qual não é possível suportar. Basta verificar quando é lançado um imóvel em uma zona chamada nobre, caracterizado por diversos ambientes e com infra-estrutura de primeiro mundo. Para muitos é uma realidade, porém, inatingível.

Nas condições acima destacadas, o ser humano terá que impor um limite aos seus desejos, optando por adquirir dentro de seus desejos aquilo que realmente pode suportar.

Na verdade, o comprador passa por uma bateria de informações que vêm na forma de publicidade, acabando por exercer uma ação neutralizadora, levando-o a adquirir mesmo desnecessariamente. A publicidade é utilizada de forma apelativa, utilizando cores que provocam grandes efeitos e impactos na vida do comprador.

Sem dúvida, a publicidade alcança seu objetivo quando consegue atingir o sentimento de todos e principalmente quando afeta as decisões das pessoas envolvidas no sistema.

Com efeito, a conclusão a que se chega neste início é a de que a publicidade é formadora de opinião e manifesta-se na vontade do comprador, induzindo à aquisição, à compra objetiva, ao consumo propriamente manifestado.

Na medida em que a publicidade é espalhada por pessoas conhecidas, tais como os artistas e apresentadores, entendemos que a influência ainda é maior e mais decisiva.

Com efeito, o festejado Scartezzini Guimarães em sua obra nos leciona:

"Há outra figura que, comumente, participa da publicidade e que influencia diretamente na decisão do consumidor.

Trata-se dos artistas, pessoas públicas, famosas, ou especialistas de produtos e serviços, que, sem dúvida, exercem grande influência sobre os consumidores ou sobre determinado grupo deles, dando-lhes, às vezes, uma falsa segurança sobre as qualidades do produto ou serviço, seja por informações, conselhos, recomendações, seja pela simples vinculação de sua imagem ou nome ao bem ou serviço. Assume assim, a celebridade, diante do consumidor, uma posição de ‘garante’."

É importante ressaltar como a publicidade age direta e objetivamente na vida do comprador, seja de modo direto ou indireto, instituindo uma resposta precisa e imediata em função do conceito que se possui da personalidade que está apresentando o produto.

Dependendo da personalidade que apresenta o produto, o comprador imediatamente faz uma associação de valores, como sucesso, riqueza, beleza, entre outros.A exemplo do exposto, basta verificar a publicidade onde se contempla o rei do futebol, ao apresentar um composto vitamínico; ou um aparelho de tonificação para os músculos. A influência, nesse caso, é objetiva, direta e decisiva na vida do consumidor, que acaba adquirindo o produto apenas pelo fato do mesmo ser apresentado pela personalidade do meio esportivo, posto que o comprador acaba crendo e confiando na sinceridade e conhecimento profissional apresentado pela celebridade.

Outro fator preponderante na publicidade é a coloração, isto é, o atrativo visual através das cores para o convencimento psicológico que tem por finalidade levar o comprador a iniciar e quiçá finalizar sua aquisição.

Por mais remoto que seja o tempo, a propaganda sempre existiu com a finalidade de divulgar o produto ou mercadoria de alguém que pretende vendê-la. Na Itália, mais precisamente na Roma antiga, por exemplo, já se tinha um espaço garantido na vida do Império. Os locais apropriados para se vender algum produtos na época eram as casas comerciais instaladas defronte para as ruas de maior movimento e eram disputadíssimas as lutas para se adquirir um espaço. Sem qualquer exagero pode-se comparar as pinturas que eram realizadas nas edificações da época com a divulgação de produtos atuais nas revistas especializadas, as quais possuem uma coloração marcante para chamar a atenção do consumidor.

Embora rude, na pintura nas fachadas das edificações havia como ponto de referência a coloração, onde a cor branca era pano de fundo seguido do vermelho e do preto para a veiculação da mensagem publicitária.

A cor tem uma ação estimulante sobre os indivíduos em reter a sua atenção. Quando bem escolhidas e harmonizadas, as cores tornam mais aprazível, mais bela e, portanto, mais atrativa a peça publicitária. E, com isso, prendem mais a vista do leitor de anúncio e dão prestígio à coisa anunciada.

O ser humano criou as cores como forma de comunicação; basta verificar no caótico trânsito paulistano o significado do verde, amarelo e vermelho. Nos grandes centros das principais capitais do País, e em especial na cidade de São Paulo, a qual se divide em centro novo e centro velho, verifica-se que o colorido tem chamado a atenção de toda população que por ali circula. São milhares de fornecedores chamando a atenção do consumidor, disputando a cada minuto o dinheiro de suas contas correntes ou de seus cartões de crédito ou até mesmo pelo crediário para aqueles que não possuem condições financeiras no momento.

Outro fator importante é que o fenômeno de cores adentra as residências todos os dias pela televisão, independentemente de horários, e tem como missão divulgar o produto do empresário e atingir os consumidores em potencial do seu produto. Logo queremos conhecer o idealizador do produto, avaliá-lo em termos de preço e durabilidade e posteriormente adquiri-lo.

A poluição visual se dá quando verificado o excesso de elementos ligados à comunicação visual nos cartazes, anúncios e placas colocados no ambiente urbano, especialmente nos centros comerciais e de serviços.

Acreditamos que os excessos causam desconfortos visuais daqueles que se locomovem pelos locais carregados na coloração. O ser humano não possui referencial em face da agressividade visual.

Por outro lado, a poluição não é só a visual, mas também auditiva, que tem uma constância na vida do homem e especialmente nos grandes centros urbanos, além, é claro, da poluição do ar, das águas etc.

O que se questiona inicialmente é se a publicidade tem um tratamento constitucional.

Neste sentido, pergunta-se: será que a liberdade de manifestação da empresa é inatacável em relação as suas formas de expressão ou a Constituição Federal delimita uma possibilidade de inversão nesta forma de comunicação? Para Vidal Serrano Nunes Junior [1], em sua obra sobre o tema "qual o alicerce de legitimação constitucional da publicidade comercial?", a procura de condições constitucionais, tanto para legitimar, quanto para coibir o empresário que promove seus produtos e serviços pela publicidade, torna-se essencial. Pois qual é a possibilidade de criação de normas jurídicas que possa restringir ou regular tal forma de expressão?

O que normalmente é feito, quando o tema tratado compreende a divulgação de mensagens publicitárias, é ligá-lo à livre manifestação do pensamento, à liberdade de divulgação de mensagens publicitárias no desenvolvimento da atividade empresarial, mas tal direito não decorre das liberdades constitucionais. Neste ponto deve-se concordar com Vidal Serrano Nunes Junior [2] quando observa:

"Deste modo, mesmo que adotada a expressão ‘livre comunicação publicitária’. Parece-nos que a publicidade deva ser apresentada, do ponto de vista constitucional, como derivada de qualquer das liberdades relacionadas à manifestação do pensamento. Parte do marketing, função de venda, a publicidade não nasceu e frutificou com a finalidade de opor limites à atividade do Estado, afastando, por conseguinte, a possibilidade de se evocar as liberdades relativas ao pensamento como normas para sua intelecção jurídica."

Deve-se centrar o estudo da publicidade mercantil atribuindo relevância ao desenvolvimento da atividade econômica, cerne da atividade. No Brasil, a atividade de produção de bens e serviços possui delineamentos previstos na Constituição Federal de 1988, que dispõe de uma ordem econômica. Assim deve entender a atividade empresarial como atividade de suprimento de necessidades humanas cujo enfoque pode ser produtivo (fornecido pela economia) e obrigacional (fornecido pelo Direito). O tratamento obrigacional ocorre à medida que o Estado virá a intervir no domínio econômico sob os pressupostos de manutenção de alguns bens constitucionalmente tutelados, como, por exemplo, o ambiente, o consumidor.

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A atividade publicitária está diretamente vinculada ao exercício da atividade econômica, pois dela faz parte, de modo que deve ser tratada dentro do ambiente do desenvolvimento da atividade econômica sustentada, principalmente, pelos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência que encontram limites na própria Constituição que prevê a defesa do ambiente, do consumidor, da livre concorrência.

Portanto, a possibilidade do empresário praticar atos de publicidade decorre da liberdade da empresa de se estabelecer e livremente competir, mas existem limites que a empresa deverá respeitar, pois decorrem de direitos também previstos e defendidos constitucionalmente. [3]

A atividade publicitária nada mais representa do que o intento do empresário de conquistar o mercado de consumo e para tanto utiliza estratégias de marketing, cujo principal instrumento é a publicidade. Dessa forma, o marketing representa a maneira mais eficiente de criação das necessidades humanas. Assim, a competição empresarial exige dos ofertantes de produtos e serviços a utilização de instrumentos lícitos. A publicidade faz parte de tais instrumentos.

A norma constitucional possibilita ao legislador impor limites às práticas comerciais de abuso do poder econômico e de deslealdade concorrencial.

Diante do exposto, a visão constitucional é a de que a comunicação é garantida ao empresário na prática publicitária, mesmo assim, tal direito será limitado em razão da tutela de outros bens jurídicos que com ela se confronte, sem desprezar-se a valoração que os referidos direitos sofrerão, por parte do Poder Judiciário ao analisar o caso concreto.

A lei 14.223/06 está sendo discutida nas diversas instâncias do Poder Judiciário, onde liminares foram concedidas e outras revogadas, não se vislumbrando definitivamente a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da referida norma. Em linhas gerais, a norma proibiu a veiculação de anúncios publicitários nos logradouros públicos para garantir a limpeza e um cenário visual harmonioso. O objetivo da lei não é outro se não devolver ao cidadão harmonia e paz, beleza, o bem-estar, o patrimônio histórico, como o cultural, além de possibilitar o resgate da identidade urbana.

Entendemos que a lei atingiu o seu objetivo, não obstante continuar a discussão sobre o tema no Poder Judiciário, mas ainda há que ser verificados os prejuízos experimentados por aqueles que dependiam diretamente desta forma de divulgação de seus produtos através da comunicação visual. No Brasil, há legislações que são bem estudadas e debatidas e outras nem tanto, ficando a impressão para a sociedade de que "há leis que pegam e outras não". Com efeito, uma lei que foi e está sendo bem estudada e amplamente discutida é o Código de Defesa do Consumidor, o qual passou a existir em setembro de 1990, porém, passou a vigorar 180 dias após. Ressalte-se que tal legislação possui caráter principiológico constitucional e qualquer pessoa da sociedade pode citar um ou mais dispositivos sem sequer compulsar o código, o que mostra efetivamente o conhecimento da legislação.

Ao contrário, a lei 14.223/06 possuiu pouco tempo para ser estudada ou quase nada, de forma que ao nosso ver fere frontalmente a livre iniciativa, que sustenta a ordem econômica, conforme se vê no artigo 170 da Constituição federal que assim assegura:

"A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme ditames da justiça social, observados os seguintes princípios."

Além da livre iniciativa, está flagrante o confronto ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.

O Poder Público pretendeu extinguir uma atividade lícita ao proibir a publicidade através de outdoors, quando, na verdade, bastaria a regulamentação da atividade, com a fixação de limites e parâmetros para a sua execução.

Por outro lado, a lei em comento não está em consonância com o Direito Urbanístico no que se refere à sustentação do sistema adotado quando se verifica os princípios do planejamento, gestão democrática da cidade e o princípio da função social, conforme se pode abstrair dos artigos 189 e seguintes da Constituição Federal.

Como é sabido, a função social da propriedade tem cunho principiológico previsto no artigo acima mencionado, e está efetivamente cumprindo a função social a empresa que dá ao imóvel destinação comercial, gerando empregos, atividade econômica e riquezas para o país.

Parece que o Poder Público só vislumbrou o Direito Constitucional ao meio ambiente, deixando de fazer uma interpretação sistêmica da Carta Magna.

Para o mercado imobiliário, o prejuízo é incalculável, iniciando pela impossibilidade da divulgação dos imóveis através dos outdoors, banners, e ainda a dificuldade de identificação dos estabelecimentos sem inscrições nas fachadas, em função da onerosidade causada pela legislação. Com efeito, o desemprego cresceu ante a estagnação do mercado de compra e venda pela falta de informação.

Do ponto de vista prático que decorreu da falta de planejamento da lei é de se observar que a retirada dos anúncios resultou em mais sujeira e duplicou a poluição visual ante o não tratamento das fachadas dos imóveis que recebiam as publicidades.

Entendemos que deva haver sempre uma harmonização entre os princípios, mediados pela razoabilidade e proporcionalidade, sendo assim, acreditamos que será possível encontrar uma solução intermediária, permitindo-se a publicidade nas vias e avenidas, sem comprometer o meio ambiente; regulamentação e fiscalização e não simplesmente extinção deste meio tão antigo de divulgação de produtos e serviços, responsável por milhares de empregos, tão escassos ultimamente.

Com a publicação da lei 14.223/06, a pergunta que deve ser feita é como solucionar o desemprego para os que viviam proveniente da renda da atividade publicitária? E ainda, como solucionar os prejuízos experimentados pelos empresários do setor imobiliário?


Bibliografia

NUNES JUNIOR,, Vidal Serrano. Publicidade Comercial: proteção e limites na Constituição de 1988. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001.

ROCHA, Silvio Luiz Ferreira. Direitos Fundamentais na Constituição de 1988. v. 758. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional positivo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. O Direito de antena em face do Direito Ambiental no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2000.


Notas

[1] Publicidade comercial: proteção e limites na Constituição de 1988. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 34.

[2] Idem, p. 150.

[3] No mesmo sentido, Vidal Serrano Nunes Junior: "Infere-se de todo exposto que a publicidade constitui, sem dúvida, um fenômeno econômico, cujo lastro legitimador está assentado basicamente na ordenação constitucional da economia, em especial na livre concorrência, cujo exercício pelos competidores implica a faculdade de conquistar clientela, podendo, para tanto, valer-se, ao lado de outros instrumentos de marketing, da publicidade comercial" (op. cit., p.160).

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Sobre o autor
Evilásio Ferreira Filho

sócio do escritório Ferreira e Melo Advogados Associados em São Paulo (SP), professor universitário, mestre em Direitos Difusos e Coletivos, pós-graduado em Direito Empresarial e em Direito Imobiliário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA FILHO, Evilásio. A poluição visual e sonora no Direito Imobiliário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1443, 14 jun. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10011. Acesso em: 23 nov. 2024.

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