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A proteção jurídica do software, com ênfase em patente.

Os conflitos, interesses e alternativas

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Parte II – OS CONFLITOS, INTERESSES E ALTERNATIVAS

II.1. Os conflitos

Muitos autores têm opiniões conflitantes a respeito do patenteamento do programa de computador. Gabriel Di Blasi (1997) relata que lei n. 9.279/96 prevê que o conjunto entre o programa e o computador tem natureza de invenção, podendo ser patenteável, desde que preencha os requisitos legais.

Um dos fortes argumentos contrário ao patenteamento do software é que o programa de computador em si escapa da idéia de industriabilidade, pois a máquina faz o processo produtivo e o programa somente o conduz. Se não está inserido em um processo industrial, não pode ser patenteado. José Ascensão (1980) lembra que diversos programas fogem totalmente da idéia de industriabilidade como, por exemplo, um banco de dados de decisões jurisprudenciais, onde o sistema de patentes não seria, de forma alguma, aplicável.

Numa disputa judicial entre NVL Software e Multimídia Ltda versus Reinaldo de Paula Machado e outro, a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi, relatora do recurso especial n. 443.119 - RJ (2002/0071281-7), relata no seu voto, entre outros, que:

"[...] O software, ou programa de computador, como disciplinado em leis específicas (9.609/98 e 9.610/98), possui natureza jurídica de direito autoral (trata-se de ´´obra intelectual´´, adotado o regime jurídico das obras literárias), e não de direito de propriedade industrial.

Esse entendimento resulta não apenas da exegese literal dos arts. 7º, inc. XII da Lei nº. 9. 610/98 e 2º da Lei nº. 9.609/98 e das expressivas contribuições de diversos doutrinadores, mas também da interpretação, a contrario sensu, do dispositivo da lei de propriedade industrial (Lei n. 9.279/96, art. 10, inc. V) que afasta a possibilidade jurídica de se requerer a patente de programa de computador, por não o considerar seja invenção, seja modelo de utilidade.

Se o direito de propriedade industrial, como positivado no Brasil, expressamente rechaça proteção ao software, não resta outra solução senão a de aceitá-lo enquanto modalidade de direito de propriedade intelectual (autoral), pois do contrário ficaria o seu titular despido de qualquer proteção jurídica a reprimir atos de contrafação"[24].

O art. 27(1) do TRIPs estabelece que qualquer invenção de produto ou de processo, em todos os setores tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial.

Será que o programa de computador preenche todos os requisitos de patenteabilidade? Pertence a um setor tecnológico? Tem aplicação industrial?

O engenheiro eletrônico, Antonio Carlos Souza de Abrantes, examinador de patentes do INPI, publicou um artigo no site eletrônico Comciencia, atualizado em 16 de setembro de 2004, sob o título " Patentes no setor de informática: a visão do INPI", e expõe, entre outros, que :

" [...] O segundo aspecto comporta os elementos não literais do programa de computador, ou seja, seus aspectos funcionais, suas características técnicas operacionais expressas por métodos e sistemas que são passíveis de proteção por patentes. Uma criação industrial relativa a programa de computador será considerada invenção desde que a criação como um todo apresente um efeito técnico, isto é, venha a resolver um problema encontrado na técnica, que não diga respeito unicamente à forma como este programa de computador é escrito, isto é, ao programa de computador em si"[25].

A declaração do eng. Abrantes foi comentada por Pedro Rezende e Hudson Lacerda (2005) no artigo "Computadores, Softwares e Patentes" que, entre outros, esclarece:

"A função técnica do hardware é processar sinais. Sinais per se nada significam, porque não são símbolos. Sinais veiculam símbolos através de códigos. Portanto, o significado das seqüências de bits manipuladas por esses programas é função semiológica das camadas de código que a lógica e ontologia dos demais programas envolvidos permitem aos seus autores representar. O funcionamento técnico de um hardware é determinado na sua fabricação, explorável através do domínio de sucessivas camadas de codificação, por programadores que podem criar programas independentemente. As simbolizações que dão funcionalidade a programas de computador só se estabelecem pelo e no contexto dos demais programas envolvidos, inclusive "programas cognitivos" imersos na cultura dos usuários. Assim, o significado das seqüências de bits manipuladas por esses programas não só não altera, como também não pode ser entendido como parte da função técnica do hardware onde executa. Da mesma forma que um disco não altera o funcionamento técnico de um toca-disco, ou, uma nova partitura não altera o funcionamento técnico de um violino. O funcionamento prático do processador, isto é, a utilidade do repertório de comportamentos de programas nele executáveis, limitado por fatores como tempo de execução, capacidade de armazenagem e de fluxo dos demais dispositivos do computador, e codificações que se sobreponham para os dados manipulados, em nada afeta a relação causal entre o projeto do processador e seu funcionamento técnico, entre a matriz dos seus circuitos eletrônicos e o repertório de comportamentos dos programas nele executáveis"[26].

Abrantes não exemplifica como um programa de computador pode alterar a funcionalidade do computador. Rezende, matemático e professor de Ciência da Computação da Universidade de Brasília, explana que o programa de computador não altera o funcionamento técnico do hardware, assim como um disco não altera o funcionamento técnico de um toca-disco.

O eng. Abrantes quando relata que "elementos não literais do programa, ou seja, seus aspectos funcionais, suas características técnicas operacionais expressas por métodos e sistemas que são passíveis de proteção por patentes", ele descreve na realidade o conceito americano de invenção para programa de computador-relacionado, ou seja, que o programa tenha uma funcionalidade, uma aplicação prática na área tecnológica. Esse conceito será analisado mais detalhadamente adiante.

Em outro trecho do artigo Abrantes relata que:

"O INPI tem considerado portanto como patenteáveis os programas de computador que evidenciem um efeito técnico novo, e que portanto não podem ser considerados como programas em si. Diretrizes de exame do início da década de 90 já estabeleciam tal conceito: "A concessão de patentes de invenção que incluem programas de computador para realização de um processo ou que integram equipamentos que realizam tais processos tem sido admitidos pelo INPI há longos anos. Isto porque não pode uma invenção ser excluída de proteção legal, desde que atendidos os requisitos convencionais de patenteabilidade, meramente pelo fato de que para sua implementação utilizem programas de computador. Assim o programa de computador em si é excluído de proteção patentária, todavia, se o programa controla a operação de um computador mesmo convencional, de modo a alterar tecnicamente o seu funcionamento, a unidade resultante do programa e do computador combinados pode ser uma invenção patenteável como método ou dispositivo"[27].

As diretrizes de exame do INPI foram comentadas por Rezende e Lacerda (2005):

" [...] dizer que o funcionamento técnico de um processador é alterado por um programa nele executável, ou que um tal programa altera esse funcionamento técnico, não faz sentido exceto no ilusionismo, já que a autoria, representação ou conhecimento de um tal programa em nada altera a coleção dos executáveis à qual ele já pertence, por definição do projeto do chip do processador. Tampouco faz sentido dizer que a funcionalidade de um tal programa altera o repertório dos possíveis comportamentos do processador. Por outro lado, se a finalidade (causa final) de um tal programa altera a utilidade do processador onde executa, isso em nada modifica seu funcionamento técnico, pois em nada afeta as causas eficientes, aqui explicadas, que o processador é capaz de instrumentar.

Pode-se perguntar, então, que programas poderiam alterar o funcionamento técnico de um processador. Somente as instruções propriamente ditas, fisicamente expressas por circuitos eletrônicos no desenho do chip e nele imersas na fabricação, e não as seqüências de suas representações binárias, pode-se admitir que alterem esse funcionamento: mas apenas no estrito sentido em que determinam o código de máquina do processador, através do código subjacente dos circuitos eletrônicos, quando inseridos no desenho do seu chip durante a etapa de projeto. [...] A diretriz do INPI inverte, portanto, uma relação de causa que não é inversível"[28].

O professor Rezende explica que o programa de computador não pode alterar tecnicamente o funcionamento do computador. Segundo Rezende, somente no desenho do chip, durante a etapa do projeto do computador, é possível alterar a funcionalidade do computador.

Quanto às "diretrizes de exame do INPI, do início da década de 90", segundo consta, não foi publicada na Revista da Propriedade Industrial – RPI e, portanto, não é um documento oficial. A primeira (e única) "Diretrizes de Exame de Patentes" foi oficialmente publicada na RPI n. 1.669, de 31 de dezembro de 2002, e não faz nenhuma menção ao programa de computador.

Quando a diretriz descreve que o programa "altera tecnicamente o funcionamento do computador", o autor, como engenheiro mecânico e também examinador de patentes do INPI, não consegue visualizar como um programa de computador pode "alterar tecnicamente" o funcionamento de um computador. O uso do programa no hardware do computador não apresenta efeito técnico novo ou inesperado em relação ao estado da técnica e não tem aplicação industrial.

Abrantes cita no artigo alguns exemplos de patentes concedidas relacionados à programas de computador, a saber: PI9504218 - alocação de memória em um sistema de impressão; PI9503180 - controle de marcha de um automóvel; PI9405871 - rede neural; PI9404321 - processamento de imagem MPEG; PI9307625 - sistema de seleção de programas em TV; PI9306983 - sistema de telecomunicações; PI9306654 - protocolo de telecomunicações; PI9302550 - sistema de criptografia; PI9300395 - controle de janelas gráficas; PI9203427 - controle de tarefas em sistema multimídia; PI9107319 correio eletrônico; PI9105295 - reconhecimento de caracteres; PI8404687 - controle de elevadores; PI8402214 - impressão de dados; PI8401590 - formatação de textos; PI8302322 - justificação de texto em impressão; e PI8202472 - ajuste de campos em um editor de textos.

O eng. Abrantes cita também, como exemplo, o exame do pedido de patente PI9407646 que sintetiza os argumentos para a patenteabilidade de métodos matemáticos. O pedido trata de processo computadorizado para otimização de gastos e a taxa de crescimento em criaturas vivas tomando por base curvas de Gompertz que levam em conta múltiplos parâmetros (genéticos e não genéticos), conforme descreve Abrantes. Segundo ele, o parecer conclui que:

"Uma invenção relativa a programa de computador cuja novidade está na utilização de um método matemático para solução de um problema será considerado invenção desde que a invenção como um todo traga a solução de um problema técnico, isto é, um problema que não seja puramente matemático. Um programa de computador que implemente um método matemático, tal como um método de solução de equações, por exemplo, não será considerado invenção pois se trata de um problema de matemática pura, isto é, o estudo das propriedades das grandezas em abstrato. Para tal criação ser considerada invenção é necessário que tal algoritmo matemático seja aplicado em determinado campo da prática, isto é, fora do universo da matemática propriamente dito. A requerente procede em seu argumento, de que no presente caso, há a aplicação de um modelo matemático para um problema de ordem prática, e não meramente matemática"[29].

Quando o parecer relata que "tal algoritmo matemático seja aplicado em determinado campo da prática" e que "há a aplicação de um modelo matemático para um problema de ordem prática e não meramente matemática", descreve na realidade o conceito americano para o patenteamento de uma invenção, ou seja, que a invenção seja útil (useful).

O conceito útil consta do Manual de Procedimento para Exame de Patentes (MPEP) do USPTO – já comentado anteriormente. O Manual descreve na seção 2106, sob o título "Invenção de Computador-Relacionado", que uma invenção deve ser patenteada como processo útil, máquina, fabricação ou composição de material e ter uma aplicação prática.

O Manual explica que uma aplicação prática de uma invenção de computador-relacionado é assunto estatutário e uma invenção que tem uma aplicação prática na área tecnológica satisfaz o requisito de utilidade (useful).

Um exemplo do tema pode ser observado no caso americano Arrythmia Research Technology Inc v. Corazonix Corp. (Federal Circuit, 1992), onde foi dito que a transformação de sinais de eletrocardiograma de uma batida do coração do paciente por uma máquina com uma série de cálculos matemáticos constituiu uma aplicação prática de uma idéia abstrata (um algoritmo matemático, fórmula, ou cálculo), porque correspondeu a uma coisa concreta ou tangível útil – a condição de um coração do paciente[30].

No Brasil, o conceito útil não existe na LPI para patentes de invenção. O conceito útil somente existe para patentes de modelo de utilidade – que corresponde a uma nova forma ou disposição em um objeto de uso prático que resulta em melhoria funcional no seu uso ou em sua fabricação (art. 9 da LPI).

Para uma invenção ser patenteável deve ter os seguintes requisitos: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial (art.8 da LPI). Alias, os requisitos de patenteabilidade na legislação brasileira segue o conceito similar de patenteabilidade definido pelo art. 52(1) da Convenção Européia de Patentes (EPC), já comentado anteriormente.

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O conceito de aplicação industrial – conceito não usado na legislação americana – significa que a invenção deve ser utilizada ou produzida em qualquer tipo de indústria (art. 15 da LPI). A invenção deve conter características técnicas e estar relacionada a um produto ou processo de fabricação (art. 42 da LPI e item 15.1.3.2 do Ato Normativo – AN 127/97).

Maria Dal Poz e Sandra Brisolla (2004) relata que "a grande maioria dos países hoje reconhece como patenteável um objeto que represente uma ‘contribuição técnica’, ou seja, uma aplicação industrial. Esta caracterização é considerada demasiadamente restritiva pelos EUA, que defendem a utilização do conceito de ‘requisito de utilidade’, ou ‘aplicação prática’"[31].

Portanto, o conceito de utilidade consiste num dos motivos pela qual uma invenção relacionada ao software ser passível de patenteabilidade nos Estados Unidos.

Um outro fator importante para analisarmos é a descrição da invenção. O art. 24 da Lei n.9.279/96 estabelece que o relatório deverá descrever clara e suficiente o objeto, de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução. Sabe-se que os programas de computador não são totalmente descritos (os códigos-fonte, por exemplo, não são totalmente revelados). Inclusive, a Resolução INPI n. 58/98 que estabeleceu normas e procedimentos relativos ao registro de programas de computador, dispõe no art. 4(2) que a documentação técnica é composta pela listagem integral, ou parcial, do programa-fonte.

Outro questionamento importante: será o programa de computador um "objeto" que possibilite a sua realização por um técnico no assunto, como previsto no art. 24 da LPI?

Sabe-se que os programas quando depositados são verdadeiras "caixas pretas" e não são totalmente revelados. O depositante quase nunca revela o código-fonte do programa, pois prefere guardá-lo como segredo industrial para evitar a cópia e a pirataria. Os programas não são objetos e são normalmente descritos em fluxogramas, fórmulas matemáticas e interfaces gráficas.

Como um programa de computador, que não é um objeto, pode ser reproduzido e realizado por um técnico no assunto e ser patenteável pelo art. 24 da LPI?

Nos Estados Unidos, ao contrário do Brasil, o objeto da patente descrito no relatório descritivo não precisa ser total revelado. Basta ser suficientemente descrito e compreeendido no setor da tecnologia a qual pretende a proteção patentária.

Dal Poz e Brisolla (2004) relata ainda que a permissão para o patenteamento pode ser obtida: "i) a partir de uma descrição baseada em inquisição subjetiva, o que permite deixar encobertas muitas características do objeto a ser patenteado, ou, ii) no caso de explicitação objetiva sobre ele, obrigando a revelação [....]. As leis nos EUA e de alguns países desenvolvidos seguem a primeira disposição, enquanto países em desenvolvimento perseguem a manutenção do padrão atual de descrição objetiva"[32].

Portanto, a descrição do pedido baseado na inquisição subjetiva consiste num outro motivo pela qual uma invenção relacionada ao software ser passível de patenteabilidade nos Estados Unidos.

O programa de computador, além de não ser considerado invenção (art. 10, V da Lei n. 9.279/96), é uma concepção puramente abstrata (não patenteável pelo art.10, II da Lei) e ainda um método matemático (algoritimo) (não patenteável pelo art.10, I da Lei) e, se relacionado a um computador, não irá "transformar-se" em um produto ou processo com "características técnicas" que possa ser fabricado na indústria (não suscetível de aplicação industrial e não patenteável pelo art. 8 da Lei).

O eng. Abrantes relata ainda que "a proteção patentária tem se expandindo significativamente a nível internacional" e na nota final do artigo explica que "nos Estados Unidos a decisão da Suprema Corte Diamond v. Diehr de 1981 dá início a uma série de decisões ampliando cada vez mais a possibilidade de patentes de software"[33].

Realmente é fato que o caso Diamond v. Diehr de 1981 dá início a uma série de decisões ampliando cada vez mais a possibilidade de patentes de software, mas somente nos Estados Unidos, Japão e EPO. Quanto ao argumento que a proteção patentária "tem se expandindo significativamente a nível internacional" não corresponde com a realidade. O Parlamento Europeu rejeitou recentemente, em 2005, o patenteamento do software, e a grande maioria dos países desenvolvidos e em desenvolvimento também se opõem ao patenteamento.

Sobre o patenteamento do software, Benjamin Coriat (2002) expõe no artigo "O novo regime global de propriedade intelectual e sua dimensão imperialista: implicações para as relações ‘norte/sul’"que:

"Dentre todas as sentenças jurisprudenciais proferidas no esforço de reafirmar o novo rumo, duas se destacam, pelo impacto que têm exercido. A primeira (conhecida como Diamond vs. Diehr, 1981) declarou que era possível patentear algorítimos, o que escancarou as portas para a patenteabilidade do software. Ao fazê-lo, essa decisão revogou a jurisprudência anterior, que impedia explicitamente essa possibilidade. A segunda decisão (Street Bank Trust vs. Signature, 1998) abriu ainda mais a brecha, ao ampliar o alcance dos produtos patenteáveis pela inclusão de patentes de ‘modelos de negócios ou gerenciais’, isto é, simples ‘métodos de trabalho’ relacionados com vários tipos de práticas comerciais tidas como automatizadas, na medida em que são exercidas numa plataforma da Internet e/ou de software. O que é digno de nota, nesse ponto, é que os registradores de patentes não são solicitados a revelar os métodos de computação exatos que utilizam. Não é o tratamento desses métodos que constitui a novidade, mas o fato de que os próprios ‘conceitos’ tornam-se o objeto de proteção. Nota-se que essas novas práticas criaram enormes conflitos reais ou potenciais entre os detentores de patentes, pois cada editor usa em cada programa de computador centenas de algoritimos, muitos dos quais são hoje protegidas por elas"[34].

No caso Street Bank Trust vs. Signature de 1998, o tribunal americano declarou patenteável um sistema desenvolvido pelo Signature Financial Group para o gerenciamento de fundos mútuos.

Os Estados Unidos (e Japão), além de patentearem o software relacionado ao computador, também consideram patenteáveis os modelos de negócios, que são base de dados para métodos organizacionais e administrativos, tais como métodos ou sistemas financeiros, comerciais, contábeis etc. que utilizam conceitos abstratos e sem aplicação industrial, que não são passíveis de privilegiabilidade pelo art. 10, inciso III, da LPI.

II.2. Os interesses

A dinâmica econômica mundial sofreu profundas alterações na década de 80 que envolveram importantes mudanças tecnológicas, organizacionais e institucionais. É uma mudança de paradigma e chamado de nova era do conhecimento baseado nos seguintes parâmetros: informação, conhecimento, aprendizado, inovação e redes.

Visando minimizar os impactos negativos dos desajustes causados pela mudança de paradigma e agilizar a reestruturação industrial, vem se observando nos últimos anos uma intensificação da competição entre empresas e países.

Para Helena Lastres e José Cassiolato (1995), o fortalecimento das bases construídas das vantagens competitivas englobando a promoção dos recursos ligados ao conhecimento e à capacitação, assim como a modernização das estruturas institucionais que facilitam e promovem a geração, internalização e difusão de inovações tecnológicas e organizacionais, e colocou-se como objetivo central da estratégia competitiva das empresas e países.

Mais recentemente, a mudança de paradigma tecnológico são lideradas pelas Tecnologias de Informação e Comunicação - TIC, as quais tornaram-se a base do rápido desenvolvimento tecnológico, da produção e do comércio internacional.

As TIC estão afetando a estrutura e a organização industrial, principalmente através do aumento do conteúdo informacional da produção, do aumento da velocidade dos processos produtivos e da ampliação do potencial de geração de economias externas. Elas estão mudando dramaticamente os métodos para processar tarefas internas das empresas.

A mudança de paradigma veio agilizar a reestruturação e organização industrial, e intensificar e acirrar a competição entre empresas e países.

A capacidade de rapidamente gerar, introduzir e difundir inovações passou a exercer papel fundamental para a sobrevivência das empresas. Tal situação colocou mais clara a importância da inovação como instrumento central da estratégia competitiva das empresas e países.

Dentro deste contexto de novo paradigma, o software constitui um fator importante na TIC e, em conseqüência, de fundamental importância para os países mais desenvolvidos – que desejam a sua proteção como patente para ter a garantia do monopólio, tanto como programa de computador como modelo de negócio.

Manuel Castells (1996) ensina que "vivemos em uma sociedade em rede, onde as redes constituem a nova morfologia das nossas sociedades, e a difusão da lógica da rede modifica substancialmente a operação e os produtos nos processos de produção, experiência, poder e cultura. Enquanto que a forma de rede de organização social existiu noutros tempos e noutros espaços, o paradigma da nova tecnologia de informação fornece o material de base para sua expansão hegemônica por toda a estrutura social"[35]. Para Castells, ou se está dentro da rede ou fora dela, não há outro espaço na sociedade.

Para Sérgio Silveira (2004) a propriedade dos bens intangíveis e das informações é o elemento decisivo da sociedade em rede. "Para os cidadãos do mundo pobre e dos países em desenvolvimento, a possibilidade de aproveitar o caráter ubíquo da informação, dos algoritmos, dos softwares e das redes digitais para se desenvolver pode estar sendo corroída pelo recrudescimento das exigências sobre a propriedade das idéias"[36].

O interesse pela harmonização (na realidade, o aumento do escopo) do sistema de patentes no mundo surgiu na Rodada Uruguai – no começo da década de 1990 – no governo Clinton, por interesse das indústrias farmacêutica e de entretenimento (veja entrevista com Joseph Stiglitz mais adiante). Culminou com a aprovação do Acordo TRIPs em 1994.

Após a implementação do Acordo TRIPs, que permitiu o patenteamento de produtos e processos químicos, farmacêuticos e alimentícios (para os países que ainda não reconheciam o seu patenteamento), o número de depósitos de patentes vêm aumentando significamente ano após ano (veja o gráfico 1 do relatório WIPO 2006).

Gráfico 1

Número de depósitos de pedidos no mundo

A maioria dos depósitos de patentes no mundo são examinados pelo Escritório de Patentes do Japão (JPO), Escritório de Patentes e Marcas dos Estados Unidos (USPTO) e Escritório de Patentes Europeu (EPO), que juntos formalizaram e compreendem o Escritório Trilateral de Patentes (Trilateral Patent Office). O Encontro Técnico Trilateral (Trilateral Technical Meeting) e a Conferência Trilateral (Trilateral Conference) vêm se reunindo anualmente (desde 1983) visando solucionar os problemas comuns do Escritório Trilateral.

Nos três Escritórios de Patentes o patenteamento dos programas de computador são permitidos (não por acaso) e, como detém a maioria dos depósitos de patentes no mundo (veja o gráfico 2), pressionam os demais países para que permitam o patenteamento dos programas de computador. Ora, sabemos que a regra basilar do princípio da igualdade é a do tratamento igual para situações iguais e o tratamento diferente para situações desiguais.

Gráfico 2

Top dos 20 maiores escritórios por depósitos de patentes em 2004

Os gráficos 3 e 4 mostram o número de depósitos de patentes nos países por residentes e não-residentes em 1995 e 2004.

Gráfico 3

Número de depósitos de patentes por residentes em 1995 e 2004

Gráfico 4

Número de depósitos de patentes por não-residentes em 1995 e 2004

Os países pobres e em desenvolvimento têm suas próprias tecnologias e indústrias locais (quando têm) e não podem serem submetidos à legislação de patentes harmonizadas pelas nações hegemônicas – o acordo TRIPs, por exemplo, somente beneficiou as grandes indústrias multinacionais dos países mais desenvolvidos.

O regime de propriedade intelectual apropriado para um país em desenvolvimento é diferente daquele para um país desenvolvido. Para Keith Maskus (1997), a lei de patentes tem um significado forte para economias desenvolvidas com capacidade de imitação e significado fraco para países de pequeno desenvolvimento, mas com grande tendência da importância do poder de mercado. Já para Janusz Ordover (1991), a história comum relata que a proteção forte de patente reduz a difusão porque reduz o spillover.

Sobre o Acordo TRIPs, o economista Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel em 2001, em sua recente passagem pelo Brasil, disse numa entrevista ao jornal "O Globo", em agosto de 2005:

"[...] Infelizmente, os negociadores comerciais que prepararam o Trips, acordo de propriedade intelectual da Rodada Uruguai, no começo da década de 1990, ou não sabiam disso ou, mais provavelmente, não tinham interesse na questão. Naquela época, eu trabalhava no Grupo de Conselheiros Econômicos do governo Clinton, e estava claro que havia mais interesse em agradar às indústrias farmacêutica e de entretenimento do que em estabelecer um regime de propriedade intelectual bom para a ciência, ou para os países em desenvolvimento.

Suspeito que a maioria dos que assinaram o acordo não sabia perfeitamente o que estava fazendo. Se soubesse, teria conscientemente condenado à morte milhares de portadores da Aids, que talvez não mais pudessem obter remédios genéricos a preços acessíveis? Se a questão tivesse sido apresentada nesses termos aos parlamentos de outros países, acho que o acordo teria sido firmemente rejeitado.

A propriedade intelectual é importante, mas o regime de propriedade intelectual apropriado para um país em desenvolvimento é diferente daquele para um país desenvolvido. O esquema Trips não levou isso em conta. Na realidade, a propriedade intelectual nunca deveria ter sido incluída no acordo comercial, porque pelo menos em parte sua regulamentação está acima da competência dos negociadores comerciais [...]"[37].

Na Europa, a pressão das pequenas e médias empresas (a maioria das indústrias na Europa) contra o projeto do patenteamento do software no Parlamento Europeu foi fundamental para a derrota do projeto. Elas pressionaram os parlamentares pela rejeição do projeto e exprimiram as suas preocupações e o efeito nocivo para a inovação e a competição, caso o software fosse patenteável, e divulgaram a seguinte petição:

"Por uma Europa livre de patentes para software.

Este abaixo-assinado é dirigido ao Parlamento Europeu. Seu objetivo é prevenir as Autoridades Européias contra os perigos do patenteamento de software. Ele conta com o apoio da Aliança EuroLinux, bem como de companhias européias e associações em prol da abertura de programas-fonte. É favor divulgar esta petição junto a todos os interessados.

Estamos preocupados com os planos atuais no sentido de a Europa legalizar as patentes de software, considerando o seu efeito nocivo para a inovação e a competição.

Estamos preocupados com a possível utilização de patentes de software para patentear métodos empresariais, métodos de educação, métodos de saúde etc.

Estamos preocupados como atual rol de abusos do European Patent Office, especialmente pela sua tendência de abusar do seu poder judicial a fim de estender o âmbito da patenteabilidade.

Estamos surpreendidos pelo fato de que nenhum relatório econômico tenha sido publicado pelas Autoridades Européias relativo ao estudo do impacto das patentes de software sobre a inovação e a competição.

Exigimos que os decisores europeus de todos os níveis façam aplicar a lei – a qual proíbe claramente patentear simples programas de computador – em vez de mudá-la.

Insistimos em que os decisores europeus de todos os níveis reconsiderem os seus planos atuais e garantam que as patentes não serão abusivamente violadas no sentido de proibir ou restringir a disseminação de programas de computador e métodos intelectuais"[38].

Para Manuel Castells (1996) somos cada vez mais uma sociedade tecnodependente. O controle da tecnologia torna-se vital e dita as possibilidades de desenvolvimento e de inclusão social. As funções e os processos principais da era informacional estão sendo cada vez mais organizados em rede e através da Internet. A morfologia das redes é uma fonte drástica de reorganização das relações de poder. "Uma vez que as redes são múltiplas, os códigos interoperacionais e as conexões entre redes tornam-se as fontes fundamentais da formação, orientação e desorientação das sociedades"[39].

No Brasil, o patenteamento do software foi questionado por Sérgio Silveira (2004), que relata: "Interessa-nos que protocolos de comunicação em rede, softwares, ícones e as linguagens de programação sejam patenteáveis? Linguagens básicas da sociedade em rede e das cidades virtuais devem ser propriedade de um grupo econômico? Qual a vantagem para a humanidade, em geral, e para o mundo pobre e em desenvolvimento, em particular, de tornar as rotinas matemáticas submetidas a legislação de propriedade intelectual forte"?[40]

A harmonização do sistema de patentes no mundo não atingiram os Estados Unidos e Japão. O acordo TRIPs, referendado pelo Decreto n. 1.355/94, estabeleceu no art. 27(1) que qualquer invenção de produto ou de processo, em todos os setores tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial. Os dois países aplicam conceitos distintos (já comentado anteriormente) do estabelecido por TRIPs para patentearem software, biotecnologia etc. Pregam a harmonização do sistema de patentes, mas não as cumprem. Visam uma legislação "não harmonizada" com os demais países do hemisfério para, com isso, defenderem seus próprios interesses comerciais e econômicos locais.

O patenteamento do programa de computador abriu o caminho para as patentes de modelos de negócios (incluindo até a Internet) nos Estados Unidos e Japão.

II.3. As alternativas

A Constituição Federal de 1988 estabelece no art. 5, inciso XXIX, que a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.

O art. 2 da LPI n. 9.279/98 determina que a proteção dos direitos relativos à proteção industrial considera o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.

Tanto a Constituição quanto a LPI não deixa dúvida que a invenção visa o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.

Portanto, é necessário desenvolvermos projetos e soluções alternativas que condizem com a nossa realidade. O sociólogo Niklas Luhmann, (1997) argumenta que a constituição/integração da sociedade não se dá por consenso, mas sim pela criação de identidades, referências, valores próprios e objetos através de processos de comunicação na sua própria continuação. Segundo ele, "a diferenciação funcional dos sistemas sociais está tão enraizada dentro da sociedade, que mesmo o uso de meios políticos e organizacionais dos mais fortes não consegue boicotá-la regionalmente"[41].

As Diretrizes de Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) publicadas em 26 de novembro de 2003 definiu como objetivo na linha de ação oficial "opções estratégicas" a concentração dos esforços em áreas intensivas em conhecimento, como semicondutores, softwares, fármacos e medicamentos, e bens de capital. Estes quatro setores apresentaram déficits comerciais, que tendem a se ampliar com o crescimento da economia.

A Lei n. 11.196, de 22 de novembro de 2005, na esfera da PITCE, prevê medidas para desonerar o investimento produtivo, estimular o setor de software e a inclusão digital, assim como incentivar a inovação tecnológica. Na questão da Tecnologia da Informação (TI) determina que serão suspensos o PIS/Pasep e a Cofins incidentes sobre as contas no mercado interno e sobre as importações de produtos e serviços destinados ao desenvolvimento no país de software e de serviços de TI para exportação.

Uma política industrial para o incremento das exportações do software brasileiro é importante e necessário, mas não é o suficiente. Na balança comercial de serviços do Relatório Anual 2005 do Banco Central do Brasil, verificamos que as despesas líquidas ao exterior com serviços de computação e informação somaram US$ 1,713 bilhão, ante US$ 1,281 bilhão em 2004 (aumento de 33,7%) e as receitas líquidas alcançaram US$ 88 milhões, ante US$ 53 milhões em 2004 (aumento de 66%). As despesas líquidas ao exterior de royalties e licenças atingiram US$ 1,404 bilhão, ante US$ 1,197 bilhão em 2004 (aumento de 17,3%) e as receitas líquidas alcançaram US$ 102 milhões, ante US$ 114 milhões em 2004 (diminuição de 11%)[42].

Podemos observar que os pontos mais importantes e cruciais no déficit da balança comercial são as despesas em computação e informação, e royalties e licenças.

O eng. Antonio Carlos Abrantes (2006), examinador de patentes do INPI, relata numa palestra em São Paulo que: "Dos 590 pedido decididos, 512 (87%) são de não residentes, sendo 425 deferidos (83%) e 87 indeferidos (17%); dos 590 pedidos decididos, apenas 78 foram de residentes (13%) sendo 14 deferidos e 64 indeferidos (82%). Poucas empresas nacionais: CMW Equipamentos, Petrobrás, Lotomídia, Tecnologia Bancária, Telebrás e Unicamp com apenas 2 pedidos"[43].

Como podemos verificar, é necessário, além de uma política de exportação, uma política que reduza a despesa em serviço. O patenteamento do programa de computador (com poucas patentes residentes e muitas patentes não residentes) certamente irá contribuir ainda mais para o aumento da despesa na balança comercial de serviços.

De acordo com Jorge Sukarie (2006), presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), o mercado brasileiro de software e serviços de tecnologia cresceu 24% no ano de 2005, movimentou US$ 7,41 bilhões e passou a ocupar o 12º lugar no ranking mundial. Em 2004, estava em 15º. As áreas que mais cresceram foram a de segurança da informação, de software de gestão ERP [Enterprise Resourse Planning é uma arquitetura de software que facilita o fluxo de informações entre todas as atividades de uma empresa, como fabricação, logística, finanças e recursos humanos] e voz sobre protocolo de Internet. As grandes empresas brasileiras são especializadas em ERP

Ainda segundo Sukarie, no ano de 2005 o setor de software movimentou US$ 2,72 bilhões e o de serviços correlatos, US$ 4,69 bilhões [US$ 7,41 bilhões no total]. O mercado brasileiro de programas para computador representa 1,2% do mundial e 41% do latino-americano. O Estados Unidos, líderes do setor, movimentaram US$ 287,5 bilhões em 2005, o que representou 43% do mercado mundial. Globalmente, o mercado de tecnologia da informação movimentou US$ 1,08 trilhão, sendo 40,8% serviços, 20,5% software e 38,7% equipamentos. Incluindo equipamentos, o Brasil movimentou US$ 11,9 bilhões no ano de 2005, o que representou 39% da América Latina.

O PITCE revela que as empresas de desenvolvimento de programas, processamento e bancos de dados passaram de 4.300 em 1994 para 5.400 em 2000.

Qual seria o impacto econômico e social sobre as empresas do setor de software e serviços correlatos se o software for patenteado?

O uso crescente das tecnologias da informação e comunicação aproximam as pessoas e instituições e contribui para uma maior sinergia dos fluxos informacionais em velocidades cada vez maiores. Ao mesmo tempo, introduz o risco de um novo tipo de exclusão social que vem sendo chamada de "exclusão digital". Nos países em que o processo de penetração de tais tecnologias se expande em ritmo acelerado, observa-se, como em nenhum outro momento da história, um crescimento econômico a taxas cada vez mais significativas.

A evolução das tecnologias digitais é mais veloz do que as transformações de valores e atitudes da sociedade. Assim, para inserir minimamente, em termos competitivos as diferentes populações e subespaços no processo de competição mundial, é fundamental garantir o acesso às redes de informação e comunicação e, simultaneamente, capacitar diferentes substratos da população no uso e domínio da linguagem apropriada. Um grande desafio a ser enfrentado na criação de oportunidades de inclusão digital é a universalização dos serviços. Para isto, é necessário criar competências e desenvolver equipamentos de acesso baratos, promover a alfabetização digital em larga escala, capacitar pessoas em todo o ciclo de geração e desenvolvimento de TIC, conteúdos adequados em língua portuguesa, além de desenvolver novos modelos de acesso à Internet. São inúmeros os desafios e oportunidades de desenvolvimento científico e tecnológico que se apresentam na transição para uma sociedade da informação a que estamos assistindo.

Neste contexto, o patenteamento do software pelo INPI, além de prejudicar às pequenas e médias empresas, irá também prejudicar o esforço do Governo Federal em reduzir a exclusão digital no País.

Nos Estados Unidos e Japão, o software, além de ser patenteado como programa de computador também está sendo patenteado como modelo de negócios, tal como métodos administrativos, financeiros, comerciais etc.

Portanto, a política da implantação e utilização do software livre pelo Governo no Brasil torna-se cada mais importante e estratégico para o País. É extremamente necessário que as "Diretrizes da Implementação do Software Livre" do Governo Federal sejam totalmente executadas[44].

O patenteamento do software pelo INPI irá prejudicar o esforço do Governo em executar as diretrizes do software livre no país.

No cenário internacional, o Brasil e a Argentina apresentaram, em 26 de agosto de 2004, uma proposta na OMPI para estabelecer uma agenda para o desenvolvimento. No item IV do anexo, referente à "Dimensão de desenvolvimento e a criação de normas da propriedade intelectual: salvaguardar a flexibilidade necessária em áreas de interesse público", foi proposto, entre outros, que: "Para aproveitar o potencial de desenvolvimento oferecido pelo ambiente digital, é necessário levar em conta a relevância dos modelos de acesso abertos para a promoção da inovação e da criatividade. Nesse sentido, a OMPI deveria considerar a necessidade de iniciar e sondar as perspectivas que oferecem certos projetos de colaboração aberto com vista ao desenvolvimento de bens públicos, tais como o Projeto de Genoma Humano e o software de código aberto (Open Source Software)"[45].

A Internet, que é a maior rede mundial de computadores, só se tornou viável por causa da disponibilidade do código-fonte de implementações da pilha de protocolos TCP/IP. Isso tornou interoperáveis todas as demais redes. Esse protocolo de comunicação é desenvolvido mundialmente, de modo compartilhado e público.

Devemos perseguir o acesso livre à informação e ao conhecimento como elementos fundamentais para a inovação e o desenvolvimento social e tecnológico do país. O caminho da sociedade da informação é o da liberdade de informações e do intercâmbio de conhecimentos, não o da exclusão na forma de monopólio sobre as patentes.

Com o surgimento de novas tecnologias e do novo paradigma tecnológico no mundo, surgem novos setores estratégicos como, por exemplo, o software, a biotecnologia, a nanotecnologia, o biodiesel etc. Nesse sentido, Governo Federal precisa fortalecer a propriedade industrial e intelectual no Brasil, criar um sistema nacional integrado de propriedade intelectual para beneficiar a sociedade brasileira e servir de instrumento para o desenvolvimento tecnológico, econômico e social do país.

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Sobre o autor
Luiz Antonio Xavier dos Santos

engenheiro mecânico, pós-graduado em Propriedade Industrial pela COPPE/UFRJ e examinador de patentes do INPI

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Luiz Antonio Xavier. A proteção jurídica do software, com ênfase em patente.: Os conflitos, interesses e alternativas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1644, 1 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10312. Acesso em: 22 nov. 2024.

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