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O caso Bombardier versus Embraer:

análise crítica do emprego da retaliação no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC

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2.NOVOS RUMOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DA RETALIAÇÃO

            Em virtude do alto grau de descontentamento dos membros da OMC em geral, em especial dos países em desenvolvimento, com o recurso à suspensão de concessões ou outras obrigações, os membros decidiram incluir propostas de reformulação do instituto por ocasião do processo de revisão dos dispositivos do ESC atualmente em curso.

            The complexity of WTO dispute settlement proceedings is underlined by the fact that [...] numerous proposals for improving and clarifying the DSU have been made and discussed in WTO bodies [...]. Most of these proposals refer to institutional and/ or procedural changes; rarely do they touch intrinsic economic problems with the DS system. The reason for the lack of proposals to improve the WTO DS system from an economic point of view may be due to the fact that WTO issues are primarily a playground for lawyers. [42]

            Dentre as propostas de alteração do ESC, notadamente de autoria de países em desenvolvimento ou daqueles denominados "menos desenvolvidos", algumas possuem aplicabilidade prática questionável. De qualquer forma, característica comum a todas as propostas é a expectativa de que garantam maior cumprimento das decisões dos órgãos adjudicatórios da OMC pelos membros demandados e vencidos, sobretudo em casos envolvendo demandantes economicamente fracos contra grandes economias.

            2.1.APERFEIÇOAMENTO DO RECURSO

            Com o intuito de promover a eficácia da retaliação na indução do cumprimento das obrigações, o primeiro grupo de propostas consiste em sugestões para aperfeiçoar a medida. Preliminarmente, tais propostas podem parecer facilmente negociáveis, uma vez que, em princípio, os fundamentos do mecanismo de solução de controvérsias, como um todo, permaneceriam inalterados, ou ao menos pouco alterados, já que a gama de recursos disponíveis em caso de descumprimento das decisões não seriam alteradas. Todavia, o que se pretende demonstrar é que tais propostas podem ser tão radicais quanto aquelas que substituem, por completo, a imposição de contramedidas.

            2.1.1.Do Tratamento Diferenciado à Retaliação Coletiva

            O Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias, em seu artigo 21, "8" dispõe acerca do tratamento especial e diferenciado dispensado aos países em desenvolvimento.

            A primeira proposta, feita pela delegação do Equador, consiste em expandir o escopo de aplicação desse tratamento, determinando que, em casos de disputa envolvendo um país em desenvolvimento como demandante, a análise da limitação quantitativa das contramedidas, a serem aplicadas pelo mesmo, deveria levar em consideração não apenas o volume de comércio afetado, como também o impacto de tais medidas sobre a economia daquele país. Dessa forma, através da mitigação do princípio da equivalência, o nível das contramedidas deveria ser equivalente a, pelo menos, o dobro dos prejuízos experimentados pelo demandante.

            Via de conseqüência, o objetivo único e exclusivo da proposta de tratamento especial e diferenciado parece ser aumentar o poder retaliatório dos países em desenvolvimento, com vistas a tornar eventuais contramedidas, impostas por estes, mais eficazes contra países desenvolvidos, em termos de indução ao cumprimento das decisões do OSC.

            Todavia, dita proposta comporta contradições em determinados aspectos: (i) a simples autorização da retaliação em níveis mais elevados não eliminaria a problemática da sua não aplicação pelos demandantes, uma vez que tal solução não expurgaria os efeitos que a suspensão de concessões teria sobre a economia do próprio membro que as impõe; (ii) segundo levantado por membros como a Comunidade Européia e a Noruega, a proposta equatoriana não estaria de fato amparada pelo princípio do tratamento especial e diferenciado dispensado a países em desenvolvimento, pois tal medida violaria o princípio da nação mais favorecida.

            Tal posicionamento merece críticas: (i) os acordos da OMC são um conjunto de regras permeado por infindáveis exceções, o que torna a resistência à criação de mais uma exceção à cláusula de nação mais favorecida exagerada, em especial se analisado o aspecto de que a proposta equatoriana visa a eliminar o problema da disparidade de forças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento; (ii) há muito o tratamento especial e diferenciado dispensado aos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos encontra-se arraigado nas normas reguladoras do comércio internacional, sendo inclusive prevista no GATT.

            De qualquer forma, a mera autorização de contramedidas em valor mais elevado, quando se tratar de países em desenvolvimento ou menos desenvolvidos, não corrige o problema da incapacidade da imposição das contramedidas e da consecução do seu principal objetivo, qual seja, a indução do cumprimento das decisões, devido aos prejuízos que a retaliação causaria às suas próprias economias.

            A delegação do Equador, entretanto, voltou a incluir a proposta no documento disponibilizado aos demais membros do OSC em 23 de janeiro de 2003, contendo o texto específico do novo dispositivo a ser acrescentado ao ESC. Apesar de o referido texto não ter sido incluído no relatório do presidente do OSC, ainda se pode dizer que as negociações permanecem abertas quanto à questão.

            Diante do exposto, com o objetivo de manter os efeitos adversos da retaliação sobre a economia do membro demandado, minimizando, contudo, tais efeitos sobre a economia do demandante, foi elaborada por diversos membros – tais como representações do Grupo dos Países Menos Desenvolvidos e do Grupo Africano e contando com o apoio de vários países em desenvolvimento, entre eles, Cuba, Honduras, Índia, Malásia, Paquistão, Sri Lanka, Tanzânia e Zimbábue – uma proposta de aperfeiçoamento do instrumento da retaliação com base na aplicação coletiva das contramedidas. [43]

            Consoante esta proposta de retaliação coletiva, na impossibilidade de imposição, pelo demandante, das contramedidas autorizadas pelos árbitros na forma do artigo 22 do ESC (o que ocorreria quase obrigatoriamente no caso de países em desenvolvimento ou país menos desenvolvidos), o OSC poderia, ou deveria, autorizar a retaliação coletiva por todos os demais membros da OMC. Nesta proposta, assim como a primeira, o nível autorizado para a retaliação não deveria observar, necessariamente, o princípio da equivalência, ou seja, este poderia ser substituído pelo princípio das contramedidas apropriadas, aplicada às disputas envolvendo subsídios proibidos.

            A principal contra-argumentação a esta proposta, segundo alguns autores, reside no fato de que, apesar de a OMC cuidar do sistema multilateral de comércio, e de as obrigações assumidas por seus membros estarem sujeitas ao tratamento da nação mais favorecida, a natureza das obrigações assumidas no âmbito da OMC e passíveis de questionamento perante o ESC é bilateral, e não multilateral, não sendo assumida perante a totalidade dos membros da OMC e nem perante toda a humanidade.

            De qualquer forma, a adoção da retaliação coletiva significaria uma profunda alteração nas bases da sistemática do mecanismo de solução de controvérsias da OMC, pois há o risco de nomear-se, efetivamente, um certo número de membros como detentores de poderes policiais, cuja conseqüência seria a priorização da fiscalização daquelas obrigações de interesse particular de tais potências, até mesmo em detrimento de todas as outras.

            Outra crítica, consistente numa abordagem pragmática, adverte que um membro que já tenha retaliado (como terceiro) com base em autorização de retaliação coletiva em determinada disputa, pode vir, no futuro, a ser prejudicado pelas mesmas medidas inconsistentes praticadas pelo membro demandado. Assim, a participação do novo demandado na retaliação coletiva anterior poderá ser um impedimento à nova autorização para a imposição de contramedidas adicionais. Neste caso, uma alternativa seria limitar o valor da nova autorização das contramedidas, deduzindo-se o montante imposto por tal membro na retaliação coletiva. Todavia, por implicar a não aplicação do princípio da equivalência, a proposta em questão possibilitaria a retaliação, coletivamente, em montante superior e desvinculado dos prejuízos decorrentes das medidas inconsistentes.

            Demais questões permanecem controvertidas, tais como quais os critérios adequados para a definição da proporção dos direitos retaliatórios a cada um dos demandantes, a cada um dos terceiros interessados, ou ainda, a cada um dos terceiros não participantes da demanda, observando-se que a retaliação por terceiros não seria obrigatória, o que causaria sua implementação apenas quando fosse de seu interesse político. Ademais, como praticamente apenas as grandes potências têm sido capazes de retaliar, tal mecanismo acabaria por concentrar tal recurso nas mãos dos Estados Unidos e da Comunidade Européia.

            Em razão dos questionamentos aduzidos e com base no prognóstico de aceitação da medida pelos membros da OMC, o presidente do OSC, em junho de 2003, declarou o entendimento de que a retaliação coletiva não goza de consenso suficiente para que venha a ser discutida em maior grau e, posteriormente, inclusa no texto do ESC.

            2.1.2Da Cessão de Direitos Retaliatórios

            Outra alternativa de aperfeiçoamento é encontrada em parte da proposta mexicana de alteração do ESC: a criação, no bojo do ESC, de um mecanismo de cessão de direitos retaliatórios, o qual permaneceria disponível àqueles países que, uma vez vencedores em sua disputa, enfrentassem a impossibilidade de imposição das contramedidas autorizadas. Nesses casos, o membro em questão seria autorizado a negociar seu direito de suspender concessões ou outras obrigações perante o demandado junto a um terceiro, em troca de certas vantagens. [44]

            Um exemplo concreto que ilustra a questão é o caso Bombardier versus Embraer. Neste caso, o Canadá, país desenvolvido, foi incapaz de impor as contramedidas autorizadas pelo OSC frente ao Brasil. Sob o modelo de cessão de direitos retaliatórios, o Canadá poderia então negociar o direito de retaliar o Brasil a quem estivesse disposto e tivesse condições de retaliar o Brasil, possivelmente Estados Unidos ou Comunidade Européia.

            A proposta defende que a livre negociação dos direitos retaliatórios não só traria um incentivo ao cumprimento das decisões do OSC, como também permitiria ao membro afetado obter um benefício mais tangível. Ainda, segundo argumentação mexicana, apesar da proposta parecer nova ao ordenamento da OMC, a idéia de direitos negociáveis já era aplicada com sucesso pela legislação interna da maioria dos membros e em outros ramos do Direito Internacional.

            Eis, entretanto, a crítica: a autorização de negociação de direitos retaliatórios transformaria a OMC em um mercado livre onde os referidos direitos seriam "traficados". Embora a contrapartida financeira experimentada pelo demandante, o mecanismo concentraria a retaliação nas mãos das grandes potências, as quais exerceriam tais direitos meramente para atingir suas finalidades, unilateralmente consideradas.

            Por outro lado, a existência em si da possibilidade da cessão onerosa de direitos retaliatórios poderia inibir a solução diplomática das disputas, o que contraria os objetivos do mecanismo de solução de controvérsias em si, conforme disposto no artigo 3, "7" do ESC. Tal comportamento prejudicaria seriamente o disposto nos artigos 4 e 5 do ESC, além de que a insuficiente transparência do mecanismo de supervisão do cumprimento das decisões do OSC, previsto no ESC, seria substituída pela obscuridade de um mercado, não regulado, de direitos retaliatórios.

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            Ainda, segundo aspecto levantado pela delegação do Canadá na reunião de novembro de 2002, além de o "mercado", que seria criado a partir da alteração sugerida, ser por si só prejudicial do ponto de vista distributivo, uma vez que o mecanismo proposto acabaria concentrando os direitos retaliatórios nas mãos das grandes potências, deve-se atentar para o fato de que os direitos negociados sob tal mercado seriam medidas inerentemente restritivas ao comércio multilateral, contrariando os objetivos e propósitos da própria OMC.

            Note-se, porém, que, afora os comentários da representação canadense, os países desenvolvidos não criticaram (contudo também não exaltaram) a proposta mexicana, preferindo adotar uma postura, talvez mais política, de solicitar maiores comentários e sugerir maiores estudos sobre a proposta.

            2.2.ALTERNATIVAS À RETALIAÇÃO EM FACE DA SOBERANIA

            Existe praticamente unanimidade em relação ao entendimento de que a OMC, como conjunto de regras contidas em acordos e no mecanismo de solução de controvérsias, representa, de qualquer forma, limitação à soberania dos membros. De fato, apesar da submissão voluntária a tais normas, a interdependência econômica entre os países, inviabiliza o sucesso na promoção e implementação de políticas de comércio exterior consistentes por países excluídos da Organização.

            Realista também a argumentação de que ditas regras não instituem um Direito uniforme, sendo permeadas por inúmeras exceções. Todavia, inegável é que grande parte da competência legislativa dos membros, em matérias relacionadas ao comércio exterior, foi transferida para a Conferência Ministerial e para os demais órgãos da OMC.

            Com base nessa transferência de competência legislativa, somada à submissão a um mecanismo de solução de controvérsias entre Estados soberanos, capaz de aplicar medidas coercitivas contra eles, inúmeros governos nacionais expressaram preocupação com o estabelecimento da OMC e a entrada em vigor dos acordos da Rodada Uruguai, enquanto ainda eram discutidos seus termos.

            Tais preocupações em torno da soberania não exprimiam desejo de descumprimento das normas da OMC, mas eram plausíveis, uma vez que é necessária certa flexibilidade para minimizar eventuais conseqüências adversas a determinados objetivos nacionais julgados essenciais (e somente nestes casos), oriundas de irregularidades procedimentais ou de abuso de poder jurisdicional pelos grupos especiais, bem como de possíveis ambigüidades encontradas em dispositivos dos acordos da Rodada Uruguai.

            O posicionamento geral foi o de que os acordos da OMC eram de vital importância para o aperfeiçoamento de um sistema econômico internacional legalista, visando a oferecer maior segurança e certeza jurídica aos países ou demais sujeitos de Direito Internacional cujos elementos culturais e estruturas governamentais diferiam fundamentalmente.

            Nesse sentido, muito embora o poder de mitigar ainda mais a soberania estatal – já que, ao sugerirem tornar o mecanismo de solução de controvérsias mais eficaz, necessariamente aumentarão sua ingerência sobre os assuntos dos seus membros, uma vez que têm o intuito de virtualmente obrigá-los a cumprir as decisões do OSC – o segundo grupo de propostas de alteração do ESC com vistas a torná-lo mais eficaz tem como objetivo substituir a retaliação, como último recurso disponível ao demandante para induzir o demandado ao cumprimento da decisão do OSC.

            2.2.1.A Compensação Compulsória

            A primeira alternativa à retaliação, de autoria da representação do Equador e, posteriormente, do chamado Grupo dos Países Menos Desenvolvidos, consiste na possibilidade de o OSC determinar o oferecimento obrigatório de compensação pelo demandado, como passo seguinte à compensação atualmente prevista no art. 22, "2" do ESC, de caráter voluntário. O intuito é fazer da compensação uma sanção imposta pelo sistema multilateral aos membros que descumpram suas obrigações assumidas em acordos comerciais.

            Uma das formas de compensação, obrigatória e automática, previa que, uma vez exauridas as tentativas de cumprimento voluntário da decisão e o igualmente voluntário oferecimento de compensação aceitável pelo demandante, o Órgão de Solução de Controvérsias deveria compelir a parte demandada a apresentar um pacote de medidas compensatórias em valor equivalente ao valor da anulação ou redução de benefícios sofrida pelo demandante. Tal pacote seria analisado pela sessão do OSC imediatamente posterior e, sendo aprovado, seria executado pelo membro demandado.

            Paralelamente, como segunda forma de compensação, caso o membro demandado não oferecesse qualquer pacote compensatório no prazo estipulado, o OSC deveria entender tal fato como sendo uma opção, de tal membro, pelo pagamento de compensação pecuniária ao demandante, tornando a compensação uma sanção com poder de restaurar o equilíbrio comercial entre as partes.

            Diante do exposto, cumpre ressaltar que a doutrina internacional especializada já sugeria a aplicação de ambas formas de compensação no âmbito do ESC. De fato, a compensação pecuniária evitaria várias das desvantagens da suspensão de concessões, em especial a existência de prejuízos econômicos para o demandante, a discriminação internacional causada pela impossibilidade de países menores retaliarem os maiores, a incompatibilidade com o princípio do livre comércio e o incentivo ao protecionismo.

            Muito embora, conforme a jurisprudência do ESC, a compensação a ser oferecida pelo demandado ao demandante, diferentemente da retaliação, sujeita-se à cláusula de nação mais favorecida. Assim, uma vez concedida à parte demandante, a compensação consistente em vantagens comerciais (ou mesmo a compensação pecuniária) deveria ser estendida a todos os demais membros da OMC, o que tornaria o seu custo virtualmente proibitivo.

            Contudo, o que se espera é justamente que a compensação pecuniária venha a restaurar somente as perdas da indústria do membro demandante efetivamente prejudicada pelas medidas julgadas inconsistentes, o que mitigaria a essencialidade da observância do tratamento de nação mais favorecida. Dessa forma, uma vez que o pacote compensatório compulsório configuraria mais uma exceção à cláusula citada, verifica-se forte resistência a tal modalidade de alternativa à retaliação.

            Uma terceira modalidade de compensação proposta pelo Equador prevê que, no caso de o pacote compensatório vir a causar distorções nos padrões do comércio internacional, deveria ser aplicada obrigatoriamente a compensação pecuniária.

            Verifica-se, todavia, uma lacuna da proposta equatoriana quanto ao oferecimento de pacote compensatório em montante inferior ao da anulação ou redução de benefícios experimentada pelo demandante. Uma possível interpretação seria a de haver a homologação do referido pacote, contudo sujeita ao pagamento de compensação pecuniária equivalente à diferença entre o valor coberto pelo pacote compensatório e o efetivo valor dos prejuízos.

            Ademais, alerta-se quanto à opção de descumprimento. Sob o sistema proposto, o país demandado detentor de abundantes recursos poderá, efetivamente, pagar, eternamente, o demandante para manter as medidas inconsistentes em vigor, o que tornaria o problema ainda maior. A proposta tenta evitar a questão estabelecendo que o demandado só poderá se submeter à compensação pecuniária por um dado período (no caso, seis meses), sendo, então, obrigado a adotar as decisões do OSC. Contudo, não há qualquer indicação de como tal país seria obrigado a tanto, mencionando-se apenas a adoção de "medidas extremas", como a suspensão do direito de tal membro figurar como demandante em procedimentos sob o ESC, ou mesmo a autorização de "retaliação em larga escala", que não restou esclarecida.

            Como resultado das críticas, o Equador não voltou a mencionar a proposta em seus documentos mais recentes, submetidos à apreciação dos demais membros do OSC em 26 de novembro de 2002 e 23 de janeiro de 2003. Uma variação da proposta, sugerida pela Comunidade Européia e pela Suíça, seria a autorização de compensação pecuniária limitada, aplicável a situações excepcionais, como a reparação de danos causados a membros que não sejam partes na disputa. Outra alternativa seria a adoção da compensação compulsória, contudo sujeita ao princípio da nação mais favorecida, excepcionada a observância desta somente nos casos de compensação pecuniária. Ambas são inegavelmente mais brandas, sendo, portanto, de maior aceitação pelos membros, já que não alteram fundamentalmente o ESC.

            2.2.2A Suspensão de Direitos Políticos

            Outra proposta consiste na suspensão do direito de voto do membro demandado, em todas ou em determinadas deliberações do OSC ou da própria Conferência Ministerial, como alternativa à imposição de contramedidas e ao próprio mecanismo de compensação obrigatória. [45]

            Dessa forma, a alternativa vislumbrada seria a suspensão, pelo OSC, de determinados direitos políticos – o direito de voto e/ ou o de obter assitência financeira ou técnica – do membro demandado, até que este cumprisse as determinações daquele órgão.

            A principal crítica concerne ao fato de que as oportunidades efetivas de votação no âmbito da OMC seriam bastante restritas, assim como a assistência técnico-financeira ainda se encontra em estágio bastante incipiente. Como alternativa, foi apontada a suspensão do direito de demandar com base no ESC.

            De qualquer forma, seria necessária uma alteração nos fundamentos do ESC, uma vez que, segundo o texto atual, nem mesmo a imposição de contramedidas pode tomar a forma de suspensão de direitos políticos, pois a retaliação por ora prevista no ESC não pode versar sobre obrigações contidas nos acordos que proíbam a suspensão de concessões ou outras obrigações, entre eles aqueles que incluem os direitos políticos dos membros, como o ESC e o Acordo Constitutivo da OMC. Tal necessidade torna dúbia a possibilidade prática de se incluir a questão nas negociações referentes à revisão do ESC.

            Uma alternativa seria o acionamento da suspensão dos direitos políticos apenas após certo número de condenações não cumpridas por um mesmo membro. No entanto, algumas críticas ainda seriam cabíveis: (i) seria árduo obter um consenso acerca do número de violações que poderiam ser mantidas antes da perda dos direitos políticos pelo membro; (ii) ocorreria o revezamento das medidas ilegais em vigor; (iii) muito embora a permissão de violações até certo limite não ser considerada uma permissão propriamente dita, uma vez que as demais sanções (compensação e retaliação) já seriam aplicáveis, ela possivelmente enfraqueceria, politicamente, o sistema de solução de controvérsias da OMC, já que traduziria uma idéia de permissividade de violação bastante perigosa em um ambiente que, apesar de crescentemente legalista, ainda possui forte componente político nas suas interações.

            Uma outra variação do mecanismo de suspensão de direitos políticos prevê a suspensão gradual de direitos políticos, começando com o direito de participar de comitês menores, progredindo para direitos mais substanciais, culminando com o direito de demandar perante o OSC. Contudo, a proposta não esclarece qual o critério para a progressão da sanção: a gravidade do descumprimento, a reincidência ou qualquer outro.

            De qualquer forma, alguma modalidade de suspensão de direitos políticos tem sido proposta recorrentemente pela doutrina, dividindo a preferência dos internacionalistas com a imposição de multas pecuniárias.

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Sobre a autora
Flávia Regina Costa Ramos Albuquerque

bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), técnica judiciária da Justiça Eleitoral

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALBUQUERQUE, Flávia Regina Costa Ramos. O caso Bombardier versus Embraer:: análise crítica do emprego da retaliação no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1514, 24 ago. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10318. Acesso em: 7 nov. 2024.

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