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Ensaio do direito ambiental e sua abordagem principiológica

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07/09/2007 às 00:00
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4 Princípios Gerais do Direito Ambiental

            Visando alicerçar o Direito Ambiental, indispensável ter-se conhecimento dos princípios próprios desta ciência autônoma, a qual tem o fito de indicar caminhos e proteger não apenas uma ecologia equilibrada, como também todo o ambiente em que vivemos. Neste sentido, identificamos princípios de Política Nacional do Meio Ambiente e princípios relativos a uma Política Global do Meio Ambiente. Seguindo a lição do respeitável professor Fiorillo (2001, p. 23), cumpre ressaltar que:

            os princípios da Política Global do Meio Ambiente foram inicialmente formulados na Conferência de Estocolmo de 1972 e ampliados na ECO-92. São princípios genéricos e diretores aplicáveis à proteção do meio ambiente. Por outro lado, os princípios da Política Nacional do Meio Ambiente são a implementação desses princípios globais, adaptados à realidade cultural e social de cada país. São um prolongamento, uma continuação dos princípios globais.

            Levando em consideração a proteção ambiental, e vinte anos depois da Declaração de Estocolmo, verifica-se que a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro de 03 a 14 de junho de 1992, conhecida como ECO-92, reafirmou princípios já existentes, bem como aditou outros referentes ao desenvolvimento sustentável, manifestando a idéia de que os seres humanos possuem o direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza, estando no centro das preocupações.

            Inúmeros são os princípios norteadores do Direito Ambiental, diferindo de acordo com a doutrina empregada. Deduz-se, portanto, que o rol trazido à baila não é taxativo, mas sim exemplificativo, havendo outras pilastras em torno do tema. Assim sendo, verificaremos os mais importantes princípios da Política Global do Meio Ambiente, os quais são de maior incidência na doutrina e encontram-se presentes no artigo 225 da Constituição Federal.

            PRINCÍPIO DO DIREITO À SADIA QUALIDADE DE VIDA: é sabido e consabido que, pela abordagem constitucional, não foi garantido somente o direito à vida, mas o direito à vida digna, saudável e com qualidade. Tal princípio pode ser mensurado em um país através dos fatores de saúde, educação e produto interno bruto. A qualidade de vida, assim, abonada pelo direito ao meio ambiente sadio, considera-se como um direito individual de gestão coletiva. Para tanto, considera-se o estado dos elementos da natureza para se apurar se estes estão em estado de sanidade e se de seu uso advenham saúde ou moléstias para os seres humanos (MACHADO, 2003, p. 48).

            PRINCÍPIOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL [04] e do ACESSO EQÜITATIVO AOS RECURSOS NATURAIS [05]: como conseqüência do objetivo de se alcançar a satisfação das necessidades comuns de todos os seres humanos, o Direito Ambiental estabelece normas que indicam a razoável utilização dos recursos naturais, visto que não é apenas o homem, mas também a preocupação com a natureza, que integra o desenvolvimento sustentável, consagrando a harmonia entre economia e meio ambiente. Deste modo, forçoso haver racionalidade e oportunidades iguais no acesso aos recursos da natureza, na proporção das necessidades de cada indivíduo.

            Tendo em vista que tais recursos não são inesgotáveis, "permite-se o desenvolvimento, mas de forma sustentável, planejada, para que os recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos" (FIORILLO, 2001. p. 24).

            Portanto, deve sim haver o desenvolvimento, porém em harmonia com as limitações ecológicas do planeta, de modo que não cause destruição ao ambiente, permitindo que as futuras gerações tenham a chance de existir e viver bem, de acordo com suas necessidades, melhorando a qualidade de vida e as condições de sobrevivência. Para tanto, há que se ter em mente que a proteção ambiental é parte integrante do processo de desenvolvimento, não podendo ser considerada isoladamente (SILVA, 2005, p. 24-25). Infere-se, pois, que deve haver comprometimento, responsabilidade e solidariedade de todos em busca do desenvolvimento sustentável, visando a qualidade de vida entre as gerações.

            Já no que tange ao acesso igualitário aos recursos ecológicos, ensina Machado (2003, p. 50):

            dentre as formas de acesso aos bens ambientais destacam-se pelo menos três: acesso visando ao consumo do bem (captação de água, caça, pesca), acesso causando poluição (acesso à água ou ao ar para lançamento de poluentes; acesso ao ar para a emissão de sons) e acesso para a contemplação da paisagem.

            Sabe-se que tanto a atividade econômica quanto o acesso aos recursos naturais podem representar dano ao ambiente, porém, utilizando-se dos ora princípios, busca-se minimizar a degradação, assegurando a toda humanidade o acesso consciente aos recursos disponíveis, em igualdade de condições, para uma vida digna e saudável, sem comprometer as futuras gerações.

            PRINCÍPIO DO USUÁRIO-PAGADOR E POLUIDOR-PAGADOR [06]: possui dois enfoques, quais sejam, caráter preventivo e caráter repressivo.

            Conforme alhures exposto, observa-se que os recursos naturais são escassos, ou seja, finitos, motivo pelo qual o uso de alguns desses recursos pode estar condicionado à compensação, soma esta que será empregada aos custos advindos de sua própria utilização.

            Seguindo a linha de raciocínio de que o usuário poderá pagar pelos recursos da natureza de que vai desfrutar, o poluidor certamente será obrigado a pagar os danos já causados ou que porventura vierem a ocorrer.

            Jungido à imposição de que o poluidor deve custear as despesas de prevenção aos possíveis danos ambientais que venha a cometer, cabe a ele o ônus de utilizar mecanismos que previnam tais desgastes naturais. Da mesma forma, caso o poluidor realmente cause degradação ambiental, deverá arcar com a respectiva reparação, sendo que, dificilmente, voltará ao status quo ante.

            Não se deve confundir o pagamento efetuado para o uso de determinado recurso natural com uma punição, já que mesmo sendo lícita a atitude do usuário ou poluidor, este poderá ser implementado. Portanto, em princípio, não significa que o pagador tenha cometido faltas ou infrações, o que não afasta a possibilidade do pagamento ser cumulado com eventual pena ou sanção administrativa.

            O que este princípio busca é o afastamento do ônus do custo econômico das costas da coletividade visando voltá-lo diretamente àquele que utiliza os recursos ambientais, estando, portanto, fundado no princípio da solidariedade social e na prevenção do dano, mediante a imposição de contrapartida econômica (ANTUNES, 2002, p. 41).

            Haverá, assim, dois momentos de aplicação do presente princípio: o da aplicação das tarifas ou preços e/ou da exigência de investimento na prevenção do uso do recurso natural, e o da responsabilização residual ou integral do poluidor (MACHADO, 2003, p. 54). Verifica-se, na ocasião, que o custo a ser imputado ao usuário ou poluidor não está exclusivamente vinculado à imediata reparação do dano, mas sim em uma atuação preventiva.

            Deste modo, não estará conferido direito algum ao predador, quanto menos o direito a poluir o meio ambiente quando do pagamento devido. Caso assim ocorra, haverá a incidência da responsabilidade civil na órbita repressiva.

            PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO [07] e PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO [08]: estes preceitos fundamentais são de extrema deferência, devido ao fato de que os danos ambientais, quase que em sua totalidade, são irreversíveis e irreparáveis.

            Diante de um sistema desprovido de restabelecer uma situação idêntica à anterior, os Princípios da Precaução e da Prevenção do dano ao meio ambiente têm sido objeto de intensa estima.

            É o que se constata no artigo 225, caput, da Constituição Federal, que dispõe que o Poder Público e a coletividade têm o dever de proteger e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, atitudes estas que, de modo indubitável, só serão concretizadas através de uma consciência ecológica e de uma política de educação ambiental. Ademais, como bem assevera Fiorillo (2001, p. 36), "a efetiva prevenção do dano deve-se também ao papel exercido pelo Estado na punição correta do poluidor, pois, dessa forma, ela passa a ser um estimulante negativo contra a prática de agressões ao meio ambiente".

            Oportuno esclarecer que nada obstante os termos "prevenção" e "precaução" tenham definições semelhantes, há características peculiares para o Princípio da Precaução, o qual é aplicado ainda quando exista incerteza da ocorrência ao dano.

            Nas palavras do jurista Jean-Marc Lavieille (1998 apud MACHADO, 2003, p. 64), "o princípio da precaução consiste em dizer que não somente somos responsáveis sobre o que nós sabemos, sobre o que nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o de que nós deveríamos duvidar".

            Isto posto, conclui-se que a existência de certeza do dano ao meio ambiente influi em sua respectiva prevenção, de acordo com o desenvolvimento e tecnologia do país (Princípio da Prevenção). De outro lado, tem-se que em caso de dúvida ou incerteza quanto à degradação, esta também deve ser prevenida, ou melhor, precavida (Princípio da Precaução).

            Assim sendo, o Princípio da Precaução, aplicável a impactos desconhecidos, afirma que a ausência de certeza quanto à existência de risco de dano sério ou irreversível demanda a implementação de medidas que possam evitar este dano.

            PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO [09]: como o próprio nome sugere, consiste em reparar o dano causado ao ambiente, princípio este que se encontra presente na Lei nº 6.938/81, acima mencionada, onde se adotou a responsabilidade objetiva ambiental, bem como na Carta Federal em seu artigo 225, §1º, inciso I, e §§2º e 3º, os quais agasalham a obrigação de restauração, recuperação e reparação do meio ambiente danificado.

            Consoante supra citado, a defesa e preservação ambiental, para as presentes e futuras gerações, cabem tanto ao Estado como à sociedade como um todo, visto que dispositivo constitucional impõe ao Poder Público e à coletividade tais incumbências (artigo 225, caput, CF).

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            PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO [10]: visa uma ação conjunta entre todos aqueles comprometidos com os interesses difusos e coletivos da sociedade, sobretudo com a causa ambiental. Por esta razão, não rara é a hipótese de ações civis públicas em defesa do meio ambiente tendo como parte autora determinada Organização Não Governamental (ONG) ou pessoa jurídica de direito público, os quais também têm o direito-dever de tutelar o meio ambiente.

            A esse respeito, Machado (2003, p. 82) explica:

            a participação dos cidadãos e das associações não merece ser entendida como uma desconfiança contra os integrantes da Administração Pública, sejam eles funcionários públicos ou pessoas exercendo cargos em caráter transitório ou em comissão. Essa participação também não é substitutiva da atuação do Poder Público. A proteção dos interesses difusos deve levar a uma nova forma participativa de atuação dos órgãos públicos, desde que não seja matéria especificamente de segurança dos Estados.

            Outrossim, há de se considerar que a participação expressa um dos elementos do Estado Social de Direito, ou Estado Ambiental de Direito, pois faz parte da estrutura essencial para uma vida digna, saudável e com qualidade, o que se traduz como um dos pontos cardeais da tutela ambiental (FIORILLO, 2001, p. 38).

            PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO [11]: consiste no direito que todos têm de receber dos órgãos públicos informações, seja de cunho particular ou coletivo, as quais serão prestadas sob pena de responsabilidade, ressalvadas as hipóteses de sigilo ou que seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (artigo 5º, inciso XXXIII, CF).

            Ainda prevê a Magna Carta que todos devem ter acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente, caracterizando-se como corolário do direito fundamental de ser informado, disposto nos artigos 220 e seguintes, da Constituição da República.

            Destarte, toda a população tem direito de ser informado de tudo o que possa interferir, direta ou indiretamente, na qualidade de vida e do meio ambiente. Neste sentido, leciona Mazzilli (2003, p. 369):

            o direito à informação é fundamental para a tutela de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, e, em especial, do patrimônio público, da moralidade administrativa, do consumidor e do meio ambiente. A opinião pública desempenha relevante papel na gestão dos negócios públicos, na política ambiental e nas decisões governamentais. Os cidadãos, com acesso à informação, têm melhores condições de atuar sobre o governo e a sociedade, articulando mais eficazmente desejos e idéias e tomando parte ativa nas decisões de seu interesse. A informação conduz à atuação eficiente da comunidade e contribui para fazer diminuir ou até cessar as freqüentes situações de abusos.

            Dessa forma, a informação ambiental deve ser transmitida à sociedade civil, em todos os seus segmentos, para que todos possam tomar conhecimento dos eventos ecológicos, e com isso formar a consciência ambiental e a opinião pública.

            PRINCÍPIO DA UBIQÜIDADE [12]: evidencia que a proteção do meio ambiente deve estar em toda parte. Tal proteção deve ser considerada sempre que qualquer atividade for criada ou desenvolvida. Como o meio ambiente não é dissociado dos aspectos da sociedade, deve-se, obrigatoriamente, fazer uma consulta ambiental prévia, apurando se a referida atividade produzirá eventual degradação ou dano ambiental, fato este que está intimamente ligado à vida com dignidade e qualidade.

            PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO [13]: extrai-se deste preceito que "a gestão do meio ambiente não é matéria que diga respeito somente à sociedade civil, ou uma relação entre poluidores e vítimas da poluição" (MACHADO, 2003, p. 87).

            Assim, o Poder Público figura não como proprietário dos bens ambientais, mas sim como administrador da res omnium, gerenciando-a, gerindo-a e respeitando regras concernentes ao Direito Administrativo, tais como eficiência e prestação de contas.

            De acordo com o saudoso professor Meirelles (2005, p. 96),

            a eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.

            Com relação à prestação de contas, significa que o administrador público deve, aplicando os princípios da motivação, publicidade, razoabilidade e proporcionalidade, manter plena transparência em seus comportamentos. Inclusive, preceitua Mello (2004, p. 104):

            não pode haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no povo (artigo 1º, parágrafo único, da Constituição), ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida.

            Ulteriormente, deduz sabiamente Machado (2003, p. 92) que,

            as gerações presentes querem ver os Estados também como protetores do meio ambiente para as gerações que não podem falar ou protestar. Os Estados precisam ser os curadores dos interesses das gerações futuras. Então, não será utopia um Estado de Bem-Estar Ecológico, fundado na eqüidade.

            Findo o estudo dos mais relevantes princípios, ora explanados em decorrência da grande incidência prática e doutrinária, analisemos alguns aspectos relevantes pertinentes à tutela ambiental.

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Sobre a autora
Elise Mirisola Maitan

advogada, especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Potiguar (UnP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAITAN, Elise Mirisola. Ensaio do direito ambiental e sua abordagem principiológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1528, 7 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10387. Acesso em: 17 nov. 2024.

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