Capa da publicação STF garante violência, tortura e golpe de Estado
Capa: Fellipe Sampaio /SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal garante violência, tortura e golpe de Estado

Resumo:


  • O Supremo Tribunal Federal é considerado contramajoritário, baseado na Constituição de 1988 e na divisão proposta por Hans Kelsen.

  • O STF decidiu sobre a prisão do depositário infiel, considerando a hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos sobre o direito interno brasileiro.

  • A dicotomia entre dualismo e monismo quanto à hierarquia das normas constitucionais e internacionais gera debates sobre a eficácia dos Tratados de Direitos Humanos no direito interno do Brasil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A maximização da dignidade humana é urgente no Brasil. A dicotomia na construção das leis e dos entendimentos do STF gera confusão sobre direito interno e internacional.

Em epígrafe, O Supremo Tribunal Federal garante violência, tortura e golpe de Estado. "Fake news"? "Sensacionalismo"? Conjuntamente, eu e os eleitores vamos percorrer alguns fatos, e estes fatos corroboram como título deste artigo

É fato, o Supremo Tribunal Federal (STF) é contramajoritário, isto é, a CRFB de 1988 é a Lei Suprema, com base na divisão proposta por Hans Kelsen, adotada no Brasil.

Na decisão do STF sobre a prisão do depositário infiel.

Há, ou não, um caso de bipolaridade na construção das leis e seus entendimentos? É de frisar que o Brasil assinou e ratificou vários Tratados Internacionais de Direitos Humanos (TIDH), o que obriga, até que se prove o contrário, a obediência aos TIDH. Parece obvio, mas não é. Lembrando que o RE n. 466.343/2008 foi necessário para decidir sobre a hierarquia dos TIDH sobre o direito interno brasileiro. Da decisão do o STF, o qual considerou a proibição da prisão civil por dívida do depositário infiel, com fundamento na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7º, § 7º), o RE 80.004-SE/77 foi lançado ao solo, isto é, perdeu a sua eficácia plena e, consequentemente, de que o direito interno é hierarquicamente superior ao direito internacional. Tudo resolvido? Não! Foi preciso ser editado o § 3º, do art. 5° na CRFB de 1988 para dar peso de igualdade dos TIDH às normas constitucionais.

Art. 5 (…):

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo)

E quanto à norma do art. 5°, § 2º da CRFB de 1988, ela não acolhia com o mesmo peso [força normativa] os TIDH? Tanto não, que foi preciso o RE n°. 466.343/2008. No RE mencionado, os TIDH são considerados supralegais, acima das leis ordinárias, mas, ainda assim, abaixo da CRFB de 1988. Na loucura que se processa diante de tamanha dicotomia, quase uma viagem astral à base de LSD [dietilamida do ácido lisérgico], ainda se discute a eficiência [superioridade ou não] dos TIDH no direito interno.

Aprecio a decisão da iminente doutrinadora Flávia Piovesan de que o art. 5°, § 2° da CRFB de 1988 inclui no direito interno os TIDH para maximizar a dignidade da pessoa humana [CF, art. 5, § 1º]. E maximizar a dignidade humana no Brasil urge iniciativas do Executivo e do Legislativo, o quanto antes. Do contrário, o STF terá que se debruçar várias vezes sobre o mesmo tema: direito interno e/ou direito internacional. Parece mesmice, mas o Brasil se encontra num caso bipolar: por pressões externas, internacionalização dos direitos humanos, a dignidade humana é logo lembrada e aplicada; quando os olhos internacionais, quanto aos direitos humanos, não se fixam mais no Brasil, a confusão, interna (Brasil), inicia-se.

Na teoria monista, deve prevalecer o pacta sunt servanda, isto é, as normas internacionais possuem hierarquia superior às normas do ordenamento jurídico interno de um país. Na teoria dualista, o pacta sunt servanda não cria uma “superioridade”, sendo assim, as normas do ordenamento jurídico interno de um país são hierarquicamente superiores às normas internacionais. Mesmo na teoria monista há pensamentos doutrinários ambivalentes: alguns consideram que em caso de dúvida, sobre a hierarquia das normas, interna ou externa, prepondera o direito internacional; outros doutrinadores amparam o primado do direito interno de um Estado sobre direito internacional.

Podemos, claramente, observar um "quase estado de alucinações" quanto à dignidade humana no Brasil, ou seria medo dos magistrados do STF quanto à pressão da maioria, a força decisória da ponta da caneta, dos magistrados, e a força, irresistível, de canos de metralhadoras mirando os magistrados?

Insculpidos na CRFB de 1988:

"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana;"

"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

Qualquer do povo pensará na impossibilidade de existência de quaisquer dúvidas sobre a prevalência da dignidade humana — posso resumir, sem dúvida nenhuma, a dignidade humana na palavra amor. A dignidade humana (amor) é um estado de espírito, de conscientização individual sobre si mesmo e sobre a coletividade. É o saber que num país, por mais que se pense em "maioria", como determinadora do modo de vida social, sendo o Estado controlador dos costumes, do poder fazer ou não poder fazer (art. 5°, II, da CRFB de 1988), as normas são resultados de novos questionamentos da espécie humana em relação à própria existência. Dificilmente, tenho minhas dúvidas, a escravidão retornará. De forma soft, a escravidão análoga — trabalho análogo à escravidão (Artigo 149 do Código Penal). Escravidão é escravidão! Duvidar, tentar relativizar, é considerar que a própria ciência inexiste ou é perniciosa.

Dificilmente pode ser interpretado como O cético autor deste artigo. Pelos ocorridos nas últimas décadas, as tentativas de enfraquecerem os direitos humanos no orbe terráqueo — não longínquo, os direitos humanos estarão em Marte —, com ataques pelas "fake news", os direitos humanos e sua internacionalização estão, sim, sendo desestruturados até não ser mais possível saber se é dignidade ou se é marginalidade

Marginalidade como um fim em si mesmo, sendo a única conclusão, o seu extermínio para a segurança nacional. Aliás, segurança nacional serve para, como ocorreu no governo de Getúlio Vargas, conter os opositores.


Retorno para O Supremo Tribunal Federal garante violência, tortura e golpe de Estado.

Duas decisões opositivas. De uma lado, o  Supremo Tribunal Federal (STF). De outro, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte-IDH). Refiro-me ao “CASO ARAGUAIA”.

Sem imbróglios, a decisão do STF legitimou condutas antidireitos humanos! Quando se afirma que houve um pacto, entre militares golpistas e o povo, para a redemocratização no Brasil, é sarcasmo. Pode-se negociar com quem tem poder bélico ou quem tem maior poder bélico? Dificilmente. O contexto histórico para o Golpe de 1964 foram os interesses internacionais, da URSS e dos EUA. "Mas o Brasil quis ser livre e não refém dos comunistas", podem dizer. No entanto, caso o Brasil quisesse ser neutro, conseguiria? Dificílimo. Vários países na Guerra Fria tiveram suas soberanias violadas tanto pela URSS quanto pelos EUA. 

O que ocorre quando Estado-parte desobedece tratado (s) internacional (ais) de direitos humanos? Existem consequências jurídicas e políticas. Jurídica, responsabilização e sansões. Política, credibilidade e prestígio diminuídos. 

Sansões diplomáticas, ações judiciais internacionais, ações judiciais interna no próprio país. Ocorre, infelizmente, que a dicotomia entre dualismo e monismo quanto à hierarquia entre CRFB de 1988 e os tratados internacionais de direitos humanos vigora no Brasil. Dessa dicotomia, a barbárie pode ser "legal"? 

Dizer ser constitucional, não basta " nas quatro linhas da CRFB de 1988"; são necessário os tratados internacionais sobre direitos humanos (art. 5°, §§ 2° e 3º, da CRFB de 1988).  A junção é o bloco de constitucionalidade.

Vamos avaliar decisões dos Aliados contra os nazistas. As decisões dos Aliados basearam-se em violações de leis internacionais existentes na época (1). Foram os nazistas condenados por genocídio, massacre, tortura etc. O Resultado foi crime contra a humanidade. Esse tipo de crime é indiferente à condição do ser humano — funcionário público ou não; ateu, agnóstico ou religioso; rico, pobre ou miserável; LGBT+ ou heterossexual; gênero masculino ou feminino; refugiado, apátrida, imigrante; morador de rua ou não; povos indígenas ou "civilizados".

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E como o nazismo alcançou os Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) do Estado? Resumo assim, pelas lições de Flávio Martins:

1) Concepção Política (Carl Smith)

Uma das mais importantes consequências de sua posição é a seguinte: o governante deve respeitar a “Constituição, mas, em casos excepcionais, pode deixar de cumprir a “Lei Constitucional”: “A Constituição é intangível, enquanto que as leis constitucionais podem ser suspensas durante o estado de exceção, e violadas pelas medidas do estado de exceção. [...] Tudo isto não atenta contra a decisão política fundamental, nem à substância da Constituição, sem que precisamente se dá no serviço da manutenção e existência da mesma”.

A teoria se fez prática na Alemanha nazista. Hitler foi nomeado chanceler em janeiro de 1933 e, em razão de um suspeito incêndio no Parlamento (Rechstag) alemão, creditado aos comunistas, convenceu o então presidente a decretar estado de sítio. Hitler convenceu o parlamento, no qual tinha maioria, a aprovar a “Lei de habilitação de grandes poderes” (Ermächtigungsgesetz), que autorizava o Chanceler a editar leis, no estado de sítio ou emergência, sem a participação do parlamento. Segundo Carl Schmitt, era possível até mesmo suspender a lei constitucional, que não era o mesmo que Constituição.Ainda decorre do pensamento de Carl Schmitt a ideia de que o Guardião da Constituição (Der Hüter der Verfassung) deve ser o líder do Reich, e não um Tribunal, opondo-se, pois, à teoria do judeu Hans Kelsen, que foi o maior defensor da existência de um Tribunal Constitucional.

2) Concepção Jurídica (Hans Kelsen)

Por conta dessa visão que restringe a Constituição a uma lei e o Direito a um conjunto de leis, Kelsen foi acusado de nazista, ou de ter uma teoria nazista. Bem, evidentemente, como vimos acima, Kelsen não era nazista, mas exatamente o contrário: era judeu e, por isso, foi perseguido e exilouse na América. Não obstante, não há como negar que sua teoria, sua percepção do Direito, veio bem a calhar aos regimes ditatoriais do século XX, como o nacional-socialismo de Adolf Hitler. Na sua Teoria Pura do Direito, Kelsen afirmava: “Segundo o Direito dos Estados totalitários, o governo tem o poder para encerrar em campos de concentração, forçar a quaisquer trabalhos e até matar os indivíduos de opinião, religião ou raça indesejável. Podemos condenar com a maior veemência tais medidas, mas o que não podemos é considerá-las como situando-se fora da ordem jurídica desses Estados.”

Para concepção sociológica, de Ferdinand Lassale, a Constituição tem força normativa enquanto o povo importância para a Constituição. Ou seja, as normas constitucionais somente existem, e se materializam, quando os seres humanos, de determinado Estado, considerarem a Constituição como expressão psicossocial do próprio povo. Disso, não é possível, por exemplo, a união estável entre duas pessoas do mesmo sexo biológico, porém, da mudança psicossocial do povo, a possibilidade da união homoafetiva. A norma do art. 226, § 3º, da CRFB de 1988, é expressa ao afirmar " Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento".

Caso a totalidade do povo compreenda que o casamento é entre seres biológicos considerados homem e a mulher, o próprio Estado (mito) não permitirá o casamento entre pessoas de sexos biológicos desiguais, a união homoafetiva. O STF mudou o seu posicionamento e garantiu o direito, constitucional, de união afetiva. O STF é contramajoritário, todavia, qualquer ministro (a) sabe de seus limites quanto às suas decisões. Não depende somente do contexto pátrio; depende também do contexto internacional. Tanto é, a internacionalização dos direitos humanos tem mudado constituições, como no Caso a Última Tentação de Cristo, e na própria condição psicossocial dos Estados. 

Podemos constatar o contexto psicossocial nas condenações dos nazistas no Tribunal de Nuremberg. Se pensarmos nas violações dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, ampla justificativa dos réus nazistas para não serem condenados, tanto Aliados quanto Eixo deveriam ser condenados. Não é possível dois pesos e duas medidas. Muito mais na Guerra Fria entre URSS e EUA. Avaliando decisões dos Aliados aos nazistas, pelo prisma de pensadores como Immanuel Kant, Thomas Hobbes, John Locke, alguns autores que já citei em outros artigos, muito provável que os pensamentos destes filósofos foram incorporados nas decisões dos nazistas.

Kant, o ser humano é um fim em si mesmo; Hobbes, o contrato social e as leis; Locke, direitos naturais como direito à vida, à liberdade e à propriedade.

A decisão do STF, contrária à condenação do Estado brasileiro pela Corte-IDH, no caso, “GUERRILHA DO ARAGUAIA” (2), é uma "licença para matar" com o manto da impunidade. Sem qualquer viés político, isto é, ser defensor de único partido político, os acontecimentos em 08/01/2023 não serão os únicos, futuramente. O Brasil teve pressões internacionais para legitimar os resultados das eleições brasileiras de 2022, os EUA foram um dos países. 

Encerro. A internacionalização dos direitos humanos, não politicagem aos direitos humanos, como forma de relativizá-los, é a única maneira de se proteger o ser humano como um fim em si mesmo. Vale para casos envolvendo extrema direita, extrema esquerda e centrão, este como os despostas esclarecidos na Revolução Francesa.


O artigo continua em: O Supremo Tribunal Federal garante violência, tortura e golpe de Estado: parte 2


Notas

(1) —  Crimes Contra a Humanidade e o Desenvolvimento do Direito Internacional | O Museu Nacional da Segunda Guerra Mundial | Nova Orleães (nationalww2museum.org)

(2) —  CASO GOMES LUND E OUTROS (“GUERRILHA DO ARAGUAIA”) VS. BRASIL seriec_219_por.pdf (corteidh.or.cr)


Referências

  • Acervo por assunto "Revolução (1964), Brasil" (senado.leg.br)

  • 'EM BUSCA DA MENTE NAZISTA?' O DESDOBRAMENTO DA PSICANÁLISE NA LUTA ALIADA CONTRA A ALEMANHA - PMC (nih.gov)

  • Golpe de 1964: o papel desempenhado pelos parlamentares — Senado Notícias

  • GOMES, Luiz Flávio. Crimes da ditadura militar e o “caso araguaia”: aplicação do direito internacional dos direitos humanos pelos juízes e tribunais brasileiros.  revista_anistia_4a_edicao.indb (corteidh.or.cr)

  • MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional / Flávio Martins. - 3ª. ed. - São Paulo : SaraivaJur, 2019.

  • Memórias de 1964: senadores relembram momentos que antecederam o Golpe Militar — Senado Notícias

  • O governo dos EUA e o golpe de 1964 | Não podemos nos calar (brown.edu)

  • PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional / Flávia Piovesan. – 14. ed., rev. e atual.– São Paulo : Saraiva, 2013.

  • 50 anos do Golpe de 1964 — Portal da Câmara dos Deputados (camara.leg.br)

  • Supremo Tribunal Federal (stf.jus.br) - Depositário Infiel

  • Supremo Tribunal Federal (stf.jus.br) - STF é contra revisão da Lei da Anistia por sete votos a dois.

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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