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(Ainda) a capacidade contributiva e a progressividade tributária

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17/09/2007 às 00:00
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IV. CONCLUSÕES.

É possível resumir as idéias expostas nas seguintes proposições objetivas:

1. O princípio da igualdade pode ser observado tanto em sua óptica formal como em sua óptica material. Em resposta à consagração do aspecto formal da igualdade (igualdade perante a lei), a partir do marxismo e, definitivamente, com o Estado Social, passou-se a realçar o substrato material da igualdade (igualdade na lei). Assim, as próprias normas deveriam veicular preceitos diferentes para pessoas diferentes. A dessemelhança, contudo, não poderia dar lugar à arbitrariedade e, por isso, deveria ser racional, vale dizer, o critério de discriminação deveria ser legítimo. Essa legitimidade estaria diretamente relacionada com três "testes": (i) o da razoabilidade do critério de discriminação escolhido, (ii) o da adequação entre o fator discriminatório adotado e a disparidade no tratamento adotado e (iii) o da promoção dos valores constitucionais de determinada ordem jurídica.

2. Com a ascensão do liberalismo e o crescimento dos Estados, intensificou-se a necessidade de a população subsidiar os gastos do Estado (que não era mais auto-sustentável) e a exação se revelou o meio mais eficaz. Para tanto, a atividade tributária aumentou, abrangendo mais e mais indivíduos. Teorias de justificação foram desenvolvidas para dar aporte doutrinário a essa ampla utilização dos tributos como instrumentos de custeio do Estado; em outras palavras, para que se evitasse uma crise sócio-política por causa da tributação, fazia-se mister convencer os cidadãos a respeito da legitimidade das exações. As teorias que elegeram a igualdade como critério de imposição justo foram crescendo e, até hoje, continuam influenciando o Direito Tributário, campo no qual a igualdade material se consubstancia no princípio da capacidade contributiva.

3. O primeiro sentido da capacidade pode ser chamado de quantitativo, pois remonta essencialmente aos elementos quantitativos dos tributos. Trata-se do senso comum, ou seja, pela capacidade contributiva o cidadão contribui em razão de sua riqueza. Apesar de a riqueza ser hoje considerada o discrímen básico para a ordem tributária (em total atenção à capacidade contributiva), não foi ela o critério desenvolvido a priori para justificar a imposição diferenciada entre os indivíduos.

4. Durante muito tempo acreditou-se que o contribuinte deveria arcar com os gastos públicos tendo em conta a utilidade que lhe derivava das prestações do Estado (teoria da equivalência). Essa teoria recebeu críticas, porque não justificava a tributação dos impostos não vinculados. Além disso, tomava como base um grau de benefício auferido, que é conceito extremamente subjetivo. Considerando a dificuldade da aplicação desta teoria aos tributos não vinculados, buscou-se uma nova construção teórica que pudesse dar aporte à constatação singela de que os cidadãos deveriam contribuir diferentemente. Só então a riqueza foi eleita como fator de discriminação (ainda que de forma distante da configuração atual). Passou-se a defender que, quando da prestação de serviços indivisíveis, os indivíduos contribuiriam em quantidades proporcionais a sua capacidade econômica, não se devendo ter em consideração, para fins de graduação do tributo, os benefícios advindos da atividade do Poder Público. Nesse sentido, foram desenvolvidas as teorias do sacrifício e a teoria da solidariedade.

5. Além de servir como parâmetro para a definição dos elementos quantitativos dos tributos, o princípio da capacidade contributiva também é pressuposto da tributação. Por isso alguns autores falam em capacidade contributiva absoluta, para se referir às hipóteses em que exista de fato manifestação de riqueza apta a ser tributada, ou, em outras palavras, em que exista efetiva capacidade para contribuir. Não se tratar de apurar em qual medida cada indivíduo vai contribuir, mas se determinada pessoa ou grupo de pessoas pode contribuir. Outra também é a conotação dada à expressão "capacidade contributiva absoluta", qual seja, a de causa do tributo. Em outras palavras: surge para o legislador o dever de só escolher como fatos geradores de tributos aqueles que revelem capacidade econômica (daí ser ela tida como causa). Como se vê, é uma faceta que decorre de considerar a capacidade contributiva como pressuposto do tributo.

6. Observando tanto o aspecto quantitativo como o aspecto qualitativo da capacidade contributiva, os economistas e também os doutrinadores do Direito Financeiro desenvolveram um conjunto de técnicas que ajudam a materializar o princípio da capacidade contributiva. Entre elas pode-se citar a proporcionalidade e a progressividade, porque ambas contemplam a necessidade de graduar a tributação de acordo com a capacidade econômica dos cidadãos e, a um só tempo, permitem que sejam levadas em consideração detalhes subjetivos do contribuinte que justificam a não incidência do poder impositivo.

7. Dizer que a progressividade tem fundamentação no princípio da capacidade contributiva não é suficiente, porque a própria capacidade contributiva enfrenta problemas de justificação. Nem mesmo as teorias do sacrifício igual e proporcional são aptas a justificar a progressividade, porque elas também embasam a proporcionalidade. Assim, a única teoria que pode fundamentar plenamente e com exclusividade a progressividade é a teoria da utilidade marginal. Pragmaticamente a teoria da utilidade marginal pode ser resumida na seguinte proposição: o valor de determinada fração de riqueza será sempre menor que o valor dado à fração de riqueza imediatamente anterior. No entanto, essa teoria também foi alvo de críticas, enfadonhamente repetitivas quando comparadas às formuladas ante as teorias fundamentadoras da riqueza como discrímen legítimo na seara da tributação e que podem ser bem resumidas no reconhecimento do elevado nível de subjetividade que permeia a construção dificulta sua aplicabilidade.

8. O Direito Tributário tem mais um papel importante aos olhos do Estado Democrático de Direito tal como hoje concebido, que é a eliminação das desigualdades sociais através da redistribuição de rendas. Esse é um dos motivos adicionais (além da teoria da utilidade marginal, que, apesar de criticada, é objetivamente útil) para que o legislador escolha a progressividade em detrimento da proporcionalidade.

9. Apesar de a redistribuição de renda ser uma finalidade do Direito Tributário, existem certos limites doutrinários e pragmáticos à utilização da progressividade. São eles: a vedação à arbitrariedade (para instituir alíquotas progressivas o legislador ordinário só poderá ter como fator de discriminação elementos que indiquem a presença de riqueza tributável, e nada mais), ao confisco (para ser legítima, a progressividade não pode, ainda, ser tão elevada a ponto de imputar ao contribuinte a perda de seu patrimônio), e ao impedimento do exercício do direito às atividades ilícitas (não é legítimo que o poder impositivo, ao instituir alíquotas progressivas em determinado caso, proíba ou inviabilize a consecução de dois pilares da ordem econômica: o trabalho e a livre iniciativa).

10. Os impostos pessoais, como o imposto sobre a renda, por exemplo, são os que melhor comportam a progressividade como técnica de graduação. Isto porque eles têm em conta a capacidade contributiva global do indivíduo. Nada obstante, no Brasil, o tratamento legislativo da matéria é o pior possível: uma progressividade maltratada com a instituição de poucas faixas de diferenciação e uma limitação desarrazoada das deduções possíveis, caminhando-se, portanto, para uma realicização desse imposto.

11. Na redação original da Constituição de 1988, a técnica da progressividade aplicada aos impostos reais tinha fins meramente extrafiscais, vale dizer, possuía uma finalidade não-arrecadatória, regulatória, indutora do comportamento dos indivíduos. Uma análise sistemática dos arts. 153, §4º, caput, 156, §1º, caput e 182, §2º e §4º, II, fazia concluir que o legislador só poderia se servir de alíquotas progressivas para promover a função social da propriedade, tanto rural quanto urbana. O proprietário que não der destinação social adequada à sua terra sofreria uma sanção através da aplicação da progressividade no tempo.

12. O Supremo Tribunal Federal apreciou a questão da progressividade nos impostos reais em atenção à proliferação de leis municipais que pretenderam utilizar a progressão de alíquotas em razão do valor venal do imóvel, da localização e/ou do uso. Não se tratava, assim, de progressividade no tempo, extrafiscal, mas de progressividade fiscal. Nessa oportunidade, a Corte Constitucional entendeu que tais leis municipais eram inconstitucionais com base em dois argumentos: (a) inexistência de autorização constitucional expressa para a adoção da progressividade como técnica de graduação do IPTU em caráter fiscal e (b) incompatibilidade dessa forma de graduação com as características ontológicas dos impostos reais.

13. Para explicar a incompatibilidade da progressividade como forma de graduação de impostos reais, o STF afirmou que o princípio da capacidade contributiva pode não ser aplicado à determinada espécie tributária, em observância de suas limitações. A bem da verdade, esse princípio é compatível com todos os tributos previstos na Constituição Federal, desde os impostos reais até as contribuições. Mesmo no caso do IPTU, um imposto real, que não leva em consideração a capacidade contributiva global do indivíduo, é necessário reconhecer que o princípio da capacidade contributiva está presente na apuração da base de cálculo, pois, de acordo com o que dispõe o art. 33 do CTN, a base de cálculo do IPTU é o valor venal do imóvel. O valor venal do terreno, para ser calculado, leva em consideração os seguintes elementos: tamanho, localização, infra-estrutura existente no local, apenas a título de exemplificação. A seu turno, o valor venal da construção tem como quesitos de formação o padrão da construção (se se trata de edifício de luxo ou popular, por exemplo) e o estado de conservação do imóvel. É um erro acreditar que esses elementos tenham sido escolhidos ao acaso. Todos eles indicam uma possível expressão da riqueza do contribuinte. Pensar de modo diferente levaria à declaração de inconstitucionalidade do próprio IPTU, pois a consagração do princípio da capacidade contributiva na Lei Maior constrange a adoção da riqueza como critério de desnivelamento entre os indivíduos ante o Fisco.

14. Após reiteradas decisões do STF contrárias à constitucionalidade das leis municipais que pretendiam instituir a progressividade do IPTU em razão do valor venal do imóvel, do seu uso e/ou de sua localização, o Congresso Nacional, investido na condição de Poder Constituinte Derivado, deu nova redação ao art. 156, §1º, da Lei Maior, exatamente para permitir a progressividade nesses casos. Trata-se de hipótese de emenda constitucional inconstitucional, violadora que é do direito fundamental veiculado pelo art. 145, §1º, da CF/88, visto que (a) os impostos reais de não têm em conta a capacidade contributiva global da pessoa, podendo a progressividade, se aplicada a eles, levar a sérias distorções impositivas e (b) a progressividade é justificada pela teoria da utilidade marginal, sendo necessário, portanto, que possa ser vislumbrada a adequação da curva de utilidade aos impostos reais, o que não ocorre.

15. Após a edição da EC nº 29/2000, o assunto foi novamente ventilado junto ao STF. Por enquanto, não houve a finalização do julgamento, tendo sido proferidos cinco votos e o entendimento do Relator, Ministro Marco Aurélio, que tem conduzido o voto dos demais, deixou de levar em conta que, no texto original da CF/88, a progressividade sobre impostos reais tinha caráter meramente extrafiscal, o que, por si só, não autorizaria a extensão dessa técnica à fiscalidade e, além disso, não atentou para o fato de que a eventual contraposição entre progressividade fiscal aplicada a impostos reais e princípio da capacidade contributiva.


NOTAS

01 Sabe-se que não há consenso doutrinário a respeito da classificação da igualdade como valor ou princípio. As discussões acerca desse assunto não terão espaço neste trabalho, no qual se partirá da igualdade como princípio concretizador do valor justiça.

02 VILLEY, Michel. Filosofia do Direito. Trad. Márcia Valéria Martinez de Aguiar. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 76-78.

03 Kelsen sustentava que a igualdade perante a lei não apresentava nenhum abono àquilo que já era papel do Direito como um todo. Confira-se KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. Trad. Ch. Einsenmann. Paris: Dalloz, 1962, p. 190.

04 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1972. p. 2-3.

05 Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, art. 1º: "Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum".

06 V. LARENZ, Karl. Derecho justo. Trad. espanhola por Luis Diez-Picazo. Madrid: Civitas, 1985. p. 142. A questão já foi submetida ao Tribunal Constitucional alemão, que chegou à mesma conclusão, de acordo com as anotações de HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 28.

07 "Em alguns Estados, apesar de se acolher o princípio da igualdade perante a lei fiscal e, pois, da generalidade da imposição, considerou-se oportuno estatuir, com normas de caráter constitucional, isenções a favor de determinados bens e atividades; e isto pela busca de fins de interesse superior (por exemplo religioso ou de cultura) ou para evitar que, sob a aparência de gravames fiscais, fossem realizadas perseguições (por exemplo, por motivos políticos)" (UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: RT, 1976. p. 56).

08 "Estos principios constituyen una reación a las reglas políticas, económicas y sociales anteriores a la Revolución Francesa, cuando privilégios derivados antaño de situaciones históricas excepcionales se cristalizaron en favor de las clases de los nobles y del clero, de forma que resultó una desigualdad e situación contributiva entre los ciudadanos que se encontraban en las mismas condiciones objetivas de capacidad de prestación" (GRIZIOTTI, Benevenuto. Principios de Política, Derecho y Ciencia de la Hacienda. Trad. espanhola por Enrique R. Mata. Madrid: Instituto Editorial Reus, 1958. p. 178).

09 Neste sentido, v. GIULIANI FONROUGE, Carlos M.. Derecho Financiero. Vol. I: Actividad financiera, presupuesto, poder tributario e obligación tributaria. Buenos Aires: Depalma, 2001. p. 371.

10 "Para o cidadão o imposto é o preço para sua liberdade econômica" (ISENSEE, Joseph, apud TORRES, Ricardo Lobo. A fiscalidade dos serviços públicos no Estado da Sociedade de Risco. In: TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Serviços públicos e Direito Tributário. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 122, nota 3.

11 Nesse caso buscava-se proteger não a igualdade, mas a liberdade, que era supervalorizada pelo liberalismo individualista. É por isso que se costuma dizer que, nessa época, o princípio da capacidade contributiva ainda era timidamente desenvolvido.

12 Conforme destaca Victor Uckmar: "A igualdade perante os gravames fiscais pode ser entendida em dois sentidos: a) em sentido jurídico, como paridade de posição, com exclusão de qualquer privilégio de classe, religião e raça, de modo que os contribuintes, que se encontrem em idênticas situações, sejam submetidos a idêntico regime fiscal; b) em sentido econômico, como dever de contribuir aos encargos públicos em igual medida, entendida em termos de sacrifício, isto é, como melhor será visto a seguir, em relação à capacidade contributiva dos indivíduos" (UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: RT, 1976. p. 54). Ora, a igualdade em sentido estrito já vinha sendo defendida desde a passagem do Estado Patrimonial para o Estado de Polícia – não se tratava, portanto, de algo novo. Também a igualdade concebida juridicamente (leia-se, capacidade contributiva) tinha suas bases doutrinárias no Estado Fiscal Liberal e, da mesma forma, não era teoria nova. São conceitos, no entanto, que foram trabalhados ao longo do tempo, aprimorados no Estado Social Fiscal e no Estado Democrático de Direito, mas de criação antiga. Daí caracterizar-se como uma evolução tímida do princípio da igualdade a ocorrida entre o Estado Social Fiscal e o Estado Democrático Fiscal.

13Tax as a premium (de Dworkin), princípio do maximin (de Rawls) e liberty tax (de Buchanan) são exemplos dessa avalanche de teorias sobre a liberdade criadas no âmbito do Estado Democrático Fiscal. Para uma visão melhor, v. TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário. Vol. II: Valores e princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 58-111.

14 GRIZIOTTI, Benevenuto. Principios de Política, Derecho y Ciencia de la Hacienda. Trad. espanhola por Enrique R. Mata. Madrid: Instituto Editorial Reus, 1958. p. 181.

15 Isso não significa que a igualdade formal não tenha sido prestigiada. O alcance de todos que estejam em situações semelhantes pela lei é também uma característica do Estado Democrático de Direito e, no campo do Direito Tributário, essa proposição vem recebendo outro nome: princípio da generalidade. No fundo, trata-se da igualdade no seu aspecto formal. Sobre este ponto, v. PEREZ ROYO, Fernando. Derecho Financiero y Tributario. Madrid: Civitas, 1994. p. 38. Um caso emblemático de aplicação do princípio da generalidade é a manifestação do poder impositivo sobre estrangeiro quando da cobrança de impostos indiretos sobre o consumo.

16 Como se realçou no fim do tópico anterior, parte da doutrina – principalmente a estrangeira – vem tentando distanciar os conceitos de capacidade contributiva e igualdade, para construir uma teoria da capacidade contributiva autônoma. No entanto, a doutrina majoritária – inclusive no Brasil – continua mantendo uma aproximação entre os dois princípios. Na verdade, para países como o Brasil, em que a Constituição Federal erigiu expressamente o princípio da capacidade contributiva a status constitucional, a discussão perde a importância (talvez até por isso a doutrina nacional não tenha se preocupado em fazer uma distinção teórica aprofundada). Mas em muitos países em que a Lei Maior é silente, a doutrina e a jurisprudência construíram a capacidade contributiva com base no princípio da igualdade. Neste sentido, v. NABAIS, José Casalta. Estudos de Direito Fiscal – Por um Estado Fiscal suportável. Coimbra: Almedina, 2005. p. 221. Para uma análise compilativa da doutrina estrangeira que analisa a capacidade contributiva com base nos cânones da igualdade, v. OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário – Capacidade contributiva. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 51-53. Para compreender as razões daqueles que defendem a separação entre os princípioS, v. RÜFNER, W., para quem "El principio de capacidad económica es una consecuencia adicional del derecho a la igualdad, pues éste no agota su contenido en la interdicción de la arbitrariedad" (apud HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 29).

17 VALDÉS COSTA, Ramón. Instituciones de Derecho Tributario. Buenos Aires: Depalma, 1992. p. 447: "El criterio de la C.C. tiene dos posibilidades de aplicación. (...) La segunda posibilidad se relaciona con la cuantificación de la obligación impositiva a los efectos de mejor adecuarla al principio de la igualdad em la ley". V. tb. PEREZ DE AYALA, José Luis e EUSEBIO GONZÁLEZ. Curso de Derecho Tributario. Tomo I. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, 1978. p. 169.

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18 Assim também o reputa Victor Uckmar, reportando as conclusões da Corte Constitucional italiana acerca da matéria: "Este foi o primeiro e importante passo [refere-se ao reconhecimento pela Corte da função de garantia do princípio contido no art. 53 da Constituição italiana – o princípio da capacidade contributiva] para esclarecer que se, no momento em que se fala de capacidade contributiva, faz-se referência de acordo com a acepção comum deste termo, a uma capacidade econômica que revela uma atitude à contribuição aos encargos públicos, o jurista, que tem perante si um sistema fiscal articulado em numerosos tributos – cada um dos quais tem um diverso objeto imponível – não pode eximir-se de estabelecer de que modo o dever que foi colocado a cargo do legislador ordinário de não exorbitar, no exercício do poder impositivo, dos limites expressos dos recursos econômicos dos contribuintes (...)" (UCKMAR, Victor. As orientações da Corte Constitucional italiana em matéria tributária. Trad. Marco Aurélio Greco e Francisco Antônio Fragata Jr.. In: XAVIER, Alberto et alli. VI Curso de Especialização em Direito Tributário (aulas e debates). Vol. 1. São Paulo: Resenha Tributária, 1978. p. 297).

19 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário – Capacidade contributiva. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 51-53. Ainda, alguns autores atribuem à capacidade contributiva a característica de relativa para tratar do mesmo fenômeno. Por todos, v. FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Macial Pons, 1992. p. 324.

20 Reputou-se como principal ante os (corretos) aportes de Herrera Molina, para quem "la justicia tributaria es fruto de una multitud de factores" (HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 26).

21 A necessidade de justificação deriva sobretudo do dever de, em um Estado Democrático de Direito, submeter as condutas do Poder Público a princípios éticos e jurídicos (entre elas, o poder de exação). V. VALDÉS COSTA, Ramón. Instituciones de Derecho Tributario. Buenos Aires: Depalma, 1992. p. 445-446. Sobre a obrigatoriedade de justificação teórica da capacidade contributiva, v. também HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 81. É curioso notar que no atual estágio da discussão, alguns autores já não mais conseguem conceber outro critério para diferenciar pessoas à luz da atividade de exação. Por todos, v. UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional e Tributário. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. p. 69-70: "Ademais o dimensionamento à capacidade contributiva exclui ‘graduações da carga tributária que não sejam relacionadas a diferenças na condição econômica dos indivíduos’. Único elemento para diferenciar as cargas tributárias entre as várias pessoas é a sua capacidade econômica (...)". Em relação a esta colocação, vale destacar um ponto. É prática recorrente a eleição de critérios outros para servir de fator de discriminação tributária. Entre eles, por exemplo, a localização do imóvel ou o número de aposentos do mesmo, ambos para fins de imposição do IPTU. Note-se que esses critérios são eleitos porque o legislador considera que, ainda que indiretamente, eles revelam capacidade econômica. Portanto, não se deve pensar que, além da riqueza, outros fatores podem ser eleitos licitamente para fins de exação. Todos eles, necessariamente, devem guardar relação com a capacidade contributiva. Ressalvam-se, contudo, os fins extrafiscais da tributação.

22 Griziotti, um autor paradigmático quando se trata do princípio da capacidade contributiva, menciona de modo inequívoco que o benefício desfrutado pelos contribuintes por conta da atuação estatal é ponto de referência e também limite para aplicação de impostos fundados na capacidade contributiva de cada um dos indivíduos. Daí estende a aplicação do princípio da capacidade contributiva às pessoas jurídicas, posto que elas também usufruem da "dádivas estatais". V. GRIZIOTTI, Benevenuto. Principios de Política, Derecho y Ciencia de la Hacienda. Trad. espanhola por Enrique R. Mata. Madrid: Instituto Editorial Reus, 1958. p. 143. E tb. BUCHANAN, James M. e FLOWERS, Marilyn R.. Introducción a la Ciencia de la Hacienda Pública. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, s/d. p. 108: "El sistema fiscal neutral o «eficiente» ideal es aquel que tiene la simples finalidad de proporcionar bienes y servicios públicos a los individuos. Este sistema hace que el proceso de gastos públicos positivos sea lo más análogo posível al mecanismo del mercado. Pero debido a la indivisibilidad de los beneficios proporcionados por los bienes y servicios públicos, el sistema de fijación directa de «precios» no puede utilizarse. De aquí que la estructura tributaria debe realizarse de tal manera que refleje las evaluaciones individuales de los beneficios marginales proporcionados por los servicios del Gobierno, y la cantidad total de los servicios colectivos proporcionados debe basarse en algún tipo de agregación o de suma de estas evaluaciones individuales. En cierta medida, el principio «ideal» de la tributación consiste en el principio del beneficio".

23 FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Macial Pons, 1992. p. 319.

24 VALDÉS COSTA, Ramón. Instituciones de Derecho Tributario. Buenos Aires: Depalma, 1992. p. 441: "Desde el punto de vista de la ciencia de la hacienda, cabe recordar el principio de la equivalencia, según el cual hay un equilibrio económico, directo o indirecto, según los casos, entre las sumas que percibe el Estado y las que éste emplea en el desarrollo de sus actividades. Algunas veces esa equivalencia se concreta en un cambio económico entre el Estado y el beneficiario del servicio, otras veces con un grupo o una región y otras, finalmente, con la sociedad considerada en conjunto. En estos últimos casos la equivalencia pierde los caracteres de cambio económico privado, pues el Estado tiene plena liberdad para organizar el servicio en la forma que estime más conveniente y los particulares carecen de derecho para exigir prestaciones por el solo hecho de contribuir a los gastos. Desde el punto de vista jurídico la diferencia tiene gran importancia. En los precios, la reciprocidad de las prestaciones es elemento esencial, sirviéndose mutuamente de causa; en las tasas, la prestación del servicio es también elemento esencial para el nacimiento de la obligación, aunque con distintas características; en cambio, en los impuestos la equivalencia carece de relevancia jurídica, pues aunque los contribuyentes disfruten en mayor o menor grado de los servicios organizados con sus aportes, ello sucede por su condición de integrantes de la sociedad, y no de contribuyentes".

25 FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Macial Pons, 1992. p. 319.

26 Existe parte da doutrina que considera possível destacar o valor da utilidade mesmo nos casos de necessidades indivisíveis. Parece que José Casalta Nabais apóia a este entendimento, pois considera possível que os proprietários de prédios beneficiados por obras e serviços efetuados pelo Poder Público paguem um plus por isso no imposto predial. Confira-se: "Mas a tributação predial encontra especial justificação na lógica do princípio do benefício, correspondendo o seu pagamento à contrapartida dos benefícios que os proprietários recebem com as obras e serviços que a colectividade lhes proporciona" (NABAIS, José Casalta. Estudos de Direito Fiscal – Por um Estado Fiscal suportável. Coimbra: Almedina, 2005. p. 239).

27 Em sentido contrário, v. GRIZIOTTI, Benevenuto. Principios de Política, Derecho y Ciencia de la Hacienda. Trad. espanhola por Enrique R. Mata. Madrid: Instituto Editorial Reus, 1958. p. 144: "Las manifestaciones de la capacidad contributiva, en relación con los beneficios producidos a los contribuyentes por la actividad del Estado y de la Sociedad, consisten en la riqueza que se gana, en la riqueza que se gasta y en los beneficios que derivan al contribuyente de una obra de interés público. (...) La riqueza ganada, la riqueza gastada y los beneficios obtenidos de las obras del Estado y de la actividad de la Sociedad son tres manifestaciones complementarias de la capacidad contributiva". Assim sendo, para o autor, o benefício auferido com a atividade estatal ainda permaneceria sendo um parâmetro da capacidade contributiva.

28 De forma geral, a doutrina aponta Stuart Mill como o sistematizador da teoria do sacrifício igual. V. UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. p. 77.

29 FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Macial Pons, 1992. p. 320-321.

30 VALDÉS COSTA, Ramón. Instituciones de Derecho Tributario. Buenos Aires: Depalma, 1992. p. 446.

31 O ponto será melhor explorado no tópico seguinte, mas, sem dúvida, a capacidade contributiva vem se distanciando cada vez mais de índices meramente numéricos ou objetivos, passando a englobar também índices subjetivos ou mesmo políticos. Cf. MOSCHETTI, Francesco. El principio de capacidad contributiva. Madrid: Instituto de Estudos Fiscales, 1980. p. 110.

32 Essa percepção foi a base da teoria da dimensão objetiva dos direitos fundamentais. Para um aprofundamento da temática, veja-se SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 133-173.

33 Recomenda-se a leitura de MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 108-117.

34 É interessante as considerações formuladas por James Buchanan e Marilyn Flowers no sentido de que a eliminação da pobreza – objetivo que bem pode ser associado à solidariedade – deve ser encarada como um bem ou serviço público coletivo: "Un planteamiento más completo del proceso fiscal aconseja que la redistribuición de la renta y de la riqueza sea analizada como un bien o servicio público o colectivo. La observación empírica sugiere que los individuos se encuentran íntimamente relacionados con la situación y bienestar de otros, y que también se encuentran bien dispuestos a que se realicen los ajustes necesarios de impuestos y gastos para que se alivie el problema de la pobreza". É a consagração da solidariedade.

35 V. MOSCHETTI, Francesco. El principio de la capacidad contributiva. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 1980. pp. 122-123 e 124.

36 Mais uma vez frisa-se que o termo "qualitativo" foi escolhido com base nos ensinamentos de Perez de Ayala e Eusébio González, em contraposição ao termo "quantitativo", também cunhado pelos autores (V. PEREZ DE AYALA, José Luis e EUSEBIO GONZÁLEZ. Curso de Derecho Tributario. Tomo I. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, 1978. p. 169).

37 V. MOSCHETTI, Francesco. El principio de capacidad contributiva. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 1980. p. 108: "Destacar que el principio de capacidad contributiva expresa una exigencia de justicia fiscal y que presupone necesariamente una capacidad económica superior a un cierto mínimo, constituye sin duda una observación exacta (...)".

38 V. FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Marcial Pons, 1992. p. 323.

39 PEREZ DE AYALA, José Luis e EUSEBIO GONZÁLEZ. Curso de Derecho Tributario. Tomo I. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, 1978. pp. 166 e 167: "Si buscamos la causa en el sentido común y no en el técnico-jurídico del tributo, podemos remontarnos hasta la causa primera de todo: se paga un tributo porque se verifican los supuestos de hecho que la ley ha previsto; se paga, pues, porque la ley así lo ha querido, y la ley manda porque el Estado tiene el poder de imperio que le permite, mediante la ley, hacerlo y porque tiene necesidad de procurarse medios pecuniarios para satisfacer sus necesidades y cumplir los fines que tiene asignados. Pero más correctamente, la causa técnico-jurídica del tributo no puede ser buscada sino en la circunstancia o el criterio que la ley asume como razón necesaria y suficiente para justificar el que, de verificarse un determinado supuesto de hecho, se derive la obligación tributaria. (...) Esta es, en efecto, la razón que explica la existencia, como presupuesto de una obligación tributaria, de hechos muy diferentes, pero todos con un cierto contenido económico implícito; (...)". V. tb. PEREZ ROYO, Fernando. Derecho Financiero y Tributario. Madrid: Civitas, 1994. p. 36-37.

40 É neste sentido que José Casalta Nabais defende que os imóveis destinados à habitação não podem ser usados na contabilidade total de imóveis com propósito de imposição progressiva: "De um lado, tendo em conta que os principais bens objeto da tributação do património são imóveis, e que uma parte muito significativa destes está destinada à satisfação de um importante direito fundamental, o direito à habitação, não podemos deixar de convocar aqui o preceito que consagra o direito fundamental à habitação, ou seja, o art. 65.º, nº.1. (...) O que para nós significa que há que fazer uma importante distinção neste domínio entre os imóveis destinados à satisfação do direito fundamental a habitação, mormente dos que satisfazem esse direito através da propriedade dos respectivos imóveis, e os restantes bens imóveis" (NABAIS, José Casalta. Estudos de Direito Fiscal – Por um Estado Fiscal suportável. Coimbra: Almedina, 2005. p. 225).

41 Para fins deste trabalho, incluem-se entre os direitos fundamentais também os direitos sociais.

42 Para maior detalhamento dessa dicotomia, ver o prefácio escrito por Luís Roberto Barroso a SARMENTO, Daniel (org.). Interesses públicos versus interesses privados: desconstruindo o princípio de supremacia do interesse público. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. vii-xviii.

43 Não se pode esquecer que a Lei Maior também determina que um dos objetivos da República Federativa brasileira é a erradicação da pobreza (CF/88, art. 3º, III). Desse modo, é inadmissível que o Estado atuasse contrariamente àquilo que dispõe a própria Constituição.

44 Maria Celina Bodin de Moraes divide o princípio da dignidade da pessoa humana em quatro sub-princípios: o princípio da liberdade, o princípio da igualdade, o princípio da tutela da integridade psicofísica e o princípio da solidariedade. Mais à frente o ponto será retomado sob a perspectiva da solidariedade. Nada obstante, remetemos o leitor a MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro-São Paulo: Renovar, 2003.

45 PEREZ DE AYALA, José Luis e EUSEBIO GONZÁLEZ. Curso de Derecho Tributario. Tomo I. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, 1978. p. 168. E tb. CANTO, Gilberto de Ulhôa. Princípios gerais tributários. Cadernos de Pesquisas Tributárias, São Paulo, n. 18, 1993. p. 36: "Penso que, na sua presente formulação, o contribuinte pode invocar o princípio da capacidade contributiva perante o Judiciário, e obter deste decisão excludente de qualquer responsabilidade tributária, se puder demonstrar que a exigência da Fazenda Pública evidentemente desconsidera sua capacidade econômica".

46 Nem todos os doutrinadores, no entanto, parecem retirar a progressividade da capacidade contributiva. Fernando Perez Royo salienta que a doutrina antiga pontuava que o princípio da capacidade contributiva geralmente impunha a proporcionalidade, derivando a imposição progressiva de outra norma do sistema. Inclusive, para essa parte dos teóricos, a progressividade era incongruente com a capacidade contributiva. Confira-se: "En la doctrina más antigua se había planteado la cuestión de la congruencia entre la existencia de impuestos con tarifas progresivas y el criterio de contribuición en proporción a los haberes o a la capacidad económica, establecido generalmente en los textos constitucionales y que se identificaba como mandato de proporcionalidad, opuesto al de progresividad" (PEREZ ROYO, Fernando. Derecho Financiero y Tributario. Madrid: Civitas, 1994. p. 39).

47 Por todos, v. FERREIRO LAPATZA, José Juan. Curso de Derecho Financiero español. Madrid: Marcial Pons, 1992. p. 321: "Expuestas así brevemente las teorías del sacrificio, interesa resaltar lo que sigue. En general, en cualquiera de sus formas, la teoría del sacrificio desemboca, en definitiva, en la defensa de un impuesto progresivo". A afirmação é sedutora, mas, data venia, não parece ser exata. A teoria do sacrifício justifica também a proporcionalidade, porque o simples fato de as bases de cálculos serem diferentes já traz como conseqüência que indivíduos economicamente mais abastados contribuirão com mais. Essa diferença entre as somas aportadas para fins de contribuição já igualaria o nível dos sacrifícios. Portanto, a progressividade não se impõe, senão que é técnica possível, tal como a proporcionalidade e a seletividade.

48 Neste sentido, v. UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. p. 77-78.

49 Alguns autores chegam a declarar a inafastabilidade da progressividade como consectário direto do princípio da capacidade contributiva, vale dizer, a capacidade contributiva como causa e como critério para graduação dos tributos obriga o legislador a prever impostos progressivos. Mas a progressividade não é a única forma de realização da igualdade e, em último grau, da capacidade contributiva. Por isso, estamos com José Casalta Nabais, para quem a progressividade só é obrigatória se houver comando expresso neste sentido, caso contrário, ela pode ser – e não deve ser – aplicada. V. NABAIS, José Casalta. Estudos de Direito Fiscal – Por um Estado Fiscal suportável. Coimbra: Almedina, 2005. p. 224: "De outro lado, embora se tenha mantido a exigência, agora reportada à tributação do património, de contribuir para a igualdade entre os cidadãos, deixou de se fazer qualquer referência à progressividade. Significa isto que não tem agora o legislador que estabelecer qualquer imposto sobre o património com taxa progressiva, muito embora, como é óbvio, também não esteja impedido de manter ou instituir imposto(s) progressivo(s) nesse sector". Também procede a ponderação de José Eduardo Soares de Melo, para quem o princípio da capacidade contributiva só veda a adoção pelo legislador de impostos fixos (MELO, José Eduardo Soares de. Em face do princípio da capacidade contributiva, é possível criar tributo fixo?. V Congresso brasileiro de Direito Tributário – princípios constitucionais tributários: aspectos práticos e aplicações concretas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 143). Em sentido contrário, v. JARACH, Dino. Finanzas públicas y Derecho Tributario. Buenos Aires: Alfredo Perrot, 1996. p. 295.

50 UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. p. 77: "Numerosas teorias foram desenvolvidas para demonstrar o fundamento científico do imposto progressivo que, particularmente da parte dos políticos, diz-se ser o único que realiza a distribuição dos impostos segundo a capacidade contributiva. Tais teorias podem, porém, em síntese reconduzir-se a três tipos: do sacrifício igual, do sacrifício proporcional e do sacrifício mínimo, todas ligadas ao conceito da decrescente utilidade marginal da riqueza".

51 VALDÉS COSTA, Ramón. Instituciones de Derecho Tributario. Buenos Aires: Depalma, 1992. p. 456.

52 UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976. p. 77.

53 PEREZ ROYO, Fernando. Derecho Financiero y Tributario – Parte general. Madrid: Civitas, 1994. p. 37. E tb. BUCHANAN, James M. e FLOWERS, Marilyn R.. Introducción a la Ciencia de la Hacienda Pública. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, s/d. p. 111: após analisar os meios não-fiscais, os autores concluem que a redistribuição de rendas melhor se realiza através do processo fiscal (Ibid., p. 125-126).

54 BUCHANAN, James M. e FLOWERS, Marilyn R.. Introducción a la Ciencia de la Hacienda Pública. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, s/d. p. 100.

55 Misabel Derzi qualifica a proporcionalidade na tributação como um princípio neutro, na medida em que não tem pretensões de modificar a dura realidade econômica nacional ("leave them as you find them"), o que imporia a escolha pela progressividade (DERZI, Misabel Abreu Machado. Princípio da igualdade no Direito Tributário e suas manifestações. V Congresso brasileiro de Direito Tributário – princípios constitucionais tributários: aspectos práticos e aplicações concretas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 176).

56 CF/88, art. 150, IV: "Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) IV - utilizar tributo com efeito de confisco;".

57 Na Argentina, na Sentença Compañia Santafecina de Inmuebles y Constituiciones c. Provincia de Córdoba, a Suprema Corte fixou em 33% (trinta e três por cento) o limite legítimo das alíquotas sobre a renda imobiliária. No Brasil, o STF não se manifestou sobre o tema de maneira contundente: o princípio da vedação ao confisco é usado muito mais como argumento de reforço, e, por isso, é pouco explorado.

58 JARACH, Dino. Finanzas públicas y Derecho Tributario. Buenos Aires: Alfredo Perrot, 1996. p. 331: "Se entra así en un terreno donde el criterio de la confiscatoriedad es relativo y se transforma, en muchos casos, en una mera cuestión de hecho, o sea, saber si existe o no una explotación racional".

59 No Brasil, o STF se trilhou um caminho para tentar conceituar confiscatoriedade na ADIn-MC 2010/DF, de cuja ementa se extrai o seguinte trecho: "A proibição constitucional do confisco em matéria tributária nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suas necessidades vitais (educação, saúde e habitação, por exemplo). A identificação do efeito confiscatório deve ser feita em função da totalidade da carga tributária, mediante verificação da capacidade de que dispõe o contribuinte - considerado o montante de sua riqueza (renda e capital) - para suportar e sofrer a incidência de todos os tributos que ele deverá pagar, dentro de determinado período, à mesma pessoa política que os houver instituído (a União Federal, no caso), condicionando-se, ainda, a aferição do grau de insuportabilidade econômico-financeira, à observância, pelo legislador, de padrões de razoabilidade destinados a neutralizar excessos de ordem fiscal eventualmente praticados pelo Poder Público (...)" (STF, j. 30.set.1999, Pleno, ADIn-MC 2010/DF, Rel. Min. Celso de Mello).

60 V. HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 132-133.

61 Aliomar Baleeiro enquadrava a proibição de comprometer o exercício livre das atividades lícitas como parte da vedação ao confisco. V. BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 564: "Dentre os efeitos jurídicos dos arts. 153, §§1º, 11 e 22 [da Constituição Federal de 1969], se inclui o da proibição de tributos confiscatórios, como tais entendidos os que absorvem parte considerável do valor da propriedade, aniquilam a empresa ou impedem exercício de atividade lícita e moral".

62 CF/88, art. 1º, III: "A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;". Art. 170, caput: "A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)" (negrito acrescentado).

63 GRIZIOTTI, Benevenuto. Principios de Política, Derecho y Ciencia de la Hacienda. Trad. espanhola por Enrique R. Mata. Madrid: Instituto Editorial Reus, 1958. p. 352.

64 V. QUEIROZ, Luís Cesar de Souza. Imposto sobre a renda. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 211-216.

65 Alguns autores destacam que a renda é sempre receita líquida, enquanto o rendimento é receita bruta; aí residiria a principal diferença entre os dois conceitos. Por todos, v. OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Imposto de renda e capacidade contributiva (Leis 7713/88 e 8134/90). Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 46, p.130, 1993.

66 "A expressão ‘sempre que possível’ permite que a capacidade contributiva e os seus subprincípios se ajustem às várias espécies de impostos, mas não admite que deixem de ser aplicados quando isso for possível : o IR não será regressivo, pois atua sob a orientação do subprincípio da progressividade (...)" (TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro-São Paulo-Recife: Renovar, 2006. p. 96).

67 CF/88, art. 153, III e §2º, I: "Compete à União instituir impostos sobre: (...) III - renda e proventos de qualquer natureza; (...) §2º. O imposto previsto no inciso III: I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei;".

68 Lei nº 7.713/88, art. 3º, caput e §5º: "O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução, ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei. (...) §5º. Ficam revogados todos os dispositivos legais concessivos de isenção ou exclusão, da base de cálculo do imposto de renda das pessoas físicas, de rendimentos e proventos de qualquer natureza, bem como os que autorizam redução do imposto por investimento de interesse econômico ou social. §6º. Ficam revogados todos os dispositivos legais que autorizam deduções cedulares ou abatimentos da renda bruta do contribuinte, para efeito de incidência do imposto de renda" (negrito acrescentado).

69 "Importa, ainda, destacar que uma tributação por meio de IR que não considerar os fatos-decréscimos necessariamente dedutíveis (o que por si só já desnatura o fato Renda [e, por ricochete, viola a obrigatoriedade personalização dos impostos quando esta for cabível]), mesmo que não afronte os limites do mínimo existencial, pode representar uma tributação excessiva (que denote uma ofensa ao direito de propriedade em sentido amplo – isto é, qualquer direito subjetivo patrimonial avaliável em moeda – ou viole a liberdade de se exercer uma atividade produtiva lícita, por inviabilizar a prática da mesma), que implicaria uma ofensa aos Princípios da Capacidade Contributiva Subjetiva e da Vedação da Utilização de Tributo com efeito de Confisco" (QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Imposto sobre a renda. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 272 – comentários acrescentados).

70 Neste sentido, v. HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998.

71 Em sentido contrário, v. ATALIBA, Geraldo. IPTU – Progressividade. Revista de Direito Público, n. 93, p. 233, jan./mar.-1990.

72 Contundente é a lição de Aliomar Baleeiro: "Em regra geral, só os impostos pessoais se ajustam adequadamente à aplicação de critérios progressivos medidos pela capacidade contributiva, (...)" (BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 745).

73 CF/88, art. 153, §4º, caput (na redação original): "§4º. O imposto previsto no inciso VI [ITR] terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas e não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore, só ou com sua família, o proprietário que não possua outro imóvel" (negrito e comentário acrescentados).

74 CF/88, art. 156, §1º, caput (na redação original): "O imposto previsto no inciso I [IPTU] poderá ser progressivo, nos termos de lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade" (negrito e comentário acrescentados).

75 CF/88, art. 182, §2º e §4º, II: "§2º. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. (...) §4º. É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: (...) II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;" (negrito acrescentado).

76 CTN, art. 3º: "Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada" (negrito acrescentado).

77 MACHADO, Hugo de Brito. Princípios constitucionais tributários. valoración una actividad jurídica". E tb. CANTO, Gilberto de Ulhôa. Princípios gerais tributários. Cadernos de Pesquisas Tributárias, São Paulo, n. 18, 1993. p. 81.

78 Aponte-se, a título de ilustração, a teoria dos atos emulativos e, modernamente, a do abuso de direito.

79 Concretização da moradia, do trabalho, enfim, do mínimo existencial. Exemplos disso são os arts. 183 e 191 da CF/88.

80 HERRERA MOLINA, Pedro Manuel. Capacidad económica y sistema fiscal: análisis del ordenamiento español a la luz del Derecho alemán. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, 1998. p. 94.

81 STF, Pleno, RE 153.771/MG, Rel. p/ acórdão Min. Moreira Alves, DJU 5.set.1997, p. 41.892, ementado da forma que se segue: "IPTU. Progressividade. - No sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente um imposto real. - Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico). - A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º. - Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de 22.12.89, no município de Belo Horizonte".

82 Trecho retirado do voto do Relator (p. 11).

83 Trecho retirado do voto do Min. Moreira Alves, Relator para acórdão (p. 3).

84 São incluídas também taxas de limpeza pública e de urbanização.

85 A base de cálculo do ITBI e do IPVA também é o valor venal do bem (ou do direito, no caso do ITBI) transferido, motivo pelo qual as considerações aqui feitas a eles se aplicam. Deve ser ressaltado, no entanto, que a Corte Constitucional tem um verbete de sua Súmula dedicado exclusivamente à incidência da progressividade no ITBI. Diz o verbete nº 656: "É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis - ITBI com base no valor venal do imóvel". Analisando os precedentes que levaram à edição desse verbete, destaca-se o leading case RE 234105/SP, cuja ementa recebeu a redação que ora se transcreve: "CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE IMÓVEIS, INTER VIVOS - ITBI. ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS. C.F., art. 156, II, § 2º. Lei nº 11.154, de 30.12.91, do Município de São Paulo, SP. I. - Imposto de transmissão de imóveis, inter vivos - ITBI: alíquotas progressivas: a Constituição Federal não autoriza a progressividade das alíquotas, realizando-se o princípio da capacidade contributiva proporcionalmente ao preço da venda. II. - R.E. conhecido e provido" (STF, Pleno, RE 234105/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJU 31.mar.2000, p. 61). No voto do Relator é recorrente a alusão ao RE 153771/MG, o leading case do IPTU. O Min. Carlos Velloso chega a firmar que o art. 145, §1º, CF/88 consagra expressamente a progressividade, citando, em apoio a essa tese, os ensinamentos de Misabel Derzi. Esta autora, todavia, separa a técnica da progressividade ao imposto de transmissão de bens causa mortis, aplicando-se ao imposto de transmissão de bens inter vivos a proporcionalidade. Não há motivo para qualquer das afirmações feitas: o art. 145, §1º, CF/88 tão-só consagra o princípio da capacidade contributiva e o da personalização dos impostos (quando estes a suportarem); ademais, não há qualquer imposição da adoção da progressividade como técnica de graduação. Por fim, mesmo que à luz do direito comparado haja a diferenciação de técnicas a serem adotadas em sede de imposto de transmissão de bens causa mortis ou de imposto de transmissão de bens inter vivos, o inverso funcionaria perfeitamente (isto é, adotar a proporcionalidade para o primeiro e a progressividade para o segundo). Parece que há outros motivos, muito mais convincentes, para sustentar a impossibilidade de aplicação da progressividade fiscal aos impostos reais. Esses argumentos serão expostos em momento próprio.

86 O fenômeno da reforma legislativa de decisão judicial foi bem conceituado por William N. Eskridge, Jr., em artigo paradigmático no assunto: "This article will use the term ‘override’ to mean any time Congress reacts consciously to, and modifies a statutory interpretation decision. A congressional ‘override’ includes a statute that: (1) completely overrules the holding of a statutory interpretation decision, just as a subsequent Court would overrule an unsatisfactory precedent; (2) modifies the result of a decision in some material way, such that the same case would have been decided differently; or (3) modifies the consequences of the decision, such that the same case would have been decided in the same way but subsequent cases would be decided differently" (ESKRIDGE, JR., William N.. Overriding Supreme Court statutory interpretation decisions. The Yale Law Journal, v. 101, n. 1, p. 332, out./1991). A expressão foi utilizada aqui com esse mesmo sentido.

87 V. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. O Poder Constituinte. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 124.

88 Em resumo, são tidos como argumentos favoráveis o reconhecimento a uma proteção das decisões políticas fundamentais (e.g., SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 371-382), a garantia mínima de imutabilidade e a deferência de garantias oferecidas pela constituição formal à constituição material (para ambos os argumentos, v. MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 414-417). Em sentido oposto, os argumento desfavoráveis, melhor sistematizados por Vanossi (VANOSSI, Jorge Reinaldo A.. Teoría constitucional. Vol. I – Teoría constituyente: Poder Constituyente fundacional, revolucionario, reformador. Buenos Aires: Depalma, 1975, p. 188-190), versam sobre a privação do Poder Constituinte Reformador da sua função essencial, a constatação de que a vocação para a perenidade somente se dá em tempos de normalidade / estabilidade, o constante tratamento das cláusulas pétreas como resposta do direito natural ao positivismo jurídico, a incompatibilidade com a idéia de que o Estado pode decidir, até mesmo, sua própria extinção, mas não mudanças substanciais nas leis fundamentais; e, por fim, o reconhecimento de que uma vedação de reformação desse porte acaba se revelando um convite à revolução, justamente aquilo que se gostaria de evitar.

89 CF/88, art. 60, §4º: "§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais".

90 Gustavo Miguez de Mello traz um exemplo: "Como discute-se uma reforma constitucional, convém lembrar que no caso do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana e territorial rural, não se admitindo a dedução das dívidas referentes aos imóveis sobre os quais eles incidem, são tributos que, se vier a ser autorizada a cobrança deles sob alíquotas progressivas, poderão afrontar o princípio da capacidade contributiva: o contribuinte pode ter assumido dívida de valor igual ao do imóvel comprado; o imóvel pode até mesmo ter seu valor venal reduzido no mercado e o débito tributário aumentado com a fluência de juros, superando este o valor daquele. Na verdade o imposto predial e territorial urbano cobrado sob alíquotas progressivas pode, portanto, se tornar regressivo em relação à renda e à capacidade contributiva, como poderá ocorrer se o contribuinte se endividar muito para adquirir o imóvel. Imóvel e dívida no valor dele não são índices de capacidade contributiva" (MELLO, Gustavo Miguez de. Princípios gerais tributários. Cadernos de Pesquisas Tributárias, São Paulo, n. 18, 1993. p. 124). V. tb. MARTINS, Ives Gandra da Silva e BARRETO, Aires F.. IPTU: por ofensa a cláusulas pétreas, a progressividade prevista na Emenda 29/2000 é inconstitucional. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 44, mai.-jun./2002. p. 282.

91 Por isso Leonardo P. Antonelli assume que a proporcionalidade é a técnica de graduação aplicada aos impostos reais: "Não fosse pelas características apontadas pelo ilustre tributarista, o IPTU, imposto notoriamente real, já atenderia em tese ao princípio da capacidade contributiva, uma vez que, havendo alíquotas uniformes, a imposição fiscal seria, naturalmente, automaticamente, proporcional à riqueza. Em outras palavras, quanto mais valioso for determinado imóvel, proporcionalmente maior será o IPTU devido. A proporcionalidade é da natureza dos impostos reais sobre o patrimônio (IPTU, ITBI, IPVA), cuja base de cálculo seja o valor de mercado do bem" (ANTONELLI, Leonardo Pietro. Emenda Constitucional 29/2000 – Progressividade do IPTU: inconstitucional correção legislativa da jurisprudência do STF. Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 39, jul.-ago./2001. p. 98).

92 STF, RE 423768/SP, voto do Ministro Marco Aurélio, ainda pendente de publicação, sujeito à revisão e gentilmente cedido pelo Gabinete do Ministro para fins exclusivamente acadêmicos.

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Sobre a autora
Renata Ribeiro Baptista

advogada, mestranda em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BAPTISTA, Renata Ribeiro. (Ainda) a capacidade contributiva e a progressividade tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1538, 17 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10419. Acesso em: 28 mar. 2024.

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