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Fundo de Participação dos Municípios e a nova Emenda Constitucional nº 55

27/09/2007 às 00:00
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A recente Emenda Constitucional nº 55, de 22 de setembro de 2007 alterou a redação do art. 159 da CF/88, no sentido de ampliar a remessa de recursos federais ao Fundo de Participação dos Municípios, nos seguintes termos:

"Art.159. .................................................................................

I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados quarenta e oito por cento na seguinte forma:

.......................................

d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano;

No Brasil, o sistema de transferência de recursos entre os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) surge, na verdade, em razão da existência de problemas clássicos na gestão fiscal dos Estados e Municípios, em que as despesas locais tendem a exceder os recursos arrecadados. Nesse sentido, assevera Marcos Nóbrega,

A principal função de um sistema de transferência seria, então, tentar minimizar as desigualdades regionais, diminuindo a distância entre o estado ótimo, ideal, de eficiência e eficácia do sistema de arrecadação concebido e o quanto, de fato, consegue ser arrecadado (lacuna ou gap fiscal) [01].

Dentro desse mecanismo de transferência de recursos, os Fundos de Participação são considerados receitas especificadas, com previsão constitucional, provenientes da transferência tributária obrigatória, de parcela de receita arrecadada com IR (imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza) e IPI (imposto sobre produto industrializado), realizada pela União para os Estados e Municípios, como forma de minimizar as desigualdades regionais e as lacunas fiscais entre eles.

Em regra, o ordenamento jurídico veda qualquer vinculação de receitas públicas em relação a despesas públicas, em razão do Princípio da não-afetação da receita ou da não-vinculação da receita, previsto no art. 167, IV da CF/88, que proíbe, expressamente, a vinculação de receita proveniente de impostos a determinada despesa, órgão ou fundo.

Nas observações de Ricardo Torres,

O princípio da não-afetação se restringe aos impostos, ao contrário do que ocorria no regime de 1967/69, quando abrangia todos os tributos; está permitida, portanto, a vinculação da receita de taxas a órgãos ou fundos, com o que se volta a antigas práticas financeiras, que tanto mal fizeram a administração pública [02].

Contudo, o Princípio da não-afetação da receita admite exceções, reconhecendo a vinculação das receitas de impostos nos casos de destinação de recursos para ações e serviços de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino, para realização de atividades da administração tributária, para prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita e, em especial, nas hipóteses de repartições tributárias constitucionais.

No caso de repartições tributárias constitucionais, as receitas provenientes de arrecadação de impostos poderão, portanto, estar vinculadas a certas despesas, órgão ou fundo, tal como dispõe os artigos 157, 158 e 159 da CF/88. Por exemplo, dos 48% arrecadados do IR e IPI pela União, 1% deverá ser repassado ao Fundo de Participação dos Municípios, com previsão de entrega no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano, nos termos da atual EC nº 55.

Esses repasses obrigatórios de recursos provenientes de impostos por determinação da Constituição aos entes federativos, são denominados, pela doutrina, de transferências tributárias obrigatórias. Na lição de Valdecir Pascoal,

Transferências tributárias obrigatórias são parcelas de recursos arrecadados pelos governos federal e estadual, mas que, obrigatoriamente, devem ser transferidas para Estados, Distrito Federal e Municípios. [03]

Importante destacar que as transferências tributárias obrigatórias não se confundem com as transferências voluntárias ou discricionárias, pois essas últimas são repasses voluntários de recursos públicos, realizados por um ente federativo para outro ente federativo. É o que dispõe o art. 25 da LRF:

Para efeito dessa lei complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes e de capital a outro ente da federação, a título de cooperação, auxílio, assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.

Vale lembrar que caberá ao Tesouro Nacional, em cumprimento aos dispositivos constitucionais, efetuar as transferências obrigatórias de parcela dos recursos arrecadados com o IR e IPI aos Municípios, nos prazos legalmente estabelecidos.

Com relação ao controle externo dos Fundos de Participação dos Municípios, o Tribunal de Contas da União é competente apenas para calcular as quotas do Fundo de Participação dos Municípios, do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal, e dos Fundos de Financiamento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e não para fiscalizar os seus recursos, nos termos do art. 161, parágrafo único [04] da CF/88. É que os recursos dos Fundos de Participação dos Municípios são receitas próprias dos Municípios, sendo, portanto, fiscalizados por seus respectivos Tribunais de Contas Estaduais ou Municipais, se existentes.

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Por todo exposto, por expressa disposição do art. 159 da CF/88, recentemente alterado pela EC nº 55, a União deverá repassar, da arrecadação do IR e do IPI, o percentual de 48%, e não mais de 47%, da seguinte forma: 21,5% ao Fundo de Participação dos Estados; 22,5% ao Fundo de Participação dos Municípios; 3% para programas de financiamento das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e, agora, mais 1% ao Fundo de Participação dos Municípios, entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano.

"Art. 159. A União entregará:.

I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados quarenta e oito por cento na seguinte forma:

a)vinte um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e Distrito Federal

b)vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios

c)três por cento, para aplicação em financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de açodo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do Nordeste, metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer.

d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano.

Contudo, em que pese a benesse da diminuição da lacuna fiscal dos Municípios, de redução das distorções e desigualdades regionais, em razão da ampliação de parcela de receita tributária do IR e IPI para o Fundo de Participação dos Municípios, oportuno considerar, a fortiori, o risco do sistema de transferências fiscais que, nas lições de Marcos Nóbrega, tem o "efeito perverso de incentivar a ociosidade fiscal, ou seja, a acomodação dos entes federados para auferirem receitas próprias, o que se torna claro em pequenos municípios que sobrevivem basicamente graças ao sistema de transferências fiscais".


Referências Bibliográficas.

NOBREGA, Marcos. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ªed. São Paulo: RT, 2001.

PASCOAL, Valdecir. Direito financeiro e Controle Externo. Rio de Janeiro: Impetus, 2005.

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 11ªed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.


Notas

01NOBREGA, Marcos. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ªed. São Paulo: RT, 2001, p. 170.

02TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 11ªed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p.118.

03 PASCOAL, Valdecir. Direito financeiro e Controle Externo. Rio de Janeiro: Impetus, 2005, p.109.

04 Art. 161

Parágrafo único. O Tribunal de Contas da União efetuará o cálculo das quotas referentes aos fundos de participação a que alude o inciso II..

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Sobre a autora
Ivana Mussi Gabriel

advogada em São José do Rio Preto (SP), professora universitária, especialista em Direito Tributário pelo IBET e mestranda na ITE/Bauru.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GABRIEL, Ivana Mussi. Fundo de Participação dos Municípios e a nova Emenda Constitucional nº 55. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1548, 27 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10462. Acesso em: 22 dez. 2024.

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