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Qual contexto? Uma análise dos critérios de interpretação segundo a Convenção de Viena sobre direito dos tratados

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19/10/2007 às 00:00
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Resumo

: Interpretação de tratados; Interpretação conforme o contexto; Relações entre Direito Internacional e Direito Interno.

1.Introdução

É de conhecimento basilar entre os jusinternacionalistas que a matéria relativa aos tratados é regulada pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (CVDT), de 1969, [01] fruto do trabalho da Comissão de Direito Internacional (CDI), que se dedicou ao tema desde sua primeira sessão, em 1949. Considerada inequivocamente como um guia da prática dos Estados na matéria e vigente desde 1980, a Convenção trata da conclusão, validade, aplicação e extinção de tratados, ou, na divisão do clássico livro de Paul Reuter, em: a) conclusão, entrada em vigor e participação; b) efeitos dos tratados; c) falta de aplicação dos tratados. [02]

Neste trabalho, dar-se-á particular atenção aos artigos da seção sobre aplicação dos tratados, em especial aqueles sobre a interpretação. Diz-se comumente sobre a CVDT que ela alcançou um bom balanço entre o desenvolvimento progressivo e a codificação do costume. A distinção, aliás, nunca foi clara. [03] Porém, é possível notar algumas inovações conceituais, dentre as quais o discutido conceito de jus cogens, [04] enquanto outras partes revelam posições já bem assentadas na prática anterior dos Estados e na jurisprudência internacional. Os artigos sobre interpretação estão neste último grupo.

Partindo da análise da experiência anterior, a CDI incluiu três artigos sobre o tema. O primeiro trata dos métodos consagrados de interpretação:

Artigo 31. Regra geral de interpretação.

1º Um tratado deve ser interpretado de boa fé, de conformidade com o sentido comum que deve ser atribuído aos termos do tratado em seu contexto e à luz de seu objeto e finalidade.

2º Para os fins de interpretação de um tratado, o contexto compreenderá, além do texto, inclusive seu preâmbulo e anexos:

a) qualquer acordo concernente ao tratado e que foi ajustado entre todas as partes a respeito da conclusão do tratado;

b) qualquer instrumento estabelecido por uma ou várias partes por ocasião da conclusão do tratado e aceito pelas outras partes como instrumento relativo ao tratado.

3º Será levado em conta, juntamente com o contexto:

a) qualquer acordo posterior ajustado entre as partes concernente à interpretação do tratado ou à aplicação de suas disposições;

b) qualquer prática posterior na aplicação do tratado pela qual fique estabelecido o acordo das partes relativo à sua interpretação;

c) qualquer regra pertinente de Direito Internacional aplicável nas relações entre as partes.

4º Será atribuído um sentido especial a um termo se for estabelecido que essa era a intenção das partes.

O artigo 32 refere-se aos meios suplementares de interpretação, dentre os quais se destaca o recurso aos trabalhos preparatórios do tratado e às circunstâncias de sua conclusão, mas dá a essa estratégia um caráter subsidiário e confirmatório. Esta, aliás, já era a posição da Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI), manifestada no caso da Competência da Organização Internacional do Trabalho para a regulamentação internacional das condições de trabalho das pessoas empregadas na agricultura. [05] Fechando a seção, o artigo 33 lida com o problema das divergências lingüísticas de tratados autenticados em mais de um idioma. [06]

De todos esses dispositivos, interessa ao presente artigo desenvolver uma análise particular do artigo 31, em especial no que tange à indicação do contexto da norma jurídica internacional. O objetivo aqui traçado é o de sustentar uma interpretação abrangente do sentido da palavra "contexto" no âmbito do artigo 31 para sua aplicação na interpretação das normas internacionais. Ênfase maior deve ser posta sobre a aplicabilidade desta tese às cortes nacionais, uma vez que as corte internacionais já registram aceitá-la irrestritamente (ou, de todo modo, pouca diferença lhes faria rejeitá-la, como será adiante evidenciado).

A proposta que será defendida diverge de outras possibilidades de significação do "contexto". Autores realistas, por exemplo, insistirão no contexto das relações de poder subjacentes à norma convencional. [07] Outros farão uma interpretação restritiva do contexto, limitando-o à interpretação sistemática do tratado em questão. [08] Como já dito, a proposta diverge porque, por um lado, dá ao contexto um significado abrangente e, por outro, ainda o baseia em referências normativas.

Segundo a tese que será aqui desenvolvida, o contexto de uma norma internacional inclui: a) a interpretação sistemática do conjunto do texto em que a norma se insere, somado aos textos de outros tratados a ele juridicamente ligados (arts. 31.2 e 31.3.a); b) as práticas relevantes dos Estados concernentes à matéria por ela tratada (art. 31.3.b); c) a evolução posterior da norma no seu contexto de aplicação por cortes internacionais e nacionais (art. 31.3.c); d) sua sistematização e interpretação pela doutrina internacionalista (art. 31.3.c).

Em outros termos, pode-se afirmar que se sustenta a identificação do contexto com o conjunto do material normativo relevante do Direito Internacional sobre a matéria em questão ou, como definiu a Corte Internacional de Justiça (CIJ), "no marco do conjunto do sistema jurídico em vigor no momento em que a interpretação tem lugar". [09] Com isto, reconhece-se o caráter sempre intertextual dos procedimentos interpretativos, porém enfatiza-se um círculo de referências próximas do texto; é uma intertextualidade baseada na comunhão de origem.

Para fundamentar esta tese a partir da consideração de sua utilidade, deve-se examinar como a experiência dos juristas abordou o tema da interpretação conforme o contexto. Assim, inicia-se com exemplos que revelam o significado mínimo de "contexto", para depois mostrar os outros componentes acima listados.


2.Interpretação Sistemática

A exigência de interpretar a norma em sintonia com o conjunto do texto em que ela se insere está insculpida no próprio artigo 31.2, que codifica uma antiga lição já trazida pela mesma opinião consultiva da CPJI já antes indicada. A pergunta que lhe fora feita respeitava a competência da OIT para regulamentar o trabalho na agricultura, já que o termo usado no Tratado de Versalhes era "indústria" ou "industriais". A Corte, já no início de seu parecer, ressalta a importância do contexto:

Para examinar a questão ora trazida à Corte, à luz dos próprios termos do Tratado, é necessário lê-lo em seu conjunto, e não se pode determinar sua significação embasando-se em algumas frases destacadas de seu meio e que, separadas de seu contexto, podem ser interpretadas de diversas maneiras. [10]

Na dúvida sobre se as palavras "indústria" e "industrial" significariam apenas o trabalho nas fábricas, excluindo o trabalho agrícola, a Corte volta-se aos dicionários e depois ao contexto, quando afirma:

Mas o contexto é o critério definitivo, e no caso que foi submetido à Corte, ela deve levar em consideração o lugar dessas palavras na Parte XIII do Tratado de Versalhes e a acepção que elas ali recebem. [11]

O contexto, portanto, é determinado pelo conjunto do texto do tratado, que inclui o seu preâmbulo (aqui, na verdade, o preâmbulo da parte XIII). Entre os argumentos favoráveis à inclusão da agricultura no alcance da norma que examinava estão os significados dicionarizados primitivos de indústria, a inserção dos termos "condições de trabalho" e "profissionais" no preâmbulo, onde não há menção ao "trabalho industrial", a alusão em outros artigos do Tratado a "industrial" que se inferem serem referência a todos os tipos de trabalho, inclusive o rural, e a prática das partes na Organização, que de 1919 a 1921 operou sem que essa dúvida tivesse sido levantada.

Com este argumento a Corte infere que a OIT tem competência para regulamentar as condições de trabalho do pessoal empregado na agricultura. O julgado apresentado compõe o conjunto de precedentes invocado pela CDI para redigir o artigo 31.

A orientação incorporada na CVDT tornou-se um lugar comum na jurisprudência e na prática posterior do Direito Internacional. Veja-se, por exemplo, como procedeu o Tribunal Internacional do Direito do Mar ao definir o "vínculo genuíno" ("genuine link") no caso Saiga.

A decisão é uma das mais importantes do Tribunal, pela abrangência das matérias analisadas. Numa questão preliminar, invocava-se o óbice da falta de legitimidade para o endosso da reclamação por São Vicente e Granadinas. Argüiu a Guiné, parte reclamada, que faltava àquele Estado o vínculo efetivo com o navio Saiga. Lembre-se que o vínculo efetivo é pressuposto da atribuição da nacionalidade e que esta é condição para o exercício da proteção diplomática. [12]

São Vicente e Granadinas defendeu-se afirmando ser o proprietário do navio uma empresa estabelecida no seu território, submetida, por essa razão, aos controles das autoridades são-vicentinas, mormente no que tange às convenções da Organização Marítima Internacional, das quais São Vicente e Granadinas é parte. Sustentou também que o vínculo genuíno é uma exigência relativa ao exercício das funções do Estado da bandeira, não uma condição geral que pode ser questionada por outros Estados.

O termo em questão está previsto no artigo 91.1 da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (CNUDM), que exige o vínculo genuíno. Depois de recorrer infrutiferamente ao que denominou contexto do artigo, qual seja, o conjunto da seção da CNUDM (artigos 91 a 94), o Tribunal invoca um antigo Projeto da CDI, de acordo com o qual o "vínculo genuíno" seria não só um critério para um Estado atribuir sua nacionalidade a um navio, mas também para o reconhecimento dessa atribuição pelos demais Estados. Em seguida, observa que esta segunda conseqüência não foi adotada pela Convenção do Alto Mar de 1958, precedente da CNUDM, que repete seus termos neste ponto.

O Tribunal volta aos artigos da seção da CNUDM e apóia-se no artigo 94 para afirmar que em caso de suspeição sobre o vínculo efetivo, o Estado deve comunicar ao Estado da bandeira para que este investigue e tome as medidas necessárias. Assim, pareceu ao Tribunal que a CNUDM não estabeleceu, no artigo 91, critérios para outros Estados aferirem a validade do registro de um navio pelo Estado da bandeira. [13]

Os exemplos trazidos nesta seção indicam o significado mínimo comum atribuído ao contexto no Direito Internacional. Advertiu-se, todavia, que se pugnaria por uma interpretação abrangente do termo. Para isso, outras referências serão apresentadas para demonstrar sua inclusão no contexto da norma internacional.


3.Prática Subseqüente

José Carlos de Magalhães insiste com freqüência que os Estados são autoridades do Direito Internacional. [14] Embora seja afirmação de difícil contestação, nem sempre se lhe confere o peso necessário. No que tange à interpretação dos tratados, sua pertinência é notória ao evidenciar que as condutas dos Estados posteriores ao tratado são interpretações autênticas dos seus termos. [15]

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O dictum clássico da CIJ sobre o tema está na decisão do litígio sobre o Templo de Preah Vihear. A questão opunha Camboja e Tailândia, que disputavam uma parcela de território onde estava localizado o Templo. Para resolver a lide, a Corte argumentou que a Tailândia, por sua conduta ulterior, aquiesceu à soberania do Camboja, o que equivale, segundo a Corte, à interpretação autêntica do tratado de delimitação territorial de 1904 assinado entre o Sião e a França, então potência dominante da região do Camboja. [16]


4.Jurisprudência e doutrina

Na tarefa de atribuir significado do termo de um tratado, é comum a busca de parâmetros complementares na doutrina e na jurisprudência. Esta é, aliás, a função das fontes auxiliares, muito bem definidas por autores anglo-saxões como law-determining agencies. [17] Assim, o texto do tratado ganha conotações diversas no confronto com os significados dos mesmos termos com os textos doutrinários e jurisprudenciais, tanto no sentido do reforço como no da abertura de seu código, ou seja, na expansão ou na redução das possibilidades interpretativas do termo.

Cumpre dizer que a doutrina atua em dois momentos distintos, pois tanto instrui o olhar inicial de quem examina questão jurídica, na medida em que apresenta, de forma sistemática e ordenada, um conjunto de conceitos, institutos, regras de integração e conciliação entre os termos do discurso normativo, como reforça, enquanto argumento de autoridade, uma dada interpretação. Neste segundo sentido, presente no contexto de justificação das decisões judiciais, sua presença é constante.

A jurisprudência também serve de reforço, do mesmo modo da doutrina, quando referida como uma conclusão sobre o significado da norma de sentido análogo à aplicação dada no caso sub examine.

Destarte, assevera-se que a doutrina e a jurisprudência auxiliam a conformar a evolução da norma internacional, motivo pelo qual devem ser incorporadas ao contexto, na forma do artigo 31.3.c da CVDT. Aliás, não há motivo para excluir as demais fontes do Direito Internacional, pois o artigo refere-se "a qualquer regra pertinente de Direito Internacional aplicável nas relações entre as partes".


5.Conclusão

Os problemas de aplicação do Direito Internacional no Direito Interno dão lugar a uma vasta literatura, constituindo-se num dos capítulos mais conhecidos da disciplina de Direito Internacional Público e, possivelmente, um dos mais atrativos para os juristas em geral. As questões clássicas do tema remetem a noções de hierarquia entre as duas ordens, auto-aplicabilidade de tratados e internalização de normas convencionais. A proposta aqui formulada não interfere diretamente em nenhuma das respostas preferenciais adotadas para essas três questões, embora a recíproca não seja verdadeira. Por ora, em razão do espaço existente, basta dizer que o juiz brasileiro ao aplicar a norma oriunda de um tratado internacional, deve interpretá-lo de acordo com o contexto de origem desta norma, o que inclui o conjunto dos elementos dos artigos 31 e 32 da CVDT, em particular o conjunto das normas convencionais sobre o tema em questão vigentes entre os Estados Partes, e seu desenvolvimento na prática dos Estados, na jurisprudência e na doutrina internacionais. Duas indagações sobre a afirmação anterior merecem comentário. São elas: a) por que o juiz deve interpretar de acordo com o contexto de origem da norma internacional, ou, dito de outro modo, qual o fundamento jurídico dessa obrigação? b) qual o grau de obrigatoriedade da regra postulada, isto é, trata-se de um dever jurídico propriamente dito?

A proposta ora exposta requer uma interpretação extensiva da noção de contexto contida no artigo 31 da CVDT. Em contestação, poder-se-ia sustentar que o dispositivo separa claramente o contexto de outros fatores a serem levados em consideração e que as referências incluídas no parágrafo 3 do artigo 31 estariam não no contexto, pois melhor seriam descritas como "outros fatores". Esta objeção talvez encontre algum respaldo na exegese doutrinária da CVDT. Porém, há munição suficiente para derrotá-la nos próprios trabalhos preparatórios da Comissão, que registram o intuito de resumir num só artigo várias regras de interpretação comumente aceitas e pouco contestadas, sem entre elas estabelecer hierarquia, porque sua aplicação requer uma única operação combinada ("a single combined operation"). Nos seus comentários ao Projeto, a CDI alegou que

Do mesmo modo, a palavra "contexto" na primeira frase do parágrafo 2 foi assim posta para conectar todos os elementos de interpretação mencionadas neste parágrafo à palavra "contexto" no primeiro parágrafo e com isto incorporá-los no dispositivo contido naquele parágrafo. Igualmente, a primeira frase do parágrafo 3 "Devem ser considerados em conjunto com o contexto" foi redigida de forma a incorporar no parágrafo um os elementos de interpretação previstos no parágrafo 3. [18]

Logo, pouca diferença fará saber se uma das referências que aqui se sugere pertencerem ao contexto correspondem ou não ao "contexto" ou aos "outros fatores" no texto do artigo 31.

Por falta de espaço para uma explicação mais detalhada do ponto de vista teórico, quer-se ao menos poder explicar que a noção de contexto ora defendida equivale a "contexto de significação", ao conjunto das referências que reforçam o significado de certo termo contido numa norma. O contexto equivale à langue em que se inserem os termos submetidos à análise semântica dos intérpretes. Trata-se de uma teoria de cunho semântico, que procura significar "contexto" à luz da pluralidade de referências normativas disponíveis sobre o termo. Esta assunção incorpora as limitações concernentes a todas as teorias desta natureza.

Em apoio desta sugestão, pode-se citar a Opinião Consultiva n. 1/2007 do Mercosul, na qual o árbitro Wilfrido Fernández de Brix assim se manifesta com relação ao Direito do Mercosul:

Não obstante, em reiteradas ocasiões, como ocorre com o artigo 5 do PBA [Protocolo de Buenos Aires], as normas regionais se referem ao direito interno dos Estados Partes para determinadas situações ou extremos, pelo qual, em tais supostos [hipóteses], os juízes nacionais poderão aplicar tais disposições. Neste contexto, essa remissão pode implicar para o juiz local o fato de ter que [a obrigação de] aplicar normas que fazem [remetem] à ordem pública nacional. O juiz nacional, no momento de aplicar essas disposições nacionais, em particular as vinculadas com a ordem pública interna, deverá considerar, necessariamente, que aquelas normas e este conceito devem ser interpretados tendo em vista a participação do Estado Parte no processo de integração, razão pela qual a mesma deverá ser efetuada de forma concordante entre o direito do MERCOSUL e o direito nacional. Nesse sentido, o juiz nacional deverá levar em consideração que, no que tange a ordem pública interna, esse conceito não será interpretado de forma isoladamente nacional, senão tendo em vista o marco comunitário ou regional. Tal exigência se desprende [infere], entre outros fundamentos, da necessidade de garantir a interpretação e aplicação uniforme das normas do MERCOSUL, na sua vinculação com as disposições nacionais eventualmente aplicáveis, assim como no patrimônio jurídico comum que existe entre os ordenamentos dos Estados Partes. [19]

Diga-se, não só de passagem, que a tese aqui formulada endereça-se sobretudo ao juiz nacional. É para ele que fará diferença considerar o contexto da norma de modo abrangente, uma vez que para o exercício da jurisdição internacional o conjunto dos elementos que foram embutidos na acepção abrangente de contexto já é obrigatório, pois as fontes do Direito Internacional devem ser consideradas em "constante e dinâmica interação". [20]

Decisões recentes do STF indicam possibilidades de bom êxito para a tese ora esposada. Neste sentido, destacam-se duas decisões: o acórdão do caso Ellwanger, em que o Min. Celso de Mello textualmente endossa a recomendação de dar-se máxima eficácia aos direitos humanos previstos nas declarações internacionais e em proclamações constitucionais de direitos; [21] e a decisão monocrática do Min. Joaquim Barbosa em pedido de extradição, na qual determina a notificação ao consulado do país do réu, por força do artigo 36 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, cujos contornos foram ressaltados nas decisões da CIJ em LaGrand e Avena. [22]

Não se sustentou aqui um método para interpretação, sobretudo se a isso se ligam as pretensões de maior objetividade e certeza na definição do direito válido. [23] Para explicar sinteticamente em que medida a tese ora sustentada difere de um método, basta dizer que não se pretende com ela restringir o conjunto das alternativas argumentativas disponíveis; ao contrário, propugna-se uma nova alternativa, freqüentemente desdenhada por tribunais nacionais instados a manifestarem-se sobre o sentido de normas internacionais. [24]

Quanto à segunda indagação acima levantada, cumpre ressaltar a necessidade de conjugar a tese proposta a uma concepção pragmática da interpretação, reconhecendo seu caráter criativo e argumentativo. Nestes termos, uma proposta hermenêutica, ainda que expressada em termos normativos, - na forma de um dever -, reside no âmbito dos conselhos e não dos comandos.

Mesmo assim, uma recomendação envigora-se quando acompanhada de boas razões para ser seguida. Nestas curtas linhas que restam, registra-se a conveniência política do cumprimento do Direito Internacional nas decisões internas do País e a convergência com os princípios das relações exteriores insculpidos no artigo 4º da Constituição. De outra parte, a liberdade de interpretação dada às cortes nacionais não livra o Estado de duas importantes conseqüências jurídicas: se um julgado nacional contrariar tratado vigente para o Brasil, isto gera a responsabilidade do Estado; e, em qualquer caso, as decisões constroem a prática brasileira na matéria, revelando a posição do País sobre a aplicação do Direito Internacional vigente em um dado momento. Em resumo, são recomendações, porém bem fundadas.

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Sobre o autor
André Lipp Pinto Basto Lupi

Doutor em Direito (USP), com estágio doutoral no IUHEI (Genebra). Mestre em Direito pela UFSC e Bacharel pela mesma instituição. Professor do Programa de Doutorado da Univali. Sócio de Menezes Niebuhr Advogados Associados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LUPI, André Lipp Pinto Basto. Qual contexto? Uma análise dos critérios de interpretação segundo a Convenção de Viena sobre direito dos tratados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1570, 19 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10538. Acesso em: 23 dez. 2024.

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