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DREX: a velha e nova discussão dos limites do leviatã

15/08/2023 às 17:59

Resumo:


  • O presidente do Banco Central Brasileiro mencionou que o Real Digital poderia ter evitado problemas com as criptomoedas, reacendendo a discussão sobre criptoativos.

  • O PIX foi criado como um sistema de pagamento instantâneo que prepara o terreno para o Real Digital, facilitando transações diretas entre contas bancárias e carteiras digitais.

  • O DREX, a moeda digital nacional brasileira, levanta questões sobre sua natureza centralizada e seu impacto nas funções do Estado, sendo considerado por alguns como um salto do Leviatã.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O Real Digital brasileiro, ou DREX, é uma moeda digital centralizada criada em resposta às criptomoedas. É também uma nova versão da vigilância e do controle do Estado.

INTRODUÇÃO

A fala do presidente do Banco Central Brasileiro, Roberto Campos Neto, reanimou a discussão dos criptoativos quando mencionou que o Real Digital poderia ter evitado problemas com as criptomoedas1. Colocando a prova os sistemas de restrição do poder por pesos e contra pesos e na promoção das liberdades individuais que Fukuyama (2006) postula a favor das democracias liberais, as moedas digitais surgem para renovar o debate no delicado equilíbrio entre a intervenção estatal e a salvaguarda das liberdades individuais nesse sistema.

Com expectativa de ser implementado ainda em 2024, em agosto de 2023 o Real Digital ou CBDC (Central Bank Digital Currency) brasileiro foi batizado de DREX, no entanto esse batismo para além de ser uma comemoração generalizada, está causando dúvidas acerca de sua natureza centralizada, o desafio que o DREX impõe ainda são antigos mas com novas facetas, seria uma versão 4.0 da vigilância e controle do Estado em seu nível mais direto ou uma resposta segura às alternativas inconsistentes das criptomoedas?

O presente artigo busca reunir duas visões acerca de quais são os prognósticos teóricos que rodeiam esse fenômeno descrevendo um panorama geral. Estando organizado em uma breve distinção entre essas moedas de maneira geral, seguido pelo advento do PIX e finalizando com as visões teóricas acerca das moedas digitais nacionais face às moedas digitais descentralizadas.


DISTINÇÃO E CONCEITUAÇÃO ENTRE AS MOEDAS DIGITAIS

Seguindo a concepção de Fobe (2016), as moedas digitais podem seguir por três diferentes formas, uma delas é forma de “Moeda Virtual” referente aquelas moedas relacionadas a jogos virtuais ou sistema de troca pontos digitais, já as outras duas formas são aquelas que interessam para a discussão deste artigo.

Primeiro temos as “Moedas Digitais Centralizadas”, que são as moedas digitais comumente chamadas de CBDC (sigla para Central Bank Digital Currency), são uma extensão digital das moedas físicas, supervisionadas pela autoridade monetária de cada país, no caso do Brasil, o BCB, enquanto o segundo tipo são as criptomoedas que operam de forma descentralizada e anônima por meio da tecnologia blockchain2 (ULRICH, 2014).


PIX: UM PEQUENO PASSO PARA A CONSOLIDAÇÃO DO REAL DIGITAL

O PIX foi criado oficialmente pelo BCB em novembro de 2020, sendo um sistema de pagamento instantâneo que permite transações diretas entre contas bancárias e carteiras digitais, eliminando intermediários financeiros. Utiliza chaves de registro para transferências em tempo real, tendo sido especialmente útil durante a pandemia de Covid-19 para alocação de recursos com pagamento digital

Ainda assim, o PIX tem também como objetivo preparar o terreno para a moeda digital nacional3, neste caso o DREX, uma vez que, existe uma cadeia de registro entre clientes, bancos comerciais e o BCB, e quando houver a efetivação do Real Digital, teríamos um cadeia mais próxima com os clientes tendo acesso direto ao BCB nas transações através do sistema PIX.


DREX: UM GRANDE SALTO DO LEVIATÃ?

O Leviatã nada mais é uma metáfora conceituada por Hobbes em que representa um governo soberano e poderoso para manter a ordem social, que em troca da liberdade da sociedade é provido segurança por uma autoridade central construída, o Estado. Neste sentido, as características do DREX em um olhar mais superficial, indicam uma redução nos custos de transações bancárias por sua operacionalização meio digital ser mais barata, comparativamente com a operacionalização que exige das moedas físicas nacionais.

Não obstante, a função desempenhada pelo DREX não é unicamente o barateamento das operacionalização monetária do país, mas ser um novo meio da sociedade se conectar com o Estado através do contato mais direto e rápido pelo meio digital. Dois pontos acerca da natureza do DREX levantam as dúvidas sobre se o Estado poderá tomar políticas mais expandidas de suas funções essenciais como a segurança e bem-estar econômico, como vem sendo mostrado por trabalhos empíricos como em Rezende (2019).

O primeiro ponto é o já mencionado, como representante digital do real brasileiro, o BCB terá controle sobre a emissão e distribuição, bem como a custódia do DREX e o outro ponto é que haverá uma garantia da segurança jurídica, cibernética e de privacidade nas operações4.

Para Cesaratto e Febrero (2022) que adotam uma postura de Estado expandido, percebem que os CBDCs podem facilitar a transferência dinheiro no nível individual e melhorar políticas de redistribuição de renda e fiscal por conta do acesso mais direto que os Bancos Centrais terão com empresas e agências sem o intermediário dos bancos comerciais.

Outros fatores cruciais para a essa postura é o fato do combate a crime e da evasão fiscal, uma vez que os CBDCs poderão facilitar o rastreamento dos pagamentos entre pessoas jurídicas que estarão no novo sistema proposto. Apesar do presidente do BCB promover uma alternativa dentro do sistema financeiro junto as criptomoedas, a verdade é que para Cesaratto e Febrero (2022) elas irão competir entre si, no caso brasileiro com o DREX ofertando a segurança das contas por ter um órgão oficial do governo, enquanto as criptomoedas não, sendo está uma das justificativas pela sua adesão mais confiável.

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Uma postura pela volta de funções clássicas do Estado acerca da efetividade da CBDC surge quando White (2021) postula que há um risco associado com a criação de uma moeda digital centralizada, uma vez que o incentivo à censura e do confisco é mais saliente nesse caso, bem como a vigilância das transações financeiras que supostamente servem para preservar a segurança.

A regulamentação das criptomoedas através do marco legal em 2022, é consideravelmente uma proposta mais razoável uma vez que se mantém a descentralização e anonimato das criptomoedas mas com a segurança de que o ambiente onde elas estão sendo transacionadas existem salvaguardas, contrariamente se todo registro de transação for feito por vigilância estatal, como no projeto de CBDC chinês.

Efeitos na geopolítica também serão salientes, tendo em vista, que novos tipos de jurisdições terão que tratar cuidadosamente como as CBDCs nacionais funcionarão, como visto na posição da presidente do Banco Central Europeu reafirmar que o Euro Digital seja regulamentado e supervisionado adequadamente para garantir pagamentos sem refrear a jurisdição e infringir soberanias com o alcance dos CBDCs de cada Estado.5 6


CONCLUSÃO

Portanto, conclui-se que a visão em favor do papel do Estado mais próximo de suas funções clássicas argumentam que o DREX fornece um tipo de controle sem precedentes e o contato direto apesar de eficiente pode ser maléfico para a proteção das liberdades individuais enquanto uma visão em favor do papel expandido do Estado acredita que a volatilidade da contrapartida descentralizada não são alternativas razoáveis e um instrumento estatal digital pode ser uma alternativa confiável, barata e com a possibilidade de resposta a crimes mais rápida.

É importante ter em mente que o CBDC ainda está em fase de desenvolvimento, e tudo indica que seguindo os padrões internacionais, o DREX ficará restrito apenas para empresas, agências e fornecedores desses serviços licenciados, excluindo por enquanto o acesso de pessoas físicas. Estudos futuros poderão demonstrar e as políticas que os Estados democráticos irão tomar poderão dar melhores perspectivas sobre como o Brasil pode se comportar na regulamentação das moedas digitais.

Finalmente, as preocupações sobre a influência de interesses políticos e de grupos de pressão bem como a ideologia da agenda governamental sob o DREX são intrínsecas. No entanto, desde que não sejam proibidas, as alternativas descentralizadas funcionam como uma salvaguarda individual, que em conjunto com o DREX funcionam como peso e contrapesos para um ambiente socioeconômico eficiente e seguro.


NOTAS

1 https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/se-o-real-digital-tivesse-sido-criado-antes-poderia-ter-evitado-problemas-com-criptos-diz-campos-neto/

2 Blockchain é a tecnologia de sistema descentralizado de registro digital que utiliza criptografia para garantir a segurança e transparência através da solução de puzzles de blocos de informação interligados que formula uma cadeia de blocos, por isso o nome.

3 https://www.infomoney.com.br/economia/pix-e-o-primeiro-passo-do-bc-no-caminho-da-substituicao-da-moeda-em-especie-pelo-real-digital-dizem-especialistas/

4 https://g1.globo.com/economia/noticia/2023/08/08/drex-entenda-a-diferenca-entre-a-nova-moeda-digital-e-o-pix.ghtml

5 https://www.infomoney.com.br/mercados/euro-digital-pode-ser-mais-popular-alem-das-fronteiras-da-uniao-europeia-diz-lagarde/

6 https://www.infomoney.com.br/mercados/moedas-digitais-poderao-infringir-soberanias-se-precaucoes-nao-forem-tomadas-diz-membro-da-ue/


REFERÊNCIAS

Fukuyama, Francis. The end of history and the last man. Simon and Schuster, 2006.

Fobe, Nicole Julie. O bitcoin como moeda paralela: uma visão econômica e a multiplicidade de desdobramentos jurídicos. Diss. 2016.

Ulrich, Fernando. Bitcoin: a moeda na era digital. LVM Editora, 2017.

Rezende, Flávio. Os leviatãs estão fora do lugar. 2ª Ed. UFPE, 2019.

White, Lawrence. Should the state or the market provide digital currency?. CATO JOURNAL Spring/Summer, 2021.

Cesaratto, S & Febrero, E. Private and Central Bank Digital Currencies: a storm in a teacup? A Post-Keynesian appraisal, 2022.

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Sobre o autor
Rickiã Rodrigues

Bacharel em Ciência Política com ênfase em Relações Internacionais - Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política - UFPE Campo Majoritário de Estudo: Governança e Economia Política Interesses: Analíse de Grupo de Interesse, Analíse de Dados, Regulamentação, Neoinstitucionalismo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Rickiã. DREX: a velha e nova discussão dos limites do leviatã. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7349, 15 ago. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/105610. Acesso em: 22 dez. 2024.

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