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A advocacia pública é incompatível com a inscrição do profissional na Ordem dos Advogados do Brasil

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Resumo:


  • Advogados públicos, como Procuradores Federais, têm legitimação constitucional e legal para exercer advocacia pública sem necessidade de inscrição na OAB.

  • A evolução legislativa revogou tacitamente dispositivos da Lei nº 8.906/1994, tornando incompatível a inscrição de advogados públicos na Ordem dos Advogados do Brasil.

  • A atuação dos advogados públicos deve obedecer aos princípios constitucionais da administração pública, não sendo necessário o controle disciplinar da OAB sobre esses profissionais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5. DA POSIÇÃO DA PROCURADORIA-GERAL FEDERAL (PGF)

Nos autos do Proc. 00407.003421/2004-51 foi instalada a seguinte situação: a PGF fez uma análise dos Procuradores Federais, a fim de os reenquadrar adequadamente nos quadros do órgão. Assim, procedendo à análise dos dados cadastrais, a comissão designada decidiu me convocar para provar que estava inscrito na OAB.

Informei a minha situação, aduzindo que não poderia ser exigida a inscrição ativa na OAB, visto que os fundamentos anteriormente expostos eram suficientes para considerar desnecessária a inscrição do Procurador Federal na OAB.

A PGF, mesmo sabendo da minha relutância em regularizar minha situação junto à OAB, considerou regular minha situação junto a ela. Na verdade, parece que há certo receio em enfrentar a resistência da OAB para excluir as inscrições dos Procuradores Federais daquele órgão. Todavia, é evidente que, para a PGF, pouco interessa a regularidade da inscrição de seu membro com a OAB.


6. DO CONTROLE PROFISSIONAL

6.1 Da regra geral

As ordens e os conselhos criados para o controle das atividades reguladas, exercem controle disciplinar sobre os profissionais. Assim, como médicos exercem atividades essencialmente públicas, os fazem os advogados. No entanto, os tribunais vêm dando tratamento diferenciado aos advogados, cujas discussões são feitas na Justiça Federal, enquanto os demais conselhos e ordens têm suas lides travadas na justiça local.

De qualquer modo, o assunto disciplinar de profissional servidor ou empregado público será do interesse da administração pública e do respectivo conselho, não sendo razoável impor duas sanções administrativas pelo mesmo fato, visto que é vedado o bis in idem. Com efeito, a administração pública e o referido conselho imporão sanções da mesma natureza, tornando inviável dizer que tal hipótese é possível.

6.2 Da inconcebível posição do TRT/12ª Região

O TRT da 12ª Região (Santa Catarina) decidiu não conhecer recurso interposto pelo INSS porque foi interposto por Procurador Federal que indicou número de inscrição de OAB de outro Estado. Esse é um erro terrível porque deixou de observar ao disposto na Lei nº 10.480/2002, in verbis:

"Art. 10. À Procuradoria-Geral Federal compete a representação judicial e extrajudicial das autarquias e fundações públicas federais, as respectivas atividades de consultoria e assessoramento jurídicos, a apuração da liquidez e certeza dos créditos, de qualquer natureza, inerentes às suas atividades, inscrevendo-os em dívida ativa, para fins de cobrança amigável ou judicial.

§ 1º No desempenho das atividades de consultoria e assessoramento, à Procuradoria-Geral Federal aplica-se, no que couber, o disposto no art. 11 da Lei Complementar n° 73, de 10 de fevereiro de 1993.

§ 2º Integram a Procuradoria-Geral Federal as Procuradorias, Departamentos Jurídicos, Consultorias Jurídicas ou Assessorias Jurídicas das autarquias e fundações federais, como órgãos de execução desta, mantidas as suas atuais competências.

§ 3o Serão mantidos, como Procuradorias Federais especializadas, os órgãos jurídicos de autarquias e fundações de âmbito nacional.

§ 4º Serão instaladas Procuradorias Federais não especializadas em Brasília e nas Capitais dos Estados, às quais incumbirão a representação judicial e as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos das entidades de âmbito local.

§ 5º Poderão ser instaladas Procuradorias Seccionais Federais fora das Capitais, quando o interesse público recomendar, às quais competirão a representação judicial de autarquias e fundações sediadas em sua área de atuação, e o assessoramento jurídico quanto às matérias de competência legal ou regulamentar das entidades e autoridades assessoradas.

§ 6º As Procuradorias Federais não especializadas e as Procuradorias Seccionais Federais prestarão assessoramento jurídico a órgãos e autoridades de autarquias e fundações de âmbito nacional localizados em sua área de atuação, que não disponham de órgão descentralizado da respectiva procuradoria especializada, e farão, quando necessário, a representação judicial dessas entidades.

§ 7º Quando o assessoramento jurídico de que trata o § 6o envolver matéria específica de atividade fim da entidade, que exija manifestação de procuradoria especializada, ou decisão de autoridade superior da entidade, o Chefe da Procuradoria Federal não especializada e o Procurador Seccional Federal encaminharão a matéria à correspondente Procuradoria Especializada.

§ 8º Enquanto não instaladas as Procuradorias Federais não especializadas e as Procuradorias Seccionais Federais as suas competências poderão ser exercidas pelos atuais órgãos jurídicos das autarquias e fundações de âmbito local, ou por Procuradoria especializada da Procuradoria-Geral Federal existente na localidade, ou por Procuradoria da União, quanto à representação judicial e, quanto ao assessoramento jurídico, por Núcleo de Assessoramento Jurídico da Consultoria-Geral da União.

§ 9º Em cada Procuradoria de autarquia ou fundação federal de âmbito nacional e nas Procuradorias Federais não especializadas haverá setor específico de cálculos e perícias, a ser instalado conforme a necessidade do serviço e a disponibilidade financeira.

§ 10. O Advogado-Geral da União indicará, para os fins desta Lei, as autarquias e fundações de âmbito nacional".

A Lei nº 8.906/1994 prevê que determinadas pessoas têm legitimação extraordinária, in verbis:

"Art. 29. Os Procuradores Gerais, Advogados Gerais, Defensores Gerais e dirigentes de órgãos jurídicos da Administração Pública direta, indireta e fundacional são exclusivamente legitimados para o exercício da advocacia vinculada à função que exerçam, durante o período da investidura".

Obviamente, a lei inclui toda administração pública. Não estou a defender o absurdo, mas ao juridicamente sustentável. Não há como se pretender excluir a participação do MPT e da Justiça do Trabalho, mantidos e organizados pelo poder público do controle. Entretanto, a Lei nº 8.906/1994 prevê:

"Art. 10 Omissis.

§ 2º - Além da principal, o advogado deve promover a inscrição suplementar nos Conselhos Seccionais em cujos territórios passar a exercer habitualmente a profissão considerando-se habitualidade a intervenção judicial que exceder de cinco causas por ano".

O TRT da 12ª Região se esqueceu que o advogado público é incompatível com a advocacia privada. [09] Ora, inexistindo qualquer hipótese em que seja autorizada a advocacia privada, esta deve ser vista como incompatível com exercício do cargo público, incidindo o art. 27 da Lei nº 10.906/1994. De qualquer modo, ainda que houvesse o exercício ilegal de profissão de um advogado em outra seccional, não seria o caso de alegar a falta de inscrição na OAB, mas apenas comunicar esta para que processasse administrativamente o profissional e exigisse dele a inscrição suplementar.

A legitimação ao exercício da profissão que é constitucional não pode gerar a extinção do processo sem resolução do mérito, mormente se a previsão legal é a da comunicação à OAB. Ademais, não há como o Procurador Federal e demais membros da AGU cumprirem aos seguintes preceitos da Lei nº 8.906/1994:

"Art. 34 - Constitui a infração disciplinar:

I - exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não-inscritos, proibidos ou impedidos;

II - manter sociedade profissional fora das normas e preceitos estabelecidos nesta lei;"

A OAB, institucionalmente, viola a Lei nº 8.906/1994 ao facilitar o exercício da advocacia privada aos proibidos de exercê-la. Ao mesmo tempo em que ela procura dizer que não há uma ordem dos advogados privados, mas para todos advogados, incorre em contradictio in terminis ao aceitar que Membros do MP exerçam a advocacia, bem como incompatíveis tenham legitimação extraordinária para o exercício da advocacia, a inscrição em seus quadros.

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Conheci um Analista Judiciário que foi, em face da influência econômica e política da sua família, Procurador Geral do CADE. Passou a ter, portanto, legitimação extraordinária, nos termos do preceito transcrito anteriormente, sendo que o TRT da 12ª Regiãop não poderia, de forma alguma negar-lhe o exercício da advocacia expressamente previsto em lei. O mesmo se pode dizer de todo Procurador Federal.


7. CONCLUSÃO

Constitui infundada negativa de acesso à justiça pretender negar ao Procurador Federal o direito de exercer advocacia pública sem inscrição na OAB, visto que sua legitimação é constitucional e regulada por lei própria, afastando a incidência da Lei nº 8.906/1994 (art. 3º, § 1º).

O interesse financeiro da OAB, bem como de alguns inscritos que ocupam cargos públicos incompatíveis com o exercício da advocacia privada, são interesses colidentes com os da advocacia pública. Outrossim, a evolução legislativa revogou tacitamente o art. 30 da Lei nº 8.906/1994, portanto, estar-se-á diante da hipótese de incompatibilidade, não apenas impedimento.

O Juiz pode até comunicar a OAB o exercício de um advogado inscrito em outra seccional, mas não conhecer do recurso interposto pelo profissional que viola norma disciplinar, data venia, constitui abuso de poder porque, além do advogado público ter legitimação dada pela Constituição Federal e ser ela regulada por lei, a previsão legal é a da inscrição suplementar, ou seja, o profissional terá capacidade postulatória, ainda que no exercício da advocacia privada, mas terá que regularizar sua situação profissional junto à OAB.

O Ministério Público advoga por meio de seus membros, os quais não são inscritos na OAB, sendo que o TRT não pode deixar de conhecer a ação coletiva proposta pelo MPT sob o argumento de falta de regularidade profissional. O mesmo se pode dizer de qualquer advogado público que tenha sua atividade regulada por lei própria.

Advogados de fundações, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista etc., estão adstritos aos princípios constitucionais que regem a administração pública. Assim, ante a legalidade estrita, não podem fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, mas somente o que a lei manda. Destarte, antes de tudo, sua atuação deve atender à moralidade pública.

Recentemente, um parlamentar renunciou a um mandato para evitar o julgamento no Supremo Tribunal Federal. Depois, ele poderá se eleger a prefeito para evitar o julgamento no tribunal do júri e assim por diante. Tal postura, embora seja autorizada por lei e compatível com a advocacia privada, é inadmissível ao advogado público, em face dos princípios norteadores da administração pública (CF, art. 37, caput).

Finalmente, toda modificação no sistema legislativo, com esquecimento de dispositivos da Lei nº 8.906/1994 incompatíveis com a nova ordem jurídica, deve levar à conclusão de que houve a revogação tácita de tais dispositivos. Destarte, não é lobby arrecadador ou interesse privado de alguns advogados públicos que sonham em ocupar alguma cadeira de determinado tribunal que deve inviabilizar a legitimação legal do advogado público para representar processualmente o órgão que representa.


NOTAS

01 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 42.

02 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2.005. p. 144-146.

03 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 60: "Os dois princípios fundamentais e que decorrem da assinalada bipolaridade do direito administrativo - liberdade do indivíduo e autoridade da Administração - são os princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular, que não são específicos do direito administrativo porque informam todos os ramos do direito público; no entanto, são essenciais, porque, a partir deles, constroem-se todos os demais".

04 "Art. 1º Somente poderão exercer a advocacia com respaldo no § 3º do art. 29 do ADCT da Constituição de 1988, os membros do Ministério Público da União que integravam a carreira na data da sua promulgação e que, desde então, permanecem regularmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil.

Parágrafo único. O exercício da advocacia, para os membros do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios está, incondicionalmente, vedado, desde a vigência do artigo 24, § 2º, da Lei Complementar nº 40/81."

05 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 358.

06 STF. Pleno. ADIn 1.754-9. Min. Cezar Peluso. DJ, Seção 1, de 6.8.1999.

07 OAB. OAB apóia PL que revoga intimação pessoal de advogado público. Disponível em: http://www.oab.org.br/noticia.asp?id=10823. Acesso em: 9.11.2007, às 3h40.

08 Espero que esse seja o objetivo dos favoráveis à manutenção da inscrição do advogado público na OAB, pois seria terrível imaginar que muitos têm medo de enfrentar o exame de ordem e serem reprovados.

09 Lei nº 10.906/1994, art. 27: "A incompatibilidade determina a proibição total, e o impedimento, a proibição parcial do exercício da advocacia".

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Sobre o autor
Sidio Rosa de Mesquita Júnior

Procurador Federal e Professor Universitário. Graduado em Segurança Pública (1989) e em Direito (1994). Especialista Direito Penal e Criminologia (1996) e Metodologia do Ensino Superior (1999). Mestre em Direito (2002). Doutorando em Direito. Autor dos livros "Prescrição Penal"; "Execução Criminal: Teoria e Prática"; e "Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006" (todos da Editora Atlas).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa. A advocacia pública é incompatível com a inscrição do profissional na Ordem dos Advogados do Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1599, 17 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10671. Acesso em: 23 dez. 2024.

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