INTRODUÇÃO
A facilitação do acesso à informação por meio da simplificação da linguagem jurídica exige muito mais do que a compreensão e o domínio da linguagem e de suas técnicas. É preciso ter a capacidade de tradução, ou de simplificação, e de transformação desse conteúdo em uma comunicação com linguagem clara e objetiva.
Comunicamos para quem? Grande parte das informações e mensagens que orientam cidadãos parecem ter sido redigidas sem considerar os leitores e receptores a que se destinam. Quando a dimensão do outro é abafada, um texto não consegue respirar e nem falar com clareza. Falta-lhe qualidade de vida. A comunicação deve se dirigir a quem não é especialista, direcionada ao usuário de acordo com sua cultura, universo e esfera social.
A vida em sociedade não pode dispensar o Direito para regular a conduta de seus integrantes. Para que o Direito possa atuar é necessário que haja democratização da linguagem jurídica, que ainda hoje é inacessível para a maior parte da população. Faz-se necessário que as leis sejam redigidas de forma a serem inteligíveis aos seus usuários/destinatários e também que os operadores do Direito, no curso dos processos judiciais, para que se valham de linguagem compreensível aos jurisdicionados.
A simplificação da linguagem jurídica deve ocorrer sem comprometimento da linguagem técnica, inerente à Ciência do Direito, preservando-se a harmonia entre a precisão terminológica e o bom uso da língua portuguesa. Facilitar a compreensão da linguagem é um ato de inclusão social e democratização do Direito.
De acordo com Rodríguez (2015): A linguagem moderna mais dinâmica e persuasiva, a capacidade de adaptar-se ao tempo progressivamente, e ao raciocínio imediatista, são valores a ser consagrados na atividade do ser humano. Não poderia ser diferente na argumentação jurídica.
Algumas expressões jurídicas têm sua razão de existir e, se não puderem ser substituídas por outras mais simples, então que uma explicação clara e compreensível acompanhe cada uma dessas expressões (DANTAS, 2012).
De acordo com Guimarães (2012), quando ressaltamos a facilitação da linguagem jurídica, não estamos justificando a banalização dela, nem instigando o abandono ou desuso de termos técnicos necessários ao contexto jurídico, nesse caso, estamos enfrentando os abusos e excessos, estimulando a acessibilidade para todos.
Na conjectura de que o problema não está no acesso à justiça em si, mas sim no próprio acesso ao Direito, acesso à informação, e na linguagem que é utilizada pelos profissionais jurídicos. Assim, seria possivel fazer os seguintes questionamentos: A linguagem jurídica nas relações processuais está ao alcance da parte vulnerável? A facilitação do discurso jurídico seria um mecanismo do direito à informação e, via de consequência, do acesso à justiça para os cidadãos? O Uso do Direito Visual e design jurídico podem ser mecanismos do acesso à justiça, facilitando a compreensão da linguagem jurídica para o usuário?
A própria linguagem limita a possibilidade de aquisição de informações e de conhecimento. Assim, o principal obstáculo ao conhecimento jurídico não é necessariamente um obstáculo físico de acesso aos materiais de informação, mas, sim, a barreira da linguagem.
Com base neste cenário, seria possivel entender que, o direito à informação enquadra-se na terceira onda renovatória do acesso à justiça, conforme classificação de Cappelletti e Garth, que seria um movimento de enfrentamento de obstáculos relativos às dificuldades enfrentadas pelas pessoas mais pobres e vulneráveis (CAPPELLETTI, 1988).
Dessa forma, diminuir a distância entre o discurso jurídico e a realidade do cidadão, destinatário da justiça, deve ser um esforço de todos os profissionais jurídicos, pois a compreensão desse discurso é essencial para a efetivação e evolução do Direito.
FERRAMENTAS PARA UMA LINGUAGEM JURÍDICA SIMPLIFICADA E DEMOCRATIZADA
A técnica judicial existente no Brasil é um dos principais instrumentos de segregação social praticadas por agentes do discurso jurídico. Às vezes, não há como evitar a complexidade, devido a uma grande quantidade de informações específicas e técnicas sobre matérias, mas o profissional multidisciplinar do Direito pode ajudar a reduzir essa complexidade, simplificando o processo de tomada de decisão para os usuários, principalmente por meio da linguagem jurídica acessível.
Sendo assim, é importante conhecer os avanços que estão sendo realizados no próprio Direito, decorrente do uso da tecnologia, mediante o emprego de recursos visuais e uso da linguagem simples, a fim de evidenciar a transformação dos gêneros textuais mais tradicionais em documentos comunicativos mais próximos de todos.
Para Richard Susskind (2019), Direitos permanecem mal compreendidos e invariavelmente não cumpridos. Os cidadãos são excluídos e se sentem desconectados. Por sua vez, a confiança do público no sistema judiciário diminui, junto com a moral entre advogados e juízes. Para Susskind é preciso pensar em novas formas de resolver conflitos. Assim, devemos colocar em prática uma nova configuração de pessoas, processos, tecnologias, ferramentas e espaços físicos que sejam centrados no usuário, e garantir que a nova estrutura seja sustentável, acessível e superior ao que temos hoje.
A multimodalidade é caracterizada pela junção de várias modalidades de meios textuais: imagens, gráficos, vídeos, fluxogramas, etc. (MOZDZENSKI, 2004).
Neste sentido, em 2020, surgiu no Brasil o Legal Design ou Design Jurídico tendo por finalidade tornar os serviços jurídicos mais utilizáveis, satisfatórios e centrados no ser humano. Enquanto espécie do Legal Design, o Visual Law (Direito Visual) corresponde ao design da informação jurídica, ou seja, uma ferramenta voltada a repensar a comunicação no Direito por meio da utilização de elementos gráficos, estímulos visuais e audiovisuais. O Visual Law pode trazer resultados positivos para a ampliação do acesso à justiça aos cidadãos, sobretudo em sua dimensão informativa (STAUT, 2021).
O Design do Litígio (Litigation Design) traz clareza à complexidade. Ajuda em toda uma série de tarefas difíceis: como explicar como está o andamento de uma ação judicial; apresentar um caso complexo ao Conselho de Administração; convencer o juiz com um resumo visual do seu caso; elaboração de ementas explicativas nas petições; ou explicando um caso marcante no boletim informativo do seu cliente. O fato é que melhores documentos legais significam melhores serviços (STAUT, 2021).
O Visual Law usa design jurídico para ajudá-lo a criar documentos mais fáceis de ler e entender. É possível combinar experiência jurídica com design de informação, pensamento visual prático e Design Thinking.
Cada vez mais atores no cenário jurídico estão aderindo ao Design Jurídico. Não é uma tendência passageira: é uma evolução. O Design Jurídico surgiu com o objetivo de otimizar os documentos legais, de conformidade e regulatórios de todos os tipos: contratos, petições, decisões, termos e condições gerais, políticas de conformidade (privacidade de dados, anticorrupção, combate à lavagem de dinheiro), procedimentos operacionais padrão, boletins informativos internos e externos, materiais de treinamento, comunicações de clientes e quaisquer outros tipos de documentos.
Em consonância com a nova visão do judiciário de melhorar a experiência dos usuários da justiça, alguns tribunais brasileiros estão facilitando a linguagem jurídica por meio do Visual Law ou Direito Visual. Um exemplo seria que o Visual Law (Direito Visual) vem ganhando credibilidade e regulamentação no Brasil. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça), por meio da Resolução nº347/2020, art.32, parágrafo único, que dispõe sobre a Política de Governança das Contratações Públicas no Poder Judiciário, recomendou de forma expressa a utilização de “visual law”. Já, no quesito linguagem simples, também podemos citar algumas iniciativas no cenário brasileiro. No Distrito Federal, o poder judiciário publicou uma portaria sobre o uso de Linguagem Simples e do Direito Visual (Visual Law) - Portaria Conjunta 91 de 01/09/2021. Em Minas Gerais, a Linguagem Simples já era decreto no Poder Executivo mineiro desde dezembro de 2021 (Decreto nº 48.327, de 29 de dezembro de 2021), e no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) foi oficializada com a publicação da Portaria conjunta nº 1391/PR/2022, de 5/10/2022. No Rio Grande do Sul a Linguagem simples está incluída no Projeto Descomplica, da Comissão de Inovação do TJ/RS (Ato nº 24/2022), dentre várias outras iniciativas no país.
Cada vez mais atores no cenário jurídico estão aderindo ao Design Jurídico. Não é uma tendência passageira: é uma evolução. O Design Jurídico surgiu com o objetivo de otimizar os documentos legais, de conformidade e regulatórios de todos os tipos: contratos, petições, decisões, termos e condições gerais, políticas de conformidade (privacidade de dados, anticorrupção, combate à lavagem de dinheiro), procedimentos operacionais padrão, boletins informativos internos e externos, materiais de treinamento, comunicações de clientes e quaisquer outros tipos de documentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A conclusão do artigo versa sobre a necessidade que temos de simplificar a linguagem do Direito, com foco na otimização da informação e da comunicação, aliando Direito, tecnologia e design, para auxiliar na criação de uma justiça mais produtiva e acessível.
A utilização de recursos visuais na criação de um documento jurídico fornece maior compreensão das informações. Expostas de maneira mais didática, interativa, autoexplicativa e intuitiva, buscam melhorar a experiência do usuário que busca uma assistência jurídica clara, compreensível, acessível e precisa no próprio documento, no entanto, não dispensa a atuação dos profissionais jurídicos, que permanecem sendo fundamentais em todos as fases de um processo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPPELLETTI, M.; GARTH; B. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988.
DANTAS, Andréa Medeiros. Linguagem jurídica e acesso à Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518− 4862, Teresina, ano 17, n. 3111, 7 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20812. Acesso em: 3 jan. 2023. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artig
GUIMARÃES, Luciana Helena Palermo de Almeida. A simplificação da linguagem jurídica como instrumento fundamental de acesso à Justiça. Publ. UEPG Ci. Hum., Ci. Soc. Apl., Ling., Letras e Artes, Ponta Grossa, 20 (2): 173-184, jul./dez. 2012. Disponível em http://www.revistas2.uepg.br/index.php/humanas Acesso em: 22 mai. 2018.
MOZDZENSKI, Leonardo Pinheiro. Desconstruindo a linguagem jurídica: multimodalidade e argumentatividade visual nas cartilhas de orientação legal. Veredas – Rev. Est. Ling., Juiz de Fora, v.8, n.1 e n.2, p.91-106, jan./dez. 2004. p. 104. Disponível em: https://www.ufjf.br/revistaveredas/
RODRÍGUEZ, Víctor Gabriel. Argumentação jurídica: técnicas de persuasão e lógica informal. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2015. 319
STAUT DE AGUIAR, Kareline. Nova realidade jurídica: Do uso da tecnologia ao Visual Law. Revista Fórum de Direito na Economia Digital - RFDED, ano 4, n. 7, p. página inicial-página final, jul./set. 2021. Disponível em: https://www.forumconhecimento.com.br/periodico/214/42081/93776. Acesso em: 24 set. 2021
STAUT, Kareline. Visual Law: como a experiência do Direito pode ser aprimorada. In: AZEVEDO, Bernardo. Visual Law: como os elementos visuais podem transformar o Direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2021, p.100.
SUSSKIND, Richard. Online Courts and The Future of Justice. New York: Oxford University Press, 2019.