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A regulação da energia solar.

Da tutela ambiental ao advento da Lei nº 14.300/2022, que instituiu o Marco Legal da Energia Solar

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A Lei nº 14.300/2022 é o marco legal que instituiu o Sistema de Compensação de Energia Elétrica e o Programa de Energia Renovável Social. Analisa-se a perspectiva da geração solar no contexto atual e o possível impacto para os consumidores-geradores, incluindo a polêmica da taxação.

Resumo: A energia solar é a fonte de energia limpa necessária para a mudança da matriz energética brasileira. Com o intuito de incentivar o setor de energia solar brasileiro foi promulgada a Lei nº 14.300/2022, que instituiu o Marco Legal da Micro e Minigeração Distribuída, o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) e o Programa de Energia Renovável Social (PERS). Visto isso, o presente trabalho pretende apresentar um histórico do processo de regulação do tema, desde o início da tutela ambiental, sob a ótica do Direito Internacional, analisando os principais documentos internacionais, chegando ao contexto brasileiro, com o estudo das leis e resoluções normativas que ampararam a criação do Marco Legal da Energia Solar, bem como dos aspectos econômicos e sociais que dele derivam. Além disso, a pesquisa quer apresentar os dispositivos da Lei nº 14.300/2022, com o fito de entender a tarifação do Fio B, o funcionamento do sistema de compensação e as regras de transição, para, assim, discutir a perspectiva da geração solar no contexto atual e o possível impacto para os consumidores-geradores. Para tanto, opta-se pelo método dedutivo, utilizando-se de análise bibliográfica, legislativa e estatística, com o escopo de atender os objetivos citados.

Palavras-chave: Energia Solar. Marco Legal. Regulação. Sustentabilidade.

Sumário: Resumo. Introdução. 1. Energia solar: conceitos e especificidades. 1.1 Conceito de energia solar e breve síntese histórica. 1.2 Contexto de produção de energia solar. 1.2.1 Energia solar no âmbito global aliada aos objetivos de desenvolvimento sustentável. 1.2.2 O contexto geral da produção de energia solar no Brasil. 1.3 Entraves à geração de energia solar no brasil. 2. A matriz energética brasileira do ponto de vista jurídico. 2.1 Dos principais documentos internacionais: breve síntese da tutela ambiental internacional. 2.2 Da evolução constitucional acerca do tema. 2.3 Das agências reguladoras: o papel da ANEEL. 3. Aspectos normativos relacionados à regulação da geração de energia solar. 3.1 Dos principais conceitos para entender a regulação. 3.1.1 Tarifa de Energia Elétrica. 3.1.2 Grupos tarifários e outras tarifas. 3.1.3 Parcelas A e B. 3.1.4 Composição da fatura de energia, Fio A e Fio B. 3.1.5 Autoconsumo local e remoto. 3.1.6 Geração compartilhada e Consórcio de consumidores de energia elétrica. 3.1.7 Consumidor-gerador. 3.1.8 Crédito de energia elétrica e Excedente de energia elétrica. 3.1.9 Microgeração distribuída e Minigeração distribuída. 3.1.10 Sistemas ON GRID e OFF GRID. 3.1.11 Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE). 3.2 Dos primeiros incentivos à produção de energia por fontes alternativas. 3.3 Das resoluções normativas anteriores à Lei nº 14.300/2022. 3.3.1 Das Resoluções Normativas nº 481 e nº 482/2012 da ANEEL. 3.3.2 Da Resolução Normativa nº 687/2015 da ANEEL. 3.3.3 Das Resoluções Normativas nº 1.000/2021 e nº 1.059/2023 da ANEEL. 3.4 Do Marco Legal da Energia Solar. 3.4.1 Do Projeto de Lei nº 5.829/2019. 3.4.2 Da polêmica da taxação. 3.4.3 Das disposições da Lei nº 14.300/2022. 3.4.3.1 Do sistema de compensação ou net-metering. 3.4.3.2 Da tarifação do Fio B. 3.4.3.3 Da isenção e da regra de transição. 3.4.3.4 Da vedação da venda de energia. 3.5 Das repercussões econômicas e sociais. 3.5.1 Do impacto da tarifação no incentivo à geração de energia solar. 3.5.2 Da barreira imposta pelas distribuidoras. 3.5.3 Das questões tributárias referentes à geração de energia solar: a cobrança do ICMS sobre a TUST e TUSD. 3.5.4 Da acessibilidade aos mais vulneráveis segundo as metas da agenda 2030. Considerações finais. Referências.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo apresentar uma visão geral do processo de regulação da energia solar no Brasil, analisando questões econômicas, jurídicas e sociais intrinsecamente conectadas. Além disso, o estudo se filia tanto às questões que concernem ao Direito Ambiental, na perspectiva do desenvolvimento sustentável, quanto às questões do Direito Administrativo, analisando a Agência Nacional de Energia (ANEEL) como agência reguladora, observando suas resoluções normativas.

Por certo, o ramo do direito ao qual o estudo melhor se enquadra é o Direito de Energia, que possui por sua característica principal a interdisciplinaridade, englobando questões do Direito Ambiental, Administrativo, Tributário e Internacional, com o fito de analisar, dentre outros, a distribuição de energia, as resoluções normativas, a eficiência energética e a matriz energética brasileira, almejando o aprofundamento jurídico das normas que abrangem essas questões.

Com a finalidade de discorrer sobre os incentivos dados ao setor, será apresentada uma síntese da evolução da tutela ambiental, com os principais documentos internacionais que dispuseram sobre os incentivos à geração de energia solar. Nessa lógica, será abordada a Agenda 2030 da ONU, com foco central no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de nº 7 (sete), que visa ao fomento da energia limpa.

Contudo, antes de iniciar o estudo, é necessário distinguir o termo “regulação” do termo “regulamentação”. Enquanto o primeiro trata, de forma ampla, da atribuição de editar atos normativos, fiscalizar e aplicar sanções, o segundo diz respeito ao exercício do poder regulamentar exercido pelo Poder Executivo (art. 84, IV, da CRFB). Em síntese, regular significa estabelecer regras e condutas, sendo a regulação a função administrativa exercida pelas agências reguladoras – no estudo em questão: a ANEEL.

No contexto em tela, é importante destacar que o termo regulação sob sua dimensão jurídica diz respeito à criação de normas pelo Estado, por meio do controle do setor de energia. Todavia, a regulação não se esgota nisso. Na verdade, está composta de aspectos econômicos, condicionando comportamentos e influenciando as trocas comerciais, bem como de aspectos sociais, com o escopo de tutelar os interesses públicos para o setor por meio de atividades de fiscalização.

Após analisar essas questões, poderá ser feito o estudo aprofundado da Lei nº 14.300/2022, que instituiu o Marco Legal da Micro e Minigeração Distribuída, popularmente conhecida como o Marco Legal da Energia Solar. Nesse contexto, serão vistas as principais disposições da lei e as suas principais repercussões jurídicas, econômicas e sociais.

A Lei nº 14.300/2022 foi promulgada com o objetivo de conferir maior segurança jurídica ao setor de energia solar e, portanto, incentivar a sua geração, possibilitando economia para o consumidor-gerador e, com isso, permitir a mudança do paradigma energético brasileiro. Ocorre que o Marco Legal trouxe consigo diversas críticas para o setor de energia, as quais serão expostas e devidamente analisadas.

Por ora, deve-se entender que o direito é instrumento de mudança social e, por meio de suas fontes, sejam as leis ou as resoluções normativas, deverá, juntamente com os principais operadores dos setores público e privado, continuar regulando as relações jurídicas relacionadas à geração e à distribuição de energia no Brasil. Por fim, espera-se que isso leve, com o passar do tempo e a maturidade do setor, à mudança, tão esperada, do cenário energético brasileiro, alavancado a economia e permitindo um desenvolvimento verdadeiramente sustentável.


1. ENERGIA SOLAR: CONCEITOS E ESPECIFICIDADES

Em primeiro lugar, para iniciar-se o estudo do tema, deve-se analisar o conceito de energia solar como fonte de energia limpa desde os primórdios dos estudos científicos ao momento atual. Além disso, analisar, no contexto global, os avanços das fontes renováveis, a importância da geração solar na matriz energética brasileira e os principais entraves ao seu desenvolvimento.

1.1 Conceito de energia solar e breve síntese histórica

No século VI a.C., Tales de Mileto foi o primeiro cientista a se interessar pelo fenômeno da eletricidade, descobrindo, por acaso, que uma pedra de âmbar em seu bolso estava atraindo pequenos fiapos de lã e de grãos (FORP USP, 2005).

Na história moderna, diversos cientistas buscaram estudar os fenômenos que envolvem a geração de energia a fim de entender o que viria a ser um dos fatores mais preponderantes do desenvolvimento humano, possibilitando o crescimento industrial e o desenvolvimento tecnológico. Contudo, apenas em 1839 o efeito voltaico foi observado pela primeira vez. O cientista Edmond Becquerel verificou que placas metálicas de platina ou prata, mergulhadas em um eletrólito, produziam pequena diferença de potencial quando expostas à luz (VALLERA, 2006, p.1).

Com o decurso do tempo, as pesquisas cientificas se aprofundaram até o cenário atual, no qual materiais de alta eficiência e durabilidade são utilizados na composição das células fotovoltaicas. Nesse sentido, a energia solar fotovoltaica é a energia obtida através da conversão direta da luz em eletricidade (efeito fotovoltaico), sendo a célula fotovoltaica um dispositivo fabricado com material semicondutor, a unidade fundamental desse processo de conversão (PINHO, 2014, p. 50).

Ao contrário de outras fontes de energia, que queimam combustíveis fósseis, que necessitam de um processo químico para aquecer a água e mover suas turbinas, ou que se utilizam de uma planície inundada para, por meio da queda d’água gerar energia, o sistema de geração solar necessita apenas que as placas solares sejam instaladas em um local com incidência direta do sol. Diante disso, o sistema de geração solar como fonte de energia limpa atende as necessidades da agropecuária, das indústrias e da população em geral, como se verá a seguir.

1.2 Contexto de produção de energia solar

Após entender o conceito de energia solar e como esta surgiu, deve-se analisar sua importância no cenário global e, com a análise de dados estatísticos, discorrer sobre o crescimento do setor no Brasil.

1.2.1 Energia solar no âmbito global aliada aos objetivos de desenvolvimento sustentável

A demanda de energia no mundo contemporâneo tem-se tornado cada vez maior, mormente no contexto de crescimento populacional, com avanços científicos e tecnológicos constantes. De fato, o impulsionamento da economia e as pesquisas científicas, em quaisquer áreas, são importantíssimos para o desenvolvimento humano.

À vista disso, a energia solar é de suma importância para o processo de crescimento global, principalmente por suas características de geração e instalação. Não só pelo viés econômico, mas por estar alinhada à questão ambiental, como fonte primordialmente limpa, tornou-se parte da agenda política das relações internacionais, gozando de relativo consenso acerca da necessidade de cooperação internacional sobre o tema (SILVA, 2022, p. 21).

Faz-se necessário lembrar que a tecnologia no mundo hodierno não tem o fito de atender as necessidades básicas tão somente, mas tem relação direta com a estrutura consumista, que norteia as relações humanas e os valores sociais (GERBASI, 2012, p. 167, apud BAUMAN, 2008). Nesse sentido, a satisfação mediante consumo está intrinsecamente ligada à produção industrial e, por óbvio, à produção de energia latu sensu.

A Agência Internacional de Energia (IEA) apresenta que o consumo industrial de energia ainda é majoritariamente dominado por combustíveis fósseis, em particular o carvão, que representa cerca de um quarto das emissões de CO2 relacionadas à energia mundial (IEA, 2023). Logo, por mais que a produção de energia solar esteja crescendo exponencialmente, ainda está distante da realidade e, consequentemente, são muitos os desafios.

Nesse contexto está a Agenda 2030 da ONU, que, por meio dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), busca alcançar um mundo melhor para todos os povos e nações (PORTAL STF, 2023). Insta salientar que o objetivo nº 7, que trata essencialmente da energia limpa e sustentável, pode ser a alternativa para mudança do paradigma energético apresentado.

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Por outro lado, pela ótica do consumo humano básico de energia, com enfoque nos usos domésticos, a Agenda 2030 da ONU cumpre seu papel. Dentro do objetivo mencionado, além de ter a finalidade de assegurar a participação das energias renováveis na matriz energética global, com participação de organismos internacionais e investimentos em infraestrutura, quer promover a participação dos países em desenvolvimento e principalmente garantir o acesso à energia como direito fundamental de forma confiável e a preços acessíveis (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2023).

Nessa lógica, em análise de dados da IEA, a previsão é otimista pois, caso a curva exponencial se mantenha, será possível alcançar as metas de geração de energia solar até 2030.

Em síntese, o cenário mundial é de expansão. Assim, para que isso possa continuar, em consonância com os princípios de Direito Internacional Ambiental e com os objetivos de desenvolvimento sustentável, deve haver impulsionamento da energia limpa, em especial da geração solar, que, apesar dos custos de investimento, por sua múltipla funcionalidade, quer se tornar estratégia eficaz para a produção de energia no processo industrial e no acesso à energia aos mais vulneráveis.

1.2.2 O contexto geral da produção de energia solar no Brasil

O Brasil está em completa consonância com o cenário global apresentado. O setor de produção de energia no Brasil vem evoluindo, deixando para trás o uso do carvão e outros combustíveis fósseis, levando ao uso primordialmente das hidrelétricas, que se tornaram base na matriz energética brasileira (SILVA, 2022, p. 42).

A tendência global de substituição gradual das fontes de produção de energia não só vem sendo seguida, como, conforme dados do Ministério de Minas e Energia, através do Balanço Energético Nacional, de 2022, o país já é destaque na participação de fontes renováveis, atingindo o patamar de 78,1% do total produzido no país (BEN, 2022).

Entretanto, o setor de geração através das hidrelétricas tem um grande desafio: a escassez de chuvas. Nesse cenário, haverá baixa oferta de energia e, consequentemente, para suprir os usos dos setores, haverá a necessidade de maior utilização das termoelétricas.

Insta salientar que já houve no país grave crise energética, inclusive que ocasionou o apagão de 2001. Naquele contexto, o Brasil passava por um grande aumento na importação de energia, com falta de investimento em novas usinas e atrasos em obras públicas. Assim, houve necessidade de racionamento de energia, que reduziu a possibilidade de consumo das residências e comércios e, por fim, desencadeou cortes de energia em indústrias. Diante disso, o cenário não poderia ser outro senão a redução do PIB e um retrocesso econômico (PEREIRA, 2006).

Para não incorrer nessas mesmas falhas, o sistema de geração de energia solar deve operar. Segundo dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), a geração fotovoltaica já corresponde a 14,8% da Matriz de Energia (ABSOLAR, 2023). Ainda, ressalta-se que o Estado de Mato Grosso do Sul é o nono colocado no que diz respeito à produção bruta de energia solar, sendo, a cidade de Campo Grande, em especial, a terceira maior em potência instalada, em ranking municipal, em relação a todas as cidades do Brasil (ABSOLAR, 2023).

Logo, a ideia central é que o país, com maior diversidade de setores de produção energética, possa ter maior disponibilidade de energia e não correr o risco de passar por nova crise energética, por menor que seja. Por fim, para possibilitar que o setor continuasse crescendo, fez-se necessária a regulação do tema, o que ocorreu com promulgação da Lei nº 14.300/2022, que será objeto de capítulo posterior.

1.3 Entraves à geração de energia solar no brasil

Após analisar as questões que englobam, em contexto amplo, o setor de produção de energia, deve-se analisar alguns entraves que dificultam a geração aqui no Brasil.

Em primeiro lugar, o fator que certamente mais impacta é o econômico. Por mais que nos últimos dez anos o preço médio de instalação do painel fotovoltaico tenha decrescido, ainda está longe de ser acessível. Portanto, o Brasil necessita de uma política industrial competitiva e justa para o setor, reduzindo os preços dos componentes e equipamentos produzidos no país.

De acordo com SILVA (2022, p. 48), para vencer essa questão, são necessárias políticas públicas de incentivo ao setor. Exemplos disso são os leilões destinados à venda de energia elétrica por usinas solares e a efetivação de ações como a que ocorreu na Usina Hidrelétrica de Sobradinho, com a instalação de uma usina solar flutuante. Tais medidas abrem oportunidade para projetos similares em outros reservatórios de usinas hidrelétricas, extremamente favoráveis em razão da não ocupação de áreas em solo, aproveitando a rede de transmissão já existente.

Por sua vez, outro fator que pode dificultar a expansão do setor é a política de importação. O Brasil tem por característica a exportação de matéria-prima e a importação dos produtos industrializados. Assim, possuindo uma das maiores reservas de silício do mundo, continua importando de outros países como a China, as placas solares já prontas, com o objetivo de apenas montá-las. Contudo, o que se deve buscar é o incentivo ao desenvolvimento de uma indústria nacional que produza aqui as células fotovoltaicas, gerando empregos e reduzindo esses custos de instalação para o consumidor final (SILVA, 2022, p. 49).

A questão da tributação também é fator jurídico-econômico que impacta no setor. O poder público tem a possibilidade de conceder benefícios e desonerações fiscais como medidas de incentivo à instalação. Nesse sentido, a Lei nº 14.300/2022 foi promulgada com muitas críticas, dentre elas que haveria maior impacto para o consumidor, desincentivando a geração solar, o que será analisado posteriormente.

Por fim, mesmo com esses obstáculos, os dados continuam a demonstrar a evolução do setor. A geração distribuída, que engloba mormente as residências e comércios de pequeno porte, representa 98,9% do total da fonte solar fotovoltaica e está possibilitando economia real para essas famílias (ABSOLAR, 2023).

Além disso, para fomentar os investimentos do setor secundário, que é o maior consumidor de energia no país, já existem algumas ações concretas. Como exemplo, o Programa de Incentivo realizado pela Companhia Paranaense de Energia Elétrica (COPEL), que promove financiamentos de projetos que demonstram importância e a viabilidade econômica, auxiliando a promoção da geração de energia limpa (COPEL, 2023).


2. A MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA DO PONTO DE VISTA JURÍDICO

Vista a ótica primordialmente econômica, deve-se analisar, sob a ótica jurídica, a evolução do tema, com os principais documentos internacionais que iniciaram a tutela ambiental e por meio das mudanças trazidas com o advento da Constituição de 1988. Além disso, quer-se entender o papel da ANEEL como agência reguladora para fomentar a energia solar, em um contexto de descentralização, atuando na fiscalização, na edição de resoluções normativas, na transmissão e na geração de energia, ou seja, diretamente na regulação do setor.

2.1 Dos principais documentos internacionais: breve síntese da tutela ambiental internacional

Para compreender como está o processo de regulação da energia solar no contexto brasileiro, faz-se necessário, em primeiro lugar, analisar como a legislação de âmbito internacional evoluiu ao longo dos anos e, consequentemente, em que isso impactou no fomento à produção da energia limpa no Brasil.

Ingressando no Direito Internacional, a tutela ambiental iniciou-se com a pretensão de combater, em contexto amplo, o aquecimento global e a poluição atmosférica. Entretanto, observado o enfoque temático do presente trabalho, em síntese, objetiva-se estudar documentos e estratégias que possuam estreita relação com a matriz energética sustentável. Não se deve olvidar que, conforme visto anteriormente, a produção e o consumo de energia são fatores que contribuem de forma significativa para a emissão de gases de efeito estufa e corroboram, portanto, para as mudanças climáticas.

Visto isso, deve-se analisar como primeiro documento a Declaração de Estocolmo de 1972. Tal documento foi fruto da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, que foi o marco inicial do Direito Ambiental Internacional, sendo a primeira reunião internacional com o objetivo de adotar medidas realmente voltadas à proteção ambiental (SILVA, 2022, p. 70).

A conferência tratou, à época, do aumento da cooperação científica, principalmente em relação às mudanças climáticas e disponibilidade dos recursos hídricos, do aumento da publicidade dos problemas ambientais, com o desaparecimento de florestas e modificação das paisagens, e também do crescimento econômico acelerado, que contribuiu para a produção de lixo e de resíduos (PASSOS, 2009).

Nesse contexto, no item 6 do preâmbulo da declaração observa-se, de fato, que o ser humano é o responsável por todas as alterações no ecossistema, devendo reconhecer essas atitudes, pois os danos causados podem ser irreparáveis:

6. Chegamos a um momento da história em que devemos orientar nossos atos em todo o mundo com particular atenção às consequências que podem ter para o meio ambiente. Por ignorância ou indiferença, podemos causar danos imensos e irreparáveis ao meio ambiente da terra do qual dependem nossa vida e nosso bem-estar. [...]

Além disso, no item 7 do preâmbulo, inicia-se a ideia do consagrado princípio da solidariedade intergeracional a partir do qual as presentes gerações devem resguardar o meio ambiente para possibilitar que as futuras gerações possam dele usufruir:

7. Para se chegar a esta meta será necessário que cidadãos e comunidades, empresas e instituições, em todos os planos, aceitem as responsabilidades que possuem e que todos eles participem equitativamente, nesse esforço comum. Homens de toda condição e organizações de diferentes tipos plasmarão o meio ambiente do futuro, integrando seus próprios valores e a soma de suas atividades. [...]

Por mais que esses objetivos ainda não tenham sido alcançados, destaca-se que na reunião foram estabelecidos 26 (vinte e seis) princípios ambientais que, apesar de não terem força jurídica vinculante, influenciaram o modelo das constituições de alguns países que foram elaboradas nas décadas de 70 e 80, como por exemplo a de Portugal (1976), a da Espanha (1978) e, por fim, a do Brasil (1988), que seguiram o caminho da Constitucionalização do Meio Ambiente (SILVA, 2022, p. 28).

Já na vigência da Constituição de 1988, alguns anos depois, no âmbito da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, amplamente conhecida como a “ECO 92”, foi formulada a Declaração do Rio Sobre o Meio Ambiente. Nela foram delineados 27 (vinte e sete) princípios ambientais, focados especialmente na qualidade ambiental global e no desenvolvimento econômico.

De acordo com PORTELA (apud SILVA, 2022, p. 32), a Declaração do Rio teve base nos valores mencionados pela Declaração de Estocolmo, porém os atualizou, atrelando o desenvolvimento sustentável a uma visão mais antropocêntrica (Princípio nº 1). Ainda, houve evolução principalmente no que tange à erradicação da pobreza, com o objetivo de reduzir as disparidades de padrões de vida e melhor atender as necessidades da população (Princípio nº 5).

Naquele mesmo contexto, estava inserida a Agenda 21, com o intuito de concretizar as ações dos países que participaram da conferencia e possibilitar que as transformações saíssem do papel. No que tange à energia solar, objeto do presente estudo, conforme síntese produzida pelo Consórcio CDS – ABIPT (Consórcio de Desenvolvimento Sustentável), do Capitulo de Gestão dos Recursos Naturais, bem como do de Promoção do Desenvolvimento Sustentável dos Assentamentos Humanos, que abordam acerca da promoção da geração de energia de forma sustentável, extraem-se os seguintes excertos (FIOCRUZ, 2000):

(ii.) Formular programas nacionais de. ação para promover o desenvolvimento integrado de tecnologias de economia de energia e de utilização de fontes renováveis de energia, em especial fontes de energia solar, hidráulica, eólica e de biomassa;

(i) Apoiar os países em desenvolvimento na implementação de programas nacionais energia que tenham o objetivo de obter um uso disseminado de tecnologias que economizem energia e utilizem fontes renováveis de energia, especialmente fontes solares, eólicas, hidráulicas e de biomassa;

(b) empreender pesquisas e transferência de tecnologias relativas à energia da biomassa e à energia solar para a produção agrícola e as atividades posteriores às colheitas.

Com o passar do tempo, outros documentos trataram sobre as questões ambientais, a se destacar o Protocolo de Quioto, formulado em 1997, que teve por objetivo central a redução da emissão de gases poluentes, definindo inclusive critérios para que os países mais poluentes do mundo o ratificassem. Ademais, visava a fomentar políticas públicas voltadas ao aumento da eficiência energética, produção e consumo de energia.

Insta salientar que o Protocolo não impôs a todos os países as mesmas metas, devendo cada um dentro de sua realidade particular – seja de país desenvolvido ou em desenvolvimento – alinhar suas legislações a esses compromissos assumidos. Ocorre que, por se tratar de meta concreta a ser cumprida, houve muita discussão por parte dos Estados Unidos, que acabou não aderindo ao tratado. Ainda, a China acabou não sendo incluída nas metas compulsórias de redução de GEE (gases de efeito estufa). Logo, gerou-se uma situação intrigante, visto que os maiores responsáveis pela produção de CO2 no mundo ficaram de fora do compromisso compulsório de redução das taxas de emissão (SILVA, 2022, p. 37).

Ademais, no ano de 2015, o Acordo de Paris constituiu um novo marco legal internacional para a redução dos gases do carbono com o intuito de conter a elevação da temperatura no planeta. O Brasil ratificou o tratado no ano seguinte, possuindo íntima relação com a inovação tecnológica, com a regulação setorial e com as energias renováveis:

A geração de energia pela fonte solar, nesse contexto, em que pese ainda ser incipiente no Brasil, apresenta se como uma das opções mais promissoras dentre as que podem gerar um crescimento econômico do setor das energias renováveis associadas ao cumprimento dos compromissos externos do país, e ao ideal do desenvolvimento sustentável (SILVA, 2022, p. 40).

Aliado a isso, para possibilitar atitudes práticas dos países foi firmado outro acordo que está mais alinhado com os entraves do mundo atual: a Agenda 2030. Esse plano de ação global não trata tão somente das questões ambientais, mas traduz as principais preocupações da sociedade internacional com a pobreza, a fome, o acesso à água potável, desigualdades e, dentre tantos da lista, com o acesso à energia limpa e sustentável.

O novo plano de metas para 2030 foi criado com o propósito de erradicar a pobreza e promover vida digna a todos, em observância ao princípio da solidariedade intergeracional. Em síntese, são propostos 17 (dezessete) objetivos de desenvolvimento sustentável, dentre os quais, vale destacar, o objetivo nº 7 que tem por escopo assegurar acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos. Ademais, na meta 7.2 busca-se até 2030 aumentar substancialmente a participação de energias renováveis na matriz energética global (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2023).

Por fim, feito o estudo dos documentos internacionais, para continuar analisando o processo de regulação do tema, mormente no que tange ao cenário brasileiro, deve-se estudar como foi tratado o tema sob o prisma constitucional.

2.2 Da evolução constitucional acerca do tema

Ao longo do tempo, na história das constituições brasileiras, houve alternância entre regimes fechados e mais democráticos, com a respectiva repercussão na aprovação das Cartas (PONTUAL, 2013). Nesse contexto, com as alterações promovidas de um governo ao outro, as disposições constitucionais sobre o tema da energia se modificaram, culminando no cenário atual.

Nessa lógica, assevera SILVA (2022, p. 43):

Tomando por base uma visualização histórica das constituições brasileiras, é possível que se verifique em cada uma dessas cartas constitucionais como evoluiu o tratamento jurídico constitucional da matriz energética brasileira e como ela sempre esteve atrelada ao modo de produção inerente às atividades econômicas predominantes ao longo do período.

Visto isso, a primeira constituição do Brasil, outorgada em 1824, estava aliada aos princípios do liberalismo e voltada à manutenção do Estado Monárquico com o Poder Moderador acima dos outros poderes. Em seguida, a Constituição de 1891, originada após a Proclamação da República, estabeleceu a independência dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e instituiu a forma federativa de Estado e a forma republicana de governo (PONTUAL, 2013). Por seu momento histórico, essas mencionadas Cartas não discorreram com propriedade sobre aspectos atinentes à produção de energia.

Diante disso, a Constituição de 1934 foi a primeira a dispor expressamente acerca da questão da energia, em seu artigo 5º, inciso XIX, “j”, disciplinando que à União competia privativamente legislar sobre bens do domínio federal, riquezas do subsolo e, dentre outros, sobre a energia hidrelétrica. Ainda, em seu artigo 119, regulou as questões das minas, jazidas minerais, águas e energia hidráulica, disciplinando sobre as autorizações e concessões.

Por se tratar de período ditatorial, a Constituição de 1937, quanto ao aspecto regulatório da energia, adotou maior intervenção do Estado na economia, mantendo à União a competência para legislar sobre o tema. Já em 1946, voltou-se, em síntese, ao sistema adotado em 1934.

No ano de 1967, no período dos regimes militares, o texto constitucional possuía muito mais amplitude em relação aos anteriores, evidenciando os avanços tecnológicos à época, contemplando não só a regulação sobre a energia hidrelétrica, mas abarcando outras fontes de energia. Como fator histórico expressivo, foi o primeiro documento constitucional a mencionar as formas de geração de energia como elétrica, térmica e nuclear. Entretanto, devido a seu momento histórico, manteve-se o caráter intervencionista.

Diante disso, somente com o fim do regime militar e o advento da Constituição de 1988 que o cenário pôde de fato avançar. A movimentação internacional, conforme demonstrado no capítulo anterior, pressionava a promulgação de uma Carta Maior mais alinhada às diretrizes do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, adveio o artigo 225 da CRFB, disciplinando que:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Como a Constituição adotou um regime menos intervencionista, consagrando um regime capitalista e descentralizado, no que tange especificamente ao contexto de produção de energia, manteve preocupação relevante com a diversificação da matriz energética nacional e com o desenvolvimento tecnológico do mercado produtivo. Merecem destaque os seguintes dispositivos: o artigo 176, §4º, da CRFB, que dispõe sobre a dispensa de “autorização ou concessão para o aproveitamento do potencial renovável de capacidade reduzida”, e o artigo 218, §2º, da CRFB, que atribui ao Estado a necessidade incentivar a produção científica e inovação, principalmente “para a solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional”.

2.3 Das agências reguladoras: o papel da ANEEL

A partir dessa concepção neoliberal de política econômica, voltada a reduzir a participação estatal em diversos setores da economia, iniciou-se na metade dos anos 1990 o processo de privatizações, ao qual está ligada a criação das principais agências reguladoras no Brasil e, dentre elas, a ANEEL.

Segundo SILVA (2022, p. 62), esse processo sofreu influência principalmente das mudanças ocorridas nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha no início dos anos 1980, que vivenciaram uma reformulação do papel do Estado, através de privatizações e ajustes fiscais:

Os planos regulatórios para o Brasil estavam alinhados às ideias neoliberais que visavam romper com acentuada intervenção estatal direta, com excesso de burocracia e de gastos públicos, e com a perda de eficiência das funções antes atribuídas ao Estado enquanto prestador de certas tarefas.

Visto isso, de acordo com MAZZA (2022, p. 382), assim pode ser definida uma agência reguladora:

De forma simples, uma agência reguladora pode ser considerada como aquela que tem função de regular uma matéria específica. Pode ser tanto um órgão da Administração Direta como uma entidade da Administração indireta. Basicamente, as agências foram introduzidas no direito brasileiro para fiscalizar e controlar a atuação de investidores privados que passaram a exercer as tarefas desempenhadas, antes da privatização, pelo próprio Estado.

Além disso, conforme OLIVEIRA (2020, p. 202), as agências reguladoras são autarquias com regime jurídico especial, dotadas de autonomia reforçada em relação ao ente central, tendo em vista dois fundamentos principais: a) a despolitização, conferindo tratamento técnico e maior segurança jurídica ao setor regulado, e b) a necessidade de celeridade na regulação de determinadas atividades técnicas. Esse conceito está perfeitamente alinhado com as diretrizes do artigo 3º da Lei nº 13.848/2019:

A natureza especial conferida à agência reguladora é caracterizada pela ausência de tutela ou de subordinação hierárquica, pela autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira e pela investidura a termo de seus dirigentes e estabilidade durante os mandatos, bem como pelas demais disposições constantes desta Lei ou de leis específicas voltadas à sua implementação.

Para a criação dessas agências reguladoras foram necessárias diversas Emendas Constitucionais. Dentre as mais relevantes está a EC nº 5, que decretou o fim da exclusividade da prestação direta pelos Estados-membros dos serviços de gás canalizado. Além disso, a EC nº 6 possibilitou tratamento igualitários às empresas estrangeiras, quanto à pesquisa e ao aproveitamento de recursos minerais e potenciais de energia hidráulica. Contudo, o marco histórico introdutor das agências reguladoras brasileiras ocorreu de fato com a promulgação das Emendas Constitucionais 8 e 9, que quebraram o monopólio estatal quanto à prestação de serviços de telecomunicação e exploração de petróleo e gás natural (MAZZA, 2022, p. 383).

Nesse cenário, surgiu a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), criada pela Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, regulamentada pelo Decreto nº 2.235/97, tendo por atribuições regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal (MAZZA, 2022, p. 387). Vale ressaltar que outras incumbências da ANEEL estão previstas nos artigos 29 e 30 da Lei. 8.987/1995.

Ante o exposto, foi outorgado à ANEEL um campo de atuação muito abrangente, com a regulação da geração, da transmissão, da distribuição e da comercialização. Ainda é a responsável por promover as licitações para as empresas concessionárias e permissionárias de energia e, consequentemente, fiscalizar permanentemente a prestação dos serviços. Salienta-se que, por se tratar de autarquia especial, a ANEEL possui dirigentes com mandato fixo, isto é, que permanecem na função por prazo determinado, não podendo ser exonerados ad nutum, o que garante maior autonomia em relação ao ente central.

Faz-se necessário destacar também que, mesmo dentro de um contexto menos centralizado, o único ente competente para legislar sobre energia elétrica é a União (art. 22, IV, da CRFB), ou seja, dentro de um contexto de edição de resoluções normativas, não pode haver conflito com leis já promulgadas. Por isso, como se verá oportunamente, se faz tão importante a existência da Lei nº 14.300/2022, uma vez que as resoluções normativas devem caminhar conjuntamente com à lei para avançar com o setor energético (art. 2º da Lei nº 9.427/1996):

Art. 2.º A Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL tem por finalidade regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal (grifo nosso).

Por fim, sejam concessionárias ou permissionárias de energia, as empresas distribuidoras contratadas no processo licitatório atuam nas principais atividades para o funcionamento do setor, com a produção (geração), transmissão e distribuição de energia elétrica aos consumidores.

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Sobre os autores
Bruno Marini

Professor de Direitos Humanos, Biodireito e Bioética na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), em Campo Grande (MS), Doutorando em Saúde (UFMS), Mestre em Desenvolvimento Local (UCDB) e Especialista em Direito Constitucional (UNIDERP).

Gabriel Loureiro Melo Ijano

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Faculdade de Direito (FADIR). Colunista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARINI, Bruno ; IJANO, Gabriel Loureiro Melo. A regulação da energia solar.: Da tutela ambiental ao advento da Lei nº 14.300/2022, que instituiu o Marco Legal da Energia Solar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7427, 1 nov. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/106838. Acesso em: 21 nov. 2024.

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