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Artigo Destaque dos editores

Crime de pornô fake (nudes por inteligência artificial).

Grave violação da dignidade humana

06/12/2023 às 14:37

Resumo:


  • O ensaio aborda o problema das "nudes" criadas por inteligência artificial, conhecidas como pornô fake, e suas implicações jurídicas e sociais.

  • Discute-se a adequação das leis existentes, como o Código Penal de 1940 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, para lidar com crimes envolvendo inteligência artificial.

  • O texto enfatiza a necessidade de atualização legislativa e medidas efetivas para combater práticas que violam a dignidade humana e causam danos sociais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O crime de criação e distribuição de "nudes" criadas por inteligência artificial, conhecidas como pornô fake, pode exigir regras mais adequadas com punições severas.

Resumo: O presente ensaio jurídico tem por finalidade analisar as ações criminosas das nudes criadas por inteligência artificial denominadas de pornô Fake, extremamente ofensivas a dignidade humana, insofismável ameaça potencial aos interesses da sociedade moderna.

Palavras-chave: Nudes; inteligência; artificial; ofenda; dignidade; humana.


O dinamismo social opera transformações das mais variadas possíveis na humanidade. Mutações genéticas, científicas, econômicas, filosóficas, jurídicas, políticas, tecnológicas, além de tantas outras. No centro dessas transformações, o homem caminha, sempre obedecendo teoricamente o pacto social, contribuindo para o aprimoramento das relações sociais, buscando como desiderato a harmonia da sociedade.

Nesse compasso, surge o direito como instrumento regulador das relações humanas, disciplinando as interações sociais no tempo e no espaço.

A guisa de exemplo, tem-se que o atual Código Penal é datado de 1940, portanto, já se passaram mais de 80 anos de sua existência. Durante o transcorrer de todo esse tempo, várias mudanças foram realizadas com o intuito de atualizar essas relações.

Modernamente, é possível falar em crime de estupro virtual, importunação sexual, sextorsão, perseguição ou stalking, estupro corretivo, estupro coletivo, violência política contra a mulher, assédio eleitoral, estelionato sentimental, fraude eletrônica, espionagem, sabotagem, falsificação de cartão, milícia privada, promoção de migração ilegal, além de outros.

Ainda nesse sentido, nos últimos dias, tem-se ouvido falar de nudes por inteligência artificial, também conhecido por pornô Fake em razão das últimas agressões que algumas atrizes brasileiras foram vítimas nas redes sociais. Esse tipo de comportamento criminoso ganhou força como se disse nos últimos dias, mas o legislador pátrio previu o crime de registro não autorizado da intimidade sexual, previsto no artigo 216-B, com nova redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018, consistente em produzir, produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes, com pena de detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo.  

Diante dessa onda de novas ações de montagens e manipulações de imagens de pessoas, famosas ou não, inserindo conteúdo sexual, literalmente despindo as pessoas, inclusive num caso que ganhou as manchetes de jornais em todo o país, quando alunos de um colégio famoso na Barra da Tijuca usando-se da inteligência artificial, fizeram montagens de aproximadamente 20 alunas nuas, com grave ofensa à dignidade humana, nasce um novo despertar das autoridades constituídas para o grave problema de ordem pública, com iminente risco de convulsão social para toda a sociedade.

Neste caso específico, a direção da escola lamentou o caso, afirmando que infelizmente uma ferramenta criada para solucionar problemas e apoiar a vida moderna ainda não tem seu fim utilizado da maneira adequada

Diante desses fatos, e de outros envolvendo como vítimas pessoas famosas, logo o legislador se incumbiu de apresentar um projeto de lei para tipificar a conduta criminosa específica e punir severamente essas condutas.

A gênese dessa conduta criminosa abjeta e repugnante de montagens de imagens pornográficas figurando como vítimas na sua grande maioria, mulheres, com a utilização de inteligência artificial, vem de uma escola de Nova Jersey (EUA), onde alunos usaram um aplicativo de inteligência artificial (IA) para montar fotos de meninas da escola em imagens pornográficas.

O ordenamento jurídico deste Torrão possui instrumento hábil para combater essas práticas nocivas? Não custa nada lembrar que além da dogmática do artigo 216-B, conforme visto alhures, ainda existe a conduta criminosa prevista no artigo 241-C, do ECA, com nova redação determinada pela Lei nº 11.829, de 2008, cuja conduta ilícita consiste em simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual, com pena de reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do artigo em apreço.

Existe ainda como aparato social, o artigo 218-C, do CP, que pune com pena de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave, a conduta de oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia.

Neste azo, o autor do projeto de lei 5.342/2023 pretende incluir no Código Penal a tipificação do crime de pornô fake. Segundo informações divulgadas em fonte aberta, o objetivo maior da proposta seria especificar o crime de produção de cenas de sexo e nudez, que tenham sido criadas por meio da inteligência artificial, prevendo pena de reclusão de 6 meses a 1 ano. A pena é aumentada de dois a três terços se a vítima for menor de idade.

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REFLEXÕES FINAIS

Acredito que o desenvolvimento pleno da inteligência artificial poderia significar o fim da raça humana. (Stephen Hawking)

A vida somente se justifica quando vivemos na sua plenitude para fazer o bem; coração bondoso, amar sem medo de ser feliz, ser sempre dadivoso, contribuir de alguma forma para a promoção do bem a todos; fazer jorrar no coração a nobreza do humanismo.

Pode-se afirmar que a evolução social e tecnológica chega primeiro que a norma jurídica criada pelo parlamento. A maldade humana sempre antecede as suas ações virtuosas. As leis que disciplinam essa matéria são de 2018, perto de cinco anos de existência. Num quinquênio, a tecnologia pode significar um século. Pretendo viver em 2028 para saber como serão as coisas. Num segundo momento, creio que não existe vazio normativo para o eficaz enfrentamento dessas ações lesivas usadas pela inteligência artificial. Mas é claro que existe um argumento defensivo de críticas ao elemento normativo “qualquer outro meio”, usados nos artigos 216-B e 218-C do CP, além do art. 241-C do ECA, sendo necessária a utilização da expressão “produção da inteligência artificial” para preencher com segurança as elementares do tipo e observar rigorosamente ao princípio da taxatividade penal.

Para esse tipo de comportamento desviante acredito que não deveria o criminoso resolver suas ações deletérias numa simples audiência no juizado especial criminal, às vezes traduzido em pagamento de cestas básicas. A lesividade resultante da conduta do delinquente é maior que a resposta do estado quando o Poder Público rotula essa conduta criminosa altamente reprovável como de menor potencial ofensivo. Isso seria ofensa ao princípio da proporcionalidade penal. Creio que a pena para esse comportamento lesivo deva ser reclusão de 01 a 05 anos, mesmo assim, ainda com a possibilidade de suspensão condicional do processo, artigo 89 da Lei nº 9.099/95, o que seria rotulado de crime de médio potencial ofensivo.

A lei deve ser a ferramenta hábil de respaldo para as ações de persecução criminal. Além da norma, é preciso investimento estatal nas ações de persecução criminal, capacitação e treinamento dos policiais, investimentos em tecnologia para as agências de polícia na apuração dessa modalidade criminosa, eficiência na resposta do estado, sob pena da lei ser mais um mero simbolismo midiático diante do terror social. A lei não pode ser um pedação de papel sem efetividade, sem poder de império, sob pena de se instituir um estado esquizofrênico, exangue, sem forças da agir. Aliás a vida é nosso maior bem jurídico e não se pode fechar os olhos para os pífios esclarecimentos dos quase 50 mil homicídios registrados anualmente neste país da impunidade, com apresentação de uma taxa de elucidação tão pequena que chega a desanimar qualquer entusiasta motivacional quanto à elucidação dos demais crimes registrados, como estupros, roubos, furtos, crimes contra a honra praticados pelas redes sociais além de muitos outros que acabam alojados na chamada cifra negra, termo utilizado pela criminologia para justificar aquelas condutas criminosas que deixam de ser apuradas pela ineficiência do estado.

Por fim, importa afirmar que a tecnologia deve ser utilizada para promoção da humanidade, sua finalidade precípua deve ser para agregar valores, promover a cultura da paz, como instrumento de propulsão do amor e do progresso. A inteligência artificial não pode substituir a singular sabedoria do homem; não pode ser utilizada para passar em concursos públicos, servir de cola nas salas de aulas, não pode substituir o professor, e hoje se não houver uma rápida intervenção e resposta efetiva do estado para reprimir esses comportamentos nocivos, aviltantes, e destruidores da dignidade da pessoa humana, artigo 1º, III, da CF/88, daqui a pouco a sociedade estará diante das eleições municipais de 2024, e viveremos um jogo de agressões, uma epidemia sem precedentes, um monte de abutres fascinados pelo poder político, amantes da maldade séptica, símbolos da putrefação do caráter, rodoleiro político, um mundo de violações covardes, sem precedentes, e quem viver verá um país virado de cabeça para baixo, degradante e incapaz de lutar por uma sociedade melhor para se viver. Precisamos acender a chama da esperança, aquecer a química do amor entre os homens para promoção do humanismo petrarquiano tão deficiente nos dias atuais no mundo em que vivemos. Portanto, a inteligência artificial não pode ser ferramenta de fuzilamento da raça humana, destruidor da dignidade sexual das pessoas, senão um componente para agregar progresso numa sociedade que necessita de laboratórios de inovações para fomentar o crescimento da humanidade.

E mais que isso. A sociedade necessita mesmo é claro comprometimento de nossos governantes com o cumprimento dos objetivos vinculados ao desenvolvimento sustentável da Agenda 2030, como a erradicação da pobreza, educação de qualidade, trabalho decente e crescimento socioeconômico, redução das desigualdades, e um ingrediente de paz, justiça e instituições eficazes, tudo isso colimando a construção de um mundo melhor.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Penal. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em 17 de novembro de 2023.

BRASIL. Lei nº 9.099/95. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9099.htm. Acesso em 17 de novembro de 2023.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm. Acesso em 17 de novembro de 2023.

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Jeferson Botelho. Crime de pornô fake (nudes por inteligência artificial).: Grave violação da dignidade humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7462, 6 dez. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/107360. Acesso em: 18 dez. 2024.

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