O presente artigo tem como escopo analisar o julgado proferido pelo Tribunal Superior do Trabalho no âmbito dos Embargos de Declaração Cível em Agravo em Recurso Ordinário Trabalhista nº TST-EDCiv-Ag-ROT-722-06.2021.5.17.0000. O foco central recai sobre a validade da jornada de trabalho 4x4, caracterizada pelo sistema de revezamento de quatro dias trabalhados, seguidos de quatro dias de folga, com jornada diária de doze horas, em regime de revezamento.
O embate jurídico delineado no julgado remonta à discussão acerca dos limites da disponibilidade negocial coletiva, destacando-se a análise à luz do Tema 1.046 do Supremo Tribunal Federal. A pretensão rescisória, nesse contexto, questiona a validade do referido sistema de jornada, confrontando-o com a tese aprovada pelo STF.
Em primeiro plano, cumpre destacar que a escala 4x4 nada mais é do que um planejamento que determina em quais dias da semana um trabalhador deverá exercer a função para a qual foi contratado.[1] É importante ressaltar que, segundo a Consolidação das Leis do Trabalho, para cada seis dias de trabalho, deverá haver um dia de descanso remunerado.[2]
Na prática, a escala 4x4 é utilizada por empresas que operam em turno ininterrupto de revezamento, ou seja, aquelas em que há trabalhadores exercendo atividades 24 (vinte e quatro) horas por dia, sem interrupção entre as trocas de equipe.[3]
A controvérsia sobre a aplicação da escala 4x4 gira em torno da previsão contida na CLT e na Constituição Federal de 1988, segundo a qual a jornada de trabalho para turnos ininterruptos deve ser, no máximo, de seis horas por dia, durante seis dias da semana, garantindo-se 24 (vinte e quatro) horas consecutivas de descanso remunerado (art. 7º, XIV, da CF).
Portanto, sob a ótica constitucional e legal, a escala 4x4 seria considerada ilegal.
Contudo, apesar do disposto no Estatuto do Obreiro e na CF/88, o TST, ao discutir os limites da disponibilidade negocial coletiva, destacou, tomando por base o Tema 1.046 do STF[4], que a escala 4x4 pode, sim, ser adotada, desde que prevista em convenção ou acordo coletivo de trabalho (art. 7º, XXVI, da CF).
Ao proferir sua decisão, o Tribunal reconheceu que a negociação coletiva deve respeitar os limites da disponibilidade negocial, especialmente considerando a tese consolidada no Tema 1.046.
Restou superada a alegação de que a referida negociação feria direitos absolutamente indisponíveis. Nada obstante, a Corte concluiu que a demanda assumiu feição meramente revisional, afastando a possibilidade de rescisão.
Portanto, o julgado destacou a natureza absolutamente excepcional da ação rescisória, cujo propósito é desconsiderar um instituto vital à segurança jurídica, garantida pela Constituição Federal.
Apesar da divergência em relação ao entendimento jurisprudencial vigente à época, a decisão rescindenda não configuraria uma manifesta violação da norma jurídica, sendo necessário reavaliar o posicionamento à luz do Tema 1.046 da Repercussão Geral.
Nesse sentido, o julgado faz referência a precedentes do TST que, com base no Tema 1.046 da Repercussão Geral, reconhecem a validade da negociação coletiva nos moldes questionados na ação rescisória.
Dessa forma, destaca-se a constitucionalidade de acordos e convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.
Conclusão
Nesses termos, é possível extrair importantes reflexões sobre os limites da disponibilidade negocial coletiva, notadamente à luz do Tema 1.046 do STF.
A controvérsia inicial envolvia a legalidade da escala 4x4, que estabelece um sistema de revezamento de quatro dias trabalhados, seguidos de quatro dias de folga, com jornada diária de doze horas.
À primeira vista, essa escala poderia conflitar com as disposições da CLT e da Constituição Federal quanto à jornada máxima diária e ao direito ao descanso remunerado.
No entanto, o TST, ao discutir os limites da disponibilidade negocial coletiva sob a égide do Tema 1.046 do STF, reconheceu que a escala 4x4 pode ser adotada.
Essa decisão, fundamentada na exigência de convenção ou acordo coletivo de trabalho, demonstra a importância da negociação coletiva na definição de condições laborais específicas, garantindo, assim, a observância dos direitos constitucionais e legais dos trabalhadores.
A discussão sobre a natureza da demanda, se rescisória ou revisional, evidencia a cautela do Tribunal na preservação da segurança jurídica e da estabilidade das relações de trabalho. A excepcionalidade da ação rescisória é reiterada, ressaltando-se que sua utilização exige a configuração de manifesta violação da norma jurídica, o que, no presente caso, não restou comprovado.
A jurisprudência consolidada em precedentes do TST, embasada no Tema 1.046 da Repercussão Geral, reforça a constitucionalidade de acordos e convenções coletivas que negociam condições específicas de trabalho, desde que sejam respeitados os direitos absolutamente indisponíveis dos trabalhadores.
Dessa forma, a conclusão do julgado destaca a relevância da negociação coletiva para a adequação setorial negociada, possibilitando a pactuação de jornadas especiais, como a 4x4, e fortalecendo a segurança jurídica das relações de trabalho.
Nesse contexto, a decisão contribui para um entendimento equilibrado entre a flexibilidade necessária à dinâmica empresarial e a proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores, promovendo, assim, um ambiente laboral mais harmonioso e adaptado à realidade contemporânea.
Notas
[1] ESCALA. Escala 4x4. Disponível em: https://escala.app/blog/escala-4x4/. Acesso em: 27 ago. 2023.
[2] BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 27 ago. 2023.
[3] Idem.
[4] Supremo Tribunal Federal [STF]. Tema 1046 - Validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente. Disponível em: https://shre.ink/rz48. Acesso em: 27 ago. 2023.