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Da ilegalidade da orientação prevista na Solução de Consulta nº 308/23 quanto ao momento da tributação

Resumo:


  • A Solução de Consulta COSIT 308/23 da Receita Federal do Brasil trata da tributação do indébito tributário, especificamente sobre o momento de reconhecimento da receita para fins de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

  • A orientação da RFB indica que o principal do indébito deve ser tributado pelo IRPJ e CSLL no momento da entrega da primeira declaração de compensação ou na escrituração contábil, se anterior, mas não há incidência de PIS e COFINS sobre o principal.

  • Há argumentos e precedentes judiciais que defendem que a tributação do indébito tributário deve ocorrer apenas no momento da homologação da compensação pelo Fisco, momento em que há liquidez e certeza do crédito.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Segundo a Receita Federal, a tributação do indébito de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS ocorre no momento da entrega da primeira declaração de compensação (ou, se houver, da escrituração contábil anterior). Contudo, só deveria ocorrer na homologação do pedido de compensação, quando há segurança sobre o montante destinado ao contribuinte.

No dia 19 de dezembro de 2023, foi publicada a Solução de Consulta COSIT 308, de 15/12/2023 ("SC COSIT 308/23") que, entre outras, trata do momento que se deve reconhecer a receita do indébito, precisamente, referente ao IRPJ, CSLL (principal), PIS e COFINS (correção monetária).

Para melhor contextualização, reproduz-se abaixo em resumo, o entendimento da Receita Federal do Brasil (“RFB”) proferido na SC COSIT 308/23 para o tratamento tributário que deve ser dado na repetição do indébito da exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e COFINS, a saber:

Quanto a incidência de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre o principal do indébito

  • (i) IRPJ e CSLL: há incidência sobre os valores referente ao principal do indébito tributário, relativos à exclusão do CIMS das bases de cálculo do PIS e COFINS; e

  • (ii) PIS e COFINS: Não há incidência sobre os valores referente ao principal do indébito tributário, relativos à exclusão do CIMS das bases de cálculo do PIS e COFINS.

Quanto a parcela correspondente a correção monetária

  • IRPJ e CSLL: Não há incidência sobre os juros de mora equivalentes à taxa Selic recebidos nas ações de repetição de indébito tributário, desde que observados os marcos temporais previstos no Recurso Extraordinário 1.063.187; e

  • PIS e COFINS: Se em nenhuma fase do processo foram definidos pelo juízo os valores a serem restituídos, é na entrega da primeira declaração de compensação, na qual se declara sob condição resolutória o valor integral a ser compensado que os juros de mora sobre ele incidentes até essa data devem ser oferecidos à tributação.

Quanto ao momento da tributação

  • na entrega da primeira declaração de compensação, na qual se declara sob condição resolutória o valor integral a ser compensado, o último momento em que os valores do principal do indébito devem ser oferecidos à tributação; ou

  • Caso haja a escrituração contábil de tais valores em momento anterior à entrega da primeira Declaração de Compensação é no momento dessa escrituração que tais valores devem ser oferecidos à tributação.


Em que pese nosso embargo quanto à ilegalidade e à inconstitucionalidade da tributação do PIS e COFINS sobre a parcela corresponde a correção monetária, o presente estudo se restringe em demonstrar a ilegalidade da orientação da RFB quanto ao momento que se deve oferecer a tributação o montante levantado na repetição do indébito, referente a exclusão do ICMS das bases de cálculo do PIS e COFINS.

Pois bem. Como se nota da orientação supra constante na SC 308/23, a RFB entende que o indébito deve ser tributado (i) no momento da entrega da primeira declaração de compensação, na qual se declara sob condição resolutória o valor integral a ser compensado e, muito pior, quando (ii) haja a escrituração contábil de tais valores, em momento anterior à entrega da primeira declaração de compensação.

Com todo o respeito, nenhuma das hipóteses enumeradas na SC 308/23 reflete o melhor cenário, simplesmente pelo fato de que de orientação da RFB não se amolda com a hipótese de incidência de cada um dos tributos, precisamente, o artigo 43, do Código Tributário Nacional (“CTN”) para IRPJ, ao artigo 2º, da Lei 7.689/88 para CSLL e as Leis 10.865/04 e 10.833/03, respectivamente, para o PIS e COFINS.

Sem prolongamento de debate, o indébito tributário deve ser tributado, apenas e tão somente, no momento da homologação do pedido de compensação.

Isso porque, antes desse momento, não há valor líquido e exigível preciso. Neste ponto, questiona-se: A entrega da declaração garante a compensação do tributo? Obviamente que não, tendo em vista que a compensação poderá ser totalmente ou parcialmente indeferida.

Logo, o momento correto para que ocorra o oferecimento à tributação é na homologação do pedido de compensação.

Ademais, beira o absurdo ainda, a orientação da RFB na SC 308/23 no sentido de que, na hipótese de escrituração contábil de tais valores, em momento anterior à entrega da primeira declaração de compensação, porque a escrituração contábil não é a hipótese de incidência desses tributos, de forma especial, IRPJ e CSLL.

Veja bem. Se não há disponibilidade jurídica dos valores antes da homologação do pedido de compensação, qual a lógica de se tributar esses valores? Não existe disponibilidade de renda a justificar a tributação.

Não à toa, há diversos precedentes que postergam o oferecimento da tributação para o momento da homologação da compensação, senão vejamos:

“TRIBUTÁRIO. INDÉBITO TRIBUTÁRIO RECONHECIDO EM SENTENÇA (EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS). MOMENTO DA INCIDÊNCIA DA TRIBUTAÇÃO PELO IRPJ E CSLL. HOMOLOGAÇÃO DA COMPENSAÇÃO PELA RECEITA FEDERAL. (...)

3. Somente a partir da homologação administrativa é que se aperfeiçoa o procedimento de recuperação do indébito mediante compensação. Embora a decisão judicial estabeleça os parâmetros a serem observados pelo contribuinte, impende consignar que a certeza, a liquidez e a exigibilidade surgirão apenas após a aquiescência fazendária, realizada mediante a homologação, expressa ou tácita, da compensação.

4. Não basta a mera apresentação da declaração de compensação, pois a homologação fazendária é requisito necessário para o aperfeiçoamento dos procedimentos realizados pelo contribuinte, de modo a consubstanciar o ato administrativo que manifesta definitiva concordância com os valores compensados (e que serão objeto de tributação pelo IRPJ e CSLL), realizando o encontro de contas.

5. A homologação da compensação é o marco temporal a evidenciar a disponibilidade jurídica ou econômica da renda, de modo a caracterizar o fato gerador do IRPJ e da CSLL. Precedentes do TRF3.

6. Remessa oficial e apelação da União improvidas.” (grifou-se)

TRF 3. Autos 5004835-41.2021.4.03.6126, DOU 02/08/22.

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“PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO.  MANDADO DE SEGURANÇA. INDÉBITO TRIBUTÁRIO.  CRÉDITOS RECUPERADOS EM DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. ART. 53, LEI Nº 9.430/96. ATO DECLARATÓRIO INTERPRETATIVO RFB Nº 25/2003. PIS/COFINS. NÃO INCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. IRPJ E CSLL. INCIDÊNCIA. DISPONIBILIDADE JURÍDICA DE RENDA. REAJUSTE DE LUCRO. MOMENTO DA TRIBUTAÇÃO. VALORES ILÍQUIDOS. HOMOLOGAÇÃO DA COMPENSAÇÃO PELO FISCO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA DO PIS/COFINS, IRPJ E CSLL. RECURSO PROVIDO EM PARTE (...)

9.     O crédito somente estará disponível para utilização em favor do contribuinte após a homologação do seu pedido de habilitação de crédito. Antes desta última data não há disponibilidade jurídica do valor do crédito. Assim, até a decisão administrativa que homologa a habilitação creditória do contribuinte, os valores reconhecidos pela decisão judicial não são certos, líquidos e exigíveis, de forma que a disponibilidade jurídica ou econômica da renda, como fato gerador do IRPJ e da CSLL, ocorrerá somente no momento da homologação da compensação pelo Fisco e que, portanto, somente nesse momento será devido o IRPJ e a CSLL. (...)

12.  Apelação provida em parte.” (grifou-se)

TRF3. Autos 5004691-74.2019.4.03.6114. Dje: 29/07/2020.

O entendimento dos tribunais, portanto, têm sido no sentido de que a tributação deve ocorrer quando há efetiva homologação da compensação, momento em que há segurança e certeza de que o montante será destinado ao contribuinte.

Em aditivo, acerca da própria liquidez e certeza dos aportes envolvidos, diversas decisões preconizam que, sequer é possível saber exatamente o valor da aquisição de disponibilidade jurídica da renda antes da homologação do pedido de compensação, conforme se nota da reprodução do julgado abaixo:

"não há como serem exigidos tributos no momento do trânsito em julgado da decisão que reconhece o direito à compensação", quando a sentença for ilíquida, visto que as bases de cálculo são "incertas e ilíquidas" 

TRF-5. Autos 08107154820194058400. DOU 02/07/2020.

Diante de todas as considerações feitas acima, não resta a menor dúvida que há bons e robustos argumentos para se discutir judicialmente o momento da tributação do indébito tributário, precisamente para que ocorra, apenas na homologação da compensação afastando se, portanto, a orientação da SC 308/23 quanto ao momento da tributação.

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Sobre os autores
Carlos Alberto Gama

Advogado na área tributária no Freitas, Silva e Panchaud Advogados Associados.

Giovanna Borsetti Cruz

Estagiária na área tributária no Freitas, Silva e Panchaud Advogados Associados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GAMA, Carlos Alberto ; CRUZ, Giovanna Borsetti. Da ilegalidade da orientação prevista na Solução de Consulta nº 308/23 quanto ao momento da tributação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7499, 12 jan. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/108014. Acesso em: 22 dez. 2024.

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