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Mediação sem mediador

05/02/2024 às 17:50
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Apresenta-se a ótica de Antonio do Passo Cabral e Leonardo Carneiro da Cunha sobre o instituto collaborative law.

O MEDIADOR COMO FIGURA FACILITADORA EM MATÉRIA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

Instintivamente o ser humano tende a centralizar suas relações interpessoais com a crença de que só há como um dos envolvidos alcançarem o melhor acordo possível se o outro abdicar-se do seu querer, constituindo-se notória inconformidade.

O mediador surge nesse espectro com a demonstração da acessibilidade para os sujeitos conflitantes, sem desempenhar constrangimentos ou pressões psicológicas nas partes. Havendo carência da identificação nesta complexidade de conflitos, o reconhecimento deste moderador acerca dos pontos centrais da contrariedade é necessário para formular melhores estratégias.

Possui o papel fundamental de canalização comunicativa entre as partes envolvidas para se fomentar um vínculo, pois, se estas pessoas buscaram alternativa na mediação, devidamente sua interlocução é defeituosa, trazendo com isso a necessidade da cognição deste intermediário acerca das pautas trazidas na conversação; consequentemente haverá melhor assentamento das vontades individuais, de modo inteligível, confirmativo e resoluto.

Como um modelo a ser seguido, o mediador ao repassar as informações relevantes trazidas pelas partes opositoras, deve utilizar-se de panoramas novos filtrantes das circunstâncias negativas, que não se restrinjam apenas a um lado do conflito, desprezando os pensamentos individualíssimos presentes no caso, reconstruindo de maneira benéfica o diálogo.

A expressividade de como o mediador irá se portar com as espécies de linguagem, por exemplo, também tem suma importância na eventual interferência dos sentimentos litigantes, devendo-se caracterizar de uma maneira comunicável simples, direta e coesa, sendo um elemento próximo às partes ao promovendo a facilitação na autonomia e participação na mutualidade nos desígnios das partes.

Como consequência, surge um viés empático onde os envolvidos passam a entender melhor os aspectos do outro, para assim conseguirem alcançar um resultado justo para ambos, empoderando-os com o intuito da resolução problemática enfocada nos eventos futuros.


NO QUE CONSISTE O INSTITUTO DA NEGOCIAÇÃO DIRETA ("MEDIAÇÃO SEM MEDIADOR") OU COLLABORATIVE LAW?

A expressão "mediação sem mediador", de início, soa como uma expressão paradoxal, tendo em vista que a técnica de mediação é uma espécie de processo que, em linhas gerais, envolve a presença de um mediador. Nesse sentido, o mediador é uma terceira pessoa imparcial e neutra que facilita a comunicação entre as partes em conflito, ajudando-as a explorar interesses, necessidades e opções de solução.

No entanto, no que tange a esfera de resolução de disputas, "mediação sem mediador", também chamada oportunamente de Collaborative Law, é usada para se referir a abordagem autocompositiva de resolução de conflitos, ao qual tende a encorajar as partes envolvidas a encontrarem uma solução de forma consensual sem a presença de um terceiro imparcial como um mediador ou um árbitro.

Nesses casos, as partes podem optar por se envolver diretamente na resolução do conflito, sem a necessidade de um mediador externo. Elas assumem a responsabilidade pela comunicação, pela busca de interesses comuns e pela negociação de um acordo. Essa abordagem é baseada na premissa de que as partes são as mais adequadas para entender suas próprias necessidades e interesses, e que possuem a capacidade de encontrar soluções mutuamente satisfatórias.

Há abordagens diferentes de negociação, sendo duas delas a negociação competitiva e a negociação cooperativa. A distinção entre esses modelos está na mentalidade adotada e nos resultados pretendidos.

A negociação competitiva é considerada ineficiente, pois as partes envolvidas estão mais interessadas em reivindicar valor do que em criar valor. O objetivo é que uma parte ganhe e a outra perca, sendo utilizadas estratégias incisivas para superar a parte contrária.

Por outro lado, na negociação cooperativa, a estratégia é baseada nos interesses em jogo, não nas posições adotadas pelas partes. O foco é criar valor e buscar benefícios mútuos, separando as pessoas do problema em si. Nesse modelo, as partes trabalham juntas para encontrar soluções que atendam aos interesses de ambas, visando a um resultado vantajoso para todos. Assim, enquanto a negociação competitiva se concentra em ganhar às custas do outro, a negociação cooperativa busca colaboração e benefícios mútuos, buscando criar valor para ambas as partes envolvidas.


ONDE E COMO É APLICADO?

Embora a incidência seja demasiadamente maior nos países adeptos ao sistema Common Law – tendo em vista que o próprio colaborative law foi criado nos Estados Unidos e posteriormente expandido –, a França, como país Civil Law tem investido nesse modelo de resolução de conflitos como uma alternativa à abordagem litigiosa tradicional.

O sistema legal francês é predominantemente baseado em códigos legislativos, assim como o Brasil, há uma demanda crescente por métodos adequados de resolução de conflitos, especialmente em casos de direito de família, como divórcios, guarda de crianças e partilhas de bens. Conflitos matrimoniais, alimentos, sucessões e relações trabalhistas, assim como direito econômico e controvérsias internas de empresas que também são áreas as quais gozam desse tipo de procedimento nos países que o utilizam.

A aplicação se baseia nos seguintes pontos:

  • Colaboração: sendo a negociação direta um método colaborativo, os advogados representam as partes, comprometendo-se na solução do conflito informalmente, sem a aplicação formal da judicialização que, de certa forma, afasta os envolvidos pela presença do litígio e, muitas vezes, instalando uma disputa para escolher-se um “vencedor”.

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  • Limites de atuação: os advogados ao perceberem que a negociação não logrou êxito, ou seja, não se chegou ao consenso e a alternativa seja judicializar a demanda, não poderão atuar como advogados no processo judicial.

  • Sigilo: a não participação do processo judicial remete a regra de confidencialidade da negociação, onde o que foi apresentado e conversado pelos representantes das partes não pode ser conhecido pelo juiz, já que o conteúdo da negociação foi destinado a fim de promover a autocomposição, não se estendendo a fase processual do litígio.

  • Cláusula de desqualificação: ao passo que os advogados não atuam no possível processo judicial que possa ser iniciado, as partes também são limitadas a contratarem os mesmos advogados atuantes da negociação. É uma forma dos advogados focarem no melhor resultado atendendo os interesses dos mandantes sem que os interesses pessoais interfiram no procedimento. Isso promove a negociação cooperativa ao passo que desfoca-se da competição, do desejo de “ganhar” ou obter de vantagem e soluciona o conflito.


O COLLABORATIVE LAW TEM ESPAÇO NO DIREITO BRASILEIRO?

Ainda que não exista manifestação legal expressa que regulamente a existência das técnicas de resolução colaborativa no Brasil, há precedentes normativos no Código de Processo Civil que possibilitam a interpretação positiva para a aplicabilidade da negociação.

Entretanto, o mesmo código é assertivo no que dita a autocomposição; nesse tipo de solução, as partes buscam ativamente resolver suas diferenças por meio da negociação, da mediação ou de outras técnicas colaborativas. O objetivo é alcançar um consenso e chegar a um acordo mutuamente satisfatório, levando em consideração os interesses e necessidades de cada uma das partes.

Ao optar pela solução autocompositiva, há maior controle sobre o processo de resolução do conflito, podendo explorar opções e encontrar soluções personalizadas que atendam melhor às suas necessidades específicas.

Sendo assim, aborda sobre o princípio da colaboração e da boa-fé, estabelecendo que todas as partes envolvidas em um processo judicial devem atuar de forma colaborativa, buscando a efetivação da justiça e a solução adequada dos conflitos.

Diante do discorrido, além do próprio incentivo do CNJ ao abordar o aperfeiçoamento da mediação e conciliação através da aplicação de políticas públicas e que levam a entender que a negociação encaixa-se nesse mesmo contexto, é possível observar que a negociação pode ser perfeitamente aplicada aos casos que a ela forem adequados, tendo em vista que o procedimento aponta para os mesmos pressupostos preenchidos pela negociação: promoção de autonomia das partes, informalidade, consenso do conflito, busca da melhor solução e que atenda as partes, a colaboração e boa-fé dos envolvidos para eficácia e eficiência do método.

Referência

CABRAL, Antonio do Passo; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Negociação direta ou resolução colaborativa de disputas (collaborative law): mediação sem mediador. Revista de Processo. Vol. 259, set. 2016.

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Sobre a autora
Joana Beatriz dos Santos

Escritora. Pesquisadora na área de processo e arbitragem. Colunista. Monitora acadêmica em Dir. Civil, Dir. Constitucional, Dir. Penal e Teoria Geral do Processo. Estagiária da Procuradoria Geral da União - PRU5.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Joana Beatriz. Mediação sem mediador. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7523, 5 fev. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/108139. Acesso em: 22 dez. 2024.

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