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Estado socioambiental de direito e o princípio da solidariedade como seu marco jurídico-constitucional

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26/01/2008 às 00:00
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3. CONCLUSÕES ARTICULADAS

A adoção do marco jurídico-constitucional socioambiental resulta da convergência necessária dos direitos sociais e os direitos ambientais num mesmo projeto jurídico-político para o desenvolvimento humano. O enfrentamento dos problemas ambientais e a opção por um desenvolvimento sustentável passam necessariamente pela correção do quadro alarmante de desigualdade social e da falta de acesso aos direitos sociais básicos, o que, diga-se de passagem, também é causa potencializadora da degradação ambiental.

2. O Estado Socioambiental de Direito atua no sentido de combater a hipertrofia do indivíduo e a base axiológica marcadamente patrimonialista do modelo do Estado Liberal, projetando como seu estandarte axiológico o terceiro (e quase esquecido) lema da Revolução Francesa, qual seja, a solidariedade (ou fraternidade), de cunho eminentemente existencial, comunitário e universalista.

3. O modelo de Estado Socioambiental agrega as conquistas positivas (em termos de tutela da dignidade humana) dos modelos de Estado de Direito que o antecederam, incorporando a tutela dos novos direitos transindividuais e, num paradigma de solidariedade humana, projetando a comunidade humana num patamar mais evoluído de efetivação de direitos fundamentais (especialmente dos novos direitos de terceira dimensão, como é caso da proteção ambiental).

4. Deve-se transcender de um pacto social para um pacto socioambiental, em vista de contemplar o novo papel do Estado e da sociedade no âmbito do Estado Socioambiental de Direito. O comando constitucional expresso no art. 225, caput, traz justamente a idéia de responsabilidades e encargos ambientais compartilhados entre Estado e sociedade, quando subscreve que se impõe "ao Poder Público e à coletividade o dever" de defender e proteger o ambiente para as presentes e futuras gerações. Os deveres de solidariedade no âmbito da tutela ambiental são atribuídos agora, para além do Estado, também aos particulares.

5. A idéia de "dever fundamental" é um dos aspectos normativos mais importantes trazidos pela nova "dogmática" dos direitos fundamentais, vinculando-se diretamente com o princípio da solidariedade. Para além de uma obrigação ou dever unicamente moral de solidariedade, há que se trazer para o plano jurídico-normativo tal compreensão, como pilar fundamental à construção de uma sociedade e de um Estado de Direito guardiões dos direitos fundamentais (de todas as dimensões) de todos os seus integrantes, e mesmo dos direitos das gerações futuras.


Notas

01 Art. 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU (1948).

02 "Há só uma Terra, mas não um só mundo. Todos nós dependemos de uma biosfera para conservarmos nossas vidas. Mesmo assim, cada comunidade, cada país luta pela sobrevivência e pela prosperidade quase sem levar em consideração o impacto que causa sobre os demais. Alguns consomem os recursos da Terra a um tal ritmo que provavelmente pouco sobrará para as gerações futuras. Outros, em número muito maior, consomem pouco demais e vivem na perspectiva da fome, da miséria, da doença e da morte prematura". Nosso Futuro Comum (Relatório Brundtland) - Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU. 2.ed. São Paulo: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991, p. 29.

03 BENJAMIN, Antônio Herman. "Função ambiental". In: BENJAMIN, Antônio Herman (Coord.). Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 15.

04 Cfr., adotando a expressão Estado Pós-Social, PEREIRA DA SILVA, Vasco. Verde Cor de Direito: lições de Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina, 2002, p. 24; PUREZA, José Manuel. Tribunais, natureza e sociedade: o direito do ambiente em Portugal. Lisboa: Cadernos do Centro de Estudos Judiciários, 1996, p. 27; e SARMENTO, Daniel. "Os direitos fundamentais nos paradigmas Liberal, Social e Pós-Social (Pós-modernidade constitucional?)". In: SAMPAIO, José Adércio Leite (Coord.). Crise e Desafios da Constituição: perspectivas críticas da teoria e das práticas constitucionais brasileiras. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, pp. 375-414.

05 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. "Estado Constitucional Ecológico e Democracia Sustentada". In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Direitos Fundamentais Sociais: estudos de Direito Constitucional, Internacional e Comparado. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003, pp. 493-508.

06 MORATO LEITE, José Rubens. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, pp. 33-45; e MORATO LEITE, José Rubens. "Estado de Direito do Ambiente: uma difícil tarefa". In: MORATO LEITE, José Rubens (Org.). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2000, pp. 13-40.

07 HÄBERLE, Peter. "A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal". In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Dimensões da Dignidade: ensaios de Filosofia do Direito e Direito Constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 128.

08 NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. "Estado ambiental de Direito". In: Jus Navigandi, n. 589, fevereiro/2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6340. Acesso em: 22 de fevereiro de 2005.

09 PORTANOVA, Rogério. "Direitos humanos e meio ambiente: uma revolução de paradigma para o Século XXI". In: BENJAMIN, Antônio Herman (Org.). Anais do 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental (10 anos da ECO-92: o Direito e o desenvolvimento sustentável). São Paulo: Instituto O Direito por um Planeta Verde/Imprensa Oficial, 2002, pp. 681-694.

10 HÄBERLE, "A dignidade humana como fundamento...", p. 130.

11 MORATO LEITE, "Dano ambiental...", p. 22.

12 MORATO LEITE, "Dano ambiental...", p. 22.

13 PEREIRA DA SILVA, "Verde Cor de Direito...", p. 18.

14 PEREIRA DA SILVA, "Verde Cor de Direito...", pp. 17-18.

15 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad. Tradução de Jorge Navarro, Daniel Jiménez e Maria Rosa Borras. Barcelona: Paidós, 2001.

16 Sobre o tema dos deveres de proteção (ou imperativos de tutela) para com os direitos fundamentais depositados pela ordem constitucional na figura do Estado, à luz da jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal alemão, DIMOULIS e MARTINS afirmam que esses foram identificados na hipótese do dever conferido ao ente estatal de tomar medidas no sentido de controlar os riscos e perigos derivados do desenvolvimento tecnológico, em razão do comprometimento dos direitos fundamentais à vida, à saúde e ao equilíbrio ambiental. Há, na hipótese, um dever estatal de garantia da segurança ou de prevenção de riscos. DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 123.

17 HÄBERLE, Peter. Libertad, Igualdad, Fraternidad: 1789 como historia, actualidad y futuro del Estado constitucional. Tradução de Ignacio Gutiérrez Gutiérrez. Madrid: Editorial Trotta, 1998, p. 53.

18 HÄBERLE, "A dignidade humana como fundamento...", p. 102.

19 Conforme destaca BERND SHULTE, à luz da Lei Fundamental alemão, o atributo "social" caracteriza um Estado que "assegura a cada pessoa uma existência humanamente digna, assiste ao fraco, oferece a cada pessoa possibilidades de desenvolvimento, concedendo-lhe em ampla medida oportunidades iguais e garantindo-lhe a sua quota-parte (Teilhabe) nos bens econômicos segundos critérios de justiça". SHULTE, Bernd. "Direitos fundamentais, segurança social e proibição de retrocesso". In: SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos Fundamentais Sociais: estudos de Direito Constitucional, Internacional e Comparado. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003, p. 306.

20 Nesse prisma, PERREIRA DA SILVA destaca que "o Estado Pós-Social em que vivemos, no quadro de uma lógica constitutiva e infra-estrutural dirigida para a criação de condições para a colaboração de entidades públicas e privadas, está associado a uma terceira geração de direitos humanos em novos domínios da vida da sociedade, como é o caso do ambiente e da qualidade de vida, da proteção individual relativamente à informática e às novas tecnologias, da tutela da vida e da personalidade em face da genética, sendo ainda de incluir nesta categoria as garantias individuais de procedimento (o qual é entendido não apenas como instrumento de legitimação do poder mas também como modo de realização da proteção jurídica subjetiva)". PEREIRA DA SILVA, "Verde Cor de Direito...", p. 23.

21 HÄBERLE, "Libertad, Igualdad, Fraternidad...", p. 58.

22 PUREZA, José Manuel. Tribunais, natureza e sociedade: o direito do ambiente em Portugal. Cadernos do Centro de Estudos Judiciários. Lisboa: 1996, p. 27.

23 PEREIRA DA SILVA, "Verde Cor de Direito...", p. 28.

24 TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Volume I. 2.ed. Porto Alegre: SAFE, 2003, p. 43.

25 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado de Direito. Cadernos Democráticos, n. 7. Fundação Mário Soares. Lisboa: Gradiva, 1998, p. 23.

26 CANOTILHO, "Estado de Direito...", p. 21.

27 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado de Direito. Cadernos Democráticos n. 7. Fundação Mário Soares. Lisboa: Gradiva, 1998, p. 44.

28 Cfr, acerca do movimento ambientalista, na literatura européia, a coletânea de artigos da ex-parlamentar do partido verde alemão PETRA KELLY. KELLY, Petra K. Por un futuro alternativo: el testimonio de una de las principales pensadoras-activistas de nuestra época. Barcelona: Paidós, 1997; e, no âmbito brasileiro, TAVOLARO, Sergio Barreira de Faria. Movimento ambientalista e modernidade: sociabilidade, risco e moral. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2001, e LUTZEMBERGER, José. A. Fim do futuro? Manifesto Ecológico Brasileiro. Porto Alegre: Movimento/UFRGS, 1980.

29 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. "Privatismo, associacionismo e publicismo no Direito do Ambiente: ou o rio da minha terra e as incertezas do Direito Público". In: Textos "Ambiente e Consumo", Volume I. Lisboa: Centro de Estudos Jurídicos, 1996, p. 156.

30 TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 104.

31 PINA, Antonio López. Prólogo à obra de HÄBERLE, Libertad, Igualdad, Fraternidad…", p. 15.

32 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 7.ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 23.

33 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2.ed. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 176.

34 TEIXEIRA, "O direito ao meio ambiente...", p. 92.

35 PUREZA, "Tribunais, natureza...", p. 27.

36 PUREZA, "Tribunais, natureza...", p. 28.

37 MATEO, Ramón Martín. Manual de Derecho Ambiental. 3.ed. Navarra: Editorial Thomson/Aranzadi, 2003, p. 38.

38 MILARÉ, Édis. "Princípios fundamentais do direito do ambiente". In: Revista dos Tribunais, São Paulo: RT, n. 756, 1998, p. 64.

39 DERANI, "Direito Ambiental Econômico…", p. 34.

40 PÉREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. 5.ed. Madrid: Editorial Tecnos, 1995, p. 478.

41 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. "Constituição e Ordem Econômica". In: FIOCCA, Demian; GRAU, Eros Roberto (Orgs.). Debate sobre a Constituição de 1988. São Paulo: Paz e Terra, 2001, p. 12.

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42 "Art. 170 (...) VI – a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação."

43 Também sobre a idéia de justiça ambiental e de um Estado de Justiça Ambiental, conferir a obra de MORATO LEITE, José Rubens; AYALA, Patryck de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de Risco. São Paulo: Forense Universitária, 2002, pp. 28-39.

44 CANOTILHO, "Privatismo, associacionismo e publicismo...", pp. 157-158.

45 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad. Tradução de Jorge Navarro, Daniel Jiménez e Maria Rosa Borras. Barcelona: Paidós, 2001, pp. 40-41.

46 O premiado documentário "Ilha das Flores" do cineasta gaúcho Jorge Furtado registrou de forma contundente a realidade degradante das comunidades humanas que se alimentam dos lixos na proximidade da Capital gaúcha.

47 Cfr. BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paidós, 2001; BECK, Ulrich; GIDDENS, Anthony; LASH, Scott. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Editora UNESP, 1997.

48 GOLDBLAT, "Teoria social e ambiente...", p. 232.

49 Nesse prisma, BODIN DE MORAES destaca que "as novas questões, postas pelas manipulações genéticas, pela reprodução assistida, pela energia nuclear, pelas agressões ao meio ambiente, pelo desenvolvimento da cibernética, configuram ‘situações-problema’ cujos limites não poderão ser decididos internamente, estabelecidos pelos próprios biólogos, físicos ou médicos, mas deverão ser resultantes de escolhas ético-político-jurídicas da sociedade". BODIN DE MORAES, Maria Celina. Danos à pessoa humana: uma leitura Civil-Constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003, p. 61.

50 GOLDBLAT, David. Teoria social e ambiente. Tradução de Ana Maria André. Lisboa: Instituto Piaget, 1996, p. 237.

51 GOLDBLAT, "Teoria social e ambiente...", p. 230.

52 Apud TORRES, "Tratado de Direito...", p. 179.

53 MORATO LEITE; AYALA, "Direito Ambiental na...", p. 30.

54 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. Volume II: Valores e Princípios Constitucionais Tributários. Rio de Janeiro/São Paulo/Recife: Renovar, 2005, p. 176-177.

55 TORRES, "Tratado de Direito...", p. 178.

56 TORRES, "Tratado de Direito...", p. 179.

57 TORRES, "Tratado de Direito...", p. 180.

58 TORRES, "Tratado de Direito...", p. 180.

59 BENJAMIN, Antônio Herman. "A implementação da legislação ambiental: o papel do Ministério Público". In: BENJAMIN, Antônio Herman (Coord.). Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 371.

60 Nesse prisma, merece destaque a Declaração e Programa de Ação de Viena (1993), promulgada na 2ª Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, a qual estabeleceu no seu art. 5º que "todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados", reconhecendo que as diferentes dimensões de direitos humanos conformam um sistema integrado de tutela da dignidade humana. Sobre o tema, cfr. WEIS, Carlos. Direitos humanos contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2006, 117-121; e SCHÄFER, Jairo. Classificação dos direitos fundamentais: do sistema geracional ao sistema unitário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

61 No sentido de aprofundar ainda mais o processo constitucional de fortalecimento da Defensoria Pública, tramita no Congresso Nacional a PEC 487.

62 Nessa perspectiva, de forma exemplar, a lei que criou a Defensoria Pública do Estado de São Paulo (Lei Complementar n.º 988, de 09 de janeiro de 2006) elencou, entre as suas atribuições institucionais, a promoção da "tutela dos direitos humanos em qualquer grau de jurisdição, inclusive perante os sistemas global e regional de proteção dos direitos humanos" (art. 5º, VI, "b"), "tutela do meio ambiente, no âmbito de suas finalidades institucionais" (art. 5ª, VI, "e") e "ação civil pública para tutela de interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo" ((art. 5ª, VI, "g").

63 FARIAS, Paulo José Leite. Competência federativa e proteção ambiental. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1999, p. 226.

64 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. "Privatismo, associacionismo e publicismo no Direito do Ambiente: ou o rio da minha terra e as incertezas do Direito Público". In: Textos Ambiente e Consumo, Volume I. Lisboa: Centro de Estudos Jurídicos, 1996, p. 154.

65 PEREIRA DA SILVA, "Verde Cor de Direito...", p. 24.

66 No mesmo sentido, TORRES refere que, em que pese a solidariedade, como sinônimo da fraternidade, ter sido valor fundante do Estado de Direito e já aparecer na trilogia da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade), o pensamento jurídico posterior a KANT exacerbou a idéia de liberdade, diluindo-a na de legalidade, com o que ficaram esquecidas as idéias de justiça e solidariedade. TORRES, "Tratado de Direito...", pp. 180-181. Também HÄBERLE, afirma a existência de um déficit de elaboração jurídico-positiva e ético-social do postulado da fraternidade de 1789 na atualidade e no futuro Estado constitucional, guardando especial importância a sua aplicação no que tange à proteção ambiental, juntamente com o princípio da responsabilidade. HÄBERLE, "Libertad, Igualdad, Fraternidad…", p. 90.

67 Registra-se que no presente trabalho as expressões "solidariedade" e "fraternidade" serão tomadas como sinônimos, não obstante a existência de divergência doutrinária a respeito de tal correspondência entre os conceitos. No mesmo sentido, atribuindo a identidade aos conceitos, TORRES, "Tratado de Direito...", p. 181.

68 Nesse prisma, em que pese não se encontrar em vigor, destaca-se a Carta dos Direitos Fundamentais da União Européia que prevê logo no início do seu preâmbulo, à luz do projeto da modernidade aludido anteriormente, que a comunidade estatal que constitui está alicerçada "nos valores indivisíveis e universais da dignidade do ser humano, da liberdade, da igualdade e da solidariedade", bem como nos princípios da democracia e do Estado de Direito.

69 SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 64.

70 SARMENTO, "Direitos fundamentais...", p. 53.

71 BODIN DE MORAES, Maria Celina. Danos à pessoa humana: uma leitura Civil-Constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003, p. 109.

72 O princípio da solidariedade também aparece consubstanciado no Preâmbulo da Constituição Federal ao estabelecer que os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna. À vista de tal contexto, merece registro as linhas traçadas por SILVA ao comentar o objetivo constitucional de estabelecer uma "sociedade livre, justa e solidária" (art. 3º, I,), onde o constitucionalista refere que tal missão constitucional posta no âmbito da República Federativa brasileira implica a construção de uma "ordem de homens livres, em que a justiça distributiva e retributiva seja um fator de dignificação da pessoa e em que o sentimento de responsabilidade e apoio recíprocos solidifique a idéia de comunidade fundada no bem comum. Surge aí o signo do Estado Democrático de Direito, voltado à realização da justiça social, tanto quanto a fórmula liberdade, igualdade e fraternidade o fora no Estado Liberal proveniente da Revolução Francesa". SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2006, pp. 46-47.

73 BODIN DE MORAES, "Danos à pessoa humana...", p. 108.

74 Quanto aos exames ou testes inerentes à proporcionalidade, em que pese o nosso entendimento contrário à adoção da proporcionalidade como postulado normativo defendido pelo autor ora citado, e sim como princípio constitucional, cfr. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 2006, pp. 152-161.

75 BODIN DE MORAES, "Danos à pessoa humana...", pp. 115-116.

76 BODIN DE MORAES, "Danos à pessoa humana...", p. 117.

77 TORRES, "Tratado de Direito...", p. 183.

78 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: introdução ao Direito Civil Constitucional. Tradução de Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 37.

79 BODIN DE MORAES, "Danos à pessoa humana...", p. 114.

80 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. "Vida Digna: Direitos, Ética e Ciência". In: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes (Coord.). O Direito à Vida Digna. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2004, p. 76.

81 "Este principio tiene intrínseca validez y operatividad por lo que debería razonablemente esperarse su efectividad en círculos sociales progresivamente ampliados. Su transcendencia para la tutela del ambiente opera en una doble dimensión: intercomunitaria e intergeneracional. La importancia de la aplicación de este principio para la efectividad de la tutela ambiental se deriva de las propias exigencias de la justicia distributiva, lo que es válido tanto a escala extra como intracomunitária y nacional". MATEO, "Manual de Derecho Ambiental...", p. 44.

82 "Princípio 3. O direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas eqüitativamente as necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras".

83 Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU. NOSSO FUTURO COMUM/COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. 2.ed. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1991., p. 46.

84 HÄBERLE, "Libertad, Igualdad, Fraternidad…", p. 52.

85 MATEO, "Manual de Derecho Ambiental...", p. 44.

86 FERRAJOLI, "A soberania no mundo...", pp. 46-47.

87 CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 1996.

88 A Convenção sobre a Diversidade Biológica foi aprovada pelo Decreto Legislativo n. 2, de 03.02.1994, e promulgada pelo Decreto n. 2.519, de 16.03.1998, incorporando-se ao ordenamento jurídico brasileiro.

89 "Ela regula o direito da humanidade à preservação da biosfera, ou seja, a harmonia ambiental do planeta. Trata-se de aplicar, na esfera planetária, o princípio fundamental da solidariedade, tanto na dimensão presente quanto na futura, isto é, solidariedade entre todas as nações, povos e grupos humanos da mesma geração, bem como solidariedade entre a geração atual e as futuras. É evidente que a geração presente tem o dever fundamental de garantir às futuras gerações uma qualidade de vida pelo menos igual à que ela desfruta atualmente. Mas não é menos evidente que esse dever para com as gerações pósteras seria despido de sentido se não se cuidasse de superar, desde agora, as atuais condições de degradação ambiental em todo o planeta, degradação essa que acaba por prejudicar mais intensamente as massas miseráveis dos países subdesenvolvidos". COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 422.

90 OST, François. A natureza à margem da lei (a ecologia à prova do direito). Lisboa: Instituto Piaget, 1995, p. 318.

91 SAMPAIO, José Adércio Leite. "Constituição e meio ambiente na perspectiva do direito constitucional comparado". In: SAMPAIO, José Adércio Leite; WOLD, Chris; NARDY, Afrânio. Princípios de Direito Ambiental na dimensão internacional e comparada. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 53.

92 A idéia de justiça entre gerações também está presente na formulação de RAWLS acerca do "princípio da poupança justa", concebendo também a existência de deveres e obrigações entre gerações. "Podemos agora ver que as pessoas de diferentes gerações têm deveres e obrigações em relação umas às outras exatamente como as têm as pessoas que vivem numa mesma época. A geração atual não pode fazer o que bem entender, mas é obrigada, por princípios que seriam escolhidos na posição original, a definir a justiça entre as pessoas que vivem em épocas diferentes. Além disso, os homens têm um dever natural de defender e promover o crescimento das instituições justas, e para isso a melhoria da civilização até um certo nível é exigida. A dedução desses deveres e obrigações pode parecer no início uma aplicação forçada da doutrina contratualista. No entanto, essa exigências seriam reconhecidas na posição original e, por isso, a concepção da justiça como eqüidade abrange essas questões sem nenhuma alteração de sua idéia básica". RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 2.ed. Tradução de Almiro Pisetta e Lenita Maria Rímoli Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 2002, pp. 323-324.

93 Nesse sentido, cfr. o artigo de KISS, Alexandre. "Os direitos e interesses das futuras gerações e o princípio da precaução". In: VARELLA, Marcelo Dias; PLATIAU, Ana Flávia Barros (Orgs.). Princípio da Precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, pp. 1-12.

94 BECK, "La sociedad del riesgo…", p. 83.

95 BECK, "La sociedad del riesgo…", p. 83.

96 SERRES, Michel. O contrato natural. Tradução de Serafim Ferreira. Lisboa: Instituto Piaget, 1990.

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Sobre o autor
Tiago Fensterseifer

Defensor Público do Estado de São Paulo. Mestre em Direito Público pela PUC/RS. Bolsista do CNPq. Membro do Núcleo de Estudos e Pesquisa de Direitos Fundamentais da PUC/RS (CNPq). Membro-colaborador do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FENSTERSEIFER, Tiago. Estado socioambiental de direito e o princípio da solidariedade como seu marco jurídico-constitucional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1669, 26 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10887. Acesso em: 24 abr. 2024.

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