Capa da publicação IA trará novas questões para o Judiciário
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Consequências da inteligência artificial (IA) ou da politicagem

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Mais uma vez, pela omissão do Executivo e do Legislativo, caberá ao Poder Judiciário resolver questões sobre emprego, cartéis tecnológicos (big techs) e outras demandas decorrentes do desenvolvimento da inteligência artificial.

Para mim, a Inteligência Artificial (IA) representa a maior invenção da humanidade. Obviamente, houve outras invenções anteriores que, sem dúvida, trouxeram avanços significativos para a saúde, desenvolvimento de melhores materiais para construção civil e para a liberdade de expressão, como a imprensa de Gutenberg, entre outros.

Contudo, como a inteligência artificial revolucionará a vida de nossa espécie é, indiscutivelmente, inimaginável. Ela possibilitará novos medicamentos, avanços em cálculos matemáticos e físicos, a integração da nanotecnologia com IA, uma “Guerra Limpa” — reduzindo as baixas de soldados através do uso de “robôs autônomos” —, além de tecnologias de reconhecimento facial e comportamental, entre outros.

A construção de um site tradicionalmente requer conhecimento em HTML. Contudo, com o avanço do tempo, surgiram programas para desktops — antes da era dos smartphones e tablets — que permitem a criação de sites sem a necessidade de entender HTML. Simplificar o HTML? É benéfico. Permitir que uma imagem “comunique”? Sim. Recursos para contestar multas de trânsito? Também. Conhecimentos básicos, porém essenciais, são necessários para manipular imagens, vídeos e construir sites. Anteriormente, era exigido um conhecimento mais profundo e detalhado. Hoje, com esses programas, não mais. Blogs, frequentemente menosprezados, refletem isso. Existe uma espécie de “racismo” contra tecnologias que facilitam o acesso das pessoas; isso é chamado de processo democrático, e há aqueles que desaprovam, seja pela perda de exclusividade no mercado ou por não serem mais “exclusivos” no conhecimento, ou por ambos os motivos, a reserva de mercado e a sensação de ser “mais qualificado”. Sim, Freud poderia explicar isso!

Há pessoas temerosas com a IA. Outras felicíssimas. As temerosas, e não por mero receio, pelas realidades atuais:

  1.  Construção de site. Há IA capaz de copiar site, modificar o site e construir site, sem qualquer ação do usuário, como ocorria com programas de desktop. Existia programas capazes de copiar sites. Algumas pessoas usavam tais programas de desktop para não terem tanto trabalho na construção de site. Pequenas modificações no HTML original (repaginada), o serviço estava feito.

  2. Influenciadores digitais. Essa nova categoria profissional, sim, profissional, é ótima oportunidade para pessoas criativas, pessoas desempregadas, não ter CTPS assinada, pessoas que querem trabalharem sem enfrentarem congestionamentos, empregadores (as) assediadores, moral e sexual, e vários outros motivos e propósitos. Ocorre que já é possível gerar influenciadores pelo uso da IA. Ou seja, não será mais necessário seres humanos. Personagem, cenário, voz. Tudo criado pela IA. 

  3. Músicos, compositores e compositoras de sucesso estão eternizados, em discos de vinil, CDs ou DVDs. O cantor ou a cantora, assim como compositores ou compositoras, em “carne e osso”. Também ocorre que já existe IA capaz de compor músicas. Quanto aos seres humanos, a IA pode criá-los.

  4. Caixas de supermercado. Em muitos países, os consumidores não veem nenhum funcionário ou nenhuma funcionária, muito menos os patrões, patroas, empreendedores e empreendedoras. É entrar e comprar. Praticidade e rapidez para os consumidores.

  5. Guerras. Não será mais preciso pilotar caça para bombardear outro Estado. Caças autônomos com IA já são realidades, dentre outros bélicos.

As felicidades trazem um novo mundo de possibilidades. Menos trabalho manual, mais facilidade para tarefas intelectuais, já reduzidas pela automação e robotização; mais tempo com a família; invenções inimagináveis em pouco tempo; ou melhorias em invenções que já fazem parte do cotidiano humano. Bombardeios precisos em alvos, sem a necessidade de um piloto humano, tudo feito pela IA. Resultado: menos vítimas, eliminação de inimigos, e redução de danos materiais.

Ambas as partes se mostram hesitantes e esperançosas. No campo do Direito, é viável inserir informações sobre direitos humanos nos algoritmos. Estes, então, processam o restante. O Direito constitui uma ideologia que engloba outras, como religião, política, economia, entre outras. A possibilidade de a IA encontrar uma solução para os conflitos humanos, qual será? E é uma preocupação real na atualidade e para o futuro da espécie humana. Direito não é imutável. Às vezes, o Direito se alinha com o liberalismo, outras vezes com o socialismo. Os direitos humanos — civis, políticos, sociais, econômicos e culturais — não devem ser divididos hoje em dia entre direitos civis e políticos e direitos sociais, econômicos e culturais. 

Chegamos ao ponto crucial das relações humanas. Desde a Primeira Revolução Industrial, os avanços tecnológicos têm criado imensas desigualdades sociais. O colonialismo serviu para extrair recursos naturais dos países colonizados — um termo polido, “colonização”, usado para mascarar atrocidades e expropriações legalizadas. Atualmente, somente um pequeno grupo de pessoas detém grandes somas de riqueza. A realidade do trabalho em condições análogas à escravidão persiste — alguns argumentam não haver “escravidão” devido à existência de autonomia privada entre quem busca e quem oferece trabalho.

Dia das Mães é um momento de felicidade para aqueles que podem estar com suas mães, sejam elas biológicas ou não. A afetividade é um conceito chave no Direito moderno, refletindo que “mãe” pode ser uma mulher cisgênero ou uma mulher transexual. No contexto capitalista, este dia é uma oportunidade para os filhos passarem tempo com suas mães. Por tradição, a “mãe mulher” não cozinha neste dia, dando-lhe uma pausa dos 364 dias do ano em que ela prepara alimentos para os filhos, filhas e marido, ou 365 dias em anos bissextos.

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Após o Dia, a dura realidade da mulher, seja ela cisgênero ou transexual, inclui o medo de perder o emprego, a necessidade de prover leite e alimento para o bebê, o que é visto como um “ato improdutivo” pela empresa. A troca de fraldas é mais um “ato improdutivo”. Assédios, sejam eles sexuais ou morais, são considerados “invenções ideológicas”, sem necessidade de mencionar que isso é uma invenção comunista.

É possível objetificar a dignidade humana sob a pretensão de “importância”. Anna Freud, filha de Sigmund Freud, discorreu sobre os mecanismos de defesa do ego. Como pode ocorrer a objetificação da dignidade, levando a pessoa a aceitar como “normal” ser coisificada e instrumentalizada? Há dois mecanismos de defesa do ego, a racionalização e a intelectualização:

  • Racionalização: “Na verdade, eu nem queria essa promoção, porque teria muito mais responsabilidade e stress.”

  • Intelectualização: Divórcio, um indivíduo pode se concentrar em analisar os fatores sociológicos e psicológicos que levam ao aumento das taxas de divórcio na sociedade, evitando lidar com a dor emocional e a sensação de perda pessoal.

Esses processos são amplamente utilizados, como no filme “Amor em Escalas”. Imagine ser dispensado por videoconferência: “Você está demitido. Aqui está sua rescisão e uma ajuda de custo para se reorganizar. Agradecemos pelos seus serviços”. Nada delicado. Agora, pense em um funcionário da empresa indo até uma filial para anunciar uma rescisão contratual: “A empresa lamenta pela rescisão, mas chegou o momento de você buscar novos horizontes e possibilidades. A idade não é um impedimento. Muitas pessoas conseguiram sucesso empreendendo. Falhas e obstáculos são comuns a quem empreende, mas essa é a magia dos grandes empreendedores: aceitar desafios e realizar seus sonhos. Na empresa, existem limitações do cargo e da função.”

Como será com a IA? Provavelmente não será de forma direta, sito é, sem se importar com o emocional de quem é despedido (a). Imprimir-se-à uma intelectualização com belas imagens, sons cativantes, claro, ao gosto de quem é despedido (a). A IA monitora a internet, provavelmente as empresas usarão da IA para vasculhar para obter informações dos perfis dos candidatos e das candidatas, ou mesmo de quem é funcionário (a). Antes da IA já tinha empresas vasculhando perfis dentro e fora das redes sociais; nas universidades existem “olheiros” para encontrarem futuros e promissores profissionais.

Trata-se de uma questão ética e moral sob a perspectiva dos direitos humanos. Prometeu-se que as máquinas proporcionariam mais tempo para a família, lazer e estudos, mas isso não se realizou. As doenças ocupacionais advindas dos modelos taylorista e fordista, o esgotamento nervoso entre os profissionais e os elevados custos para a saúde pública são preocupantes. Profissional doente não gera riqueza para as empresas, logo, a solução é dispensá-los (rescisão contratual) pelo uso de tecnologias (robotização, automatização e Inteligência Artificial).

Consequências da Inteligência Artificial (IA)? Automatização e robotização serviram para os empresários, mesmo mão de obra, geralmente “braçal”. Inteligência Artificial, um novo modelo de cortar custos, agora “intelectual”.

No Brasil, é raro que políticos debatam abertamente os desafios da automação, robotização e inteligência artificial. Existe uma intensa disputa de “nós contra eles”, frequentemente focada na defesa de valores tradicionais, da família e da heteronormatividade, o que leva à judicialização. Assim, caberá ao Poder Judiciário, pela omissão dos outros poderes (Executivo e Legislativo), resolver questões sobre emprego, desemprego, formações de cartéis tecnológicos (Big Techs). Em outras palavras, em vez de serem discutidas em âmbitos políticos e legislativos, como o Congresso e o Poder Executivo, essas questões serão encaminhadas aos tribunais para decisão. Exemplos incluem o reconhecimento da união homoafetiva, o afastamento de congressistas eleitos e a criminalização da homofobia e transfobia. Pela politicagem, o Supremo Tribunal Federal será provocado para resolver, com base nos princípios constitucionais. E vozes se levantarão “STF usurpar poderes do Executivo de do Legislativo”. Sabe quem sofrerá? Sim, quem quer trabalhar.

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HENRIQUE, Sérgio Silva Pereira. Consequências da inteligência artificial (IA) ou da politicagem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7623, 15 mai. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/109357. Acesso em: 26 jul. 2024.

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