Em textos escritos anteriormente, esclarecemos que o planejamento sucessório, por meio de uma holding familiar, não mais oferece as mesmas vantagens de outrora, porque a Constituição de 1988 passou a tributar a transmissão por meio de doação de quaisquer bens ou direitos, o que envolve a doação de cotas sociais.
Consoante escrevemos “houve alargamento da hipótese de incidência em relação à Constituição anterior à Constituição de 1988. Agora, a transmissão causa mortis passa a abranger quaisquer bens ou direitos, o mesmo acontecendo com as transmissões graciosas inter vivos. Houve retorno ao sistema tributário da Constituição de 1946 (art. 19 e §§ 1º e 2º da CF/1946)” .
O propósito deste artigo é o de analisar a base de cálculo na hipótese de transmissão de cotas de uma holding familiar ante a divergência de posicionamento entre o fisco estadual e os contribuintes.
O primeiro bate-se pela adoção do valor de mercado, interpretando o texto constitucional do art. 155, inciso I e do art. 38 do CTN que se refere ao valor venal dos bens ou direitos transmitidos.
Os contribuintes, por sua vez, entendem que a base de cálculo nessas hipóteses é o valor do patrimônio líquido (diferença entre o ativo e o passivo) apurado em balanço contábil.
Examinamos a questão à luz do que dispõe a lei do Estado de São Paulo, Lei nº 10.705, de 28-12-2000.
Reza o art. 9º da citada lei:
“Art. 9º -A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).
§1º- Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.”
A conjugação do caput com o §1º acima transcritos, na visão do fisco paulista, estaria a autorizar a adoção como base de cálculo do ITCMD o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.
Só que referir-se ao valor de mercado do bem ou direito na data de abertura de sucessão ou da celebração do contrato de doação, como diz o §1º, do art. 9º, não deita luz sobre essa questão controvertida, porque tanto na sucessão, como na doação não há preço de mercado para ser tomado como referência na fixação da base de cálculo.
É preciso, então, que os bens ou direitos transmitidos sejam valorados ou avaliados.
A valoração não requer conhecimento técnico especializado. Ela é feita normalmente por consenso das partes interessadas, baseada no conhecimento empírico. A avaliação é feita por um perito nomeado pelo juiz .
Daí a regra do art. 14 da Lei que assim prescreve:
“Art. 14- No caso de bem móvel ou direito não abrangido pelo disposto nos artigos 9°, 10 e 13, a base de cálculo é o valor corrente de mercado do bem, título, crédito ou direito, na data da transmissão ou do ato translativo.
§ 1º - À falta do valor de que trata este artigo, admitir-se-á o que for declarado pelo interessado, ressalvada a revisão do lançamento pela autoridade competente, nos termos do artigo 11.”
[...]
§ 3º- Nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, admitir-se-á o respectivo valor patrimonial.
É o caso sob exame em que as cotas de uma holding familiar não são negociadas na bolsa de valores.
Valor patrimonial é o que resulta do balanço contábil em que se apura a diferença entre o ativo da sociedade e o passivo da mesma sociedade.
Difere do balanço para apuração do valor real dos bens ou direitos (reavaliação do ativo).
Na cessão de cotas de uma holding familiar, a título gratuito, há de ser apurada a sua base de cálculo pelo valor do patrimônio líquido da holding.
É a posição majoritária adotada pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: Proc. nº 1000481-49.2023.8.26.0483 e Proc. nº 10055713-45.2023.8.26.0482.