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Punhal Verde Amarelo e os crimes de empreendimento.

Uma análise jurídica e criminológica

27/11/2024 às 23:14
Leia nesta página:

O plano Punhal Verde Amarelo exemplifica um crime de empreendimento, cuja consumação pode ser interpretada a partir do início dos atos executórios.

A revelação do plano golpista denominado Punhal Verde Amarelo trouxe à tona uma articulação criminosa que combina planejamento estratégico, uso de logística militar e objetivos terroristas. Esse episódio não apenas desafia a estabilidade institucional brasileira, mas também exige uma análise aprofundada sobre a consumação de diferentes tipos de crimes e o conceito de crimes de empreendimento. Este artigo busca explorar essas questões à luz da doutrina penal e de jurisprudência relevante.


Classificação dos Crimes Quanto à Consumação

1. Crimes de Mera Conduta

Crimes de mera conduta são aqueles em que a consumação ocorre com a simples prática da ação ou omissão proibida, independentemente de um resultado naturalístico. Exemplos incluem a invasão de domicílio (art. 150. do Código Penal) e o porte ilegal de arma de fogo (art. 14. da Lei nº 10.826/2003).

Doutrina: Guilherme de Souza Nucci esclarece que, nos crimes de mera conduta, "o legislador contenta-se com a simples ação ou omissão, sem exigir um resultado naturalístico" (Manual de Direito Penal, 20ª ed., 2024, p. 295).

No caso concreto: Atos como o uso de linhas telefônicas não registradas e a impressão de documentos oficiais podem ser considerados crimes de mera conduta, consumados no momento de sua execução.

2. Crimes de Dano

Nos crimes de dano, a consumação depende da efetiva lesão ao bem jurídico tutelado. O homicídio (art. 121. do Código Penal) é um exemplo clássico, consumando-se com a morte da vítima.

Doutrina: Rogério Greco afirma que "nos crimes de dano, a conduta é relevante porque provoca uma efetiva lesão ao bem jurídico, como ocorre no homicídio ou no furto" (Curso de Direito Penal - Parte Geral, 26ª ed., 2024, p. 214).

Jurisprudência: O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que "o crime de homicídio é consumado com a morte da vítima, sendo irrelevante o tempo necessário para que esta se materialize" (STJ, REsp 1.450.497/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 27/03/2018).

3. Crimes de Perigo

Crimes de perigo não exigem resultado concreto, apenas a exposição de um bem jurídico a risco. São classificados em concreto (quando o risco precisa ser comprovado) e abstrato (quando o risco é presumido pela lei). Exemplos incluem o crime de incêndio (art. 250. do Código Penal).

Doutrina: Segundo Celso Delmanto, "os crimes de perigo destacam-se por sua função preventiva, punindo condutas que possam ameaçar bens jurídicos relevantes" (Código Penal Comentado, 10ª ed., 2021, p. 522).

Jurisprudência: O Supremo Tribunal Federal reconhece que "nos crimes de perigo abstrato, o simples comportamento do agente já configura o ilícito penal, sendo desnecessária a comprovação de perigo concreto" (STF, HC 104.410, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18/03/2011).

No caso concreto: O uso planejado de explosivos pelos golpistas poderia configurar crime de perigo abstrato, consumado com o simples transporte ou posse do material.

4. Crimes Formais

Crimes formais são aqueles em que a consumação ocorre com a prática da conduta proibida, independentemente da ocorrência de um resultado naturalístico. Exemplos incluem a corrupção ativa (art. 333. do Código Penal).

Doutrina: Luiz Regis Prado aponta que "os crimes formais dispensam a demonstração do resultado naturalístico, bastando a realização do ato típico" (Curso de Direito Penal Brasileiro, 19ª ed., 2022, p. 329).

No caso concreto: A conspiração e os atos preparatórios, como as reuniões para planejar o golpe, podem ser considerados crimes formais consumados no ato de sua execução.

5. Crimes de Empreendimento

Os crimes de empreendimento são uma categoria moderna, caracterizada pela estruturação e planejamento de atos ilícitos com lógica corporativa. Combinam elementos de crimes de mera conduta, de perigo e de dano, tornando a definição de consumação desafiadora.

Doutrina: Eugenio Raúl Zaffaroni observa que "os crimes organizados e planejados apresentam complexidade adicional, pois envolvem múltiplos agentes, fases distintas e objetivos de longo prazo" (Manual de Direito Penal Latino-Americano, 2015, p. 491).

No caso concreto: O plano Punhal Verde Amarelo exemplifica um crime de empreendimento, cuja consumação pode ser interpretada a partir do início dos atos executórios, como o monitoramento de Alexandre de Moraes.


Consumação e Teorias Aplicáveis

Teoria da Atividade

A consumação ocorre no momento em que o agente pratica o ato, independentemente do resultado. É aplicada a crimes de mera conduta e de perigo.

Jurisprudência: "O crime de porte ilegal de arma de fogo é de mera conduta e se consuma com a simples prática do ato de portar a arma, sem necessidade de comprovação de resultado" (STJ, HC 279.790/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 13/03/2015).

Teoria do Resultado

A consumação exige a efetiva produção do resultado previsto no tipo penal. É aplicada a crimes de dano,como homicídio e furto. No caso do plano Punhal Verde Amarelo, o resultado final – como o assassinato das autoridades – seria indispensável para a consumação dos crimes de dano planejados.

Teoria Mista

A teoria mista combina elementos da teoria da atividade e da teoria do resultado. É especialmente relevante para crimes complexos, como o golpe de Estado, onde atos preparatórios avançados e organização hierárquica podem ser suficientes para configurar atos executórios, mesmo sem o resultado final.

Doutrina: Julio Fabbrini Mirabete aponta que "a teoria mista é a mais adequada para lidar com crimes de execução continuada ou com fases distintas, pois considera tanto o início dos atos executórios quanto o resultado pretendido pelo agente" (Manual de Direito Penal, 2020, p. 412).

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Conclusão: Avanços Necessários

O caso Punhal Verde Amarelo é um marco na análise criminológica e jurídica de crimes organizados e planejados no Brasil. A sofisticação e a racionalidade instrumental dos atos demandam que o direito penal avance na interpretação dos crimes de empreendimento, adotando critérios claros para identificar a consumação e punir com rigor os atos preparatórios que colocam o Estado de Direito em risco.

Ao mesmo tempo, o episódio reforça a importância de um sistema de justiça ágil e eficaz para enfrentar desafios de grande complexidade. A punição exemplar dos envolvidos não apenas preserva a democracia, mas também serve como uma advertência contra novas tentativas de desestabilização institucional.


Referências Bibliográficas

  • DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

  • GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal - Parte Geral. 26ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2024.

  • MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2020.

  • NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 20ª ed. São Paulo: RT, 2024.

  • PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 19ª ed. São Paulo: RT, 2022.

  • ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de Direito Penal Latino-Americano. São Paulo: RT, 2015.

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Sobre o autor
Gustavo Lopes Pires de Souza

Gustavo Lopes Pires de Souza, especializado em Direito Desportivo, Direito Empresarial, e também atua como consultor de negócios com foco em empresas, ética e gestão esportiva. Formado em Direito com licenciatura em Ciências Sociais, doutorado hc em Direito, Gestão e Polímata pela EBWU (EUA), além de mestrado em Direito Desportivo pela Universitat de Lleida, traz uma rica experiência acadêmica e profissional, incluindo atuação como professor e palestrante em diversas instituições de ensino. Como influenciador digital e comentarista, participa ativamente em discussões sobre temas jurídicos e esportivos, contribuindo para uma maior compreensão e engajamento do público nessas áreas. Além disso, é autor de diversos livros e artigos que exploram as complexidades do Direito e suas implicações sociais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Gustavo Lopes Pires. Punhal Verde Amarelo e os crimes de empreendimento.: Uma análise jurídica e criminológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7819, 27 nov. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/111938. Acesso em: 28 nov. 2024.

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