Capa da publicação Polícia pode solicitar relatórios ao COAF?
Artigo Destaque dos editores

Relatórios de Inteligência Financeira (RIF) e o seu compartilhamento pelo COAF

23/12/2024 às 16:09

Resumo:


  • O COAF é responsável por receber comunicações de atividades financeiras obrigatórias.

  • O COAF não realiza investigações, mas desempenha atividade de inteligência financeira.

  • O compartilhamento de relatórios do COAF com órgãos de persecução penal foi considerado constitucional pelo STF.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O STF declarou constitucional o compartilhamento de Relatórios de Inteligência Financeira do COAF com órgãos de persecução penal sem autorização judicial. Contudo, a polícia poderia solicitar esses relatórios diretamente ao COAF?

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) é o órgão responsável por receber as comunicações de atividades financeiras realizadas pelas pessoas físicas e jurídicas obrigadas, conforme estabelecido na Lei de Lavagem de Capitais (Lei nº 9.613/98).

O COAF não realiza investigações nem possui atribuições relacionadas a processos penais ou à persecução penal. Sua função principal é desempenhar uma atividade típica de inteligência. Essa atividade tem como objetivo subsidiar a tomada de decisões por parte das autoridades competentes para investigar. Por outro lado, os órgãos com atribuição para investigar, como as agências de investigação, têm como finalidade a coleta de elementos de prova relacionados a determinados delitos.

Na condição de Unidade de Inteligência Financeira (UIF) do Brasil, o COAF recebe as comunicações das pessoas físicas e jurídicas obrigadas a repassarem informações ao órgão. Quando identificados indícios da prática de delitos, o COAF elabora um Relatório de Inteligência Financeira (RIF) e o encaminha aos órgãos de persecução penal, como a Polícia Judiciária e o Ministério Público, para que sejam tomadas as devidas providências.

Diante desse contexto, surgiu a seguinte discussão: à luz dos artigos 5º, incisos X e XII, 145, § 1º, e 129, inciso VI, da Constituição da República, seria constitucional o compartilhamento dos RIFs pela UIF com o Ministério Público e a Polícia sem autorização judicial prévia?

Conforme análise do tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a seguinte tese:

É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial.

(STF. Plenário. RE 1.055.941/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/12/2019, repercussão geral – Tema 990, Informativo 962).

No julgamento, realizado sob a sistemática da repercussão geral, foram fixadas as seguintes teses:

  1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil (RFB), que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, desde que seja garantido o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional.

  2. O compartilhamento pela UIF e pela RFB, conforme o item anterior, deve ser realizado exclusivamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de mecanismos eficazes para apuração e correção de eventuais desvios.

Após a decisão do STF no Tema 990, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi chamado a se manifestar sobre a questão no julgamento do RHC 203578/SP. Na ocasião, o STJ declarou ilícitos dois RIFs produzidos pelo COAF, que haviam sido solicitados diretamente pela polícia e utilizados em investigações de lavagem de dinheiro.

A decisão do STJ estabeleceu que a polícia não pode solicitar relatórios diretamente ao COAF sem autorização judicial. O relator, ministro Antônio Saldanha Pinheiro, esclareceu que essa decisão não contradiz a tese fixada pelo STF no Tema 990, que considerou lícito o compartilhamento de informações do COAF com órgãos de persecução penal em outro contexto. No caso analisado pelo STJ, a solicitação foi considerada irregular por ter sido feita diretamente pela polícia, sem a intermediação de órgãos fiscalizadores ou autorização judicial.

Além disso, o ministro destacou:

"(...) Não se desconhece que as duas Turmas do Supremo Tribunal Federal têm apresentado entendimentos divergentes sobre o assunto: enquanto a Segunda Turma, corroborando o posicionamento deste Superior Tribunal, adota postura mais restritiva, a Primeira Turma legitima a solicitação direta dos dados sigilosos. Diante da falta de uniformidade, contudo, não há óbice a que esta Corte continue aplicando a jurisprudência firmada por sua Terceira Seção, até que haja definição final."

Posteriormente, o tema voltou a ser analisado pelo STF na Reclamação Constitucional (RCL) 61944. Nesse julgamento, a Primeira Turma do STF manteve o entendimento de que a polícia pode requerer diretamente ao COAF o compartilhamento de relatórios de inteligência financeira, sem necessidade de autorização judicial prévia.

O colegiado confirmou decisão do ministro Cristiano Zanin, que anulou ato do STJ que havia declarado ilegal o compartilhamento em tal hipótese. Na reclamação, o Ministério Público do Estado do Pará (MP-PA) questionou a decisão do STJ que havia acolhido recurso em habeas corpus apresentado pela defesa de uma dirigente da Cerpa – Cervejaria Paraense S.A., investigada pela suposta prática do crime de lavagem de dinheiro.

Para o STF, o compartilhamento de dados entre a autoridade policial e o COAF, mesmo sem autorização judicial, é válido, tanto quando ocorre por iniciativa espontânea do COAF quanto quando solicitado diretamente por autoridades policiais. O ministro relator, Cristiano Zanin, apontou que o entendimento do STJ foi equivocado ao interpretar o Tema 990 como permissivo apenas para o compartilhamento espontâneo. Além disso, ressaltou que decisões restritivas nesse âmbito poderiam dificultar investigações e ações necessárias para prevenir crimes como terrorismo, lavagem de dinheiro, crime organizado e delitos financeiros, além de gerar potenciais implicações negativas para o Brasil no cenário internacional.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Diante das divergências ainda existentes sobre o tema, é necessário acompanhar os próximos julgados para observar a consolidação do entendimento jurisprudencial.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Taylison Renner

Advogado Criminalista. Graduado em Direito pela Faculdade Paraíso do Ceará (FAP), Pós-Graduado na Lei de Drogas pela Faculdade Centro-Oeste (FACEO), Pós-Graduando em Lavagem de Capitais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RENNER, Taylison. Relatórios de Inteligência Financeira (RIF) e o seu compartilhamento pelo COAF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7845, 23 dez. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/112321. Acesso em: 22 abr. 2025.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos