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Uma breve análise do art. 543-C do CPC

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A Lei n.º 11.672, de 08 de maio de 2008, objetivando o alcance de uma prestação jurisdicional racional e célere, sem, ao mesmo tempo, ferir o contraditório e a ampla defesa, estabeleceu o procedimento para o julgamento de recursos especiais repetitivos.

Segundo a referida norma, quando, perante o tribunal a quo, houver multiplicidade de demandas fundadas em idêntica questão de direito, os recursos especiais eventualmente interpostos serão processados nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil.

Ao contrário do que pareceu para alguns em primeiro momento, o julgamento por amostragem (ou julgamento por seleção – nomenclatura mais adequada, pois deverão ser escolhidos os recursos que melhor representem a questão de direito) alcança, unicamente, os recursos especiais. O julgamento do recurso ordinário, por exemplo, não obedecerá a esta regra – até mesmo porque violaria o duplo grau de jurisdição.

Outrossim, não é necessário que os atos jurisdicionais decisórios que deram ensejo à interposição de recursos especiais sejam idênticos. Basta que tratem da mesma questão (pouco importando o resultado do decisum), e que ela seja de direito (até porque, nos termos da Súmula 7 do STJ, as questões de fato, em regra, não são levadas aos tribunais superiores).

Segundo a sistemática de processamento instituída para os recursos especiais repetitivos, caberá ao presidente do tribunal a quo admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados [01] ao Superior Tribunal de Justiça. Os demais recursos especiais ficarão suspensos até o pronunciamento definitivo do STJ.

Casualmente, entendendo a parte recorrente que a suspensão do seu recurso seria indevida (por não estar contemplado pela questão de direito repetitiva), deverá ele impetrar mandado de segurança (ou propor uma medida cautelar), para afastar o sobrestamento imposto.

Não selecionados os recursos representativos pelo presidente do tribunal a quo a fim de atender ao comando do art. 543-C, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida.

Além disso, o relator do(s) recurso(s) especial(is), com objetivo de conhecer os argumentos que circundam a controvérsia, poderá solicitar informações, que serão prestadas no prazo de quinze dias, pelo tribunal de origem. Poderá, ainda, com base no mesmo móbil, e considerando a relevância da matéria, admitir manifestação de pessoas (inclusive das partes que não tiveram seus recursos escolhidos), órgãos ou entidades com interesse na controvérsia.

Depois de recebidas as informações a serem prestadas pelo tribunal a quo e, se for o caso, de manifestar os interessados na controvérsia, o Ministério Público terá vista pelo prazo de quinze dias. Transcorrido este prazo e remetida cópia do relatório aos demais ministros, o processo, para que alcance um resultado legítimo e célere, será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos (exceto com relação àqueles que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus).

Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem poderão seguir dois caminhos: ou terão seguimento denegado, na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou serão novamente examinados pelo tribunal de origem (através do mesmo órgão julgador – que poderá se retratar) na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça [02].

Não exercido o juízo de retratação pelo tribunal de origem, mantendo-se, em conseqüência, a decisão divergente, segundo o § 8º do art. 543-C do CPC, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial. Tal determinação acaba sendo uma incoerência ao espírito da lei, pois, se não for recebido o recurso especial referido, a decisão contrária ao entendimento do STJ prevalecerá. O juízo de retratação, na verdade, deveria ser obrigatório, sob pena de ensejar o manejo de reclamação perante aquela corte superior.

Um ponto merece realce. O art. 543-C tem aplicação imediata, inclusive com relação aos recursos já interpostos por ocasião da sua entrada em vigor. Neste caso, não há desrespeito ao direito processual adquirido, porque a disposição legal em referência não diz respeito a pressupostos de admissibilidade recursal.

Assim, a uma primeira vista, tem-se que a nova sistemática apresenta mais pontos positivos que negativos. Destacar-se-ia como principal benefício o fato de que, firmado o posicionamento pelo STJ acerca da questão de direito, os demais recursos de natureza ordinária surgentes terão seu seguimento negado ou serão monocraticamente providos (se a decisão anterior estiver, respectivamente, de acordo ou contra o entendimento do STJ).

E vai-se mais longe: as novas demandas certamente deparar-se-ão com as diposições do art. 285-A do Código de Processo Civil, sendo alvos de julgamento imediato de improcedência (acaso estejam em desarmonia com a orientação pronunciada pelo Superior Tribunal de Justiça).

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Notas

01 Conquanto alguns doutrinadores, diante da omissão legislativa, tenham entendido que apenas o recurso será remetido ao Superior Tribunal de Justiça, é mais razoável que sejam remetidos os autos por completo, permitindo àquela Corte o fiel conhecimento da questão de direito a ser analisada. Na escolha, para legitimar a decisão a ser proferida pelo STJ, deve o tribunal de origem escolher os autos do(s) recurso(s) que melhor represente(m) a controvérsia.

02 Contra a decisão que nega seguimento ao recurso especial, comportará interposição de agravo para o STJ. Já contra a decisão que implique em retratação da decisão anterior, caberá à parte interessada interpor recurso especial. Se este tiver seu seguimento negado, comportará a interposição de agravo para o STJ. Em todas estas hipóteses delineadas, poderá o recorrente demonstrar que a questão por ele suscitada é diferente daquela anteriormente analisada pelo STJ.

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Sobre o autor
Rinaldo Mouzalas de Souza e Silva

Mestre em Processo e Cidadania pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Processo Civil pela Universidade Potiguar. Graduado em ciências jurídicas e sociais pela Universidade Federal da Paraíba. Membro da ANNEP – Associação Norte e Nordeste dos Professores de Processo. Advogado e consultor jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rinaldo Mouzalas Souza. Uma breve análise do art. 543-C do CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1778, 14 mai. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11266. Acesso em: 19 abr. 2024.

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