Mito 5: A corrupção eleitoral não afeta diretamente a vida das pessoas
Para demonstrar que este é apenas mais um grave mito que circunda a doutrina estudiosa do tema, podemos recorrer à teoria de HABERMAS (2012), especialmente à sua concepção de esfera pública e democracia deliberativa. Segundo ele, a esfera pública é um espaço de debate e formação da opinião pública, no qual os cidadãos podem se informar, debater e exercer sua capacidade de influenciar nas decisões políticas.
Nesse sentido, a corrupção eleitoral afeta diretamente a vida das pessoas porque prejudica a formação de uma esfera pública efetiva e a deliberação democrática. Quando o processo eleitoral é corrompido, a opinião pública é manipulada, a vontade popular é desrespeitada e as decisões políticas não refletem os interesses da sociedade como um todo.
Além disso, a corrupção eleitoral tem efeitos diretos sobre a qualidade de vida dos cidadãos, pois favorece interesses particulares em detrimento do bem comum. Recursos públicos são desviados para financiar campanhas eleitorais, em vez de serem investidos em áreas prioritárias como saúde, educação e segurança pública. Isso gera prejuízos materiais e imateriais para a sociedade, que fica sem os serviços essenciais e sem a possibilidade de participar plenamente da vida política.
Vale colacionarmos que a corrupção eleitoral viola os princípios fundamentais do Estado de Direito, como a igualdade e a justiça. Quando corruptos usam o poder, de quaisquer naturezas, para influenciar o processo eleitoral, estão violando a igualdade de oportunidades e criando vantagens indevidas para si mesmos. Isso gera um contexto de injustiça e desigualdade que afeta diretamente a vida dos cidadãos, especialmente aqueles que não têm acesso aos recursos econômicos necessários para competir em igualdade de condições.
DWORKIN (2010. p. 16) defende que os direitos são importantes não apenas em si mesmos, mas também como garantia de que as pessoas possam planejar suas vidas de acordo com suas próprias concepções de bem.
No contexto da corrupção eleitoral, podemos afirmar que essa prática afeta diretamente a vida das pessoas, ao interferir na realização dos seus planos e projetos pessoais. Por exemplo, se um corrupto é eleito e passa a governar de forma desonesta, direcionando recursos públicos para beneficiar a si mesmo ou a grupos privilegiados, os cidadãos que dependem desses recursos para a realização de seus projetos podem ser prejudicados.
Além disso, a corrupção eleitoral compromete a legitimidade do sistema democrático como um todo, já que os eleitos não representam, verdadeiramente, a vontade popular. Por conseguinte, a corrupção eleitoral pode levar a uma erosão do Estado de Direito e dos direitos fundamentais.
Por isso, podemos afirmar que a corrupção eleitoral tem um impacto direto na vida das pessoas, interferindo na sua capacidade de planejar suas vidas e comprometendo a legitimidade do sistema democrático.
Em resumo, a afirmação de que a corrupção eleitoral não afeta diretamente a vida das pessoas é um mito que pode ser desfeito com fundamentos jurídicos e teóricos. A corrupção eleitoral viola os princípios fundamentais da democracia e do Estado de Direito, prejudica a formação de uma esfera pública efetiva e afeta diretamente a qualidade de vida dos cidadãos.
Mito 6: O uso de recursos públicos em campanhas eleitorais não é uma forma de corrupção eleitoral
A questão também precisa ser analisada de maneira profunda, para que se possa concluir pela sua inverdade...
ALEXY (2014, p. 74) defende que a utilização de recursos públicos em campanhas eleitorais pode configurar um ataque aos direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente o direito à igualdade de chances. Isso ocorre porque, ao utilizar recursos públicos para financiar campanhas, os candidatos que têm acesso a esses recursos acabam tendo vantagens em relação aos demais, o que pode prejudicar a igualdade de oportunidades e a livre competição eleitoral. Nesse sentido, é possível perceber que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode, sim, configurar uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que viola o princípio da igualdade, rechaçada pela legislação eleitoral que prevê “condutas vedadas aos agentes públicos em campanha”, vedando de maneira pontual situações que possam traduzir essas práticas.
O mesmo autor trabalha uma teoria dos direitos fundamentais, estabelecendo que eles são autênticos princípios jurídicos que devem ser respeitados e protegidos pelo Estado e pela sociedade. Dessa forma, a utilização de recursos públicos em campanhas eleitorais pode ser vista como uma violação aos princípios dos próprios direitos fundamentais, principalmente os princípios da igualdade e da democracia.
O princípio da igualdade, no espectro aqui aplicável, exige que todos os cidadãos tenham as mesmas oportunidades e recursos para participar do processo eleitoral, o que inclui a possibilidade de se candidatar a cargos políticos. O uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode favorecer alguns candidatos em detrimento de outros, desequilibrando a igualdade de condições.
Além disso, o princípio democrático exige que as eleições sejam realizadas de forma livre e justa, com a participação de todos os cidadãos, pelo que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode comprometer a lisura do processo eleitoral, favorecendo determinados candidatos em detrimento de outros.
Dessa forma, pode-se concluir que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais é uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que viola os princípios dos direitos fundamentais, especialmente os princípios da igualdade e da democracia.
Já HABERMAS (2012, 298-300) aborda a questão da corrupção eleitoral a partir da perspectiva da legitimação democrática. Segundo ele, o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode comprometer a integridade do processo democrático, uma vez que pode influenciar o resultado das eleições de forma indevida. Além disso, o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode minar a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas, o que pode gerar um sentimento de descrença e apatia política. Nesse sentido, é possível argumentar que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode, sim, configurar uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que compromete a integridade e a confiança no processo democrático.
Por fim, DWORKIN (2000) aborda a questão da corrupção eleitoral a partir da perspectiva da igualdade de oportunidades. Segundo ele, a utilização de recursos públicos em campanhas eleitorais pode configurar uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que viola o princípio da igualdade de oportunidades. Isso ocorre porque os candidatos que têm acesso a recursos públicos têm vantagens em relação aos demais, o que pode prejudicar a livre competição eleitoral e a igualdade de oportunidades. Nesse sentido, é possível argumentar que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode, sim, configurar uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que viola o princípio da igualdade.
O autor segue tratando a temática, para discutir a importância da igualdade política e do uso correto do dinheiro em campanhas eleitorais para a efetividade da democracia (DWORKIN, 2005). Ele argumenta que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais distorce o processo democrático, favorecendo os candidatos mais ricos e diminuindo a igualdade de oportunidades entre os candidatos.
Defende, ainda, que o dinheiro não deve ser um fator determinante na disputa eleitoral e que a igualdade política só pode ser alcançada quando todos os candidatos têm as mesmas oportunidades de apresentar suas ideias e propostas aos eleitores. Segundo ele, a distribuição igualitária de recursos é fundamental para garantir que todos os candidatos tenham chances iguais de vencer a eleição.
Em "Justiça para Ouriços", DWORKIN (2011) também argumenta que o financiamento de campanhas eleitorais deve ser regulamentado para evitar a corrupção eleitoral e garantir a igualdade de oportunidades entre os candidatos. Ele destaca a importância de um sistema eleitoral justo e transparente para a construção de uma sociedade democrática e igualitária.
Em suma, é possível afirmar que o uso de recursos públicos em campanhas eleitorais pode ensejar a prática e até configurar uma forma de corrupção eleitoral, uma vez que viola princípios fundamentais da democracia e da igualdade.
A realidade da corrupção eleitoral no mundo
A corrupção eleitoral é um fenômeno presente em diversos países do mundo e pode assumir diversas formas, desde a compra direta de votos até a utilização de recursos públicos em campanhas eleitorais. Em muitos casos, a corrupção eleitoral é vista como um obstáculo para a construção de democracias sólidas e legítimas, uma vez que compromete a lisura do processo eleitoral e deslegitima o resultado das eleições.
O mal pode assumir muitas formas diferentes. Em alguns países, as autoridades eleitorais são subornadas ou intimidadas para manipular os resultados das eleições, enquanto em outros, os eleitores são coagidos ou pagos para votar em um determinado candidato. Além disso, em muitos países, os partidos políticos recebem contribuições financeiras ilegais de empresas ou indivíduos ricos para financiar suas campanhas eleitorais, muitas vezes em troca de favores políticos futuros.
Certo é que, independentemente da forma que assume, a corrupção eleitoral tem várias consequências graves para a Democracia e a sociedade em geral. Em primeiro lugar, distorce o processo democrático, permitindo que os candidatos ou grupos de poder mais ricos ou poderosos influenciem indevidamente o resultado das eleições, em detrimento dos interesses do povo. Isso compromete a integridade das eleições e pode minar a confiança do público nas instituições democráticas.
Além disso, a corrupção eleitoral muitas vezes está ligada a outras formas de corrupção, como a corrupção na administração pública ou a corrupção na área empresarial. Isso pode levar a uma cultura de corrupção generalizada na sociedade, prejudicando a economia, minando o Estado de direito e afetando negativamente a qualidade de vida das pessoas.
Em alguns países, a corrupção eleitoral é mais comum em eleições locais, enquanto em outros é mais frequente em eleições nacionais. Em muitos casos, é perpetrada por candidatos e partidos políticos que buscam obter vantagens indevidas e se perpetuar no poder.
Outro dado importante é que, embora a corrupção eleitoral seja um problema global, é particularmente prevalente em países em desenvolvimento ou emergentes, onde as instituições democráticas e os controles de corrupção são muitas vezes menos eficazes do que nos países desenvolvidos. De fato, em muitos países em desenvolvimento, a corrupção eleitoral é tão generalizada que se tornou uma parte normalizada do processo político.
Na América Latina, o argentino GARGARELLA (2004) discute a corrupção política e eleitoral na região, destacando a relação entre a corrupção e a falta de instituições democráticas sólidas. Ele argumenta que a corrupção eleitoral é resultado da falta de transparência e controle no financiamento de campanhas, bem como da falta de independência dos órgãos de fiscalização eleitoral em relação aos governos e partidos políticos. Aponta, ademais, a necessidade de uma reforma política que fortaleça a Democracia e crie uma cultura política de transparência e responsabilidade.
O colombiano HENAO (2009), por sua vez, aborda a corrupção eleitoral em seu país, destacando a influência do narcotráfico e das organizações criminosas nas eleições. O autor aponta a necessidade, no seu entendimento, de uma reforma política que permita o financiamento público de campanhas eleitorais, bem como o fortalecimento da independência dos órgãos eleitorais em relação aos partidos políticos.
BARROSO (2010) propunha uma série de medidas para combater a corrupção eleitoral no Brasil, incluindo a proibição de doações de empresas para campanhas políticas, o fortalecimento da transparência e da fiscalização das doações e gastos de campanha, a ampliação do acesso dos partidos políticos aos meios de comunicação e a adoção de mecanismos de financiamento público de campanhas. O detalhe interessante é que as manifestações se deram antes de sua assunção ao Supremo Tribunal Federal e ao TSE.
Posteriormente, já na Corte Excelsa, sua atuação tem sido marcada por defesas enfáticas do combate à corrupção, incluindo a corrupção eleitoral. Em 2020, por exemplo, foi eleito presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e sua gestão foi marcada por medidas de fortalecimento da transparência e da integridade do processo eleitoral. Importante ressaltar que o Ministro se tem posicionado contra tentativas de enfraquecer as leis de combate à corrupção, como a Lei da Ficha Limpa, que traça regras de inelegibilidade levando em consideração, entre outros, a vida pregressa de candidatos.
Esses autores sul-americanos convergem em suas análises sobre a corrupção eleitoral na América Latina, apontando a necessidade de uma reforma política que permita o financiamento público de campanhas, o fortalecimento da independência dos órgãos de fiscalização eleitoral e a criação de uma cultura política de transparência e responsabilidade.
BARROSO (2010) defende que a corrupção eleitoral é um grave problema que afeta a qualidade da democracia e a legitimidade das eleições. Ele argumenta que a corrupção eleitoral prejudica a igualdade de oportunidades entre os candidatos, pois permite que aqueles com mais recursos financeiros tenham uma vantagem desleal sobre os demais. Além disso, afirma que ela pode levar a uma distorção das políticas públicas, já que os eleitos tendem a privilegiar os interesses de seus financiadores em detrimento do interesse público.
Em outros países, como a Índia, a corrupção eleitoral também é um problema sério. Em eleições locais, por exemplo, é comum a distribuição de dinheiro, alimentos e até mesmo bebidas alcoólicas para influenciar o voto dos eleitores. A utilização de recursos públicos em campanhas eleitorais também é um problema recorrente nesse país, onde os partidos políticos muita vez utilizam fundos destinados a programas sociais para financiar suas campanhas.4
No entanto, a corrupção eleitoral não é um problema exclusivo de países em desenvolvimento. Em países como os Estados Unidos e a Alemanha, por exemplo, também já foram registrados diversos casos de corrupção eleitoral. Em 2016, por exemplo, surgiram denúncias de que a Rússia teria interferido nas eleições presidenciais dos Estados Unidos por meio de ataques cibernéticos e propaganda falsa.
De acordo com HASEN (2014), a corrupção eleitoral nos Estados Unidos pode ser dividida em três categorias: corrupção monetária, corrupção de bens e serviços, e corrupção de informação. A corrupção monetária é a mais comum, e inclui a contribuição de dinheiro ilícito para campanhas políticas. A de bens e serviços envolve a doação de bens ou serviços em troca de favores políticos. Já a de informação ocorre quando informações são deturpadas ou ocultadas para manipular os eleitores.
HASEN argumenta que a decisão da Suprema Corte dos EUA no caso Citizens United v. Federal Election Commission, de 2010, agravou a corrupção eleitoral no país. Naquele caso, a Suprema Corte decidiu que as empresas e sindicatos têm o direito de gastar quantias ilimitadas de dinheiro em campanhas políticas, desde que o gasto seja independente da campanha de um candidato.
LESSIG (2011), argumenta que a corrupção eleitoral nos Estados Unidos é resultado da influência do dinheiro na política. O autor defende a criação de um sistema de financiamento público de campanhas para reduzir a influência do dinheiro na política e, consequentemente, a corrupção eleitoral.
Ambos os autores mostram que a corrupção eleitoral é um problema grave nos Estados Unidos, e que medidas devem ser tomadas para combatê-la. Além disso, suas obras evidenciam a importância de se compreender as diferentes formas de corrupção eleitoral e suas implicações políticas, econômicas e sociais.
Para combater a corrupção eleitoral, é necessário um esforço conjunto por parte dos governos, organizações internacionais e da sociedade civil. Isso inclui a implementação de leis e regulamentações eleitorais rigorosas, a promoção de uma cultura de integridade eleitoral, a educação dos eleitores sobre seus direitos e a mobilização da sociedade civil para monitorar e denunciar casos de corrupção eleitoral.
Diante desse cenário, é fundamental que os países adotem medidas eficazes para prevenir e combater a corrupção eleitoral. Isso pode incluir a criação de leis mais rigorosas, o fortalecimento das instituições responsáveis pela fiscalização e combate à corrupção, além da conscientização da população sobre a importância de um processo eleitoral justo e transparente.