Capa da publicação STF e a garantia do seguro-defeso aos pescadores
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A inconstitucionalidade da Portaria nº 192/2015 e o direito ao seguro-defeso

Resumo:


  • O Seguro-Defeso é um benefício destinado a pescadores artesanais que dependem exclusivamente da pesca como fonte de renda.

  • O benefício garante uma renda mínima aos pescadores durante o período de defeso, quando a pesca é proibida para preservar as espécies.

  • A suspensão do Seguro-Defeso no biênio 2015/2016 gerou impactos negativos para os pescadores e o meio ambiente.

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A suspensão do seguro-defeso no biênio 2015/2016 impactou pescadores e meio ambiente. Como a decisão do STF reafirmou o direito ao benefício e influenciou a política pesqueira?

Resumo: O Seguro-Defeso é um benefício destinado a pescadores artesanais que dependem exclusivamente da pesca como fonte de renda. Durante o período de defeso, quando a pesca é proibida para preservar as espécies, o seguro garante uma renda mínima aos pescadores. A concessão do benefício está sujeita a critérios legais, como registro no Ministério da Pesca e contribuição previdenciária. A importância do Seguro-Defeso reside em sua função socioeconômica e ambiental, pois assegura a subsistência dos pescadores e contribui para a preservação das espécies. No entanto, a suspensão do benefício, como ocorreu no biênio 2015/2016, gerou impactos negativos tanto para os pescadores quanto para o meio ambiente.

Palavras-chave: Seguro-Defeso, Pesca Artesanal, Direito ao Benefício, Preservação Ambiental, Sustentabilidade Socioeconômica


Introdução

A pesca artesanal é uma atividade fundamental para a economia e a cultura de muitas comunidades ao redor do mundo, especialmente em países com extensas costas e rios. No Brasil, essa prática é essencial para a subsistência de milhares de famílias que dependem exclusivamente da pesca como fonte de renda. Para garantir a sustentabilidade dessa atividade e proteger as espécies marinhas, o governo brasileiro instituiu o Seguro-Defeso, um benefício que assegura uma renda mínima aos pescadores durante o período de defeso, quando a pesca é proibida para permitir a reprodução das espécies.

No entanto, a implementação e o pagamento desse benefício têm enfrentado desafios significativos. A suspensão do Seguro-Defeso no biênio 2015/2016, decorrente da Portaria Interministerial nº 192/2015, gerou graves consequências socioeconômicas para os pescadores e suas famílias, além de impactos ambientais negativos. A inconstitucionalidade dessa portaria foi posteriormente reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), reafirmando o direito dos pescadores ao benefício.

Este texto aborda a importância do Seguro-Defeso, os desafios enfrentados por sua suspensão e a relevância jurídica e ambiental da garantia desse direito aos pescadores artesanais. Além disso, discute as implicações legais e socioeconômicas da decisão do STF e a responsabilidade do Estado em assegurar a continuidade do pagamento do benefício.


1. Breve Histórico

O seguro-defeso é um benefício social instituído no Brasil com o objetivo de garantir uma renda mínima aos pescadores artesanais durante o período de defeso, que é o intervalo de tempo em que a pesca é proibida para proteger a reprodução das espécies aquáticas. Esse benefício é essencial para assegurar a subsistência dos pescadores e, ao mesmo tempo, preservar os recursos naturais.

A criação do seguro-defeso remonta à década de 1990, com a Lei nº 8.287, de 20 de dezembro de 1991, que estabeleceu o direito ao benefício para os pescadores artesanais que dependem exclusivamente da pesca para sua sobrevivência. Posteriormente, o benefício foi regulamentado pelo Decreto nº 1.201, de 1994, que detalhou as condições para o acesso ao seguro-defeso, como a comprovação de que o pescador exerce a atividade de forma artesanal e que não possui outra fonte de renda.

O seguro-defeso foi incorporado ao sistema de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social, sendo pago no valor de um salário mínimo mensal durante o período de defeso, que pode variar de acordo com a espécie e a região. O benefício é concedido apenas aos pescadores devidamente registrados no Registro Geral da Atividade Pesqueira (RGP), mantido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura (atualmente vinculado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

Ao longo dos anos, o seguro-defeso passou por diversas alterações e enfrentou desafios, como fraudes e dificuldades na fiscalização. Em 2015, o governo federal suspendeu temporariamente o benefício para revisar os cadastros e combater irregularidades. Essa suspensão gerou críticas e protestos por parte dos pescadores, que dependem do benefício para sobreviver durante o período em que a pesca é proibida.

Em 2017, o Decreto nº 8.967 trouxe novas regras para o seguro-defeso, buscando maior controle e transparência na concessão do benefício. Entre as mudanças, foi exigida maior comprovação da atividade pesqueira e a integração de dados entre diferentes órgãos governamentais.

Atualmente, o seguro-defeso continua sendo um instrumento fundamental para a proteção social dos pescadores artesanais e para a preservação ambiental. No entanto, o benefício ainda enfrenta desafios relacionados à fiscalização, à atualização cadastral e à garantia de que chegue apenas aos pescadores que realmente dependem da pesca para sua subsistência.


2. Quem Tem o Direito

O pescador artesanal, exercendo sua atividade de forma exclusiva e ininterrupta, conforme comprovado por sua inscrição no Registro Geral da Pesca (RGP), emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, tem direito ao seguro-defeso. Durante o período de defeso, em que a pesca é proibida para preservação das espécies, o pescador sempre recebeu regularmente o benefício do seguro-defeso, conforme previsto na Lei nº 10.779/2003. Contudo, no biênio 2015/2016, foi surpreendido com a negativa do pagamento do benefício, mesmo preenchendo todos os requisitos legais para sua concessão.

O pescador dependia exclusivamente da atividade pesqueira para sua subsistência e a de sua família, não possuindo outra fonte de renda. A ausência do pagamento do seguro-defeso no período mencionado causou graves prejuízos financeiros, comprometendo sua dignidade e o sustento de sua família.

Inicialmente, é preciso fazer tentativas administrativas para solucionar a questão, e se não obtiver êxito, é necessário recorrer ao Poder Judiciário para garantir o direito ao benefício que lhe é devido.


3. Da Fixação do Termo Inicial do Prazo Prescricional

A controvérsia sobre o prazo prescricional para o recebimento do seguro-defeso referente ao biênio 2015/2016 foi resolvida pela Turma Regional de Uniformização (TRU) do TRF da 1ª Região, que, no julgamento do PUILCiv 1022010-18.2022.4.01.3902, fixou o termo inicial do prazo prescricional em 22 de maio de 2020, data do julgamento da ADI 5.447 e da ADPF 389 pelo STF.

A tese fixada pela TRU foi a seguinte:

"Considerada a inconstitucionalidade da Portaria Interministerial MAPA/MMA nº 192/2015, o termo inicial do prazo prescricional referente ao seguro-defeso do período de defeso para o pescador artesanal no biênio 2015/2016 é o dia 22/05/2020, data do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da ADI nº 5.447 e da ADPF nº 389."

Essa decisão superou a Súmula 11 das Turmas Recursais do Amapá e Pará, que havia declarado prescrito o direito ao benefício em 28 de junho de 2023. Com a nova tese, os pescadores artesanais têm até 22 de maio de 2025 para pleitear judicialmente o pagamento do seguro-defeso referente ao biênio 2015/2016.

Nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, as dívidas da Fazenda Pública prescrevem em cinco anos. Contudo, considerando que o pescador ajuíza a presente ação dentro do prazo prescricional, não há que se falar em prescrição do direito ao benefício referente ao biênio 2015/2016.


4. Do Direito ao Seguro-Defeso.

O seguro-defeso é um benefício de natureza assistencial, instituído pela Lei nº 10.779/2003, que assegura ao pescador artesanal o direito a uma assistência financeira temporária durante o período de defeso, quando a pesca é proibida para preservação das espécies. O art. 1º da referida lei dispõe:

"O pescador profissional que exerça sua atividade de forma artesanal, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de parceiros, fará jus ao benefício de seguro-desemprego, no valor de um salário-mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie."

O benefício possui caráter alimentar, conforme reconhecido pelo art. 100 da Constituição Federal, sendo essencial para a subsistência do pescador e de sua família durante o período em que a pesca é proibida. A jurisprudência também reconhece o caráter alimentar do seguro-defeso, destacando sua relevância socioeconômica para as comunidades pesqueiras.

O pescador preenche todos os requisitos legais para a concessão do benefício, conforme demonstrado nos documentos anexos, nos termos do art. 1º da referida lei:

  • Possui inscrição no Registro Geral da Pesca (RGP);

  • Exerce a atividade de forma exclusiva e ininterrupta;

  • Não possui vínculo empregatício ou outra fonte de renda diversa da pesca;

  • Comprova o exercício da atividade pesqueira por meio de documentos fiscais ou outros meios idôneos.


5. Da Inconstitucionalidade da Portaria Interministerial nº 192/2015.

A Portaria Interministerial nº 192/2015, que suspendeu o pagamento do seguro-defeso no biênio 2015/2016, foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento conjunto da ADI 5.447 e da ADPF 389, realizado em 22 de maio de 2020. O STF reconheceu que a portaria foi editada com desvio de finalidade, visando exclusivamente à redução de custos fiscais, em detrimento dos direitos dos pescadores e da proteção ambiental.

Conforme destacado no voto do Ministro Luís Roberto Barroso, relator da ADI 5.447:

"A necessidade de economizar recursos públicos, tanto quanto a ocorrência de supostas fraudes no deferimento de benefícios, não é causa válida para liberar a pesca no período de reprodução dos peixes e sacrificar espécies. Se este é o caso, cabe ao Poder Público, e não ao meio ambiente, assumir os ônus da medida."

A decisão do STF reafirmou a constitucionalidade do Decreto Legislativo nº 293/2015, que sustou os efeitos da portaria interministerial, restabelecendo o direito dos pescadores ao seguro-defeso referente ao biênio 2015/2016.


6. Da Responsabilidade do INSS

O INSS, como autarquia responsável pela gestão e pagamento do seguro-defeso, tem o dever de assegurar o cumprimento das normas legais e constitucionais que regem o benefício. A negativa do pagamento do seguro-defeso ao pescador, mesmo após o reconhecimento da inconstitucionalidade da Portaria nº 192/2015, configura ato ilegal e abusivo, violando os princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção social.

Conforme destacado aqui, o benefício do seguro-defeso é essencial para garantir a subsistência do pescador artesanal e de sua família durante o período de defeso, sendo sua única fonte de renda. A omissão do INSS em efetuar o pagamento do benefício viola o direito fundamental à alimentação e à dignidade, assegurados pela Constituição Federal.

A negativa do pagamento do seguro-defeso no biênio 2015/2016 viola os direitos do pescador, uma vez que ele cumpriu todas as exigências legais para a concessão do benefício. A ausência de justificativa plausível para a negativa administrativa configura ato ilegal e abusivo por parte do INSS.

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O direito ao seguro-defeso é garantido pela Constituição Federal, que, em seu art. 6º, assegura a proteção social como direito fundamental. Além disso, o art. 7º, inciso XXIV, prevê a proteção ao trabalhador em situações de desemprego involuntário, como ocorre no período de defeso.

O INSS, como autarquia responsável pela gestão e pagamento do seguro-defeso, tem o dever legal de assegurar o cumprimento das normas que regem o benefício. A omissão no pagamento do benefício ao pescador configura falha na prestação do serviço público, ensejando a intervenção do Poder Judiciário para garantir o direito violado.


7. Da Relevância Ambiental e Social do Seguro-Defeso

Além de sua importância socioeconômica, o seguro-defeso desempenha um papel fundamental na preservação ambiental, ao garantir que os pescadores respeitem o período de reprodução das espécies. A suspensão do benefício, como ocorreu no biênio 2015/2016, expôs os ecossistemas a riscos ambientais significativos, conforme reconhecido pelo STF na ADI 5.447:

"Sem estudos ambientais satisfatórios, a suspensão do defeso apenas põe em risco grupos já extremamente carentes e vulneráveis."

Portanto, o restabelecimento do direito ao seguro-defeso não apenas assegura a subsistência dos pescadores, mas também contribui para a sustentabilidade dos recursos pesqueiros e a proteção do meio ambiente.

Diante do exposto, a fundamentação legal apresentada demonstra que o pescador possui direito líquido e certo ao recebimento do seguro-defeso referente ao biênio 2015/2016, sendo a presente ação tempestiva e plenamente amparada pela legislação e pela jurisprudência. A negativa do benefício pelo INSS configura ato ilegal e abusivo, que deve ser reparado pelo Poder Judiciário.


Conclusão

O Seguro-Defeso desempenha um papel crucial na sustentabilidade socioeconômica e ambiental da pesca artesanal. Além de garantir a subsistência dos pescadores durante o período de defeso, o benefício contribui para a preservação das espécies e a proteção do meio ambiente. A garantia desse direito é essencial para manter a dignidade e a segurança alimentar das famílias dos pescadores. Portanto, é fundamental que o Estado assegure a continuidade do pagamento do Seguro-Defeso, evitando a suspensão injustificada do benefício e promovendo políticas que fortaleçam as comunidades pesqueiras.


Referências

https://scientiaetratio.com.br/concessao-do-seguro-defeso-reflexoes-acerca-da-solidariedade-sustentabilidade-e-seguranca-alimentar-em-face-da-pesca-artesanal/

https://www.gov.br/inss/pt-br/noticias/seguro-defeso-entenda-o-beneficio-para-o-pescador-artesanal

https://ambitojuridico.com.br/criterios-e-metamorfoses-legais-do-seguro-defeso-do-pescador-artesanal/

https://www.redalyc.org/journal/3211/321165166011/html/

https://periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/rppublica/article/view/14372

https://periodicos.ufpe.br/revistas/index.php/ruralurbano/article/download/250970/39708/199463

https://portalantigo.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/livros/livros/181127_comite_de_monitoramento_cap03.pdf

https://periodicos.set.edu.br/cadernohumanas/article/download/1960/1214/6693

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Arnaldo Gonçalves Dias. A inconstitucionalidade da Portaria nº 192/2015 e o direito ao seguro-defeso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 7916, 4 mar. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/113090. Acesso em: 10 abr. 2025.

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