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Gestão de riscos nas contratações públicas.

Medida essencial para eficácia da boa governança e accountability

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3. Mapa de Riscos do Macroprocesso

Todos os órgãos da Administração Pública devem mapear os riscos que envolvem os interesses institucionais como forma de subsidiar todos os demais setores no gerenciamento de riscos nos processos de contratação. O TCU em seu Referencial Básico de Gestão de Riscos assim conceituou macroprocesso:

“...processos mais abrangentes da organização. Representam conjuntos de atividades agregadas, em nível de abstração amplo, que formam a cadeia de valor de uma organização, explicitando como ela opera para cumprir sua missão e atender as necessidades de suas partes interessadas.” (TCU, 2018, p. 151)

A Controladoria Geral do Estado de Minas Gerais, através da Resolução Conjunta nº 01/2024 também estabeleceu a conceituação:

Art. 2º – Para fins desta resolução conjunta, considera-se:

[...]

VII – macroprocesso de contratação pública: rito integrado pelas fases de planejamento da contratação, de seleção do fornecedor e de gestão do contrato, e que serve como referência para que os processos específicos de contratação sejam realizados;

O Mapa de Riscos do Macroprocesso deve ser elaborado por uma equipe multidisciplinar devidamente designada pelo gestor do órgão. Essa equipe seguirá todos as etapas de gerenciamento de riscos referenciadas no presente estudo e seu trabalho servirá de norte para todas as contratações realizadas no âmbito da instituição. Em Minas Gerais a Resolução Conjunta nº 01/2024 da Controladoria Geral do Estado estabeleceu o rito da seguinte forma:

Art. 11. – Compete aos órgãos e entidades elaborar, em até 180 (cento e oitenta) dias, contados da data de publicação desta resolução conjunta, o Mapa de Riscos do Macroprocesso, referente à gestão de riscos do macroprocesso de contratação pública, que deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

I – fase do macroprocesso de contratação pública;

II – identificação dos eventos de riscos, suas causas, consequências, a probabilidade da ocorrência e os possíveis impactos;

III – controles preventivos e contingenciais existentes e as respectivas avaliações quanto ao seu grau de implementação;

IV – nível de risco;

V – declaração de apetite a riscos, nos termos do art. 12;

VI – tratamento proposto, considerando as opções: aceitar, reduzir, transferir ou evitar o risco;

VII – justificativa caso o tratamento seja diferente do apetite a riscos;

VIII – plano de ação para os riscos que ensejarem tratamento dos tipos reduzir, transferir ou evitar, com descrição da ação de controle, do como implementar, do responsável por cada ação e do respectivo cronograma.

§ 1° – O Mapa de Riscos do Macroprocesso deverá ser:

I – elaborado por equipe multidisciplinar, designada pela autoridade competente do órgão ou entidade, e composta por agentes públicos que participam do processo de contratação, conforme previsto no inciso I, do art. 169. da Lei Federal n° 14.133, de 2021;

II – aprovado pela autoridade competente;

III – atualizado caso sejam identificados novos riscos ou implementados novos controles considerados relevantes.


4. Mapa de Riscos do Processo

Todos os órgãos além de realizarem o Mapa de Riscos do Macroprocesso deverão mapear também os riscos das contratações específicas.

O TCU em seu Referencial Básico de Gestão de Riscos assim conceituou mapa do processo:

Mapa de processo - representação gráfica da sequência de atividades que compõem um processo, fornecendo uma visão dos fluxos operacionais do trabalho, incluindo, a depender do nível de análise que se deseja realizar, a evidenciação dos agentes envolvidos, os prazos, o fluxo de documentos, o processo decisório. (TCU, 2018, p. 151)

Em razão da complexidade e da quantidade elevada de processos licitatórios que são realizados em todas as instituições, é plenamente razoável que os órgãos e entidades busquem priorizar os principais processos, ou seja, aqueles que tenham maior valor institucional. Dessa feita, não é necessário realizar o gerenciamento de riscos de todas as contratações, exceção àquelas que forem priorizadas no Plano de Contratações Anual (PCA). (MATO GROSSO DO SUL, 2024, p.13)

A Controladoria Geral do Estado de Minas Gerais, através da Resolução Conjunta nº 01/2024 estabeleceu o mesmo entendimento:

Art. 14. – Durante o planejamento anual de contratações, o órgão ou entidade deverá priorizar dentre os processos de licitação, de contratação direta e procedimentos auxiliares planejados, aqueles que serão abrangidos pela gestão de riscos específicos, considerando os seguintes critérios:

I – relevância: impacto decorrente da contratação para a realização dos objetivos-chave do órgão ou entidade;

II – materialidade: representatividade do valor da contratação em relação ao montante estimado para as contratações no período de análise;

III – maturidade do processo de contratação: nível de institucionalização da contratação do objeto pelo órgão ou entidade em termos de modelagem, medição de desempenho, métodos de gestão contratual e atendimento aos padrões de entrega;

IV – criticidade do objeto: nível de complexidade do objeto a ser contratado em relação às especificações e ao

procedimento de contratação.

§ 1º – O órgão ou entidade poderá priorizar novos processos que serão abrangidos pela gestão de riscos específicos, considerando modificações no planejamento a que se refere o caput.

Dessa maneira, verifica-se que o Mapa de Riscos do Macroprocesso servirá de orientação para os demais servidores da instituição aplicaram nos mapas de risco da contratação quando houver a necessidade de apresentar riscos complementares ao seu processo em específico, conforme previsão inserta na mesma legislação citada anteriormente:

Art. 15. – Compete aos órgãos e entidades elaborar, durante a fase de planejamento da contratação, o Mapa de Riscos da Contratação, referente à gestão de riscos específicos das contratações, que deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

[...]

§ 3° – O Mapa de Riscos da Contratação tem como foco apresentar riscos complementares aos riscos identificados no Mapa de Riscos do Macroprocesso, que sejam específicos do objeto da contratação.

§ 4° – Os eventos de riscos previstos no Mapa de Riscos do Macroprocesso poderão ser reproduzidos no Mapa de Riscos da Contratação nas hipóteses de serem incluídas ou excluídas novas causas, consequências ou controles.

§ 5° – Os controles previstos no Mapa de Riscos da Contratação deverão estar contemplados no termo de referência, anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo, conforme o caso, e, quando houver, no modelo de gestão contratual e nos demais instrumentos de gerenciamento do contrato.

§ 6° – O Mapa de Riscos da Contratação deverá ser atualizado caso sejam identificados novos riscos ou controles considerados relevantes. (grifo nosso)


5. Matriz de Riscos

A Matriz de riscos trata-se de uma peça gráfica que especifica o conjunto das combinações entre probabilidade e impacto de riscos classificando-os em níveis. Em sua estrutura, sistematiza a identificação, a análise e a avaliação de riscos, além de conter a avaliação de controles internos e decisões sobre o tratamento de riscos. (TCU, 2018)

A Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 14.133/2021 assim definiu:

XXVII - matriz de riscos: cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação, contendo, no mínimo, as seguintes informações:

a) listagem de possíveis eventos supervenientes à assinatura do contrato que possam causar impacto em seu equilíbrio econômico-financeiro e previsão de eventual necessidade de prolação de termo aditivo por ocasião de sua ocorrência;

b) no caso de obrigações de resultado, estabelecimento das frações do objeto com relação às quais haverá liberdade para os contratados inovarem em soluções metodológicas ou tecnológicas, em termos de modificação das soluções previamente delineadas no anteprojeto ou no projeto básico;

c) no caso de obrigações de meio, estabelecimento preciso das frações do objeto com relação às quais não haverá liberdade para os contratados inovarem em soluções metodológicas ou tecnológicas, devendo haver obrigação de aderência entre a execução e a solução predefinida no anteprojeto ou no projeto básico, consideradas as características do regime de execução no caso de obras e serviços de engenharia; (BRASIL, 2021)

A matriz de riscos relaciona-se diretamente à equação econômico-financeira da contratação que tem por finalidade distribuir entre os contratantes a responsabilidade pelos encargos financeiros decorrentes dos riscos identificados que possam, de alguma forma, promover o desequilíbrio econômico-financeiro depois de apresentada a proposta na licitação até o final da execução contratual.

No tocante a matriz de riscos o Tribunal de Contas da União assim ensina:

Cabe esclarecer que a matriz de riscos não se confunde com a análise de riscos exigida no art. 18, inciso X, da Lei 14.133/2021. A análise de riscos é obrigatória e tem como objetivo identificar e tratar os riscos da licitação e da contratação, iniciando-se no planejamento da contratação, podendo levantar riscos relativos a ações anteriores à contratação, como, por exemplo, a necessidade de alocação de espaço físico ou infraestrutura de ar-condicionado ou elétrica para atender às necessidades prévias do objeto. Já a matriz de riscos é uma cláusula contratual elaborada quando for necessária a formalização da divisão dos riscos contratuais entre contratante e contratado.

Na matriz de riscos, serão registrados possíveis eventos supervenientes à assinatura do contrato que possam impactar o seu equilíbrio econômico-financeiro. Para cada evento, serão definidas as medidas de tratamento para reduzir a sua probabilidade de ocorrência e mitigar os seus efeitos, bem como as responsabilidades de cada parte contratante com relação ao risco identificado. (TCU, 2024, p. 464)

Para o estabelecimento da Matriz de Riscos torna-se imperiosa a correta execução das etapas do gerenciamento de riscos para que a Administração Pública possa definir de maneira adequada quem suportará cada risco. Isso pode interferir significativamente no valor do preço a ser oferecido à Administração Pública, uma vez que o contratado deverá calcular os riscos assumidos por ele.

A Lei 14.133/2021 prevê as hipóteses em que será obrigatória a confecção da Matriz de Riscos:

Art. 22. O edital poderá contemplar matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado, hipótese em que o cálculo do valor estimado da contratação poderá considerar taxa de risco compatível com o objeto da licitação e com os riscos atribuídos ao contratado, de acordo com metodologia predefinida pelo ente federativo.

§ 1º A matriz de que trata o caput deste artigo deverá promover a alocação eficiente dos riscos de cada contrato e estabelecer a responsabilidade que caiba a cada parte contratante, bem como os mecanismos que afastem a ocorrência do sinistro e mitiguem os seus efeitos, caso este ocorra durante a execução contratual.

§ 2º O contrato deverá refletir a alocação realizada pela matriz de riscos, especialmente quanto:

I - às hipóteses de alteração para o restabelecimento da equação econômico-financeira do contrato nos casos em que o sinistro seja considerado na matriz de riscos como causa de desequilíbrio não suportada pela parte que pretenda o restabelecimento;

II - à possibilidade de resolução quando o sinistro majorar excessivamente ou impedir a continuidade da execução contratual;

III - à contratação de seguros obrigatórios previamente definidos no contrato, integrado o custo de contratação ao preço ofertado.

§ 3º Quando a contratação se referir a obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital obrigatoriamente contemplará matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado. (BRASIL, 2021)

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Deverá ser elaborada a Matriz de Riscos sempre que houver possibilidade de alteração contratual para reestabelecimento do equilibrio econônico-financeiro, quando forem adotados os regimes de contratação integrada ou semi-integrada e quando forem realizadas contratações de grande vulto, cujo valor estimado supera R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais), conforme inciso XXII, do art. 6º, da Lei 14.133/2021.


Conclusão

O presente estudo teve como objetivo trazer uma abordagem sobre o enfoque dado pela Lei 14.133/2021 na política de gestão de riscos nas contratações públicas.

Foi demonstrado que o gerenciamento de riscos trata-se de um elemento essencial na governança pública. Gerir os riscos é contribuir para redução de situações que possam comprometer os objetivos das organizações públicas. Existem duas maneiras como a Administração Pública pode lidar com os riscos decorrentes das contratações: “apagar incêndios”, o que demonstra despreparo ou antecipar-se a eles, o que demonstra organização e busca pela eficiência e eficácia na prestação do serviço público. Para o Tribunal de Contas da União:

A gestão de riscos corretamente implementada e aplicada de forma sistemática, estruturada e oportuna gera benefícios que impactam diretamente cidadãos e outras partes interessadas da organização ao viabilizar o adequado suporte às decisões de alocação e uso apropriado dos recursos públicos, o aumento do grau de eficiência e eficácia no processo de criação, proteção e entrega de valor público, otimizando o desempenho e os resultados entregues à sociedade. (TCU, 2016, p. 16)

Gerenciar riscos não é uma atividade que dá “holoforte” à Administração Pública, pois os resultados dessa atividade não “aparecem”. No entanto, as consequências da falta de um gerenciamento de riscos eficaz pode provocar efeitos demasiadamente negativos à instituição. Com os avanços dos meios de comunicação e acesso às informações, o não cumprimento dos deveres de accountability são cada vez mais perceptíveis pela nossa sociedade. Por isso, a alta gestão das organizações deve estar cada vez mais envolvida nesse processo. O próprio TCU já atribui responsabilidade a alta administração pela falha na implementação de ações de governança:

Nos termos do disposto na nova lei de licitações e contratos, a governança das contratações constitui responsabilidade da alta administração do órgão, cabendo-lhe implantar processos e estruturas, inclusive de gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, tendo por objetivos, dentre outros, o de assegurar a seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública; assegurar tratamento isonômico entre os licitantes, bem como a justa competição, além de evitar contratações com sobrepreço. ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na execução dos contratos (Lei 14.133/2021, artigos 11 e 169).

Conclui-se, no ponto, pela desnecessidade da emitir ciência ao Ministério da Saúde quanto à falha ora constatada por já haver sido reconhecida pelo próprio órgão, sem prejuízo de assinalar que a não resolução das recorrentes fragilidades constatadas ao longo de anos na governança das contratações, atrai diretamente para a alta administração do órgão a responsabilização pelas irregularidades e eventuais danos ao erário que vierem a ser constatados. (TCU - SNN: 029.554/2022-5, Relator: Min. Vital do Rêgo, Data do Julgamento: 21/06/2023)

Sendo assim, percebe-se que a alta administração deve promover uma mudança na cultura organizacional para a implementação da gestão de riscos. É de responsabilidade dos gestores a accountability em suas intituições, promovendo assim resultados mais eficazes, com maior transparência e ética na gestão dos recursos públicos.

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Sobre o autor
Sergio Henrique Zilochi Soares

Funcionário Público. Chefe de Seção de Licitações. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Sete Lagoas, Bacharel em Teologia pelo Centro Universitário de Maringá. Pós-Graduação latu sensu em: Aconselhamento Pastoral pela Faculdade Teológica Batista; Teologia Contemporânea pelo Centro Universitário Claretiano; Liderança e Desenvolvimento de equipes pela Faculdade Focus; Gestão Estratégica de Pessoas pela Faculdade Focus; Direito Administrativo e Licitações pela Faculdade Única de Ipatinga; Gestão Logística pela Faculdade Única de Ipatinga. Atualmente cursa Pós Graduação em Administração Financeira, Orçamentária e Contábil no Setor Público pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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