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O desaforamento e o reaforamento no novo procedimento do júri

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17/06/2008 às 00:00
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4. Reaforamento

O CPP, antes da reforma processual, não previa expressamente a figura do Reaforamento. Esperávamos que a Lei nº. 11.689/08, neste particular, regulamentasse a matéria. Todavia, lamentavelmente, manteve-se silente.

Porém, conquanto não encontre amparo legal, certo é que este instituto não é vedado. É uma construção doutrinária e jurisprudencial, razão pela qual se entende que a figura do Reaforamento encontra respaldo no Direito brasileiro, embora não seja entendimento pacífico.

Preliminarmente, temos que entender que o reaforamento é uma espécie de segundo desaforamento [21], ou seja, retira o julgamento do foro para o qual tinha sido designado (face o desaforamento), retornando para o foro original, de modo que o réu é julgado onde deveria sê-lo inicialmente.

A peculiaridade é que retorna o julgamento (lembre-se que o desaforamento é do julgamento) para o foro onde havia sido desaforado.

A maior parte da doutrina [22] preleciona que, ocorrido o desaforamento, não pode ocorrer o reaforamento, mesmo que no foro inicial tenham desaparecido as causas que o determinaram, a saber as hipóteses do art. 427 e 428 do CPP, bem como as questões de ordem material.

Nessa seara intelectual, ninguém menos que Eduardo Spínola nos proporciona a seguinte lição, in verbis:

Definitivos são os efeitos do desaforamento, e, assim, se proscreve o reaforamento, mesmo quando, antes do julgamento, tenham desaparecido as causas que o determinaram [23].

A jurisprudência dominante também é no sentido de descabimento do reaforamento:

Não se justifica o restabelecimento da competência do foro de origem (‘reaforamento’) se permanecem as razões que ditaram o desaforamento. (RT 661/364)

Os opositores do reaforamento sustentam ainda que seria tarefa árdua provar que tenha ocorrido o desaparecimento integral das causas que justificaram o desaforamento. "Desaforado, ainda que tenham desaparecido as causas que o autorizaram, sempre resta um ressaibo do que antes ocorrerá, desaconselhando, por isto, o retorno do julgamento à comarca de origem" [24].

Não obstante, prossegue a doutrina e jurisprudência majoritária, caso no novo foro também encontrem os motivos que foram determinantes do desaforamento poderia haver um novo desaforamento (só não poderia voltar para o foro original, vez que se trataria de reaforamento).

Assumindo posição isolada na doutrina, Tourinho Filho admite a possibilidade de reaforamento, uma vez extinto os motivos que ocasionaram o deslocamento do foro original, e no local para onde fora desaforado, as circunstâncias não permitirem um julgamento sereno.

Se, por acaso, os motivos que originaram o pedido de reaforamento houverem desaparecido e eles surgirem no novo foro, nada impede o reaforamento. Aliás, o Egrégio STF, invocando nosso ponto de vista, houve por bem admitir o reaforamento.

O reaforamento, nesse caso, só pode ser argüido, obviamente, depois de ter se operado o desaforamento e até antes do início do julgamento do réu. As hipóteses de reaforamento seriam as mesmas para o desaforamento, salvo a hipótese do art. 428 do CPP, em que nunca se admitirá o reaforamento, já que se trata de um critério cronológico. O tempo estampa marcas indeléveis, não havendo como fazer voltar ao estado anterior.

Embora tenhamos um maior apreço pelas lições de Tourinho Filho, não nos parece adequado admitir o reaforamento. Preferimos (e entendemos ser a mais correta) a posição da maioria da doutrina, segundo a qual uma vez desaforado o julgamento não haveria possibilidade de reaforamento, vez que seria difícil (até mesmo impossível) provar que as razões que determinaram o desaforamento cessaram. Os efeitos são, pois, definitivos.

Contudo, excepcionalmente, consideramos que, apenas quando as causas que justificaram o desaforamento forem questões de ordem meramente materiais, seria possível falar-se em reaforamento. A justificativa é simples.

Essas questões materiais, p. ex., precariedade de instalações, são hipóteses objetivas, razão pela qual são de fácil constatação. E, uma vez supridas, desapareceriam por inteiro a causa que determinou o desaforamento, ao contrário das hipóteses do art. 427 do CPP, que, por serem subjetivas, nunca se saberá ao certo se as causas que justificaram o desaforamento tenham, de fato, desaparecido por inteiro.

4.1. O reaforamento e a anulação da decisão de pronúncia

Não é possível reaforamento quando a decisão interlocutória de pronúncia for anulada, pois nada tem a ver com juízo de admissibilidade, e sim com a mudança onde se processará o julgamento. Esse entendimento já foi consolidado por nossa Corte Suprema, in verbis:

Sendo o desaforamento processo incidental, fora dos autos principais, diz respeito apenas à transferência do foro de julgamento dos pronunciados em processo por crime da competência do Júri, nada tendo a ver com a sentença de pronúncia, que é juízo de admissibilidade da acusação intentada. (RT 586/415)

Sendo assim, uma vez anulada a decisão de pronúncia, não se opera o retorno do julgamento para a comarca anterior.


5. Referências Bibliográficas

• FILHO, Eduardo Spínola. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado.Campinas-SP, Broockseller, 2000, vol. IV.

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• FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo. Saraiva, 2005, 9ª ed.

• MIRABETE. Júlio Fabbrini, Processo Penal, São Paulo, Atlas, 2005, 17ª ed.

• NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 2002, 28ª ed., atualizada e revisada por Adalto José Q. T. de Camargo Aranha.

• OLIVEIRA. Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte, Del Rey, 2004, 3ª ed.

• ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Curso de Direito Processual Penal, Rio de Janeiro, Forense, 1999.


Notas

01 FILHO, Eduardo Spínola. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. Vol. IV Campinas: Broockseller, 2000, p. 400, apud TORRES. A. Magarinos, Processo Penal do Júri, 1939, pp. 257-258.

02 Nesse sentido é o ensinamento de MIRABETE. Júlio Fabbrini, Processo Penal, São Paulo: Atlas, 2005, 17ª ed, p. 545: "Em regra, a competência é determinada pelo lugar em que se consumou a infração (art. 70), de modo que o réu deve ser julgado no distrito de sua culpa, ou seja, onde cometeu o delito e a ordem social foi violada"; e nesse sentido, também, é a preleção de NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo: Saraiva, 2002, 28ª ed., p. 342, atualizada e revisada por Adalto José Q. T. de Camargo Aranha: "(…) é regra fundamental que o réu seja julgado no distrito de sua culpa, isto é, no local onde cometeu o delito".

03 ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Curso de Direito Processual Penal., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 749, apud Hélio Tornaghi.

04 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte, Del Rey, 2004, 3ª ed., p. 699.

05 MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. Cit p.545

06

FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, ed., p. 66.

07 Compartilham esse entendimento: FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 67; NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, 28ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 343; MIRABETE. Júlio Fabbrini, Processo Penal, 17ª ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 545; ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Curso de Direito Processual Penal., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 750.

08 NORONHA. E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 2002, 28ª ed., p. 343.

09 ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. cit, p. 751.

10 Ibidem.

11 FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 67.

12 É nesse diapasão o entendimento do TJ-SP: "É de deferir a representação do juiz que propugna o desaforamento do julgamento baseado na falta de instalações adequadas do Tribunal do Júri e na perspectiva de ser aquele de longa duração, dada a intensa repercussão do fato".

13 NORONHA. E. Magalhães. Op. Cit. P. 343.

14 Cf "FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo. Saraiva, 2005, 9ª ed., p. 68.

15 MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. cit, p. 546.

16 FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Código De Processo Penal Comentado. São Paulo. Saraiva, 2005, 9ª ed., p. 68

17 FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 70.

18 ROCHA. Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. cit, p. 756 apud JAMES TUDENCHLAK

19 Ibidem.

20 FILHO. Fernando Da Costa Tourinho. Op. Cit. P. 69.

21 Nesse sentido, propugna o doutrinador baiano Ticiano Alves e Silva, em sua monografia "Possibilidade e admissibilidade do reaforamento no direito brasileiro: doutrina e jurisprudência": "Pode-se afirmar, até, que o desaforamento é gênero do qual reaforamento é espécie".

22 Nesse diapasão: MIRABETE. Júlio Fabbrini, op. Cit., p. 549; NORONHA. E. Magalhães. Op. Cit., p. 344, ROCHA, Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. Cit., p. 752.

23 FILHO, Eduardo Spínola. Op. Cit., p. 407

24 ROCHA, Francisco De Assis do Rego Monteiro. Op. Cit., p. 752

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Sobre o autor
Rodrigo Tourinho Dantas

Advogado em Salvador (BA). Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL). Pós-graduando "lato sensu" em Direito Processual Civil pela Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Rodrigo Tourinho. O desaforamento e o reaforamento no novo procedimento do júri. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1812, 17 jun. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11389. Acesso em: 22 nov. 2024.

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