Em 22 de maio de 2025, o governo federal publicou o Decreto nº 12.466/2025 (DOU extra) elevando diversas alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) como parte do esforço de ajuste fiscal. As alterações atingiram principalmente três categorias: operações de crédito, operações de câmbio e seguro de vida/resseguro (VGBL). A medida – apresentada junto a um contingenciamento de R$ 31,3 bi – foi justificada como forma de reforçar o arcabouço fiscal, harmonizar política tributária e monetária, reduzir distorções e aumentar a arrecadação. A seguir, detalhamos o que mudou, os objetivos declarados e os impactos previstos.
Categorias afetadas e principais mudanças
Operações de Crédito (empréstimos e financiamentos)
Manteve-se inalterado o IOF sobre empréstimos a pessoas físicas (por exemplo, cheque especial e crédito pessoal), mas a alíquota para pessoas jurídicas quase dobrou, de 1,88% para 3,95% ao ano (teto). No momento da contratação, empresas passarão a pagar 0,95% (antes 0,38%) e a alíquota diária, de 0,0041% para 0,0082%. Para as pequenas empresas do Simples Nacional (empréstimos até R$ 30 mil), a alíquota anual subiu de 0,88% para 1,95%. O Microempreendedor Individual (MEI), que sofria insegurança jurídica, agora tem alíquota fixa de 1,95% ao ano. As cooperativas de crédito com volume superior a R$ 100 milhões/ano passaram a ser tratadas como empresas comuns (0% → 3,95% ao ano); cooperativas rurais abaixo desse limite permanecem isentas. Em resumo, cooperativas grandes e empresas pagam IOF maior, igualando-os aos encargos de PF, enquanto crédito habitacional, rural e programas sociais seguem isentos.
Operações de Câmbio
Houve uniformização das alíquotas em 3,5% por operação para quase todas as transações internacionais. Cartões de crédito, débito e pré-pagos estrangeiros e cheques de viagem: de 3,38% para 3,50%. Compra de moeda em espécie e remessa a conta de residente no exterior: de 1,10% para 3,50%. Operações “não especificadas” (saída de recursos não classificadas): de 0,38% para 3,50% por operação. Empréstimos externos de curto prazo tiveram conceito de “curto” reduzido de 1.080 para 360 dias, passando de IOF 0% para 3,50%. Somente a entrada de recursos permanece tributada em 0,38%, sem aumento. Inicialmente previa-se também 3,5% sobre transferências de fundos de investimentos ao exterior, mas essa alíquota foi revogada horas depois, mantendo-se 0% para esse caso. O objetivo declarado foi eliminar brechas e assimetrias na tributação cambial e desencorajar contas bancárias no exterior.
Seguros e previdência privada (VGBL)
Foi excluída a isenção sobre aportes elevados. Para planos de Vida Gerador de Benefício Livre, aplica-se IOF de 5% sobre aportes mensais superiores a R$ 50 mil (R$ 600 mil/ano); aportes menores mantêm alíquota zero. Segundo o governo, a medida corrige “distorção” que permitia alta renda remeter dinheiro a VGBL sem tributação, em vez de investir em fundos exclusivos onerados desde 2023.
Outros
Destacou-se a equiparação do MEI mencionado (padronizado em 1,95%). Aplicações de fundos nacionais no exterior chegariam a ter IOF de 3,5%, mas isso foi revogado. O próprio Decreto nº 12.466/2025 (publicado em 22/05) entrou em vigor em 23/05/2025. Em 23/05 o governo alterou o texto para restaurar isenção de fundos estrangeiros (alíquota 0%) e manter a alíquota de 1,1% para remessas de pessoas físicas a investimentos no exterior.
Objetivos do governo
A justificativa oficial destacou metas fiscais e correção de distorções. O ministério da Fazenda afirmou que as medidas “focam na uniformização e correção de distorções” e harmonizam as políticas fiscal e monetária, reduzindo volatilidade cambial e criando “maior estabilidade macroeconômica”. Em entrevista, executivos do Tesouro ressaltaram que o foco seria empresas e contribuintes de maior renda, sem elevar tributos para pessoas físicas (PF) ou investimentos de longo prazo. O secretário Durigan lembrou que o aumento no IOF terá “grande importância” para manter o país no “rumo correto” do equilíbrio fiscal. Em suma, os objetivos declarados incluem:
Arrecadação extra: reforçar o caixa do governo. A equipe econômica estimava R$ 20,5 bilhões adicionais em 2025 (R$ 41 bi em 2026) para ajudar a cumprir as metas fiscais do arcabouço.
Equilíbrio fiscal: sinalizar compromisso com controle de gastos e redução de deficit. Junto ao congelamento de despesas, o aumento do IOF seria parte de um pacote de “consolidação fiscal”.
Harmonização tributária: igualar a carga do IOF entre PF e PJ e fechar brechas. Por exemplo, empresas passaram a pagar a mesma alíquota de empréstimo das pessoas físicas; cooperativas grandes são equiparadas a bancos; e a tributação cambial foi unificada para evitar tratamento preferencial.
Fechamento de brechas: eliminar distorções fiscais apontadas. A medida do VGBL visa tributar aqueles que vinham usando previdência privada de alto valor para fugir de imposto de renda sobre fundos exclusivos. Segundo Barreirinhas (Receita Federal), “trazemos pessoas jurídicas para a mesma carga das pessoas físicas” em crédito.
Controle de capitais: desencorajar saída de recursos. O governo admitiu que a equalização do IOF em câmbio visa “desestimular a preferência pela abertura de conta internacional”. Economistas viram nas mudanças um passo em direção ao controle da conta de capitais (conforme José Márcio Camargo), embora o Tesouro negue objetivo de conter o dólar.
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Estabilidade macro: ao reduzir distorções e gerar mais receita, as medidas deveriam dar “credibilidade” à política fiscal e colaborar com o Banco Central na queda das taxas de juros reais.
Impactos previstos
Os efeitos das mudanças têm sido amplamente debatidos. Em linhas gerais, para consumidores (PF) o governo ressaltou que operações cotidianas, como cheque especial, crédito habitacional e rural, não mudam. No entanto, turistas e pessoas que fazem compras ou remessas internacionais passarão a pagar IOF mais alto (3,5% sobre cartão internacional, câmbio em espécie e envios ao exterior). Um exemplo prático citado é que uma remessa de R$ 3.000 a familiares no exterior, antes sujeita a 1,1%, agora geraria R$ 105 de IOF. Pagamentos de serviços em nuvem ou aplicativos estrangeiros ficarão 3% mais caros a cada transação. Além disso, compras parceladas no cartão nacional podem pesar no orçamento familiar, pois o IOF embutido em cada parcela subiu.
Para empresas, o aumento do IOF encarece empréstimos e financiamentos. Uma empresa que pegava R$ 10 mil emprestado por um ano pagará até R$ 395 de IOF (antes até R$ 188). No Simples, um empréstimo de R$ 10 mil gerará IOF de R$ 195 (antes R$ 88). Sob essa lógica, associações empresariais estimam custo adicional de cerca de R$ 19,5 bilhões em 2025 nas operações de crédito, câmbio e seguros, chegando a R$ 39 bi em 2026. A tributação cambial também onera insumos importados: o frete internacional, por exemplo, terá carga de IOF de 3,5% (era 0,38%), elevando preços de produtos importados e pressionando a inflação. Cooperativas de crédito de grande porte veem aumento do custo de captação (tributação de 0→3,95%), prejudicando concorrência frente a bancos. Por outro lado, pequenas empresas do Simples sentirão impacto relativamente menor, mas ainda assim pagarão IOF mais alto em financiamentos.
No setor público, as mudanças foram quantificadas em receitas extras. Inicialmente, esperava-se arrecadar R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026 com o novo IOF. Com a revogação parcial (manutenção de 0% em fundos externos e 1,1% em remessas PF), esse total deverá ser ajustado, embora o governo não tenha divulgado cálculo final. A equipe econômica afirma que esses recursos reforçam a meta fiscal e ajudam o BC a reduzir juros. Já o setor privado alerta que o aumento do IOF elevará custos de operação em quase R$ 19,5 bi em 2025, com impacto amplo sobre crédito e câmbio.
Pontos positivos
Aumento de receita fiscal: a elevação do IOF reforça o caixa do governo em montantes bilionários, ajudando a cumprir a meta do arcabouço fiscal.
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Uniformização tributária: ao igualar o IOF para empresas e pessoas físicas e remover isenções concentradas na alta renda, reduz-se arbitragem fiscal. Por exemplo, empresas passarão a pagar IOF equivalente ao de PF em financiamentos, tornando o sistema mais equânime.
Fechamento de brechas: o governo arguiu que a mudança corrige distorções – por exemplo, faz com que quem aplicava em VGBL de alto valor pague IOF, evitando fuga tributária para esses produtos.
Controle de fluxos internacionais: a unificação das alíquotas cambiais e a tributação sobre remessas desincentivam a abertura de contas no exterior e reduzem espaço para arbitrariedades que pressionavam o câmbio.
Disciplina macro: segundo o governo, as medidas reforçam a credibilidade fiscal do país. Barreirinhas (Receita) lembrou que as alíquotas ainda estão abaixo das praticadas no governo anterior, e o ajuste promove “estabilidade fiscal” e alinhamento entre políticas econômicas.
Pontos negativos
Custo elevado do crédito: o principal receio é que as empresas sofram com empréstimos mais caros. As confederações do setor produtivo apontam que o IOF sobre empréstimos à empresa cresceu mais de 110% ao ano, encarecendo investimentos produtivos. Micro e pequenas empresas também sentem impacto (ex.: IOF em R$ 10 mil emprestados sobe de R$ 88 para R$ 195).
Aumento dos custos de importação e inflação: tributar em 3,5% serviços e bens do exterior (fretes, softwares, equipamentos) eleva a carga tributária sobre insumos importados. Isso pode repassar-se aos preços ao consumidor, exigindo contenção de gastos em outras áreas para evitar pressões inflacionárias.
Redução do consumo interno: a carga adicional em compras parceladas no cartão e serviços online estranhamente onera o bolso do consumidor sem redução correspondente de outras taxas. Especialistas afirmam que esses 3% adicionais em transações internacionais transferem poder de compra para o setor externo, o que tende a frear consumo interno não-essencial.
Insegurança jurídica e reação do mercado: mudanças abruptas em tributos regulatórios geraram protestos. As principais entidades privadas lançaram manifesto contra o decreto, pedindo sua anulação. Também houve projetos no Congresso para revogar a medida. Essa imprevisibilidade pode afetar a confiança dos investidores.
Risco de controle de capitais: como apontou o economista José Márcio Camargo, elevar o IOF para operações internacionais é visto como “primeiro passo” para restringir conta de capitais. Há críticas de que o tributo regulatório, usado com finalidade arrecadatória, pode ser contestado judicialmente e frear investimentos externos.
Em síntese, as alterações no IOF têm o potencial de reforçar receitas e corrigir distorções tributárias, mas geram custos adicionais para crédito, comércio exterior e consumo. Os efeitos dependem do equilíbrio entre as metas fiscais alcançadas e os impactos negativos sobre a atividade econômica. O governo vem destacando ganhos em arrecadação e estabilidade cambial, enquanto setores privados alertam para agravamento de encargos e retração de investimentos.
Fontes
Decreto presidencial (DOU 23/05/2025)
Informações da Receita Federal/Fazenda
Notícias da Agência Brasil, UOL, BBC, Globo/Valor, CNN Brasil e outros veículos econômicos.