4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo abordou a criminologia midiática, que se apresenta como uma área de análise crítica ao relacionar mídia, sociedade e crime, promovendo reflexões relevantes acerca dos efeitos da cobertura jornalística na persecução penal. Buscou-se investigar até que ponto a imprensa respeita os limites do devido processo legal ao noticiar crimes de grande impacto.
A pesquisa evidenciou uma realidade preocupante: a espetacularização midiática de crimes, especialmente aqueles de violência extrema ou envolvendo figuras públicas. Essa prática compromete a neutralidade indispensável ao processo penal, substituindo a investigação técnica por narrativas sensacionalistas que, muitas vezes, julgam publicamente os acusados antes de suas respectivas audiências.
Constatou-se que a influência da mídia pode ser prejudicial ao equilíbrio do processo penal, sobretudo quando veículos de comunicação assumem o papel de “julgadores morais”, atribuindo culpa antes da conclusão legal dos fatos. Tal postura origina um “tribunal midiático” paralelo, que prejudica o direito de defesa e alimenta o preconceito social contra o acusado.
Conclui-se que a criminologia midiática, embora não seja um fenômeno recente, assume contornos especialmente perigosos no contexto atual de hiperconectividade, jornalismo instantâneo e redes sociais. Observa-se um desgaste no limite entre o interesse público e o interesse pelo espetáculo, resultando na transformação do processo penal em narrativa midiática pautada pela audiência, e não pela justiça. Esse cenário prejudica não apenas o direito do acusado, mas também a credibilidade do sistema de justiça.
Como proposta de aperfeiçoamento jurídico, sugere-se a criação de uma regulamentação que estabeleça parâmetros legais claros para a cobertura midiática de processos penais em andamento, com especial atenção à preservação da identidade e da imagem dos acusados, bem como à responsabilização civil e penal por danos decorrentes de julgamentos antecipados e da divulgação seletiva de provas. É imprescindível fortalecer os mecanismos de responsabilização da imprensa quando esta, de forma reiterada e consciente, viola direitos fundamentais assegurados pela Constituição.
As limitações do presente estudo devem ser reconhecidas. Por se tratar de uma pesquisa de cunho teórico, não houve coleta de dados experimentais por meio de entrevistas com profissionais do sistema de justiça ou da comunicação, o que poderia oferecer uma compreensão mais prática e interdisciplinar do fenômeno. Também não foram analisadas estatísticas sobre o impacto direto da mídia nas decisões judiciais, o que possibilitaria mensurar com maior precisão os efeitos qualitativamente observados.
Para pesquisas futuras, recomenda-se a realização de estudos empíricos que avaliem a percepção de magistrados, defensores públicos, promotores e jornalistas sobre o papel da mídia nos processos penais. Ademais, seria importante investigar como a formação ética e jurídica dos profissionais da comunicação pode contribuir para uma cobertura mais responsável de casos criminais. Outro campo promissor de estudo refere-se ao impacto das redes sociais e da desinformação na construção de narrativas criminais e no fortalecimento do punitivismo penal.
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MEDIA CRIMINOLOGY AND CRIMINAL LAW: an analysis in the light of public opinion and fundamental rights
Abstract: The present study addresses the relativization of the fundamental rights of the accused, focusing on cases that gain wide repercussion in the media. It sought to know how the influence of the media reflects on the due process of law and what are its consequences in the sphere of Brazilian Criminal Law. The objective was to critically reflect on the developments of media criminology in the context of Brazilian criminal procedure, focusing on the guarantee of fundamental rights and judicial independence. The methodology adopted was qualitative, descriptive and exploratory, with the purpose of critically analyzing the impacts of the media on the Brazilian criminal process and its interference in the protection of fundamental rights, in particular, the right to the presumption of innocence. It was possible to understand that media criminology increases the scope of traditional criminology, by including the media as a determining variable in the study of criminality. The aforementioned jurisprudence makes it evident that the judiciary has faced this dilemma carefully, sometimes identifying the moral damage caused by the media, understanding that the little repercussion does not compromise, by itself, the impartiality of the trial. By characterizing cases as denied habeas corpus or requests for waivers, it is evident that the moral impacts caused by media exposure are not always fully identified or repaired by the justice system, which leaves the feeling of justice weakened. It was concluded that media criminology, even if it is not a current phenomenon, gains especially dangerous contours nowadays of hyperconnectivity, instant journalism and social networks. This scenario harms not only the rights of the accused, but the credibility of the justice system itself.
Keywords: Criminology; Criminal law; Media, Influence; Public opinion.