Nos últimos anos a legislação processual brasileira tem sido objeto de significativas mudanças. O procedimento executório, por exemplo, foi profundamente alterado no intuito de adequá-lo à sua finalidade satisfativa, sem descuido das garantias do executado.
Uma dessas alterações diz respeito ao prazo para pagamento da obrigação constante de título executivo extrajudicial. Segundo a nova redação do art. 652, será o executado citado para pagar a dívida em três dias. Vejamos o que diz o citado artigo:
Art. 652. O executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
§ 1º Não efetuado o pagamento, munido da segunda via do mandado, o oficial de justiça procederá de imediato à penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se o respectivo auto e de tais atos intimando, na mesma oportunidade, o executado. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). (negrito nosso)
Para compreender a controvérsia, necessário se faz transcrever o texto revogado pela lei 11.382/06:
Art. 652. O devedor será citado para, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, pagar ou nomear bens à penhora.
§ 1o O oficial de justiça certificará, no mandado, a hora da citação. (negrito nosso)
Apoiado na redação anterior, a jurisprudência se firmou no sentido de considerar o início do prazo a partir do momento da efetivação da citação do executado. Nesse sentido, o prazo fixado em horas seria contado de minuto a minuto, por aplicação analógica do art. 132, §4º do Código Civil. Se o prazo houvesse de ser contado a partir da juntada do mandado aos autos, o §1º que previa a certificação da hora da citação seria letra morta, por absoluta inutilidade.
Ademais, a título exemplificativo da ampla jurisprudência sobre o assunto, cabe transcrever trecho do voto proferido pelo ministro Vicente Leal nos autos do RE nº 416.861/DF:
Ocorre, todavia, que a simples leitura do citado dispositivo legal indica ser o prazo de vinte e quatro horas para pagamento ou nomeação de bens à penhora contado da data da citação do devedor e não da juntada do mandado aos autos.
Tal entendimento se coaduna, inclusive, com o disposto no § 1º do dispositivo em comento, determinando ao oficial de justiça que certifique, no mandado, a hora da citação, para que o prazo peremptório de 24 horas seja contado minuto a minuto.
Não é demais salientar que na redação anterior havia a faculdade, atribuída ao executado, de nomear bens à penhora, o que foi suprimido pela lei 11.382/06. Logo, o prazo também tinha natureza peremptória, com efeito preclusivo quanto ao exercício dessa faculdade.
Entretanto, com as alterações promovidas pela citada lei, o prazo não mais se conta em horas, mas em dias. E a alteração não foi despropositada. Em primeiro lugar, há muito o prazo horário era apenas simbólico, pela absoluta impossibilidade de pronto cumprimento por parte dos oficiais de justiça. O legislador, portanto, fixou prazo razoável tanto para o executado quanto para os oficiais cumprirem o que lhes cabe sem prejuízo de seu ofício.
Em segundo lugar, não mais existe a previsão de se fazer constar no mandado a hora em que se realiza a citação. Se o que justificava a contagem do prazo a partir da citação era justamente isso, suprimida essa, desaparece a razão que estabelecia regra especial de contagem. Se quisesse o legislador preservar o modo de contagem, bastaria estabelecer 72 horas, e não três dias, como fez.
Por essa razão, não mais subsistem os caracteres que excepcionavam o início da contagem do prazo. Portanto, embora o processo de execução tenha características distintas, naquilo que não tenha recebido regramento específico, incidirão as normas próprias do processo de conhecimento. É o que dispõe o art. 598 do CPC. Vê-se, outrossim, que o legislador unificou o modo de contagem do prazo, fazendo o iniciar nos moldes genéricos estabelecidos no diploma processual.
Vejamos, portanto, o que dispõe o Código de Processo Civil acerca dos prazos:
Art. 241. Começa a correr o prazo: (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993)
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II - quando a citação ou intimação for por oficial de justiça, da data de juntada aos autos do mandado cumprido; (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993)
Dando mostras de que pretendeu unificar o modo de contagem dos prazos, previu o legislador que o mandado fosse expedido em duas vias, conforme se depreende da leitura da nova redação do §1º do art. 652. Expede-se, portanto, mandado em duas vias, sendo a primeira para citação, e a segunda para penhora e avaliação. Se o prazo fosse para iniciar com a entrega real da citação, bastaria apenas uma via para efeito de citação, penhora e avaliação.
Portanto, por ocasião da citação, a contrafé da primeira via do mandado será entregue ao executado. Cumprida a citação, a primeira via será juntada aos autos do processo. Entretanto, a segunda via, e sua respectiva contrafé, restará em mãos do oficial para eventual penhora e avaliação, caso inadimplida a obrigação. Caberá ao oficial verificar nos autos se o executado pagou a dívida no prazo de três dias a partir da juntada.
Ademais, essa também é a conclusão a que chega Alexandre Freitas Câmara:
" (...) A citação na execução por quantia certa contra devedor solvente é feita para que o demandado, no prazo de 3 dias, pague a dívida. O prazo de três dias corre da juntada aos autos do mandado. O mandado de citação (que, na verdade, é muito mais do que isso, tratando-se de verdadeiro mandado de execução) deverá ser extraído pelo cartório em duas vias, e o oficial de justiça, após realizar a citação, deverá devolver - para ser juntado aos autos- apenas a primeira delas. A segunda via deverá permanecer com o oficial para que, se for o caso, realize posteriormente a penhora. (...) (Câmara. Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Vol II. 14ª ed. Lumen Juris. p.303)
Parece cristalino que o início do prazo para adimplemento da obrigação deve, realmente, seguir a regra geral do processo civil. Se feita a citação por oficial de justiça, o prazo iniciará apenas com a juntada aos autos do mandado de citação cumprido.