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O controle concomitante dos atos administrativos pelo Ministério Público como instrumento de combate à corrupção

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14/07/2008 às 00:00

Resumo:


  • A corrupção é um dos grandes males que afetam a sociedade brasileira, sendo combatida pelo Estado através de meios legais, como a atuação do Ministério Público.

  • No Brasil, a corrupção é encontrada em diversas esferas do Estado, sendo necessário distinguir corrupção política de corrupção administrativa.

  • Além do enfoque repressivo, o controle concomitante dos atos administrativos pelo Ministério Público surge como uma estratégia preventiva eficaz no combate à corrupção, permitindo corrigir ou anular atos viciados antes que produzam efeitos danosos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

"(,,,)

Com o tempo a gente consegue

ser livre, ético e o escambau.

Dirão: é inútil, todo mundo aqui é corrupto,

desde o primeiro homem

que veio de Portugal.

E eu direi: não admito.

Minha esperança é imortal.

E eu repito: ouviram? Imortal.

Sei que não dá pra mudar o começo.

Mas, se a gente quiser,

vai dar pra mudar o final." (g.n.)

Elisa Lucinda [01]

1.INTRODUÇÃO

Um dos grandes males que afetam a sociedade brasileira há muito tempo é a corrupção. Em face disso, o Estado tem criado e implementado diversos meios legais para combatê-la.

Destaca-se no cumprimento desse papel o Ministério Público, que por possuir inúmeras atribuições constitucionais e gozar de valiosíssimas prerrogativas institucionais, tem tido atuação forte na tentativa de moralizar a Administração Pública.

Assim, deve ser constantemente repensada sua atuação funcional no que diz respeito ao controle dos atos praticados pela Administração Pública. É a isso que se propõe o presente artigo, numa tentativa de avaliar uma nova fórmula de se lidar com a corrupção por essa Instituição.


2.DEFINIÇÃO DE CORRUPÇÃO – O CASO BRASILEIRO

Para o termo corrupção não se tem uma definição exata. A palavra pode tomar diversas acepções, dependendo do contexto em que é inserida. Deriva ela do latim corruptus [02], que pode significar quebrado em pedaços ou, então, apodrecido, depravado.

Porém, pode-se tomá-la no sentido mais comum em que ela é utilizada, sendo aquela situação em que há uma obtenção de vantagem por alguém mediante a quebra da impessoalidade. Ou seja, numa relação que deveria ser regida pelo aspecto impessoal, há desrespeito a essa orientação, atendendo-se a alguém por motivo de amizade, vantagem financeira ou qualquer outro meio ilegítimo.

Nesse sentido, o termo corrupção não está ligado somente à questão pública, havendo, de igual forma, corrupção na esfera privada. E o exemplo que se dá dessa última é o de pagamento de suborno por uma empresa para um diretor de estabelecimento concorrente a fim de se obter o segredo profissional da competidora.

Contudo, o que interessa ao presente artigo é a corrupção pública que a população brasileira de há muito se acostumou a ver no seu cotidiano, seja nos bate-papos, seja nos noticiários da imprensa.

Um caso corriqueiro e simbólico de corrupção é a solicitação ou exigência de vantagens por policiais rodoviários de motoristas flagrados infringindo regras de trânsito, para que se deixe de lavrar o auto de infração de imposição de multa. Se um brasileiro ainda não passou por essa situação, quase sempre sabe de alguém que a tenha vivenciado. Infelizmente, essa é a conduta leviana adotada por alguns profissionais dessa e de outras categorias, que se submetem ao suborno.

Além disso, o fenômeno da corrupção é encontrado nas três esferas do Estado, tendo atingido até mesmo o Poder Judiciário, que antes gozava de uma imagem sacra perante a população. As operações policiais que descobriram o comércio de decisões judiciais tornaram-se públicas. Assim, é falsa a impressão de que por lidarem os Poderes Executivo e Legislativo com a destinação das verbas públicas, seriam os únicos focos da corrupção estatal.

Nessa toada, compreende distinguir corrupção política de corrupção administrativa.

A corrupção política faz-se no âmbito da elaboração das leis e nas tomadas de decisões políticas, envolvendo agentes de poder. Ou seja, mesmo que tenhamos em vigor uma lei aprovada pelo Parlamento, isso não nos permite dizer que o ato normativo é legítimo, pois pode ter sido fruto de vício da vontade parlamentar. Esse fenômeno é mais perigoso, pois está camuflado nos bastidores políticos e vicia a própria representação popular no parlamento, deturpando a democracia.

Um caso recente, que bem demonstra a corrupção política, é o famoso "Mensalão", em que ficou fortemente evidenciado que inúmeros parlamentares recebiam recursos públicos e privados, para apoiar a base governista do Governo Lula. Os acusados estão sendo processados no Supremo Tribunal Federal, na Ação Penal n.º 470, de Relatoria do Ministro Joaquim Barbosa [03], em face da prerrogativa de foro de alguns dos réus, que atrai por conexão o processo dos demais acusados [04]. Interessante registrar que há corrente doutrinária que sustenta ser inconstitucional por vício de decoro parlamentar a norma aprovada dessa forma. [05]

De outro lado, a corrupção administrativa diz respeito ao desvio do agente público da legalidade e moralidade administrativa que o norteiam. Tratam-se de casos em que há quebra do dever de lealdade do servidor público de qualquer escalão com a Administração Pública que o remunera. Nesse aspecto que se enquadra o sobredito exemplo do policial rodoviário.

A corrupção administrativa compreende, além da ofensa à lei, o desatendimento à moralidade. Ressalte-se que a moral desatendida pelo corrupto não é a moral comum, pessoal, mas sim à moralidade administrativa, como distingue Jefferson Aparecido Dias [06]:

"Apesar de respeitáveis entendimentos em sentido contrário, não nos parece que a moral administrativa tenha a mesma abrangência da moral comum em qualquer de seus aspectos; nem que seja sinônimo de moral pessoal, ou indicativa da moral vigente nas relações interpessoais, uma vez que a moral administrativa deve incluir apenas as máximas que dizem respeito à Administração Pública e seus fins, e não todas as máximas que devem nortear a vida dos homens em sociedade."

A situação da corrupção tornou-se tão generalizada que se chega ao extremo de se dizer no senso comum que "todo político é corrupto". A afirmação, de grande equívoco, faz injustiça com o trabalho honesto de várias pessoas ligadas à classe política e que prestam relevantes serviços ao país.

Menciona-se, ainda, a respeito da corrupção, que é fenômeno cultural, arraigado no comportamento da sociedade brasileira, que remonta à sua colonização. Afirma-se que o brasileiro, oriundo da miscigenação do índio, do português e do escravo, gerou o homem cordial, que teria dificuldades de assimilar as normas gerais e impessoais. Baseia sua conduta em relações de aproximação e de lhaneza do trato.

A respeito da cultura de corrupção, leciona Wallace Paiva Martins Júnior [07]:

"A deturpação tradicional do poder disseminou na sociedade brasileira a inconveniente, insuportável e incômoda cultura da improbidade administrativa, pela qual os maiores e mais gritantes escândalos eram vistos com passividade geral como decorrência da naturalidade das coisas, como se fosse absoluta, elementar e naturalmente lícitos aos agentes públicos a obtenção de vantagens ilícitas, o malbaratamento dos recursos do erário, o vilipêndio aos princípios da Administração Pública e o desprezo aos direitos e garantias individuais e sociais. Causas inúmeras (algumas atávicas, implantadas na fase do colonialismo português) contribuíram para esse estado de coisas, notadamente porque o Estado brasileiro é excessivamente tutelar, demasiadamente burocrático e radical interveniente no atacado e varejo das relações sociais."

A corrupção tem como principal efeito a lesão aos cofres públicos. Verbas que são arrecadadas para o atendimento das necessidades públicas (tais como: serviços públicos de saúde, educação, polícia etc.) escoam para patrimônios privados de pessoas inescrupulosas. Como efeitos reflexos de sua prática, podem-se citar: diminuição do crescimento econômico, obstrução do desenvolvimento, comprometimento da legitimidade política, enfraquecimento das instituições democráticas, dos valores morais e um descrédito nos serviços públicos, permitindo o avanço do crime organizado e o agravamento dos problemas sociais. Ela gera também a redução de investimentos públicos e privados, nacionais e internacionais, prejudicando o desenvolvimento industrial.

No ano de 2007, dados da ONG - Transparência Internacional atribuíram ao Brasil a posição de 72º lugar no ranking mundial de corrupção, com pontuação de 3,5 numa escala de 0 a 10 no Índice de Percepção da Corrupção (quanto menor a nota, pior a avaliação). Nas primeiras posições aparecem países como Dinamarca, Finlândia e Nova Zelândia, todos com pontuação de 9,4 [08].

O tamanho do problema não pode servir de óbice à análise e à implementação de novas medidas de combate. Pelo contrário, a sociedade como um todo, em especial os agentes públicos, tem um compromisso com a diminuição da corrupção. Certamente, acabar com ela é propósito utópico e inatingível, dada a falibilidade humana. No entanto, numa sociedade democrática e republicana os desvios de conduta e ilícitos praticados por qualquer pessoa devem ser apurados e punidos, na forma da lei.


3.POSIÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO FRENTE À CORRUPÇÃO

O Estado Brasileiro adotou, no seu plano jurídico, uma verdadeira cruzada contra a corrupção pública, conhecendo os efeitos deletérios dessa prática para a sociedade. Aliás, na própria definição da forma republicana de Estado (art. 1.◦ da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB) há o repúdio aos benefícios ilegítimos e ilegais deferidos ao príncipe.

Em outro ponto, a cidadania, como fundamento da República (art. 1.◦, inciso II, CRFB), consagra o direito do cidadão à participação nos destinos políticos do país, garantindo, dentre outras formas, a fiscalização da coisa pública. Nesse sentido o art. 5.º, inciso LXXIII, da Constituição Republicana confere a ele o direito de propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público e o art. 74, § 2.◦, defere a todos cidadãos o direito de denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas. Nesse sentido, o texto constitucional traz uma garantia ao cidadão, a saber, o direito subjetivo ao governo honesto.

A Constituição Federal dispõe, no art. 14, §9.º, que a lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade, a fim de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato. Forte corrente de juristas vem afirmando ser esse artigo auto-aplicável, extraindo-se a conclusão de que os tribunais eleitorais não devem aceitar candidatura de pessoas que tenham a vida pregressa manchada de registros criminais. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, nas eleições de 2006, não aceitou alguns registros de candidatura com esse fundamento. No entanto, o Tribunal Superior Eleitoral- TSE não acatou tal argumento, admitindo que eles concorressem aos cargos [09]. Esse entendimento foi corroborado no ano de 2008, quando o TSE julgou o Processo Administrativo n. º 19919 [10].

No capítulo constitucional da Administração Pública, (art. 37, caput) coloca-se como pilar de qualquer agir administrativo, dentre outros, a atenção aos princípios da moralidade, da publicidade e da impessoalidade, servindo eles como verdadeiras armas contra a prática da corrupção. Logo em seguida, no §4º do citado artigo, trata das penalidades aplicáveis aos sujeitos que praticam atos de improbidade administrativa, a saber, a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário.

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Vale registrar, ainda, que figura como princípio constitucional sensível o dever de prestação de contas da administração pública direta e indireta (art. 34, inciso VII, alínea ‘b’ da CRFB). Seu desatendimento autoriza, inclusive, a medida extrema existente no estado federativo, a saber, a intervenção da União nos Estados.

Além disso, o atentado contra a probidade na administração é previsto como crime de responsabilidade praticado pelo Presidente da República ou por Ministros de Estados (art. 85, inciso V, CRFB).

Já no âmbito internacional, o Brasil comprometeu-se em mais de um organismo internacional a adotar práticas que previnam e reprimam a corrupção. Em 09 de dezembro de 2003, na cidade de Mérida (México) o país assinou a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, que o Governo Brasileiro promulgou por meio do Decreto n.º 5.687/06.

A mencionada Convenção [11] prescreve, num considerando, que:

"Tendo presente que a prevenção e a erradicação da corrupção são responsabilidades de todos os Estados e que estes devem cooperar entre si, com o apoio e a participação de pessoas e grupos que não pertencem ao setor público, como a sociedade civil, as organizações não-governamentais e as organizações de base comunitárias, para que seus esforços neste âmbito sejam eficazes;"

No âmbito da Organização dos Estados Americanos - OEA, o país assinou a Convenção Interamericana Contra a Corrupção, firmada em 29 de março de 1996, em Caracas (Venezuela). No Brasil, o Decreto n.º 4.410/02 a promulgou.

De todo o panorama legislativo exposto, revela-se que o Estado Brasileiro, em seu ordenamento jurídico, declarou verdadeira guerra à corrupção, proscrevendo atos administrativos imorais e ímprobos. Definitivamente, não se tolera mais a prática administrativa manchada pela quebra da impessoalidade.

Na atual ordem jurídica, dá-se grande importância ao princípio da transparência pública, que há muito fora reconhecido no Direito Público brasileiro como orientador da ação dos gestores públicos. Trata-se de medida saudável ao exercício da função pública, e que permite à sociedade e aos órgãos de controle interno e externo que tomem conhecimento das ações patrocinadas pelo Poder Público para fins de controle do seu procedimento e dos seus fins.

A esse dever de transparência e de combate à corrupção pelo Poder Público e pela sociedade em geral corresponde o direito subjetivo de todo cidadão a ter um governo honesto.

A propósito, em voto brilhante, proferido nos autos do MS 27141 MC/DF, o Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, descreveu assim a relação Estado-cidadão perante o tema [12]:

"Sabemos

todos
que o cidadão tem o direito de exigir que o Estado seja dirigido por administradores íntegros, por legisladores probos e por juízes incorruptíveis, que desempenhem as suas funções com total respeito aos postulados ético-jurídicos que condicionam o exercício legítimo da atividade pública. O direito ao governo honesto – nunca é demasiado reconhecê-lo - traduz uma prerrogativa insuprimível da cidadania."

Portanto, pelos princípios e normas vigentes ora descritos, evidencia-se um Estado Brasileiro que não tolera a corrupção. Pelo trágico histórico, pretende-se extirpar dos quadros públicos as pessoas desonestas e corruptas.


4.FORMAS DE CONTROLE DO ATO ADMINISTRATIVO

De início, cumpre conceituar controle do ato administrativo ou da Administração Pública. A respeito disso, Hely Lopes Meirelles [13] leciona: "Controle, em tema de administração pública, é a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro."

A propósito, Diógenes Gasparini [14] afirma que controle do ato administrativo:

"É a atribuição de vigilância, orientação e correção de certo órgão ou agente público sobre a atuação de outro ou de sua própria atuação, visando confirmá-la ou desfazê-la, conforme seja ou não legal, conveniente, oportuna e eficiente. No primeiro caso tem-se heterocontrole; no segundo, autocontrole, ou, respectivamente, controle externo e controle interno"

Trata-se assim da verificação da legalidade e do mérito do ato ou atividade administrativa analisados pelo próprio ou por outro órgão com o objetivo de ratificá-lo, corrigi-lo, revogá-lo, ou anulá-lo.

A Administração Pública sujeita-se a diversas espécies de controle. A primeira divisão é feita quanto ao âmbito de quem o realiza. Divide-se em externo e interno, conforme leciona Celso Antônio Bandeira de Mello [15]: "A Administração Pública, direta, indireta ou fundacional, assujeita-se a controles internos e externos. Interno é o controle exercido por órgãos da própria Administração, isto é, integrantes do aparelho do Poder Executivo. Externo é o efetuado por órgãos alheios à Administração".

O controle interno é exercido pelos três Poderes com a finalidade primordial de comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial (art. 74, inciso II, CRFB). Destaca-se, nesse cenário, o trabalho da Controladoria-Geral da União, órgão de controle interno do Poder Executivo Federal [16].

Já o controle externo pode ser exercido pelo Poder Legislativo, diretamente ou auxiliado pelo Tribunal de Contas, ou ainda pelo Poder Judiciário.

No controle feito pelo Legislativo, tem-se aquele que é realizado diretamente, com base nos seguintes dispositivos constitucionais [17]:

"Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (...) V – sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; e VI – fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta;"

O controle exercido pelo Poder Legislativo também pode ser feito com auxílio do Tribunal de Contas, com base no seguinte artigo:

"Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (...) §1º No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis. §2º. Se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito."

A divisão que mais interessa ao presente artigo é aquela feita quanto ao momento em que é exercido, sendo conhecidos, neste aspecto, três tipos de controle do ato administrativo: o controle prévio, o concomitante e o posterior.

A respeito dessa divisão, Kiyoshi Harada [18] escreve:

"O controle prévio é aquele em que torna obrigatório o prévio registro do contrato para ulterior realização da despesa. Conquanto possa criar eventuais embaraços na Administração, retardando a prática dos atos, é o sistema que maior eficácia confere na fiscalização da execução orçamentária. Esse tipo de controle que estava previsto na Constituição Federal de 1946 (art. 77 1 e2) não mais existe na Carta Política vigente, que contempla apenas os controles concomitante e posterior. Descoberta a irregularidade no curso da realização da despesa, ocorre a sustação do ato de execução (controle concomitante), ou, verificada a ilegalidade ou abuso na despesa, por ocasião do julgamento das contas dos administradores em geral, cabe ao Tribunal de Contas aplicar aos responsáveis as sanções previstas em lei (controle posterior)."

No campo normativo, deve-se mencionar o art. 77 da Lei n.º 4.320/64, que estatui normas gerais de direito financeiro, dispondo que: "A verificação da legalidade dos atos de execução orçamentária será prévia, concomitante e subseqüente". (g.n)

Vale transcrever, também, o art. 6.º do Decreto n.º 3.372/05 [19], do Estado de Santa Catarina, que dispondo sobre sistemas e técnicas de controle da Administração Pública prescreve:

"Art. 6º As atividades de controle interno serão exercidas mediante atuação prévia, concomitante e posterior.

§ 1º O controle prévio verifica os atos administrativos antes do seu efetivo reflexo no orçamento e nas finanças do Estado, buscando prevenir a ocorrência de erros ou desvios para garantir, entre outros pressupostos de interesse público, a legalidade, a eficiência e a eficácia da gestão pública.

§ 2º O controle concomitante verifica e acompanha a prática dos atos administrativos durante a realização das operações orçamentárias, contábeis e financeiras, zelando pela legitimidade, legalidade, efetividade e eficácia da gestão pública.

§ 3º O controle posterior verifica, após a execução de programa, projeto ou atividade, a regularidade do recolhimento da receita e da realização da despesa pelo empenho, liquidação e pagamento, com base em prestação de contas, tomada de contas, auditoria de gestão e outros procedimentos pertinentes." (g.n.)

Assim, no combate à corrupção, há de se distinguir, quanto à eficácia, qual o momento mais apropriado para o exercício do controle do ato administrativo, ou seja, definir se antes, durante ou depois da sua prática.

4.1. PREDÔMINANCIA DOS MEIOS REPRESSIVOS DE COMBATE – CONTROLE POSTERIOR

Como instrumento utilizado pelo Poder Público no combate à corrupção, predomina a atuação de meios repressivos de controle, ou seja, realizados posteriormente à sua prática, Vale dizer, tenta-se, embora com muita dificuldade, punir os responsáveis pelo ato ilícito, seja impondo-se sanções de natureza civil, administrativa, eleitoral, e até mesmo criminal.

Tendo isso em conta, destaca-se o papel do Ministério Público no combate à corrupção, seja como titular privativo da ação penal pública seja como legitimado à ação civil pública para proteção do patrimônio público (art. 129, incisos I e III, CRFB), e para ação de improbidade administrativa (art. 17 da Lei n.º 8.429/92).

O meio mais utilizado, hoje em dia, pelo Ministério Público é, sem dúvida, a ação de improbidade administrativa, regida pela Lei n.º 8.429/92. Trata-se de importante instrumento normativo erigido para punir os agentes públicos desonestos, ímprobos. Divide os atos de improbidade em três espécies: a) os que causam enriquecimento ilícito; b) os que causam prejuízo ao Erário; e c) os que atentam contra os princípios da Administração Pública.

Apesar da importância desse aparato e da sua larga utilização pelo Ministério Público, nota-se na prática que, por si só, não dá conta de diminuir os efeitos deletérios da corrupção. Há inúmeros problemas na sua efetivação, tais como demora inerente ao mecanismo Judiciário, dificuldades de produção de provas e de execução da sentença condenatória, dispersão e ocultamento dos beneficiários e dos valores surrupiados etc. Hoje em dia, dificilmente são efetivamente reparados os prejuízos causados ao Erário por atos de corrupção.

De outro lado, o Direito Penal e o Processual Penal também não têm tido o condão de evitar ou coibir práticas desonestas na Administração Pública. Dificilmente, temos notícias de pessoas corruptas cumprindo penas. Isso se dá pela seletividade dos bens penais escolhidos pelo legislador, ue prescreve penas gravíssimas contra autores de delitos que ofendem bens individuais (p. ex., vida, patrimônio individual, liberdade individual) e é mais tolerante com as pessoas que atentam contra valores públicos e difusos (p. ex., administração pública, fé pública, ordem tributária). Nesse ponto, há que se registrar que existem propostas pretendendo classificar como hediondos os crimes cometidos contra a Administração Pública. Já o mecanismo de persecução criminal só recentemente tem adotados instrumentos e meios de se combater esse tipo de criminalidade quase sempre associada ao colarinho branco, restando a superar, ainda, muitos entraves antiquados na legislação processual penal.

Portanto, o enfoque punitivo-repressivo não está dando conta de deter a escalada progressiva da corrupção. É preciso mais, ou seja, que os órgãos públicos controladores, conhecendo os ralos em que escoam os recursos públicos, adotem práticas preventivas e inibidoras dela.

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Sobre o autor
José Rubens Plates

Bacharel em Direito. Analista Processual do Ministério Público da União

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PLATES, José Rubens. O controle concomitante dos atos administrativos pelo Ministério Público como instrumento de combate à corrupção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1839, 14 jul. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11492. Acesso em: 29 dez. 2024.

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